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Art. 8 ― Se a admiração é causa de prazer.

O oitavo discute-se assim. ― Parece que a admiração não é causa de prazer.
 
1. ― Pois, admirar é próprio da natureza ignorante, como diz Damasceno1. Ora, a ignorância não é deleitável, mas antes, a ciência. Logo, a admiração não é causa do prazer.
 
2. Demais. ― A admiração é o princípio da ciência, quase via para inquirir a verdade, como diz Aristóteles2. Ora, contemplar o que já se conhece é mais deleitável do que perquirir o desconhecido, como diz o Filósofo3; pois, isto acarreta dificuldades e obstáculos e aquilo, não, pois o prazer é causado por uma atividade sem obstáculos, como diz Aristóteles4. Logo, a admiração não é causa do prazer, antes, serve-lhe de obstáculo.
 
3. Demais. ― Todos nos deleitamos com aquilo com que estamos acostumados; e por isso as ações habituais, por estarmos acostumados com o que já adquirimos, são deleitáveis. Ora, não admiramos aquilo com o que estamos acostumados, como diz Agostinho5. Logo, a admiração é contrária à causa do prazer.
 
Mas, em contrário, diz o Filósofo6, que a admiração é causa de prazer.
 
Solução. ― Alcançar o que desejamos é deleitável, como já dissemos7. Por onde, quanto maior for o desejo do objeto amado, tanto maior será o prazer causado pela sua aquisição. Além disso, o aumento mesmo do desejo implica aumento do prazer, por implicar também a esperança de possuir o objeto amado, conforme já dissemos, quando explicamos que, pela esperança, o desejo próprio é deleitável. Ora, a admiração é o desejo de sabermos alguma coisa; o que se dá quando, vendo o efeito, ignoramos a causa, ou quando a causa de um determinado efeito nos excede o conhecimento ou a faculdade. Por onde, a admiração é causa do prazer, enquanto é acompanhada da esperança de conseguir o que deseja saber. E por isso, tudo o admirável é deleitável, como o que é raro e todas as representações das coisas, mesmo as que em si não são deleitáveis. Pois, a alma se compraz em comparar uma coisa com outra, o que é ato próprio e conatural da razão, como diz o Filósofo8. E também libertar-se de grandes perigos é mais deleitável porque é admirável, como diz Aristóteles9.
 
Donde a resposta à primeira objeção. ― A admiração não é deleitável, quando acompanhada de ignorância, mas quando tem o desejo de conhecer a causa, e quando, quem admira conhece algo de novo i. é, se conhece como sendo diferente do que pensava ser.
 
Resposta à segunda. ― O prazer implica duas condições: o repouso no bem e a percepção desse repouso. Quanto à primeira, sendo mais perfeito contemplar a verdade conhecida, que perquirir a desconhecida, a contemplação do que sabemos é em si mais deleitável que a perquirição do ignorado. Contudo, por acidente e quanto à segunda condição, pode suceder que às vezes inquirir seja mais agradável, quando a inquirição procede de uma maior desejo; ora, o desejo maior é excitado pela percepção da ignorância. E por isso, nós nos deleitamos mais com o que pela primeira vez descobrimos ou conhecemos.
 
Resposta à terceira. ― Aquilo de que temos costume nos é deleitável, no agir, como nos sendo quase conatural. Contudo as coisas raras podem ser agradáveis, que em razão do conhecimento, por desejarmos o conhecimento delas como nos sendo admirável; quer em razão da ação, pois, pelo desejo mais se inclina a mente a agir intensamente em relação ao que é novo, como diz Aristóteles10. Ora, ação mais perfeita causa prazer mais perfeito.

  1. 1. Lib. II, cap. XXII.
  2. 2. Metaph., lect. III.
  3. 3. X Ethic., lect. X.
  4. 4. VII Ethic., lect. XII, XIII.
  5. 5. Super Ioan., tract. XXIV.
  6. 6. I Rhetoric., cap. XI.
  7. 7. Q. 23, a. 4.
  8. 8. Poetica, cap. IV.
  9. 9. I Rhetoric., cap. XI.
  10. 10. X Ethic., lect. VI.
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