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Category: Santo Tomás de AquinoConteúdo sindicalizado

Art. 3 — Se todos os preceitos morais da lei antiga reduzem-se aos dez preceitos do decálogo.

(Infra. A. 2; IIª-IIae, q. 122, a. 6, ad. 2; III Sent., dist. XXXVII, a. 3; De Malo, q. 14, a. 2, ad 14; Quodl. VII, q. 7, a. 1, ad 8).
 
O terceiro discute-se assim. — Parece que nem todos os preceitos morais da lei antiga se reduzem aos dez preceitos do decálogo.
 
1. — Pois, os primeiros e principais preceitos da lei são: Amarás o Senhor teu Deus e amarás o teu próximo, como está na Escritura (Mt 22, 37-39). Ora, estes dois preceitos não fazem parte dos do decálogo. Logo, nem todos os preceitos morais estão contidos nos do decálogo.
 
2. Demais. — Os preceitos morais não se reduzem aos cerimoniais, mas antes, inversamente. Ora, entre os preceitos do decálogo, um é cerimonial, a saber: Lembra-te de santificar o dia de sábado. Logo, os preceitos morais não se reduzem a todos os do decálogo.
 
3. Demais. — Os preceitos morais regulam todos os atos da virtude. Ora, os do decálogo abrangem só os atos de justiça, como claramente verá quem examinar cada um deles. Logo, os preceitos do decálogo não contêm todos os preceitos morais.
 
Mas, em contrário, aquilo da Escritura. — Bem aventurados sois quando vos injuriarem — diz a Glosa, que Moisés, depois de ter proposto os dez preceitos, explicou-os por partes. Logo, todos os preceitos da lei fazem parte dos preceitos do decálogo.
 
Solução. — Os preceitos do decálogo diferem dos outros preceitos da lei, por, como está dito, terem sido propostos por Deus mesmo ao povo; ao passo que os outros Ele os propôs por meio de Moisés. Por onde, pertencem aos preceitos do decálogo aqueles cujo conhecimento o homem tem, por si mesmo, de Deus. Ora, estes são os que, com pouca reflexão, podem ser logo conhecidos, como o auxílio dos primeiros princípios comuns; e os que também se tornam logo conhecidos pela fé divinamente infusa. Logo, entre os preceitos do decálogo não se contam dois gêneros de preceitos. Os primeiros e comuns, como — a ninguém se deve fazer mal, e outros semelhantes — que não precisam de nenhuma transmissão, mas, quase evidentes, estão escritos na razão natural. Nem os que a perquirição diligente dos prudentes considera como pertencentes à razão; pois, esses Deus os transmitiu ao povo, mediante o ensinamento dos prudentes. Ora, ambos estes gêneros de preceitos estão contidos nos do decálogo, mas diversamente. Os primeiros e comuns neles estão contidos como os princípios, nas conclusões próximas; e os conhecidos por meio dos prudentes, inversamente, como as conclusões, nos princípios.
 
Donde a resposta à primeira objeção. — Os dois preceitos referidos são preceitos primeiros e comuns da lei da natureza, quase evidentes à razão humana, pela natureza ou pela fé. Por onde, todos os preceitos do decálogo se referem a esses dois, como conclusões, aos princípios comuns.
 
Resposta à segunda. — O preceito sobre a observância do sábado é, de certo modo, moral; pois preceitua que o homem, em algum tempo, se entregue às coisas de Deus, conforme aquilo da Escritura (Sl 45, 11): Cessai e vede que eu sou o Deus. E assim se contam entre os preceitos do decálogo. Não porém quanto à determinação do tempo; porque, por aí, é cerimonial.
 
Resposta à terceira. — A noção de dívida é, nas outras virtudes, mais lata que na justiça. E assim, os preceitos referentes aos atos das outras virtudes não são conhecidos do povo como os preceitos sobre os atos de justiça. E por isso os atos de justiça caem especialmente sob a alçada dos preceitos do decálogo, que são os primeiros elementos da lei.

Art. 2 — Se os preceitos morais da lei abrangem todos os atos virtuosos.

(IIª-IIae, q. CXL., a. 2).
 
O segundo discute-se assim. — Parece que os preceitos morais da lei não abrangem todos os atos virtuosos.
 
1. — Pois, à observância dos preceitos da lei antiga se chama justificação, conforme aquilo da Escritura (Sl 118, 8): observarei as tuas justificações. Ora, a justificação é a execução da justiça. Logo, os preceitos morais não abrangem senão os atos de justiça.
 
2. Demais. — O que cai sob a alçada de um preceito tem natureza de obrigação. Ora, a noção de obrigação não inclui as demais virtudes, senão só a justiça, cujo ato próprio é dar a cada um o que lhe é devido. Logo, os preceitos da lei moral não abrangem os atos das outras virtudes, mas só os da justiça.
 
3. Demais. — Toda lei é estabelecida para o bem comum, como diz Isidoro. Ora, dentre as virtudes, só a justiça visa o bem comum, conforme diz o Filósofo. Logo, os preceitos morais abrangem só os atos de justiça.
 
Mas, em contrário, diz Ambrósio: o pecado é a transgressão da lei divina e a desobediência aos mandamentos celestes. Ora, os pecados contrariam todos os atos virtuosos. Logo, a lei divina deve ordenar sobre os atos de todas as virtudes.
 
Solução. — Ordenando-se os preceitos da lei para o bem comum, como já se disse (q. 90, a. 2), eles hão de forçosamente diversificar-se conforme as diversas maneiras de ser da comunidade. Por isso, o Filósofo ensina, que umas serão as lei estabelecidas para a cidade governada por um rei, e outras as estabelecidas para a que é governada pelo povo ou pelos mais poderosos, dos habitantes dela. Ora, um é o feitio da comunidade, para que se ordena a lei humana, e outro, para que se ordena a lei divina. — Pois, a lei humana se ordena à comunidade civil, a constituída pelos homens entre si; e estes se ordenam uns para os outros pelos seus atos exteriores, com que se entre comunicam. E essa comunicação pertence essencialmente à justiça, que é propriamente diretiva da comunidade humana. Por onde, a lei humana só propõe preceitos referentes aos atos de justiça; e se ordenar outros atos de virtude, não será senão enquanto se revestem da essência da justiça, como está claro no Filósofo.
 
A comunidade porém, a que se ordena a lei divina, é a dos homens enquanto tendem para Deus, na vida presente ou na futura. Por isso, essa lei propõe preceitos sobre todos os atos pelos quais os homens bem se ordenam à comunicação com Deus. Ora, o homem se une a Deus pela razão, ou espírito, que reproduz a imagem d’Êle. Por onde, a lei divina propõe preceitos sobre todos os atos pelos quais bem ordenada fica a razão do homem. Ora, isto se dá pelos atos de todas as virtudes. Assim, as virtudes intelectuais ordenam com acerto os atos da razão em si mesmos; as morais, por seu lado, impõem ordem aos atos da razão relativamente às paixões internas e as obras externas. Por onde é manifesto, que a lei divina propõe convenientemente preceitos sobre os atos de todas as virtudes. De modo porém que certos atos, sem os quais a ordem da virtude, que é a da razão, não pode ser observada, são impostos pela obrigação de preceitos; e outros, relativos à existência completa da virtude perfeita, pertencem à advertência do conselho.
 
Donde a resposta à primeira objeção. — O cumprir os mandamentos da lei, mesmo os que pertencem aos atos das outras virtudes, implica a idéia de justificação. Enquanto é justo o homem obedecer a Deus; ou ainda enquanto é justo que todo o humano esteja sujeito à razão.
 
Donde a Resposta à segunda. — A justiça propriamente dita implica a dívida de um homem para com outro; ao passo que todas as outras virtudes implicam o débito das faculdades inferiores para com as superiores. E, conforme a natureza desse débito, o Filósofo distingue uma certa justiça metafórica.
 
Resposta à terceira. — A resposta se deduz clara do que dissemos sobre as diversas comunidades.

Art. 1 — Se todos os preceitos morais pertencem à lei da natureza.

(Infra, q. 104, a. 1).
 
O primeiro discute-se assim. — Parece que nem todos os preceitos morais pertencem à lei da natureza.
 
1. — Pois, diz a Escritura (Sr 17, 9): acrescentou-lhes a disciplina, e deu-lhes em herança a lei da vida. Ora, a disciplina se divide, por oposição, da lei da natureza; porque a lei natural não se aprende, mas se tem por instinto natural. Logo, nem todos os preceitos morais pertencem à lei da natureza.
 
2. Demais. — A lei divina é mais perfeita que a humana. Ora, esta faz, aos preceitos da lei da natureza, certos acréscimos relativos aos bons costumes. E isso é claro por ser a lei da natureza a mesma para todos, ao passo que essas instituições morais variam com os diversos povos. Logo, com muito maior razão, a lei divina devia acrescentar à lei da natureza certos preceitos relativos aos bons costumes.
 
3. Demais. — Assim como a razão natural produz bons costumes, assim também a fé; donde o dizer a Escritura (Gl 5, 6): a fé obra por caridade. Ora, a fé não está contida na lei da natureza, porque as suas verdades são superiores à razão natural. Logo, nem todos os preceitos morais da lei divina pertencem à lei da natureza.
 
Mas, em contrário, diz o Apóstolo (Rm 2, 14): os gentios, que não têm lei, fazem naturalmente as coisas que são da lei. O que se deve entender como referente ao que respeita aos bons costumes. Logo, todos os preceitos morais da lei pertencem à lei da natureza.
 
Solução. — Os preceitos morais são distintos dos cerimoniais e dos judiciais. Pois, os morais respeitam ao que, em si mesmo, pertence aos bons costumes. Ora, como os costumes humanos se consideram em relação à razão, que é o princípio próprio dos atos humanos, chamam-se bons os costumes congruentes com a razão, e maus, os que dela se afastam. Ora, assim como todo juízo da razão especulativa procede do conhecimento natural dos primeiros princípios, assim também todo juízo da razão prática procede de certos princípios naturalmente conhecidos, conforme já dissemos (q. 94, a. 2, a. 4). Donde podemos proceder diversamente para julgar coisas diversas. Pois, há certos atos humanos de tal modo explícitos, que, com pouca reflexão, podem logo ser aprovados ou reprovados, tendo-se em vista esses princípios comuns e primeiros. Outros há porém, para cuja apreciação é preciso refletir aturadamente nas diversas circunstâncias, que podem ser consideradas diligentemente só pelo homem prudente, e não por qualquer pessoa. Assim como, considerar as conclusões particulares das ciências não pertence a todos, mas só aos filósofos. Outros há enfim que, para julgá-las, o homem precisa ser ajudado pela instrução divina, como é o caso do que pertence à fé.
 
Por onde é claro que, dizendo respeito os preceitos morais aos bons costumes e estes sendo os que estão de acordo com a razão; e todo juízo da razão humana derivando, de certo modo, da razão natural, necessariamente todos os preceitos morais hão de pertencer à lei da natureza, mas diversamente. — Assim, há certos de que a razão natural de qualquer homem pode logo julgar, que devem ser obedecidos. Tais são: honrarás a teu pai e a tua mãe; e não matarás, não furtarás. E estes pertencem absolutamente à lei da natureza. — Há porém outros que são tidos, pelos homens prudentes, e em virtude de uma consideração mais subtil da razão, como devendo ser observados. E estes pertencem à lei natural, mas precisam de uma certa doutrina pela qual os prudentes ensinem os que não o são. Tal aquilo da Escritura: Levanta-te diante dos que têm a cabeça cheia de cãs e honra a pessoa do velho; e outros semelhantes. — Há outros enfim, para julgar dos quais a razão humana precisa da instrução divina, que nos ensina sobre as coisas divinas. Tais aqueles: não farás para ti imagem de escultura, nem figura alguma; não tomarás o nome do Senhor teu Deus em vão.
 
Donde se deduzem claras as respostas às objeções.

03 de janeiro: Utilidade do nome de Jesus [*]

3 de janeiro 
   
    
Deve-se saber que o nome de Jesus é nome de muitas e grandes virtudes: é refúgio para os penitentes, remédio para os doentes, auxílio para os que lutam e sufrágio para os que oram; posto que confere o perdão dos pecados, a graça da sanidade, a vitória na tentação e a virtude e certeza de se chegar a salvação.
   
Sobre o primeiro ponto, diz a Escritura (1 Jo 2, 12): « Eu vos escrevo, filhinhos, porque os vossos pecados vos são perdoados pelo seu nome ». E S. Agostinho: « Que significa Jesus, senão Salvador? Portanto, por causa de vós mesmo, sede Jesus para mim. Não queirais, ó Senhor, não queirais prestar tanta atenção a meus males, que vos esqueçais de vossa bondade ». Deve-se observar que este nome é imposto na circuncisão; por onde se significa que os circuncisos são salvos espiritualmente. Donde S. Bernardo: « A nós, irmãos, é preciso sermos circuncidados, e assim receber o nome da salvação -- circuncidados não segundo a letra, mas em espírito e verdade ».
  
Sobre o segundo ponto (Ct 1, 2): « O teu nome é como o óleo derramado ». Ora, o óleo traz o alívio às dores, e assim também o nome de Jesus. Diz S. Bernardo: « Tens, minha alma, um segredo dos eleitos no frasco de nome Jesus, porque, contra nenhuma peste, jamais se mostrou ineficaz ». E Pedro de Ravena: « Este é o nome que deu visão aos cegos e audição aos surdos, que fez caminhar aos coxos, falar aos mudos e deu a vida aos mortos ».    
 
Sobre o terceiro ponto (Pr 18, 10): « O nome do Senhor é uma torre fortíssima »; e Mc 16, 17, « Expulsarão demônios em meu nome »;  Lc 10, 17, « E os setenta e dois voltaram alegres, dizendo: Senhor, até os demônios se nos submetem em virtude do teu nome ». Diz Pedro de Ravena: « O poder deste nome, o nome de Jesus, afugenta todo poder do demônio sobre os corpos atormentados ».
 
Sobre o quarto ponto (Jo 14, 14): « Se me pedirdes alguma coisa em meu nome, eu a farei. » Diz Agostinho: « Em meu nome, significa que Cristo Jesus é Cristo Rei e Cristo Salvador; e por isto, tudo que pedimos, pedimos em nome do Salvador e, no entanto, é Salvador não somente quando nos atende, mas também quando não nos atende; porque quando vê que se pede algo contrário à salvação, mostra-se salvador ao não atender. Ora, o médico sabe se o que pede o doente é bom ou mal para sua saúde; assim, não atende a vontade do que pede algo danoso, para que se restabeleça a saúde. »
  
É conhecida a palavra de S. Bernardo sobre a circuncisão de Cristo e a imposição de seu nome: « Grande e admirável mistério: o menino é circuncidado, e a Ele se dá o nome de Jesus. Por que quis para si esta conexão? Ora, considera como o mediador de Deus e do homem, desde o início de sua natividade, une as coisas humanas às divinas, as inferiores às superiores. Nasce de uma mulher, mas a quem o fruto da fecundidade sobrevém de tal forma, que não desfalece a flor da virgindade; nasce envolto em panos, mas são estes mesmos panos honrados com louvores angélicos; nasce escondido num presépio, mas dado a conhecer por uma estrela radiante no céu. Assim também, a circuncisão prova a verdade da humanidade assumida, e o nome que está acima de todo nome, indica a glória de sua majestade ».      
  
De Human., c. XXVI
  
 (P. D. Mézard, O. P., Meditationes ex Operibus S. Thomae.)

04 de janeiro: A virgindade de Maria Santíssima

4 de janeiro
   
    
I - Sem nenhuma dúvida devemos afirmar que a mãe de Deus foi Virgem, mesmo no parto. Pois o Profeta não só disse « Eis que uma virgem conceberá », mas acrescentou: « e dará à luz um filho ». (Is 7, 14)
    
Há três razões  que mostram por que convinha que assim fosse:
   
1ª. Porque correspondia ao que é próprio daquele que iria nascer, ou seja o Verbo de Deus. Porque o Verbo não só é concebido no coração sem corrupção, mas procede do coração também sem corrupção. Por isso, para que ficasse manifesto que aquele corpo era do Verbo de Deus em pessoa, era conveniente que nascesse do seio incorrupto de uma virgem. Assim se lê: « Aquela que dá à luz a carne deixa de ser virgem. Mas porque o Verbo nasceu da carne, o próprio Deus protegeu a virgindade, mostrando assim que ele é o Verbo. Pois,  nem mesmo o nosso verbo ao ser gerado corrompe a alma, nem Deus, o Verbo substancial. ao escolher nascer, destrói a virgindade. »
   
2º. É também conveniente no que diz respeito ao efeito da encarnação de Cristo. Pois ele veio precisamente para tirar a nossa corrupção. Por isso não seria conveniente que, ao nascer, destruísse a virgindade da mãe. Eis por que, afirma Agostinho: « Não seria justo que, aquele que vinha sarar a corrupção, violasse a integridade com sua vinda ».
   
3º. Era conveniente que, aquele que mandou honrar os pais, não diminuísse a honra da mãe ao nascer.
   
Cristo, porém, juntou o admirável com o simples. Para mostrar que o seu corpo é verdadeiro, nasce de uma mulher; para mostrar sua divindade, nasce de uma virgem. Um nascimento assim era digno de Deus, como diz Santo Ambrósio num hino de Natal. 
   
E assim, a Bem Aventurada Virgem deu à luz sem dores; houve, sim, a maior alegria, porque nasceu para o mundo o homem Deus, como diz Isaías: « Que a terra se cubra de flores dos campos, que ela exulte e grite de alegria ». (Is 35, 1-2)
   
II - A Virgem bem-aventurada permaneceu virgem depois do parto
  
Diz-se em Ezequiel: « E o Senhor disse-me: Esta porta estará fechada; não se abrirá, e ninguém passará por ela; porque o Senhor Deus de Israel entrou por esta porta » (44, 42). Agostinho comenta assim este texto: « Que significa  'porta fechada na casa do Senhor' a não ser que Maria permanecerá sempre intacta? E que significa 'o homem não passará por ela' a não ser que José não a 'conhecerá'? E que significa 'só o Senhor entra e sai por ela', a não ser que o Espírito Santo a fecundará e o Senhor dos anjos nascerá dela? E qual o sentido de 'estará fechada para sempre' a não ser que Maria é virgem antes do parto, no parto e depois do parto? »
   
Sem nenhuma dúvida devemos detestar o erro de Celvídio, que pretendia ter sido a mãe de Cristo, depois do parto, conhecida por José e ter gerado outros filhos. Pois isto vai contra a perfeição de Cristo que, assim como pela sua natureza divina é o Unigênito do Pai, como o seu Filho em tudo perfeito, assim também convinha que fosse o unigênito da mãe, como seu fruto perfeitíssimo.
   
III q. 28, a. 2 e a. 3; q. 35, a. 6
  
     
 (P. D. Mézard, O. P., Meditationes ex Operibus S. Thomae.)

05 de janeiro: O Fruto da bem-aventurada Virgem

5 de janeiro
   
« Bendito o fruto  de vosso ventre » (Lc 1, 42).
   
O pecador procura nas criaturas aquilo que não pode achar, mas o justo o obtém. « A riqueza dos pecadores está reservada para os justos », dizem os Provérbios (13, 22). Assim Eva procurou o fruto, sem achar nele a satisfação de seus desejos. A Bem-aventurada Virgem, ao contrário, achou em seu fruto tudo o que Eva desejou.
   
Eva, com efeito, desejou de seu fruto três coisas:
   
1º. a deificação de Adão e dela mesma e o conhecimento do bem e do mal, como lhe prometera falsamente o diabo: « Sereis como deuses » (Gn 3, 5), disse-lhes o mentiroso. O diabo mentiu, porque ele é mentiroso e o pai da mentira (cf. Jo 8, 44). E por ter comido do fruto, Eva, em vez de se tornar semelhante a Deus, tornou-se dessemelhante. Por seu pecado, afastou-se de Deus, sua salvação, e foi expulsa do paraíso.
   
A Bem-aventurada Virgem, ao contrário, achou sua deificação no fruto de suas entranhas. Por Cristo nos unimos a Deus e nos tornamos semelhantes a Ele. Diz-nos São João: (1 Jo 3, 2) « Quando Deus se manifestar, seremos semelhantes a Ele, porque o veremos como Ele é. »
   
2º. Eva desejava o deleite (cf. Gn 3, 6), mas não o encontrou no fruto e imediatamente conheceu que estava nua e a dor entrou em sua vida. No fruto da Virgem, ao contrário, encontramos a suavidade e a salvação. « Quem come minha carne tem a vida eterna » (Jo 6, 55).
   
3º. Enfim, o fruto de Eva era sedutor no aspecto, mas quão mais belo é o fruto da Virgem que os próprios Anjos desejam contemplar (cf. 1 Pe 1, 12). « É o mais belo dos filhos dos homens (Sl 44, 3), « porque é o esplendor da glória de seu Pai » (Heb 1, 3) como diz S. Paulo.
  
Portanto, Eva não pôde achar em seu fruto o que também nenhum pecador achará em seu pecado. Acharemos, no entanto, tudo o que desejamos no fruto da Virgem. Busquemo-lo.
   
O fruto da Virgem Maria é bendito por Deus, que de tal forma encheu-o de graças que sua simples vinda já nos faz render homenagem a Deus. « Bendito seja Deus e Pai de nosso Senhor Jesus Cristo que nos abençoou com toda a bênção espiritual em Cristo », declara São Paulo (Ef 1, 3).
  
O fruto de Maria é também bendito pelos anjos e homens: « Toda a língua confesse que o Senhor Jesus Cristo está na glória de Deus Pai », nos diz o Apóstolo (Fp 2, 11). E o Salmista (Sl 117, 26) o saúda assim: « Bendito o que vem em nome do Senhor. »
  
Assim, pois, a Virgem é bendita, porém, bem mais ainda, é o seu fruto.
    
Expositio Salut. angel.
   
(P. D. Mézard, O. P., Meditationes ex Operibus S. Thomae.)

06 de janeiro: Epifania

6 de janeiro
   
«Andaram as gentes na tua luz e os reis no esplendor do teu nascimento» (Is 60, 3).
   
I. — Os Magos foram as primícias dos gentios que acreditaram em Cristo. E neles se manifestou, como um presságio, a fé e a devoção das gentes que vieram a Cristo, das mais remotas regiões. Por onde, assim como a devoção e a fé dos gentios não estava contaminada de nenhum erro, por inspiração do Espírito Santo, assim também devemos crer que os Magos, inspirados pelo Espírito Santo, prestaram sabiamente reverência a Cristo.
   
II. — Diz Agostinho: «A estrela, que conduziu os Magos ao lugar onde o Deus infante estava com sua mãe, podia também tê-los conduzido à cidade mesma de Belém, onde nasceu Cristo. Contudo, escondeu-se-lhes aos olhares, até que os próprios judeus dessem testemunho da cidade onde nasceu Cristo. E assim, confirmados por um testemunho duplo, como diz Leão Papa, buscassem com fé mais ardente aquele que punham de manifesto o clarão da estrela e a autoridade das profecias.» E assim os Magos anunciam a natividade de Cristo e interrogam qual o lugar, crêem e procuram, como significando os que vivem na fé e desejam a visão.
  
E foi também por determinação divina que os Magos, mesmo sem avistarem então a estrela, guiados pelo senso humano, chegaram à Jerusalém onde, na cidade real, buscaram o Rei nascido; e assim foi Jerusalém o primeiro lugar onde se anunciou publicamente a natividade de Cristo, segundo àquilo da Escritura: «De Sião sairá a lei e de Jerusalém a palavra do Senhor» (Is 2, 3). E também para que o trabalho a que se deram os Magos, vindos de tão longe, condenasse a displicência dos judeus, que viviam tão perto.
 
III. — Admirável foi a fé dos Magos. Como diz Crisóstomo, «Se os Magos tivessem saído à procura de um rei terreno, ficariam confundidos por terem sem causa se dado ao trabalho de uma viagem tão longa». E por isso não o teriam adorado nem oferecido presentes. «Mas, porque buscavam um Rei celeste, embora nada descobrissem nele denotador da excelência real, contudo, contentes com o só testemunho da estrela, adoraram-no» Pois, reconheceram um Deus no homem que vêem. E oferecem dois presente convenientes à dignidade de Cristo: «ouro, como a um grande Rei; o incenso, usado nos sacrifícios divinos, como a Deus; e a mirra, com que se embalsamam os corpos dos mortos, lho oferecem como a quem havia de morrer pela salvação de todos.»   
 
    
III q. XXVI a. VIII.
   
(P. D. Mézard, O. P., Meditationes ex Operibus S. Thomae.)

07 de janeiro: A ordem da manifestação de Cristo

7 de janeiro 
   
   
1º. O nascimento de Cristo foi manifestado em primeiro lugar aos pastores, no dia mesmo do nascimento de Cristo. Com efeito, diz o Evangelho de Lucas: « Ora, naquela mesma região, havia uns pastores que velavam e faziam de noite a guarda ao seu rebanho. E depois que os anjos se retiraram deles para o céu, os pastores diziam entre si: vamos até Belém. E foram com grande pressa » (Lc 2, 8, 15, 16).
  
2º. Os magos chegaram a Cristo treze dias depois de seu nascimento, dia no qual se celebra a Epifania. Pois se tivessem vindo um ano depois ou passado dois anos, não o teriam encontrado em Belém, pois o Evangelho de Lucas diz: « Depois que cumpriram tudo, segundo o que mandava a lei do Senhor, isto é, depois de ter oferecido o menino Jesus no Templo,  voltaram para a Galiléia, para a sua cidade de Nazaré » (Lc 2, 39).
   
3º. Foi manifestado aos justos no templo, quarenta dias depois do nascimento, como diz o Evangelho de Lucas. (Lc 2, 22).
   
Eis a razão de tal ordem. Os pastores simbolizam os apóstolos e os outros crentes os judeus, aos quais foi manifestada em primeiro lugar a fé em Cristo, entre eles, como diz a primeira Carta aos Coríntios, não havia « nem muitos poderosos, nem muitos nobres » (1 Cor 1, 26)
  
Em segundo lugar, a fé em Cristo chegou à totalidade das nações, prefigurada pelos magos.
   
E, finalmente, chegou à totalidade dos judeus, prefigurada pelos justos.  E, por isso, Cristo foi-lhes manifestado no templo dos judeus.
   
Portanto, deve-se dizer que a manifestação do nascimento de Cristo foi uma antecipação da manifestação plena que haveria de vir. E assim como na segunda manifestação a graça de Cristo foi anunciada por Cristo e por seus apóstolos, primeiro aos judeus, e depois aos pagãos, assim também, os primeiros a aproximar-se de Cristo foram os pastores, que eram as primícias dos judeus e estavam perto; depois vieram os magos, de longe, como primícias dos pagãos, na expressão de Santo Agostinho.
   
III. q. 36, a. 6 et a. 3 ad 1m.
        
(P. D. Mézard, O. P., Meditationes ex Operibus S. Thomae.)

Questão 100: Dos preceitos morais da lei antiga.

Em seguida devemos tratar de cada um dos gêneros dos preceitos da lei antiga. E primeiro, dos preceitos morais. Segundo, dos cerimoniais. Terceiro, dos judiciais.
 
Na primeira questão discutem-se doze artigos:

02 de janeiro: A imposição do nome de Jesus

 

2 de janeiro  
  
« E, depois que se completaram os oito dias para ser circuncidado o Menino, foi-lhe posto o nome de Jesus. » (Lc 2, 21)
   
Os nomes que Deus impõe a alguns significam sempre algum dom gratuito que Deus lhes concede, como foi dito a Abraão: « Chamar-te-ás Abraão, porque te destinei para pai de muitas gentes » (Gn 17, 5); ou como foi dito a Pedro: « Tu és Pedro e sobre esta pedra edificarei a minha Igreja » (Mt 16, 18).
   
Lemos no livro do Gênesis que Abraão recebeu ao mesmo tempo a imposição do nome por Deus e o preceito da circuncisão. Por isso costumavam os judeus impor o nome à criança no mesmo dia da circuncisão, como para indicar que antes da circuncisão não tinham atingido ainda a perfeição do existir; da mesma forma que agora se impõe o nome às crianças no batismo.
   
Mas os nomes dos indivíduos são dados por alguma propriedade daquele a quem se dá o nome: quer por uma circunstância temporal, como é dado o nome de alguns santos àqueles que nascem no dia de sua festa; quer por razão de parentesco, como quando se dá ao filho o nome do pai, ou de alguém da família; assim, os vizinhos e parentes de João Batista queriam que se chamasse com « o nome de seu pai Zacarias » , e não João, porque « não há ninguém na tua parentela que tenha este nome » (Lc 1, 59 ss).
   
Ora, dado que ao homem Cristo fora concedido este dom gratuito de salvar todos os homens, convenientemente, pois, lhe foi dado o nome de Jesus, ou seja, Salvador; nome que o anjo comunicou de antemão não só à mãe, mas também a José, que haveria de ser o pai de criação.
   
Segundo Isaías: « Chamar-te-ão por um nome novo, que o Senhor designará pela sua boca » (Is 62, 2). Ora, o nome Jesus não é um nome novo, pois foi imposto a muitos no Antigo Testamento. Deve-se dizer que o nome de Jesus podia convir aos que viveram antes de Cristo por alguma outra razão, por exemplo, porque trouxeram alguma salvação particular e temporal. Mas, no sentido espiritual e universal da salvação, este nome é próprio de Cristo. E nesse sentido se diz que é novo.
   
III q. 37. a. 2
   
 (P. D. Mézard, O. P., Meditationes ex Operibus S. Thomae.)

 

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