Category: Santo Tomás de Aquino
O quinto assim se discute. ─ Parece que, neste sacramento, deve ser ungido todo o corpo.
1. ─ Pois, segundo Agostinho, a alma está toda em todo o corpo. Ora, este sacramento é ministrado sobretudo para curar a alma. Logo, todo o corpo deve ser o ungido.
2. Demais. ─ Onde está a doença aí se deve aplicar o remédio. Ora, às vezes o mal, como a febre, é geral e está em todo corpo. Logo, todo ele deve ser ungido.
3. Demais. ─ No batismo todo o corpo é imerso. Logo, também deve ser todo ungido.
Mas, em contrário, é costume da Igreja universal, pelo qual, neste sacramento, o enfermo não é ungido senão em determinadas partes do corpo.
SOLUÇÃO. ─ Este sacramento é aplicado como remédio. Ora, a cura do corpo não é preciso seja feita pela aplicação do remédio a todo ele, mas só naquelas partes onde está a raiz do mal. Por onde, também a unção sacramental deve ser feita só naquelas partes onde está a raiz do mal espiritual.
DONDE A RESPOSTA À PRIMEIRA OBJEÇÃO. ─ A alma embora esteja essencialmente em todas as partes do corpo, não está porém desse modo em todas as potências dele, que é onde estão as raízes dos atos pecaminosos. Por isso, hão de fazer-se as unções nas determinadas partes do corpo onde tem essas potências a sua sede.
RESPOSTA À SEGUNDA. ─ Nem sempre se aplica o remédio onde está a doença; mas antes, e melhor, onde está a raiz do mal.
RESPOSTA À TERCEIRA. ─ O batismo se faz sob a forma de ablução. Ora, a ablução corporal só purifica da mancha a parte do corpo onde se faz; por isso o batismo é aplicado a todo o corpo. Diferente é o caso da extrema unção, como dissemos.
O quarto discute-se assim. ─ Parece que este sacramento deve ser conferido às crianças.
1. ─ Pois, das mesmas enfermidades podem sofrer tanto as crianças como os adultos. Ora, à mesma doença se deve aplicar o mesmo remédio. Logo, este sacramento deve ser conferido tanto aos adultos como às crianças.
2. Demais. ─ Este sacramento é ministrado para purificar das relíquias do pecado, como se disse ─ tanto das do pecado original como das do atual. Ora, as crianças também sofrem as consequências do pecado original. Logo, deve-lhes ser conferido este sacramento.
Mas, em contrário, a ninguém deve ser ministrado este sacramento, a quem não seja susceptível da forma dele. Ora, às crianças, que não pecaram pela vista e pelos ouvidos, como reza a fórmula, esta não se lhes aplica. Logo, não lhes deve ser ministrado este sacramento.
SOLUÇÃO. ─ Este sacramento exige, como a Escritura, a devoção atual em quem o recebe. Por onde, assim como a Eucaristia não deve ser dada às crianças, assim nem este sacramento.
DONDE A RESPOSTA À PRIMEIRA OBJEÇÃO. ─ As doenças não são causadas, nas crianças, como nos adultos, pelo pecado atual. Ora, este sacramento é sobretudo ministrado como remédio contra os que são uns como restos dos pecados que as causaram.
RESPOSTA À SEGUNDA. ─ Este sacramento não é conferido contra as relíquias do pecado original, senão enquanto de certo modo fortificadas pelos pecados atuais. Por isso é o principalmente conferido contra os pecados atuais, como resulta da própria forma; e esses não existem nas crianças.
O terceiro assim se discute. ─ Parece que aos loucos e aos dementes pode ser conferido este sacramento.
1. ─ Pois, tais doenças são perigosíssimas e dispõem com rapidez para a morte. Ora, a um perigo deve-se aplicar um remédio. Logo, este sacramento, remédio às enfermidades humanas, deve ser conferido aos de que se trata.
2. Demais. ─ O sacramento do batismo é mais digno que este. Ora, o batismo pode ser conferido aos loucos, como se disse. Logo, também este lhes deve ser ministrado.
Mas, em contrário. ─ Este sacramento não deve ser conferido senão aos que o reconhecem. Ora, tais não são os loucos nem os dementes. Logo, não se lhes deve conferir.
SOLUÇÃO. ─ Para colher o efeito deste sacramento muito contribui a devoção de quem o recebe, o mérito pessoal dos que o conferem e o geral de toda a Igreja; isso resulta claro da forma deprecativa que nele é proferida. Por onde, os que não podem ter o conhecimento desse sacramento e recebê-lo com devoção, a esses não se lhes deve dar. E sobretudo aos loucos e aos dementes, capazes de tratar com irreverência o sacramento, profanando-o com atos inconvenientes. Salvo se tiverem intervalos lúcidos, em que pudessem reconhecê-lo; e então nesse estado se lhes poderia ministrar.
DONDE A RESPOSTA À PRIMEIRA OBJEÇÃO. ─ Embora esses tais possam às vezes estar em perigo de morte, contudo não se lhes pode aplicar um remédio mediante a devoção própria deles. Por isso, não lhes deve ser conferido.
RESPOSTA À SEGUNDA. ─ O batismo não requer o ato do livre arbítrio, porque é conferido principalmente como remédio do pecado original. Do contrário, este sacramento requer um tal ato. Logo, não há símile. Além disso, o batismo é um sacramento necessário à salvação, mas não a extrema unção.
O segundo discute-se assim. ─ Parece que este sacramento deve ser ministrado em qualquer enfermidade.
1. ─ Pois, quando a Escritura refere a instituição deste sacramento nenhuma enfermidade determina. Logo, em todas as enfermidades deve ele ser ministrado.
2. Demais. ─ Quanto mais digno é um remédio tanto mais geral deve ser. Ora, este sacramento é mais digno que o remédio do corpo. Logo, sendo o remédio do corpo dado a todos os doentes, parece que também deve sê-lo este sacramento.
Mas, em contrário: ─ Este sacramento é chamado por todos extrema unção. Ora, nem toda doença leva a vida ao fim, pois certas são causas de uma vida mais longa, como o diz o Filósofo. Logo, nem em todas as enfermidades deve ser conferido este sacramento.
SOLUÇÃO. ─ Este sacramento é o último remédio que a Igreja pode conferir, quase imediatamente dispositivo para a glória. Por isso só deve ser conferido aos enfermos moribundos, quando a doença é de natureza a causar a morte e teme-se esse perigo.
DONDE A RESPOSTA À PRIMEIRA OBJEÇÃO. ─ Qualquer doença pode, chegada a um certo grau, causar a morte. Por onde, pesados os gêneros das enfermidades, em qualquer doença pode-se ministrar este sacramento; por isso o Apóstolo não se refere a nenhuma determinadamente. Levando-se em conta porém o modo e o estado da doença, nem sempre deve aos doentes ser conferido este sacramento.
RESPOSTA À SEGUNDA. ─ O remédio corporal tem como principal efeito a saúde do corpo, da qual todos os doentes em qualquer estado necessitam. Ora, este sacramento tem como efeito principal a melhoria necessária ao estado da alma dos que estão a ponto de sair desta vida e se encaminham para a glória. Logo, o símile não colhe.
O primeiro discute-se assim. ─ Parece que este sacramento deve ser conferido também aos sãos.
1. ─ Pois, o efeito principal deste sacramento é a cura, antes, da alma que a do corpo, como se disse. Ora, mesmo os sãos de corpo precisam de serem curados na alma. Logo, também a eles se lhes deve conferir este sacramento.
2. Demais. ─ Este sacramento é o dos que se vão desta vida, assim como o batismo é o dos que entram nela. Ora, a todos os que entram na vida se lhes confere o batismo. Logo, a todos os que dela saem deve este sacramento ser conferido. Ora, às vezes aqueles que estão a ponto de deixar a vida, como os que vão ser decapitados, estão sãos. Logo, a esses tais deve este sacramento ser conferido.
Mas, em contrário, a Escritura: Está entre vós algum enfermo? Etc. Logo, só compete aos enfermos.
SOLUÇÃO. ─ Este sacramento e uma cura espiritual, como se disse; e essa é significada a modo de cura do corpo. Por onde, aqueles que não precisam de curar o corpo, isto é, os sãos, não se lhes deve conferir a eles este sacramento.
DONDE A RESPOSTA À PRIMEIRA OBJEÇÃO. ─ Embora a saúde espiritual seja o efeito principal deste sacramento, contudo e necessário que pela cura do corpo seja significa da a cura espiritual do sacramento, mesmo se dela não resulta a saúde do corpo. Por isso, a saúde espiritual só aqueles este sacramento a pode conferir, que precisam da saúde do corpo, isto é, os enfermos; assim como só pode receber o batismo quem pode receber a ablução do corpo, e portanto não o pode o feto existente no ventre materno.
RESPOSTA À SEGUNDA. ─ Mesmo o batismo só o podem receber os que entrando na vida, são susceptíveis da ablução. Por onde, a extrema unção só a podem receber os que se vão da vida e que assim são susceptíveis de cura do corpo.
O terceiro discute-se assim. ─ Parece que só o bispo pode conferir este sacramento.
1. ─ Pois, este sacramento, como a confirmação, se perfaz pela unção. Ora, só o bispo pode confirmar. Logo, só o bispo pode conferir este sacramento.
2. Demais. ─ Quem não pode o menos não pode o mais. Ora, mais é usar da matéria santificada que santificá-la, pois, aquilo é a finalidade disto. Logo, como o sacerdote não pode santificar a matéria, também não pode usar da matéria santificada.
Mas, em contrário. ─ O ministro deste sacramento deve ir ter com quem o recebe, como está claro na Escritura. Ora, o bispo não poderia ir ter com todos os enfermos da sua diocese. Logo, nem só o bispo pode conferir este sacramento.
SOLUÇÃO. ─ Segundo Dionísio, o ofício próprio do bispo é aperfeiçoar, como iluminar é o do sacerdote. Por onde, só os bispos podem dispensar os sacramentos, que colocam quem os recebe num estado de perfeição superior aos outros estados. Ora, tal não se dá com este sacramento, que é dado a todos. Logo, pode ser administrado pelos simples sacerdotes.
DONDE A RESPOSTA À PRIMEIRA OBJEÇÃO. ─ A confirmação imprime caráter, que coloca o homem no estado de perfeição, como dissemos. Ora, isto não se dá com este sacramento. Logo, o símile não colhe.
RESPOSTA À SEGUNDA. ─ Embora, na ordem da causa final, o uso da matéria santificada tenha prioridade sobre a santificação dela, contudo na ordem da causa eficiente a santificação da matéria é a que tem prioridade, porque dela depende o uso, como da sua causa ativa. Por onde, a santificação demanda uma virtude ativa mais elevada que o uso.
O segundo discute-se assim. ─ Parece que os diáconos podem conferir este sacramento.
1. ─ Pois, segundo Dionísio, os diáconos tem o poder de purificar. Ora, este sacramento foi instituído só para purificar da doença da alma e do corpo. Logo, também os diáconos podem conferi-lo.
2. Demais. ─ Mais digno do que sacramento da extrema unção é o do batismo. Ora, os diáconos podem batizar, como o demonstra o caso de S. Lourenço. Logo, também podem conferir este sacramento.
Mas, em contrário, a Escritura: Chame os presbíteros da Igreja.
SOLUÇÃO. ─ Os diáconos tem só a faculdade de purificar mas não a de iluminar. Ora, como a iluminação é obra da graça, o diácono não pode, por ofício próprio, ministrar nenhum sacramento que confira a graça. Logo, nem este, que a confere.
DONDE A RESPOSTA À PRIMEIRA OBJEÇÃO. ─ Este sacramento purifica, iluminando pela colação da graça. Por onde, ao diácono não lhe compete conferi-lo.
RESPOSTA À SEGUNDA. ─ Este sacramento não é de necessidade à salvação, como o batismo. Por isso, o poder de o conferir não é dado a todos, em caso de necessidade, mas só àqueles a quem por oficio compete esse poder. Ora, aos diáconos não cabe por ofício batizar.
O primeiro discute-se assim. ─ Parece que também um leigo pode conferir este sacramento.
1. ─ Pois, este sacramento haure a sua eficácia na oração, como diz Tiago. Ora, a oração de um leigo é às vezes tão aceita de Deus como a de sacerdote. Logo, pode o leigo conferir este sacramento.
2. Demais. ─ Lemos de certos padres do Egito, que aplicavam o óleo aos enfermos e eles saravam. E o mesmo também se conta de santa Genoveva, que ungia com óleo os doentes. Logo, este sacramento pode ser conferido mesmo pelos leigos.
Mas, em contrário, neste sacramento se dá o perdão aos pecados. Ora, os leigos não tem o poder de perdoar os pecados. Logo, etc.
SOLUÇÃO. ─ Segundo Dionísio, uns são os que exercem a atividade hierárquica; outros, os leigos, os que a recebem. Por onde, a nenhum leigo cabe por ofício dispensar qualquer sacramento; mas, por divina dispensa podem batizar em caso de necessidade, a fim de não faltar a ninguém a faculdade da regeneração espiritual.
DONDE A RESPOSTA À PRIMEIRA OBJEÇÃO. ─ A oração referida não na faz o sacerdote em seu próprio nome, porque, como também às vezes poderia estar em pecado, não seria ouvido. Mas a faz em nome de toda a Igreja, em cujo nome pode orar, como pessoa pública; e isso não pode fazer o leigo, que é uma pessoa privada.
RESPOSTA À SEGUNDA. ─ Essas unções não eram sacramentais; mas, por uma certa devoção dos que as recebiam ou pelos méritos dos que ungiam ou aplicavam o óleo, produziam o efeito da saúde do corpo, pela graça de curar as doenças, não porém pela graça sacramental.
O terceiro discute-se assim. ─ Parece que este sacramento imprime caráter.
1. Pois, o caráter é um sinal distintivo. Ora, assim como o batizado se distingue do não batizado, assim o ungido do não ungido. Logo, assim como o batismo imprime caráter, assim também a extrema unção.
2. Demais. ─ Nos sacramentos da ordem e da confirmação também se faz unção, como neste sacramento. Ora, naqueles imprime caráter. Logo, também neste.
3. Demais. ─ Todo sacramento inclui os seguintes elementos: o que é só realidade, o que é só sacramento, e o que é realidade e sacramento. Ora, nada podemos distinguir, neste sacramento, que seja realidade e sacramento, senão o caráter. Logo, este sacramento também imprime caráter.
Mas, em contrário. ─ Nenhum sacramento, que imprima caráter, pode ser renovado. Ora, este o pode, como diremos. Logo, não imprime caráter.
2. Demais. ─ A diferença fundada no caráter sacramental é a que se faz entre os fiéis da Igreja militante. Ora, a extrema unção é conferida a quem deixa, pela morte, de fazer parte dessa Igreja. Logo, não imprime caráter.
SOLUÇÃO. ─ Só imprimem caráter aqueles sacramentos que nos destinam a um fim sagrado. Ora, este sacramento serve apenas de remédio; nem destina ninguém a fazer ou a receber nada de sagrado. Logo, não imprime caráter.
DONDE A RESPOSTA À PRIMEIRA OBJEÇÃO. ─ O caráter produz a distinção dos estados, quanto à atividades de cada um dentro da Igreja; mas uma unção não estabelece nenhuma diferença de estado entre os fiéis.
RESPOSTA À SEGUNDA. ─ A unção feita na ordem e na confirmação é a da consagração, que destina o homem a um estado sagrado. Ora, a unção de que tratamos, é para curar. Logo, o símile não colhe.
RESPOSTA À TERCEIRA. ─ A realidade e o sacramento da extrema unção não é o caráter, mas uma devoção interior, que é a unção espiritual.
O segundo discute-se assim. ─ Parece que a saúde do corpo não é efeito deste sacramento.
1. ─ Pois, todo sacramento é um remédio espiritual. Ora, o remédio espiritual se ordena à saúde espiritual, como o material, à saúde do corpo. Logo, a saúde do corpo não é efeito deste sacramento.
2. Demais. ─ O sacramento produz sempre o seu efeito em quem não o recebe dissimuladamente. Ora, às vezes não recobra a saúde do corpo quem recebe este sacramento, por mais devotamente que o faça. Logo, a saúde do corpo não é efeito seu.
3. Demais. ─ A Escritura nos mostra a eficácia deste sacramento. Ora, nela não se atribui o efeito da cura à unção, mas à oração, pois diz: A oração da fé salvará o enfermo. Logo, a saúde do corpo não é efeito deste sacramento.
Mas, em contrário. ─ A operação da Igreja tem maior eficácia depois da paixão de Cristo, que antes. Ora, antes, os ungidos com óleo pelos Apóstolos saravam, como o refere o Evangelho. Logo, também agora produz o efeito de dar saúde ao corpo.
2. Demais. ─ Os sacramentos produzem efeito pela sua significação. Ora, o batismo, pela ablução exterior do corpo, tem um significado e um efeito espiritual. Logo, também a extrema unção, pela saúde do corpo, que exteriormente produz, significa e causa a saúde espiritual.
SOLUÇÃO. ─ Assim como o batismo, pela ablução do corpo, causa a purificação espiritual das máculas espirituais, assim também este sacramento, pela medicação sacramental exterior, produz a cura interior; e assim como a ablução do batismo produz o efeito da ablução corporal, porque também produz a purificação do corpo, assim, a extrema unção produz o efeito de uma medicação corporal, isto é, a saúde do corpo. Mas com a diferença, que a ablução corporal, pela propriedade mesma natural do elemento, produz a purificação do corpo e por isso sempre a produz. Ao passo que a extrema unção não causa a saúde do corpo por propriedade natural da matéria, mas por virtude divina, que obra racionalmente. E como um princípio operativo não produz nunca um efeito secundário, senão enquanto este importa ao principal, por isso este sacramento não causa nunca a saúde do corpo senão enquanto esta importa a saúde espiritual. - E então a produz sempre, contanto que não haja impedimento por parte de quem a recebe.
DONDE A RESPOSTA À PRIMEIRA OBJEÇÃO. ─ A objeção prova que a saúde do corpo não é o efeito principal deste sacramento. O que é verdade.
RESPOSTA À SEGUNDA. ─ Deduz-se clara do que foi dito.
RESPOSTA À TERCEIRA. ─ A referida oração é a forma deste sacramento, como se disse. Por onde, tem ele da sua forma a eficácia, por si mesma, para produzir a saúde do corpo.