Category: Santo Tomás de Aquino
O oitavo discute-se assim. ― Parece que a admiração não é causa de prazer.
1. ― Pois, admirar é próprio da natureza ignorante, como diz Damasceno. Ora, a ignorância não é deleitável, mas antes, a ciência. Logo, a admiração não é causa do prazer.
2. Demais. ― A admiração é o princípio da ciência, quase via para inquirir a verdade, como diz Aristóteles. Ora, contemplar o que já se conhece é mais deleitável do que perquirir o desconhecido, como diz o Filósofo; pois, isto acarreta dificuldades e obstáculos e aquilo, não, pois o prazer é causado por uma atividade sem obstáculos, como diz Aristóteles. Logo, a admiração não é causa do prazer, antes, serve-lhe de obstáculo.
O sétimo discute-se assim. ― Parece que a semelhança não é causa do prazer.
1. ― Pois, governar e presidir implica dissemelhança. Ora, ambos são deleitáveis, naturalmente, como diz Aristóteles. Logo, mais que a semelhança, a dissemelhança é causa do prazer.
2. Demais. ― Nada é mais dissemelhante do prazer que a tristeza. Ora, os que sofrem de alguma tristeza são os que mais procuram os prazeres, como diz Aristóteles. Logo, a dissemelhança é, mais que a semelhança, causa do prazer.
3. Demais. ― Os que superabundam em certos prazeres não se deleitam, mas antes, se enfastiam com eles, como o mostram os que se abarrotam de alimentos. Logo, a semelhança não é causa do prazer.
O sexto discute-se assim. ― Parece que fazer bem a outrem não é causa de prazer.
1. ― Pois, o prazer é causado pela consecução do bem próprio, como já foi dito. Ora, fazer bem não concerne à consecução, mas antes, ao dispêndio do bem próprio. Logo, é antes causa de tristeza que de prazer.
2. Demais. ― O Filósofo diz, que o egoísmo é mais conatural ao homem que a prodigalidade. Ora, a esta pertence fazer bem aos outros, e àquele é próprio deixar de o fazer. Ora, como é deleitável a ação que a cada um de nós é conatural, conforme Aristóteles, resulta que fazer bem aos outros não é causa de prazer.
O quinto discute-se assim. ― Parece que as ações dos outros não nos são causa de prazer.
1. ― Pois, a causa do prazer é um bem próprio que conosco se aduna. Ora, isto não se dá com as ações dos outros. Logo, estas não nos são causa de prazer.
2. Demais. ― Uma ação é um bem próprio do agente. Se pois as ações dos outros são-nos causa de prazer, pela mesma razão hão-de sê-lo todos os demais bens deles, o que é claramente, falso.
O quarto discute-se assim. ― Parece que a tristeza não é causa do prazer.
1. ― Pois, um contrário não é causa de outro. Ora, a tristeza contraria o prazer. Logo, não é causa deste.
2. Demais. ― Os efeitos dos contrários são contrários. Ora, a lembrança das coisas deleitáveis é causa de prazer. Logo, a das coisas tristes é causa da dor e não, do prazer.
3. Demais. ― A tristeza está para o prazer como o ódio para o amor. Ora, o ódio não é causa do amor, antes pelo contrário, como foi dito. Logo, a tristeza não é causa do prazer,
(III Sent., dist. XXVI, q. 1, a . 1, ad. 3; XI Metaph., lect. VIII).
O terceiro discute-se assim. ― Parece que a memória e a esperança não são causas do prazer.
1. ― Pois, o prazer se refere ao bem presente, como diz Damasceno. Ora, a memória e a esperança se referem ao bem ausente; aquela ao passado, esta, ao futuro. Logo, a memória e a esperança não são causas do prazer.
2. Demais. ― Os contrários não podem ter a mesma causa. Ora, a esperança é causa da aflição, conforme a Escritura (Pr 13, 12): A esperança que se retarda aflige a alma. Logo, a esperança não é causa do prazer.
(IV Sent., dist. XLIX, q. 3, a . 2, ad 3).
O segundo discute-se assim. ― Parece que o movimento não é causa do prazer.
1. ― Porque, como já dissemos, o bem presentemente obtido é a causa do prazer; e por isso o Filósofo diz, que o prazer não e comparável à geração, mas à operação de um ser já existente. Ora, o que é movido para um termo ainda não o alcançou, mas de certo modo está em via de geração, relativamente a ele, enquanto que todo movimento implica a geração e a corrupção, como diz Aristóteles. Logo, o movimento não é causa do prazer.
(IV Sent., dist. XLIX, q. 3, a . 2).
O primeiro discute-se assim. ― Parece que a atividade não é a causa própria e primeira do prazer.
1. ― Pois, como diz o Filósofo: deleitar-se consiste em o sentido sofrer, porquanto o prazer supõe o conhecimento, como ficou dito. Ora, antes de conhecermos as atividades mesmas, conhecemos-lhe os objetos. Logo, a atividade não é a causa própria do prazer.
2. Demais. ― O prazer consiste principalmente no fim alcançado o qual é principalmente desejado. Ora, nem sempre a atividade é um fim, mas às vezes este é o objeto da ação. Logo, a atividade não é a causa própria e por si mesma do prazer.
Em seguida devemos tratar das causas do prazer.
E sobre esta questão oito artigos se discutem:
O oitavo discute-se assim. ― Parece que um prazer não pode ser contrário a outro.
1. ― Pois, as paixões da alma se especificam e se opõem pelos seus objetos. Ora, o objeto do prazer é o bem. E como não há bem contrário a outro bem, antes, o bem é contrário ao mal e o mal, ao bem, como diz Aristóteles, conclui-se que nenhum prazer é contrário a outro.
2. Demais. ― Uma coisa só tem uma contrariedade, como o prova Aristóteles. Ora, ao prazer é contrária a tristeza. Logo, um prazer não é contrário a outro.