Category: Santo Tomás de Aquino
O quinto discute-se assim. ─ Parece que devemos ter contrição dos pecados alheios.
1. ─ Pois, ninguém pede perdão a não ser do pecado de que está contrito. Ora, na Escritura se pede perdão dos pecados alheios: Perdoa ao teu servo os alheios. Logo, devemos ter contrição dos pecados alheios.
2. Demais. ─ É dever de caridade amar ao próximo como a si mesmo. Ora, o amor de nós mesmos, nos leva a nos afligir dos nossos males e desejar o que nos é bom. Logo, estando obrigado a desejar ao próximo, como a nós mesmos, o bem da graça, parece que devemos ter, como dos nossos, dor pelos pecados deles. Ora, a contrição não é senão a dor dos pecados. Logo, devemos ter contrição dos pecados alheios.
Mas, em contrário. ─ A contrição é um ato da virtude de penitência. Ora, ninguém se penitência senão de atos que praticou. Logo, ninguém pode ter contrição de pecados alheios.
SOLUÇÃO. ─ O que se tritura é o que antes era duro e íntegro. Por onde e necessàriamente, a contrição do pecador deve recair sobre o mesmo que fora, antes, a dureza dele. Assim, não pode haver contrição dos pecados alheios.
DONDE A RESPOSTA À PRIMEIRA OBJEÇÃO. ─ O profeta roga lhe sejam perdoados os pecados alheios, enquanto que a convivência dos pecados nos leva a consentir na contaminação da macula pecaminosa. Por isso diz a Escritura: Serás perverso com o perverso.
RESPOSTA À SEGUNDA. ─ Devemos ter dor dos pecados alheios. Mas não é preciso termos contrição deles; porque nem toda dor dos pecados passados é contrição, como do sobredito se colhe.
O quarto discute-se assim. - Parece que devemos ter contrição também dos pecados futuros.
1. ─ Pois, a contrição é um ato do livre arbítrio. Ora, o livre arbítrio se estende mais ao futuro que ao passado; pois, a eleição, ato do livre arbítrio, recai sobre os futuros contingentes, como diz Aristóteles. Logo, a contrição tem por objeto, antes, os pecados futuros que os passados.
2. Demais. ─ O pecado se agrava pelo seu efeito conseqüente. Por isso Jerônimo diz que a pena de Ario ainda não foi determinada, porque ainda é possível haver quem lhe caia na heresia. E o mesmo se dá com quem é julgado homicida se ferir mortalmente, mesmo antes de o ferido morrer. Mas, nesse tempo intermédio deve o pecador ter contrição do pecado. Logo, não só na sua extensão passada, mas também na futura. E assim, a contrição respeita o futuro.
Mas, em contrário. ─ A contrição faz parte da penitência. Ora, a penitência sempre respeita o passado. Logo, também a contrição.
SOLUÇÃO. ─ Em todos os motores e móveis ordenados, dá-se que o motor inferior além de seu movimento próprio recebe, de certo modo, o movimento do motor superior; tal o que passa com o movimento dos planetas que, além dos seus movimentos próprios, seguem o movimento do orbe primeiro. Ora, em todas as virtudes morais, o motor é a prudência mesma, chamada auriga das virtudes. Por onde qualquer virtude moral, além do seu movimento próprio, se conjuga com o de prudência. Ora, o seu ato próprio recai sobre o seu objeto próprio, que é o pecado cometido. Por isso, o seu ato principal, a saber, a contrição, respeita especificamente só o pecado pretérito. Mas, por consequência, respeita o pecado futuro, enquanto participa do ato adjunto da prudência. E contudo não se move para esse futuro pela sua essência própria e específica. Por isso, quem tem contrição sente dor do pecado passado e se acautela quanto ao futuro; mas não se diz que o pecado futuro é objeto da contrição, mas antes, da cautela, parte da prudência anexa à contrição.
DONDE A RESPOSTA À PRIMEIRA OBJEÇÃO. ─ Diz-se que o livre arbítrio respeita os futuros contingentes, enquanto respeita aos atos; mas não por concernir dos objetos dos atos. Por que podemos, com o nosso livre arbítrio, cogitar das coisas passadas e necessárias; contudo, o ato mesmo de pensar, enquanto cai sob o livre arbítrio, é um futuro contingente. E assim, também o ato de contrição é um futuro contingente, enquanto objeto do livre arbítrio; mas o objeto deste também pode ser o passado.
RESPOSTA À SEGUNDA. ─ Esse efeito consequente, que agrava o pecado, já precedeu em ato, como a causa. Por onde, quando foi cometido, teve a totalidade da sua extensão: e o efeito consequente nada lhe acrescenta essencialmente à culpa. Embora lhe acresça a pena acidental, pois muitos terão razões de sofrer no inferno, pelos muitos males que se lhes seguiram aos pecados. Tal o sentido das palavras de Jerônimo. Por onde não é necessário tenha a contrição outro objeto diferente dos pecados passados.
O terceiro discute-se assim. ─ Parece que não devemos ter contrição de todos os pecados atuais que cometemos.
1. ─ Pois, os contrários se curam pelos contrários. Ora, certos pecados, como a acédia e a inveja, se cometem por tristeza. Logo, o remédio deles não deve ser a tristeza da contrição, mas a alegria.
2. Demais. ─ A contrição é um ato da vontade, que não pode recair sobre o que não pode ser objeto do conhecimento. Ora, há certos pecados, tais os esquecidos, que não são objeto do nosso conhecimento. Logo, não podemos ter contrição deles.
3. Demais. ─ Pela contrição voluntária delimos o que voluntariamente cometemos. Ora, a ignorância elimina o vocabulário, como está claro no Filósofo. Logo, não devemos ter contrição do que por ignorância cometemos.
4. Demais. ─ Não devemos ter contrição de um pecado que não pode ser por ela delido. Ora, certos pecados não são de lidos pela contrição, como os veniais, que ainda permanecem depois da graça da contrição. Logo, não devemos ter contrição de todos os pecados passados.
Mas, em contrário. ─ A penitência é o remédio contra todos os pecados atuais. Ora, não podemos fazer penitência de pecados de que não podemos ter contrição, por esta ser a primeira parte de aquela. Logo, a contrição deve ser de todos os pecados.
2. Demais. ─ Nenhum pecado pode ser perdoado sem a justificação do pecador. Ora, para a justificação é necessária a contrição, como antes dissemos. Logo, devemos ter contrição de todos os pecados.
SOLUÇÃO. ─ Toda culpa atual procede de a nossa vontade não ceder à lei de Deus, pela transgredir, por omissão ou por agir contra ele. E como duro se chama o que tem uma potência que não cede facilmente ao sofrimento, por isso todo pecado atual implica uma certa dureza de vontade. Por onde, devendo nos curar do pecado, é necessário nos seja perdoado mediante a contrição que o dele.
DONDE A RESPOSTA ÀPRIMEIRA OBJEÇÃO. ─ Como do sobredito resulta, a contrição se opõe ao pecado por proceder este da eleição da vontade, que não segue o império da lei divina; e não pelo que tem o pecado de material, sobre o que recai a eleição da vontade. Ora, a eleição da vontade recai não só sobre os atos das outras potências, das quais ela usa para os seus fins, mas também sobre o ato próprio dela; pois, a vontade quer o seu querer. E assim, a eleição da vontade recai sobre a dor ou tristeza que encerra a inveja e pecados semelhantes, quer essa dor seja sensível, quer seja da vontade mesma. Por isso a dor da contrição se opõe a tais pecados.
RESPOSTA À SEGUNDA. ─ De dois modos podemos nos esquecer de alguma coisa. Ou porque ela se nos deliu totalmente da memória; e então não pode ninguém indagar dela; ou porque se nos deliu da memória parcialmente e parcialmente nela permanece, como quando me recordo em geral de ter ouvido alguma coisa, sem que saiba especialmente o que ouvi, procurando então provocar a memória ao reconhecimento. ─E assim sendo, também qualquer pecado pode ser esquecido, de dois modos, Ou por permanecer na memória em geral, mas não em especial. E então devemos nos esforçar por relembrar o pecado, porque de todo pecado mortal devemos ter contrição atual. Se porém, apesar de toda a diligência aplicada, não nos pudermos lembrar, basta termos contrição do pecado tal como ele se nos apresenta ao conhecimento; e devemos ter dor, não só do pecado, mas também do esquecimento dele, causado da negligência. Se contudo o pecado de todo se nos deliu da memória, então somos escusados do dever por impotência de agir e basta a contrição geral de tudo o por que ofendemos a Deus. Mas desaparecendo essa impotência, como quando à memória voltar o pecado, então, estamos obrigados a ter contrição dele em especial. Seria o mesmo caso do pobre, escusado por não poder pagar o débito, mas contudo obrigado a fazê-lo desde que o possa.
RESPOSTA À TERCEIRA. ─ Depois da contrição do pecado mortal, pode permanecer o venial; mas não, depois da contrição deste. Por isso, dos pecados veniais também devemos ter contrição, do mesmo modo por que devemos fazer penitência deles, como dissemos.
RESPOSTA A QUARTA. ─ Depois da contrição do pecado mortal pode permanecer o venial. Mas não após a contrição do venial. Por isso deve haver contrição dos pecados veniais, do mesmo modo que penitência deles, como acima dito.
O segundo discute-se assim. ─ Parece que devemos ter contrição do pecado original
1. ─ Pois, devemos ter contrição do pecado atual, não em virtude do ato, enquanto um certo ser, mas por causa da deformidade; porque um ato, na sua substância, é um bem e procede de Deus. Ora, o pecado original tem a sua deformidade, como o atual. Logo, também dele devemos ter contrição.
2. Demais. - Pelo pecado original o homem se afastou de Deus; pois a sua pena foi ficar privado da visão de Deus. Ora, a todos deve desagradar o ter-se afastado de Deus. Logo, devemos nos desagradar do pecado original. E assim, devemos ter contrição dele.
Mas, em contrário. ─ O remédio deve ser proporcionado à doença. Ora, o pecado original foi contraído sem a nossa vontade. Logo, não é necessário nos purifiquemos dele pelo ato de vontade chamado contrição.
SOLUÇÃO. ─ A contrição, como dissemos, é uma dor que respeita e de certo modo tritura a dureza da vontade. Portanto pode recair só sobre os pecados que nascem em nós pela dureza da nossa vontade. E como o pecado original não foi cometido por vontade nossa, mas contraído pela natureza originalmente viciada, por isso não podemos ter contrição dele, propriamente falando, mas uma simples displicência ou dor.
DONDE A RESPOSTA À PRIMEIRA OBJEÇÃO. ─ A contrição não tem por objeto o pecado em razão da substância do ato somente, porque como tal não tem natureza de mal; nem em razão da deformidade somente, porque a deformidade, em si mesma, não tem natureza de culpa, mas às vezes implica a pena. Devemos porém ter contrição dos pecados, enquanto implica uma deformidade proveniente do ato da vontade. O que não existe no pecado original. Por isso não precisamos ter contrição dele.
E o mesmo, devemos responder à segunda objeção. ─ Pois, é da aversão da vontade que devemos ter contrição.
O primeiro discute-se assim. ─ Parece que devemos ter contrição não somente das penas, mas também da culpa.
1. ─ Pois, Agostinho diz: Ninguém deseja a vida eterna, que não se penitencie desta vida mortal. Ora, a vida mortal é uma pena. Logo, o penitente deve ter contrição também da pena.
Como diz Agostinho, temos dor do que nos sucede contra a vontade. Ora, tal não se dá com os pecados. Logo, a contrição não é a dor dos pecados.
2. Demais. ─ Como se estabeleceu antes, com palavras de Agostinho, o penitente deve condoer-se de se ter privado da virtude. Ora, a privação da virtude é uma pena Logo, a contrição é uma dor também dos pecados.
Mas, em contrário. ─ Ninguém tem o de que se condoí. Ora, a penitência, como o nome indica, tem a pena (poenam tenet). Logo, não se condói da pena. E assim, a contrição, que é uma dor penitente, não tem por objeto a pena.
SOLUÇÃO. ─ A contrição implica, como se disse, a trituração de um corpo integro e duro. Ora, essa integridade e dureza existe no mal da culpa, pois, a vontade, causa dela, por ter procedido mal, permanece no que é, nem cede ao preceito da lei. Por isso, a displicência desse mal se chama, por semelhança, contrição. Mas essa semelhança não pode aplicar-se ao mal da pena; pois, a pena significa simplesmente uma diminuição. Por onde, do mal da pena pode haver dor, mas não contrição.
DONDE A RESPOSTA À PRIMEIRA OBJEÇÃO. ─ A penitência, segundo Agostinho, deve ter por objeto esta vida mortal, não por causa da sua mortalidade mesma, salvo se tomarmos a penitência em sentido lato, para significar qualquer dor. Mas, em razão dos pecados aos quais somos arrastados pela fraqueza desta vida.
RESPOSTA À SEGUNDA. ─ A dor pela qual nos arrependemos do pecado, que nos fez perder a virtude, não é, essencialmente a contrição, mas o principio desta. Pois, assim como somos levados a desejar uma coisa pelo bem que dela esperamos, assim a ter dor de um ato, pelo mal dele resultante.
Em seguida devemos tratar do objeto da contrição. Sobre o que seis artigos se discutem:
O terceiro discute-se assim. ─ Parece que a atrição pode se tornar contrição.
1. ─ Pois, a contrição difere da atrição, como o informado, do informe. Ora, a fé informe se torna informada. Logo, a atrição pode tornar-se contrição.
2. Demais. ─A matéria recebe a perfeição quando removida a privação. Ora, a dor está para a graça como a matéria para a forma; pois, a graça informa a dor. Logo, a dor, de primeiro informe, quando existia a culpa, que é privação da graça, recebe, removida a culpa, a perfeição que dá a informação da graça. Donde, pois, se conclui o mesmo que antes.
Mas, em contrário. ─ Coisas cujos princípios são absolutamente diversos, não pode uma transformar-se na outra. Ora, o princípio da atrição é o temor servil; ao passo que o da contrição é o temor filial. Logo, a atrição não pode transformar-se em contrição.
SOLUÇÃO. ─ Nesta matéria há duas opiniões. ─ Uns dizem que a atrição se torna contrição, como a fé informe, fé informada. - Mas isto, como vemos, não pode ser. Porque embora o hábito da fé informe seja informado, contudo nunca o ato de fé informe se torna ato de fé informada; pois, esse ato informe passa e não permanece com a sobreveniência da caridade. Ora, a atrição e a contrição não significam hábitos, mas somente atos. Mas os hábitos das virtudes infusas, atinentes à vontade, não podem ser informes, pois, resultam da caridade, como dissemos no Terceiro Livro. Por onde, antes de a graça ser infundida, não há nenhum hábito do qual venha depois a ser elícito o ato de contrição. E assim, de nenhum modo pode a atrição tornar-se contrição. E é o que diz a outra opinião.
DONDE A RESPOSTA À PRIMEIRA OBJEÇÃO. ─ Não há símile entre a fé e a contrição, como se disse.
RESPOSTA À SEGUNDA. ─ A matéria, que permanece, quando recebe a perfeição adveniente, fica informada, removida a sua privação. Mas a referida dor, que era informe, não permanece, advindo-lhe a caridade. E portanto não pode ser informada. ─ Ou devemos responder que a matéria, na sua essência, não se origina da forma, assim como o ato se origina do hábito que o informa. Por onde, nenhum inconveniente há em a matéria ser informada por uma outra forma, que antes não a informava.
Mas é impossível dar-se isto com o ato, assim como é impossível um ser, numericamente o mesmo, proceder de um princípio, donde antes não procedia, pois, as coisas vêm à existência só uma vez.
O segundo discute-se assim. ─ Parece que a contrição não é um ato de virtude.
1. ─ Pois, as paixões não são atos de virtudes, porque por elas não somos louvados nem censurados, como diz Aristóteles. Ora, a dor é uma paixão. Logo, sendo a contrição dor, parece que não é ato de virtude.
2. Demais. ─ Assim como a contrição, também a atrição deriva de triturar (tero), Ora, a atrição não é um ato de virtude, como dizem todos. Logo, nem a contrição.
Mas, em contrário. ─ Só o ato de virtude é meritório. Ora, a contrição é um ato meritório. Logo, é ato de virtude.
SOLUÇÃO. ─ A contrição, de significado próprio, não designa um ato de virtude, mas antes, uma certa paixão do corpo. Mas não é neste sentido que agora tratamos da contrição; mas naquele em que tem significação figurada, por semelhança. Pois, assim como a inflação da nossa vontade própria a fazer o mal implica, por si mesma, genericamente o mal, assim essa aniquilação e contrição da vontade implica por si mesma um bem genérico; pois, isso é detestar a vontade própria pela qual cometemos o pecado. Por onde, a contrição, que o significa, importa numa certa retidão da vontade. Daí o ser ato de virtude próprio da penitência, que nos leva a detestar e destruir o pecado passado, conforme resulta do que foi dito na distinção XIV.
DONDE A RESPOSTA À PRIMEIRA OBJECÇÁO. ─ Na contrição há uma dupla dor do pecado. ─ Uma na parte sensitiva e é a paixão. E esta não é essencialmente contrição, como ato de virtude, mas antes, efeito dela. Pois, assim como a virtude da penitência inflige uma pena externa do corpo para reparar a ofensa feita a Deus pelos membros corpóreos, assim também à parte concupiscível inflige a pena da referida dor, porque também essa parte cooperou no pecado. Essa dor contudo pode pertencer à contrição, enquanto parte do sacramento; porque os sacramentos não só consistem nos atos internos, mas também nos externos e nas cousas sensíveis. ─ Outra é a dor de vontade, que não é senão a displicência de um determinado mal; segundo o que o efeito da vontade tira a sua denominação dos nomes das paixões, como se disse na Terceira Parte. E assim, a contrição é dor por essência e ato da virtude da penitência.
RESPOSTA À SEGUNDA. ─ Atrição diz acesso à perfeita contrição; por isso, na ordem material chamamos torturadas (attrita) às cousas de certo modo esmagadas, mas não perfeitamente; ao passo que contrição (contrito) se deveria dizer para significar que todas as partes trituradas foram simultaneamente reduzidas ao mínimo pela divisão. Por isso, no plano espiritual, a atrição significa uma certa displicência dos pecados, permitidos, mas não perfeita; ao passo que a contrição o é perfeitamente.
O primeiro discute-se assim. ─ Parece que a contrição não é a dor dos pecados assumida com o propósito de confessar e satisfazer, como certos definem.
1. Pois, como diz Agostinho, temos dor do que nos sucede contra a vontade. Ora, tal não se dá com os pecados. Logo, a contrição não é a dor dos pecados.
2. Demais. ─ A contrição nos é dada por Deus. Ora, o dado não é assumido. Logo, a contrição não é a dor assumida.
3. Demais. ─ A satisfação e a confissão são necessárias para ser remetida a pena que não o for na contrição. Ora, às vezes essa pena é totalmente remitida na confissão. Logo, nem sempre é necessário tenha o contrito o propósito de confessar e de satisfazer.
SOLUÇÃO ─ No dizer da Escritura, o princípio de todo pecado é a soberba, que nos torna aferrados às nossas opiniões próprias e nos afasta dos mandamentos divinos. Por onde, o que destrói o pecado necessàriamente nos leva a abandonar as nossas opiniões. Ora, quem persevera nas suas opiniões próprias é chamado, por semelhança, rígido e duro; donde o dizermos que se quebra quando abandona tais opiniões. Ora, entre a fração e a trituração ou contrição. na ordem material ─ donde esses nomes forem derivados para a ordem espiritual há a diferença seguinte, como o ensina Aristóteles. Dizemos que sofre fração uma causa quando dividida em grandes partes; e triturado ou esmagado quando o que em si mesmo era sólido é reduzido a partes mínimas. E como, para nos serem perdoados, é necessário deixarmos totalmente o afeto aos pecados, o que nos dava uma certa continuidade e a ferramenta ao nosso sentir próprio, por isso o ato pelo qual o pecado é perdoado se chama, por semelhança, contrição.
Em cuja contrição, podemos distinguir vários elementos, a saber: a substância mesma do ato, o modo de agir, o princípio e o efeito. E por isso se encontram várias definições dadas da contrição.
Relativamente à substância mesma do ato, foi dada a definição referida. E sendo o ato de contrição um ato de virtude e parte do sacramento da penitência, por isso a referida definição a põe de manifesto, como ato de virtude, quando lhe indica o gênero, é a dor; e o objeto, quando diz ─ dos pecados; e a eleição, que implica todo ato de virtude, quando diz - assumida. E a revela como parte do sacramento, ordenando-a relativamente às outras partes, quando diz: com o propósito de confessar e satisfazer.
Encontra-se, porém, outra definição, que define a contrição somente como ato de virtude; mas acrescenta à definição referida a diferença que a limita à virtude especial da penitência. Diz, pois, essa definição, que a contrição é uma dor voluntária do pecado, punitiva do que temos dor de haver praticado. Assim, acrescentando a idéia de punir, reduz a penitência a uma virtude especial.
Outra é a definição de Isidoro, e é a seguinte: A contrição é a compunção e a humilhação da alma, acompanhada de lágrimas, proveniente da recordação do pecado e do temor do juízo. E esta leva em conta a significação do nome quando diz: humilhação da alma; pois, assim como o orgulho nos enrijece no nosso modo próprio de sentir, assim, quando, contritos, abandonamos o nosso modo próprio de pensar, humilhamo-nos. E também lhe abrange a expressão exterior, quando diz: proveniente da recordação do pecado, etc.
Outra definição é a tomada das palavras de Agostinho, que leva em conta o efeito da contrição e é a seguinte: a contrição é a dor, que perdoa os pecados.
Outra é deduzida das palavras de Gregório e é a seguinte: a contrição é a humildade do espírito, que aniquila pecado, causada da esperança e do temor. E essa leva em conta a significação da palavra, quando diz ser a contrição a humildade do espírito; e o seu efeito, quando diz - que aniquila o pecado; e a origem, ao afirmar - causada da esperança e do temor. Não só enuncia a causa principal - o temor; mas também dá a causalidade da esperança, sem a qual o temor podia levar ao desespero.
DONDE A RESPOSTA À PRIMEIRA OBJEÇÃO. ─ Embora quando cometemos os pecados voluntàriamente o tivéssemos feito, contudo já não são voluntários quando deles temos contrição. Por isso, neles caímos involuntàriamente; não, certo, segundo a vontade, que então tínhamos quando os quisemos; mas, segundo a que então temos, pela qual quiséramos nunca os ter cometido.
RESPOSTA À SEGUNDA. ─ A contrição procede de Deus só, quanto à forma que a informa; mas a substância do ato resulta do livre arbítrio e de Deus, que atua em todas as obras, tanto da natureza como da vontade.
RESPOSTA À TERCEIRA. ─ Embora a pena possa ser totalmente perdoada pela contrição, contudo continua ainda necessária a confissão e a satisfação. - Quer por não podermos ter certeza da nossa contrição, que seria a necessária para eliminar totalmente o pecado; quer também por serem de preceito a confissão e a satisfação. Por isso em transgressão incorreria quem não confessasse e satisfizesse.
Em seguida devemos tratar de cada uma das partes da penitência. E primeiro, da contrição. Segundo, da confissão. Terceiro, da satisfação. Sobre a contrição devemos considerar cinco questões. Primeiro, o que é. Segundo, o seu objeto. Terceiro, a sua extensão. Quarto, a sua duração. Quinto, o seu efeito.
Na primeira, discutem-se três artigos: