Category: Santo Tomás de Aquino
O quinto discute-se assim. - Parece que o caráter de uma ordem pressupõe necessariamente o caráter de outra.
1. - Pois, maior é a conveniência entre uma ordem e outra, que entre a ordem e outro sacramento. Ora, o caráter da ordem pressupõe o de outro sacramento ─ o batismo. Logo, com maior razão, o caráter de uma ordem pressupõe o de outra.
2. Demais. ─ As ordens são determinados graus. Ora, ninguém pode chegar a um grau superior, sem primeiro chegar ao que o antecede. Logo, ninguém pode receber o caráter de uma ordem mais elevada sem primeiro ter recebido a ordem precedente.
Mas, em contrário. ─ O sacramento a que faltar uma condição necessária à sua validade há de forçosamente ser reiterado. Ora, quem receber uma ordem superior, passando por sobre a que conduz a ela, não precisará de ser ordenado de novo, conferindo-se-lhe apenas a que faltava, segundo o estatuído nos cânones. Logo, a ordem inferior não é necessária para se receber a mais elevada.
SOLUÇÃO. ─ Não é necessário que se tenham as ordens menores, antes de se receberem as maiores, por serem distintos os poderes; e uma não exige, por natureza, que o mesmo sujeito tenha já a outra. Por isso também na primitiva Igreja ordenava-se presbítero quem ainda não tinha as ordens inferiores; e contudo os assim ordenados tinham todos os poderes das ordens inferiores. Pois, o poder inferior está compreendido no superior, como os sentidos na inteligência e o ducado no reino. Mas depois, por constituição da Igreja, foi determinado que não tenha o exercício das ordens superiores quem antes não exercitar a sua humildade nos ofícios inferiores. Donde vem, que quem se ordena, passando por sobre as ordens inferiores, não precisa, segundo os cânones, de ser reordenado, conferindo-se-lhe tão somente as ordens inferiores que deixou de receber.
DONDE A RESPOSTA À PRIMEIRA OBJEÇÃO. ─ Por semelhança específica, mais convêm as ordens entre si, que a ordem, com o batismo; mas se se leva em conta a proporção entre a potência e o ato, mais convém o batismo com a ordem, que uma ordem com outra. Porque o batismo confere a potência passiva de receber as ordens; ao passo que uma ordem inferior não outorga a potência passiva de receber as ordens maiores.
RESPOSTA À SEGUNDA. ─ As ordens não são degraus que devamos percorrer sucessivamente numa mesma ação, ou movimento, de maneira que devêssemos passar pelo último para chegar ao primeiro. Mas são como os graus existentes entre coisas diversas. Tal o grau entre o homem e o anjo; assim, não é necessário que o anjo tenha sido antes homem. Tais são também os graus entre a cabeça e os outros membros do corpo: não é necessário tenha a cabeça principiado por ser pé. Ora, tal é o que se dá no caso vertente.
O quarto discute-se assim. - Parece que a ordem pressupõe necessariamente o caráter da confirmação.
1. Pois, em seres entre si ordenados, assim como o médio pressupõe o primeiro, assim o último, o médio. Ora, o caráter da confirmação pressupõe o batismal como primeiro. Logo, o caráter da ordem pressupõe como médio o caráter da confirmação.
2. Demais. - Os colocados a confirmar os outros devem ser os confirmados por excelência. Ora, os que recebem o sacramento da ordem são os confirmados dos outros. Logo, ninguém mais do que eles deve ter o sacramento da confirmação.
Mas, em contrário. ─ Os Apóstolos receberam o poder da ordem antes da ascenção, quando se lhes disse: Recebei o Espírito Santo. Mas foram confirmados depois da Ascensão pelo advento do Espírito Santo. Logo, a ordem não supõe a confirmação.
SOLUÇÃO. ─ Certas condições são necessárias a quem recebe a ordem; outras são de conveniência. É necessário à validade do sacramento, que quem receba as ordens seja susceptível delas; e isso lhe é facultado pelo batismo. Por onde, o caráter batismal é necessàriamente pressuposto a validade da ordem, de modo que sem ele o sacramento da ordem não pode ser conferido. Quanto à conveniência, requer a ordem que quem a receber tenha todas as perfeições que o tornem idôneo ao exercício dela; e uma dessas perfeições está em ser confirmado. Por onde, o caráter da ordem pressupõe como conveniente, mas não como necessário, o da confirmação.
DONDE A RESPOSTA À PRIMEIRA OBJEÇÃO. ─ A relação entre o médio e o último não é da mesma natureza que a entre o primeiro e o médio, no caso vertente. Pois, o caráter batismal nos torna susceptíveis do sacramento da confirmação; mas o caráter da confirmação a ninguém torna susceptível do sacramento da ordem. Logo, a razão não é a mesma.
RESPOSTA À SEGUNDA. ─ A objeção se funda na idoneidade por conveniência.
O terceiro discute-se assim. ─ Parece que o caráter da ordem não pressupõe o do batismo.
1. ─ Pois, o caráter da ordem dá a quem o recebe o poder de dispensar os sacramentos; ao passo que o caráter batismal só lhe confere a faculdade de os receber. Ora, o poder ativo não supõe necessàriamente o passivo, porque pode existir sem este, como se dá com Deus. Logo, o caráter da ordem não pressupõe necessariamente o caráter batismal.
2. Demais. ─ Pode acontecer que um não batizado se tenha na conta de provável batizado. Se esse tal, pois, receber as ordens não lhes receberá o caráter, se este pois, supõe o do batismo. E assim os atos de consagração ou de absolvição, que praticar, nenhum valor terão; de modo que a Igreja será enganada. O que é inadmissível.
Mas, em contrário. ─ O batismo é a porta dos sacramentos. Logo, sendo a ordem um sacramento, pressupõe o batismo.
SOLUÇÃO. ─ Ninguém pode receber aquilo de que não é susceptível. Ora, o caráter batismal nos torna susceptíveis dos outros sacramentos. Por onde, quem não tem o caráter batismal não pode receber nenhum outro sacramento. E assim, o caráter da ordem pressupõe o do batismo.
DONDE A RESPOSTA À PRIMEIRA OBJEÇÃO. ─ A potência ativa não pressupõe a passiva quando quem tem aquela por si mesmo a tem. Mas em quem a tem recebida, pressupõe ela a uma potência passiva, que seja a susceptível da ativa.
RESPOSTA À SEGUNDA. ─ Esse tal, promovido ao sacerdócio, não é sacerdote; não poderá consagrar nem absolver no foro da penitência. Por isso, segundo os cânones, deve ser de novo batizado e ordenado. Além disso, se for elevado a bispo, não terão a ordem aqueles a quem tiver ordenado. Contudo, podemos piamente crer que quanto aos efeitos últimos dos sacramentos, o Sumo Sacerdote poderia lhes suprir a falta; e que não permitiria que isso passasse despercebido a ponto de poder a sua Igreja correr o risco de ser enganada.
O segundo discute-se assim. ─ Parece que o sacramento da ordem não imprime caráter em todos os seus graus.
1. ─ Pois, o caráter da ordem é um poder espiritual. Ora, certas ordens só se ordenam a certos atos materiais; como as de ostiário ou acólito. Logo, essas não imprimem caráter.
2. Demais. ─ Todo caráter é indelével. Por isso, o caráter coloca o ordenado em tal estado, donde não pode sair. Ora, os que receberam certas ordens, podem voltar ao laicato. Logo, nem todas as ordens imprimem caráter.
3. Demais. ─ O caráter consagra aquele, em quem se imprimiu, a administrar ou receber certas coisas santas. Ora, para receber os sacramentos já ficamos suficientemente preparados pelo caráter batismal. Mas, dispensador dos sacramentos ninguém é constituído senão pela ordem sacerdotal. Logo, as outras ordens não imprimem caráter.
Mas, em contrário. ─ Todo sacramento, que não imprime caráter, pode ser reiterado. Ora, nenhuma ordem pode ser reiterada. Logo, toda ordem imprime caráter.
2. Demais. ─ O caráter é um sinal distintivo. Ora, toda ordem causa uma distinção. Logo, toda ordem imprime caráter.
SOLUÇÃO. ─ Nesta matéria três são as opiniões.
Assim, certos disseram, que só a ordem sacerdotal imprime caráter. ─ Mas isto não é verdade. Pois, os atos do diácono ninguém os pode licitamente praticar senão o diácono. Por onde, é claro que tem um poder especial de dispensar os sacramentos, que os outros não tem. Por isso outros opinaram, que as ordens sacras imprimem caráter, mas não as ordens menores. ─ Mas também isto é inadmissível. Por que qualquer ordem constitui o ordenado num grau de poder superior ao povo, poder ordenado à dispensa dos sacramentos.
Por onde, sendo o caráter um sinal que distingue uns cristãos dos outros, é necessário seja impresso por todas as ordens. E prova disso é que permanece perpetuamente e nunca pode ser reiterada. Esta é a terceira opinião e a mais comum.
DONDE A RESPOSTA À PRIMEIRA OBJEÇÃO. ─ Toda ordem, qualquer que seja, tem como objeto do seu exercício ou o próprio sacramento, ou se ordena à dispensação dos sacramentos. Por exemplo, a função dos ostiários é admitir os fiéis à assistência dos divinos sacramentos; e assim por diante. Por isso, todas essas funções implicam um poder espiritual.
RESPOSTA À SEGUNDA. - Embora se transfira um para o laicato, nele permanece sempre contudo o caráter. E bem o demonstra o fato de não precisar receber de novo a ordem, que já tinha, se reverter ao clericato.
RESPOSTA À TERCEIRA. ─ Veja-se a resposta à primeira.
O primeiro discute-se assim. ─ Parece que o sacramento da ordem não confere a graça santificante.
1. ─ Pois, geralmente se diz que o sacramento da ordem é um remédio contra a ignorância. Ora, a graça, que visa expelir a ignorância, não é a santificante, mas a gratuita; porque a santificante concerne, antes, ao afeto. Logo, o sacramento da ordem não confere a graça santificante.
2. Demais. ─ A ordem implica uma distinção. Ora, os membros da Igreja não se distinguem uns dos outros pela graça santificante, mas antes, pela graça gratuita, da qual diz o Apóstolo: Há repartição de graças. Logo, a ordem não confere a graça santificante.
3. Demais. ─ Nenhuma causa pressupõe o seu efeito. Ora, quem vai receber as ordens há de ter tido antes a graça, que o torna idôneo a recebê-las. Logo, tal graça não é dada quando é conferida a ordem.
Mas, em contrário. ─ Os sacramentos da lei nova realizam o que figuram. Ora, a ordem pelo número sete significa os sete dons do Espírito Santo, como diz o Mestre. Logo, os dons do Espírito Santo, que não existem sem a graça santificante, são conferidos juntamente com a ordem.
2. Demais. ─- A ordem é um sacramento da Lei Nova. Ora, na definição desse sacramento se diz ─ para que seja a causa da graça. Logo, causa a graça em quem o recebe.
SOLUÇÃO. ─ As obras de Deus são perfeitas, como diz a Escritura. Por onde, a quem Deus dá um poder qualquer dá também os meios de pô-la convenientemente em exercício. O que bem vemos na ordem natural; assim, aos animais foram dados membros, pelos quais as potências da alma possam exercer os seus atos, salvo se alguma deficiência da matéria a isso se opuser. Ora, assim como a graça santificante é necessária, para recebermos dignamente os sacramentos, assim também o é para serem dignamente dispensados. Por onde, assim como pelo batismo, que nos torna capazes de receber os outros sacramentos, é dada a graça santificante, assim, pelo sacramento da ordem, que destina alguém a dispensador dos outros sacramentos.
DONDE A RESPOSTA À PRIMEIRA OBJEÇÃO. ─ A ordem é conferida em benefício, não de uma pessoa, mas de toda a Igreja. Por isso a expressão ─ remédio contra a ignorância ─ não se deve entender como significando, que o fato de receber a ordem elimina a ignorância de quem a recebe; mas, que quem a recebe está preparado a acabar com a ignorância do povo.
RESPOSTA À SEGUNDA. ─ Embora os dons da graça santificante sejam comuns a todos os membros da Igreja, contudo ninguém, que não tenha a caridade, pode dignamente receber a ação daqueles dons, nos quais se funda a distinção entre os vários membros da Igreja; e a caridade não pode existir sem a graça santificante.
RESPOSTA À TERCEIRA. ─- Para o cabal exercício das ordens não basta qualquer bondade, mas é necessário uma bondade excelente. De modo que, como aqueles que recebem a ordem, ela os coloca em grau superior ao povo, assim também lhe sejam superiores pelo mérito da santidade. Por isso devem ter antes a graça bastante para fazerem dignamente parte do povo cristão; quando porém recebem a ordem, recebem também maior dom da graça, que os torna capazes de coisas maiores.
O quinto discute-se assim. ─ Parece que este sacramento não tem matéria.
1. ─ Pois, todo sacramento, que tem matéria, a virtude operativa dele está na matéria. Ora, as causas materiais aqui usadas, como as chaves, os candelabros e outras semelhantes, nenhuma virtude tem para santificar. Logo, este sacramento não tem matéria.
2. Demais. ─ Este sacramento confere como a confirmação a plenitude da graça dos sete dons do Espírito Santo, na expressão do Mestre. Ora, a matéria da confirmação pressupõe a sua santificação. Logo, como os elementos materiais usados neste sacramento não são pressantificados, parece que não podem ser a matéria dele.
3. Demais. ─ Em todos os sacramentos que tem matéria, é necessário o contacto dela com quem recebe o sacramento. Ora, como certos dizem, o contato desses elementos materiais com quem recebe o sacramento não é necessário para a validade deste; mas basta sejam apresentados ao ordenando. Logo, as referidas coisas materiais não são a matéria deste sacramento.
Mas, em contrário, todo sacramento supõe realidades e palavras. Ora, a realidade de um sacramento é a sua matéria. Logo, também as coisas usadas neste sacramento são a matéria dele,
2. Demais. ─ Há mais exigências para dispensar os sacramentos do que para os receber. Ora, o batismo, que confere o poder de receber os sacramentos, precisa de matéria. Logo, também a ordem, que dá o poder de dispensá-los.
SOLUÇÃO. ─ A matéria exterior, de que usam sacramentos, significa que a virtude neles operante é de origem totalmente externa. Por onde, como o caráter, efeito próprio deste sacramento, não é recebido por nenhum ato de quem a ele se achega ─ como se dá com a penitência, mas tem origem de todo externa, cabe-lhe ter uma determinada matéria. Embora porém de modo diverso dos outros sacramentos que a tem. Porque o conferido nos outros deriva só de Deus, e não do ministro do sacramento, ao passo que o poder espiritual, conferido pela ordem, deriva também do ministro dela, como o poder imperfeito. Por isso, a eficácia dos outros sacramentos consiste principalmente na matéria, que significa e contém uma virtude divina, pela santificação recebida pelo ministro. Ao passo que a eficácia deste sacramento principalmente reside em quem o ministra; enquanto que a matéria é usada, antes, para mostrar o poder, transmitido particularmente por quem o tem de maneira completa, do que para causá-lo. O que resulta de a matéria ser necessária ao uso do poder.
Donde se deduz a resposta à primeira objeção.
RESPOSTA À SEGUNDA. ─ A matéria dos outros sacramentos precisa de ser santificada por causa da virtude que contém. Mas isto não se dá no caso vertente.
RESPOSTA À TERCEIRA. ─ Se quisermos manter essa opinião, poderemos justificá-la pelo que dissemos. Pois, o poder da ordem é recebido do ministro, mas não da matéria. Por isso, a apresentação desta é, mais que o contato, da essência do sacramento. Contudo, essas palavras da forma mostram, que o contato da matéria é da essência do sacramento; pois nela se diz ─ Recebei isto ou aquilo.
O quarto discute-se assim. ─ Parece que a forma deste sacramento esta mal expressa pelo Mestre.
1. ─ Pois, os sacramentos são eficazes em virtude da sua forma. Ora, a eficácia dos sacramentos resulta do poder divino, que obra neles mais secretamente a salvação. Logo, na forma deste sacramento deve-se fazer menção do poder divino, pela invocação da Trindade, como nos outros sacramentos.
2. Demais. ─ Mandar é próprio de quem tem autoridade. Ora, a autoridade não reside em quem dispensa os sacramentos, que só tem o ministro. Logo, não se devia usar na forma o verbo no modo imperativo, dizendo: Fazei ou recebei isto ou aquilo, ou formas semelhantes.
3. Demais. ─ Na forma sacramental não se deve fazer menção senão do que é essencial ao sacramento. Ora, o uso do poder recebido não é da essência deste sacramento, mas resulta dele. Logo, não se deve fazer menção dele na forma sacramental.
4. Demais. ─ Todos os sacramentos tem por alvo a remuneração eterna. Ora, nas formas dos outros sacramentos não se faz menção da remuneração. Logo, nem na forma deste deveria ela ser mencionada, como se faz quando se diz: Terá parte, se fielmente etc.
SOLUÇÃO. ─ Este sacramento consiste principalmente no poder conferido. Ora, um poder é conferido por outro, como o semelhante pelo semelhante. Além disso, um poder se revela pelo uso dele feito, porque as potências se notificam pelos seus atos. Por isso, a forma da ordem exprime-lhe o uso, por um ato imperado; e exprime a transmissão do poder, no modo imperativo.
DONDE A RESPOSTA À PRIMEIRA OBJEÇÃO. ─ Os outros sacramentos não se ordenam principalmente, como este sacramento, a efeito, semelhantes ao poder pelo qual são dispensados. Por isso, há neles uma comunicação por assim dizer unívoca. Por onde, nos outros sacramentos, mas não neste, se exprime em parte o poder divino.
RESPOSTA À SEGUNDA. ─ Embora o bispo, que é o ministro deste sacramento, não tenha autoridade quanto à colação dele, contudo a tem quanto ao poder da ordem, que confere, pois esse poder deriva do seu.
RESPOSTA À TERCEIRA. ─ O uso do poder é o efeito deste no gênero da causa eficiente; e por isso não há razão para ser incluído na definição da ordem. Mas é de certo modo causa, no gênero da causa final. Por isso, a esta luz, pode ser incluído na definição da ordem.
RESPOSTA À QUARTA. ─ Os outros sacramentos não ordenam à remuneração eterna, mediante o exercício de uma função, como se dá com a ordem. Logo, o símile não colhe.
O terceiro discute-se assim. ─ Parece que a ordem não é sacramento.
1. ─ Pois, o sacramento, no dizer de Hugo Vitorino, é um elemento material. Ora, a ordem não designa nada de tal, mas antes, uma relação ou um poder; porque ela supõe um poder, segundo Isidoro. Logo, não é sacramento.
2. Demais. ─ Os sacramentos não existem na Igreja triunfante. Ora, nela há ordem, como o demonstram os anjos. Logo, a ordem não é sacramento.
3. Demais. ─ Assim como a prelatura especial da ordem é conferida junto com uma certa consagração, assim também a prelatura secular; pois, os reis também são ungidos, como se disse. Ora, o poder real não é um sacramento. Logo, nem a ordem, da qual se trata.
Mas, em contrário, todos a enumeram entre os sete sacramentos da Igreja.
2. Demais. - Toda causa contém em grau eminente o seu efeito. Ora, a ordem é a que dá a faculdade de dispensar os outros sacramentos. Logo, mais que os outros, é o sacramento por excelência.
SOLUÇÃO. ─ O sacramento, como do sobredito se colhe, não é senão uma santificação, que nos é conferida, sob um sinal visível. Por onde, como quando alguém recebe a ordem recebe também uma consagração por meio de sinais visíveis, resulta ser ela um sacramento.
DONDE A RESPOSTA À PRIMEIRA OBJEÇÃO. ─ Embora a ordem, pela sua denominação mesma, não exprima nenhum elemento material, contudo não pode ser conferida sem um elemento dessa natureza.
RESPOSTA À SEGUNDA. ─ Um poder deve ser proporcionado ao seu sujeito. Ora, a comunicação dos dons divinos, em vista da qual é conferido o poder espiritual, não se opera nos anjos mediante nenhuns sinais sensíveis, como o é aos homens. Por onde, a ordem é um sacramento para nós, mas não para o anjo.
RESPOSTA À TERCEIRA. ─ Nem toda bênção dada aos homens ou consagração é um sacramento. Assim, os monges e os abades recebem bênçãos e contudo sacramentos não são elas. O mesmo se dá com a unção real. Porque tais bênçãos não tornam ninguém apto a dispensar os divinos sacramentos, como pela bênção da ordem.
O segundo discute-se assim. ─ Não parece boa a definição da ordem dada pelo Mestre das Sentenças, quando diz: A ordem é como um selo da Igreja pelo qual o poder espiritual é comunicado ao ordenado.
1. ─ Pois, a parte não deve ser posta como gênero do lado. Ora, o caráter, designado pela palavra selo na explicação da definição, que se lhe segue, é parte da ordem; porque se divide por oposição com o que é só realidade, ou só sacramento, por ser realidade ao mesmo tempo que sacramento. Logo, o selo não pode ser considerado como gênero da ordem.
2. Demais. ─ Assim como o sacramento da ordem imprime caráter, assim também o do batismo. Ora, na definição do batismo não se incluiu o caráter. Logo, também não deve ser incluído na da ordem.
3. Demais, ─ O batismo também confere um certo poder espiritual de nos achegarmos aos sacramentos; e além disso, sendo sacramento, é um selo. Logo, esta definição convém ao batismo. E assim, não convém à ordem.
4. Demais. ─ A ordem é uma relação, que deve aparecer nos seus dois extremos. Ora, os extremos da relação da ordem são o superior e o inferior. Logo, os inferiores tem a ordem do mesmo modo que os superiores. Ora, nenhum poder de preeminência tem eles, como o introduzido aqui na definição da ordem, conforme o demonstra a sequência de exposição, quando diz ─ promoção a um poder. Logo, a definição de que tratamos não é boa.
SOLUÇÃO. ─ A definição da ordem, que o Mestre dá, convém-lhe enquanto sacramento da Igreja. Por isso dois elementos nela inclui: o sinal exterior, quando diz - um selo, isto é, um certo sinal; e o efeito interior, quando diz pelo qual o poder espiritual, etc.
DONDE A RESPOSTA À PRIMEIRA OBJEÇÃO. ─ O selo não é aqui considerado como caráter interior, mas pela prática exterior, sinal e causa do poder interior. E assim também é tomado o caráter na outra definição. ─ Mas ainda que o tomássemos pelo caráter interior nenhum inconveniente haveria. Porque essas três divisões do sacramento referidas não constituem partes integrantes dele, propriamente falando. Pois, que só é realidade não é da essência do sacramento. Também o que é só sacramento é transitório ; mas do sacramento dizemos que permanece. Donde se conclui, que o caráter interior é essencial, e principalmente o sacramento mesmo da ordem.
RESPOSTA À SEGUNDA. ─ Embora o batismo confira um certo poder espiritual para receber os outros sacramentos, razão pela qual imprime caráter, contudo não é esse o seu efeito principal, mas sim, a ablução interior, que daria existência ao batismo, mesmo sem a outra causa alegada, Ao passo que a ordem implica principalmente um poder. Por onde, o caráter, que é um poder espiritual, é posto na definição da ordem, mas não na do batismo.
RESPOSTA À TERCEIRA. ─ O batismo confere um certo poder espiritual para receber, e assim, de certo modo, passivo. Ora, a palavra poder designa propriamente uma potência ativa com certa preeminência. Por onde, essa definição não convém ao batismo.
RESPOSTA À QUARTA. ─ A palavra ordem é susceptível de duplo sentido. Assim, às vezes significa a relação mesma. E então podem-na receber tanto o inferior como o superior, conforme o diz a objeção. Mas não é esse o sentido de que se trata. Noutro sentido significa o grau mesmo resultante da ordem, no primeiro sentido. E como a ordem, enquanto relação, existe sempre que há um superior e um inferior, por isso esse grau eminente de poder espiritual se chama ordem.
O primeiro discute-se assim. - Parece que a ordem não deve existir na Igreja.
1. ─ Pois, a ordem supõe uma distinção entre inferior e superior. Ora, a sujeição repugna à liberdade à qual fomos chamados por Cristo. Logo, não deve haver a ordem na Igreja.
2. Demais. ─ Quem está constituído na ordem se torna superior a quem não o está. Ora, na Igreja todos nos devemos considerar inferiores um aos outros, conforme àquilo do Apóstolo: Tendo cada um aos outros por superiores. Logo, não deve na Igreja haver a ordem.
3. Demais. ─ Há ordem entre os anjos por causa da distinção que há neles entre bens naturais e da graça. Ora, todos os homens tem a mesma natureza; e quanto aos dons da graça, ninguém sabe quem os tem mais eminentes. Logo, na Igreja não deve haver a ordem.
Mas, em contrário. ─ O Apóstolo diz: As causas de Deus são ordenadas. Ora, a Igreja é de Deus, pois ele próprio a edificou com o seu sangue. Logo, deve haver a ordem na Igreja.
2. Demais. ─ O estado eclesiástico é um meio termo entre o estado da natureza e o da glória. Ora, há em a natureza uma ordem, pela qual uns seres são superiores aos outros; e do mesmo modo na glória, como se dá com os anjos. Logo, na Igreja deve haver a ordem.
SOLUÇÃO. ─ Deus quis fazer as suas obras semelhantes a si, na medida do possível, para que fossem perfeitas e pudesse ser ele conhecido por meio delas. Por isso, a fim de que as suas obras o representassem, não só como ele em si mesmo é, mas também enquanto influi nos outros seres, impôs a todos a lei natural de serem os últimos dirigidos e aperfeiçoados pelos médios, e os médios pelos primeiros, como diz Dionísio. Por onde, a fim de que essa beleza não faltasse à Igreja, introduziu nelas a ordem, de modo que uns ministrassem os sacramentos aos outros, assemelhando-se assim a Deus a seu modo, quase cooperadores dele, assim como na ordem natural certos membros influem nos outros.
DONDE A RESPOSTA À PRIMEIRA OBJEÇÃO. ─ A sujeição de escravidão repugna à liberdade, e consiste no domínio de alguém, que usa dos súditos para a sua utilidade. E tal sujeição não é a que a ordem exige, pela qual os superiores devem buscar a salvação dos seus subordinados e não a utilidade própria.
RESPOSTA À SEGUNDA. ─ Cada um deve reputar-se interior pelo mérito e não pelo oficio. Ora, as ordens são uns ofícios.
RESPOSTA À TERCEIRA. ─ A ordem, nos anjos não se funda em nenhuma distinção natural, senão por acidente, enquanto da distinção de natureza resulta neles a distinção da graça. Porque as ordens deles dependem da participação das perfeições divinas e da função do mesmo estado da glória, fundada na medida da graça e que é como um fim e de certo modo efeito da graça. Ao passo que as ordens da Igreja militante concernem à participação dos sacramentos e a comunicação deles, que são a causa da graça e de certo modo a precedem. E assim a graça necessariamente ligada à recepção dessas ordens não é precisamente a graça santificante, mas apenas o poder de dispensar os sacramentos. Por isso, a ordem não se funda nas distinções da graça santificante, mas na do poder.