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Category: Santo Tomás de AquinoConteúdo sindicalizado

Art. 5 — Se se consideram convenientemente efeitos do batismo certos a dos de virtudes: a incorporação com Cristo, a iluminação e a fecundidade espiritual.

O quinto discute-se assim. — Parece que inconvenientemente se consideram efeitos do ba­tismo certos atos de virtudes: a incorporação com Cristo, a iluminação e a fecundidade espi­ritual.
 
1. — Pois, o batismo só é conferido ao adulto, quando tem fé, segundo aquilo do Evangelho: O que crer e for batizado será salvo. Ora, pela fé nos incorporamos com Cristo, segundo o Após­tolo: Para que Cristo habite pela fé em vossos corações. Logo, ninguém é batizado, que já não esteja incorporado com Cristo. Portanto, não é efeito do batismo incorporar com Cristo.
 
2. Demais. — A iluminação se dá pela doutrina segundo o Apóstolo: A mim que sou o mínimo de todos os santos me foi dada esta graça de anunciar a todos, etc. Ora, o ensino catequético precede ao batismo. Logo, não é efeito dele.
 
3. Demais. — A fecundidade é efeito da geração ativa. Ora, o batismo nos regenera es­piritualmente. Logo, a fecundidade espiritual não é efeito do batismo.
 
Mas, em contrário, diz Agostinho, que é efeito do batismo incorporar os batizados com Cristo. E Dionísio também atribui a iluminação ao batismo. E àquilo da Escritura - A uma água da rejeição - diz a Glosa: A alma dos pecadores, estéril pela aridez, é fecundada pelo batismo.
 
SOLUÇÃO. — O batismo nos faz renascer para a vida espiritual, própria dos fiéis de Cris­to, como o diz o Apóstolo: Se eu vivo agora em carne, vivo na Fé do Filho de Deus. Ora, só vivem os membros unidos à cabeça, donde rece­bem a sensibilidade e o movimento. Por onde e necessàriamente, o batismo nos incorpora com Cristo quase membros dele. - Assim como da cabeça, no sentido natural, deriva para os mem­bros a sensibilidade e o movimento, assim da cabeça espiritual, que é Cristo, deriva para os seus membros o senso do espiritual, consistente no conhecimento da verdade, e o movimento espiritual, por inspiração da graça. Donde o dizer o Evangelho: Nós o vimos cheio de graça e de verdade e todos nós participamos da sua plenitude. Por onde e conseqüentemente, hão ­de os batizados ser iluminados por Cristo no concernente ao conhecimento da verdade, e por ele fecundados para a fecundidade das boas obras, pela infusão da graça.
 
DONDE A RESPOSTA À PRIMEIRA OBJEÇÃO. — Pela fé que lhes precede o batismo, os adultos são incorporados com Cristo mentalmente. Mas depois, quando batizados, de certo modo são in­corporados com ele corporalmente, isto é, pelo sacramento visível, sem o desejo do qual nem mesmo a incorporação espiritual lhes seria pos­sível.
 
RESPOSTA À SEGUNDA. — Quem ensina ilumi­na externamente pelo ministério catequético; mas Deus ilumina interiormente os batizados, preparando-lhes o coração para receber a dou­trina da verdade, segundo aquilo do Evangelho: Escrito está nos Projetas - Serão todos ensina­dos de Deus.
 
RESPOSTA À TERCEIRA. — Considera-se efeito do batismo a fecundidade pela qual praticamos as boas obras; mas não a pela qual geramos outros para Cristo, como o diz o Apóstolo: Eu vos gerei em Jesus Cristo pelo Evangelho.

Art. 4 — Se o batismo confere ao homem a graça e as virtudes.

O quarto discute-se assim, — Parece que o batismo não confere ao homem a graça e as virtudes.
 
1. — Pois, como se disse, os sacramentos da lei nova realizam o que figuram. Ora, a ablução do batismo significa a purificação da alma, da culpa; mas a informação da alma pela graça e pelas virtudes. Logo, parece que o batismo não confere ao homem a graça e as virtudes.
 
2. Demais. — O que já alcançamos não precisamos receber de novo. Ora, certos se apresen­tam ao batismo, tendo já a graça e as virtudes. Assim, lemos na Escritura: Havia em Cesaréia um homem, por nome Cornélio, que era centu­rião da corte que se chama Italiana, cheio de religião e temente a Deus. E contudo foi depois batizado por Pedro. Logo, o batismo não con­fere a graça e as virtudes.
 
3. Demais. — A virtude é um hábito; e este é por natureza uma qualidade que dificilmente perdemos e que nos faz agir fácil e deleitávelmente. Ora, depois do batismo permanece em nós a inclinação para o mal, inimigo da virtude e temos dificuldade de praticar o bem que é o ato virtuoso. Logo, o batismo não nos con­fere a graça nem as virtudes.
 
Mas, em contrário, o Apóstolo: Salvou-nos pelo batismo de regeneração, isto é, pelo batismo e renovação do Espírito Santo, o qual ele difundiu sobre nós abundantemente, isto é, para a remissão dos pecados e a abundância das virtudes, como o expõe a Glosa a esse lugar. Assim, pois, o ba­tismo confere a graça do Espírito Santo e a abundância das virtudes.
 
SOLUÇÃO. — Como diz Agostinho, o efeito do batismo está em incorporar os batizados com Cristo, tornando-os membros seus. Ora, de Cristo, que é a cabeça, deriva para todos os seus membros a plenitude da graça e da virtude se­gundo aquilo do Evangelho: Todos nós partici­pamos da sua plenitude. Por onde, é manifesto que pelo batismo alcançamos a graça e as vir­tudes.
 
DONDE A RESPOSTA À PRIMEIRA OBJEÇÃO. — ­Assim como a água do batismo significa pela sua ablução a purificação da culpa, e pelo seu refrigério, a liberação da pena, assim, pela sua natural cladade, o esplendor da graça e das virtudes.
 
RESPOSTA À SEGUNDA. — Como dissemos, a re­missão dos pecados pode alcançá-la antes do ba­tismo quem o deseja explícita ou implicita­mente. E contudo quando realmente o recebe, faz-se-lhe mais plena a remissão, ficando total­mente livre da pena. Assim também, antes do batismo, Cornélio e todos os da mesma condição alcançam a graça e as virtudes pela fé de Cristo e o desejo do batismo, implícita ou explicita­mente; mas depois, no batismo, alcançam maior cópia de graça e de virtudes. Por isso, àquilo da Escritura - Ele me conduziu junto a uma água de rejeição - diz a Glosa: Pelo aumento da virtude e de obras santas nos fortificou no batismo.
 
RESPOSTA À TERCEIRA. — A dificuldade para o bem e a inclinação para o mal os batizados as sentem não por deficiência do hábito das vir­tudes, mas pela concupiscência, não eliminada pelo batismo. Assim, pois, como o batismo di­minui a concupiscência, de modo que não possa ela dominar, assim também diminui a inclinação para o mal e a concupiscência, para não nos vencerem.

Art. 3 — Se o batismo deve livrar das penalidades da vida presente.

O terceiro discute-se assim. — Parece que o batismo deve livrar das penalidades da vida presente.
 
1. — Pois, como diz o Apóstolo, o dom de Cristo é mais forte que o pecado de Adão. Ora, pelo pecado de Adão, como diz ainda ele no mesmo lugar, a morte entrou neste mundo e por consequência todas as outras penalidades da vida presente. Logo e com muito maior razão, pelo dom de Cristo, recebido no batismo, devíamos ser liberados de todas as penalidades da vida presente.
 
2. Demais. — O batismo dele a culpa ori­ginal e a atual como se disse. Ora, dele a culpa atual liberando-nos totalmente do reato da pena a ela consequente. Logo, também nos libera das penalidades da vida presente, que são a pena do pecado original.
 
3. Demais. — Removida a causa, removido fica o efeito. Ora, a causa das referidas penali­dades é o pecado original, delido pelo batismo. Logo, não devem tais penalidades permanecer.
 
Mas, em contrário, aquilo do Apóstolo – Seja destruído o corpo do pecado - diz a Glosa: O batismo produz o efeito de crucificar o homem velho e destruir o corpo do pecado; não de ma­neira que a concupiscência enraizada na carne viva, com a qual nasceu, fique logo consumida e desapareça; mas de modo, que presente em nós ao nascermos, já não nos possa fazer mal quando morremos. Logo, pela mesma razão, o batismo tira as outras penalidades.
 
SOLUÇÃO. — O batismo tem a virtude de nos livrar das penalidades da vida presente. Não as tira porém já nesta vida, mas, pela sua virtude são tiradas ao justo, na ressurreição, quando este corpo mortal se revestir da imortalidade, na frase do Apóstolo. E isto racionalmente. - Pri­meiro, porque o batismo nos incorpora com Cristo, tornando-nos membro dele, como dissemos. Por isso deve dar-se com o membro incorporado os que deu com o chefe. Ora, Cristo desde o momento da sua concepção teve a plenitude da graça e da verdade; mas teve um corpo passível, ressusci­tado depois da paixão e da morte à vida glorio­sa. Por isto também o cristão no batismo alcança a graça para a alma, mas tem um corpo passível no qual pode sofrer por Cristo. Ressus­citará porem para uma vida impassível. Por isso diz o Apóstolo: Aquele que ressuscitou dos mor­tos a Jesus Cristo também dará vida aos vossos corpos mortais pelo seu Espírito, que habita em vós. E mais abaixo: Herdeiros verdadeiramente de Deus e coerdeiros de Cristo, se é que, todavia nós padecemos com ele para que sejamos tam­bém com ele glorificados. - Segundo, em bene­fício do exercício espiritual; isto é, a fim de, lutando contra a concupiscência e as outras paixões recebermos; a coroa da glória. Por isso, àquilo do Apóstolo: - Para que seja destruído o corpo do pecado, - diz a Glosa: Se, uma vez batizado, o homem continua a viver na carne, terá que combater a concupiscência e a vencerá com o auxílio de Deus. Luta que está simbolizada na Escritura: Estas são as gentes que o Senhor deixou para instruir por meio delas a Israel, para que depois aprendessem seus filhos a com­bater contra seus inimigos e se avezassem a pe­lejar. - Terceiro, a fim de que ninguém se apresentasse ao batismo levado do desejo de fugir aos sofrimentos desta vida, em lugar de ter em mira a glória da vida eterna. Donde o dizer o Após­tolo: Se nesta vida tão somente esperemos em Cristo, somos nós os mais infelizes de todos os homens.
 
DONDE A RESPOSTA À PRIMEIRA OBJEÇÃO. — Aquilo do Apóstolo - Não sirvamos, jamais ao pecado - diz a Glosa: Assim como quem se apo­dera de um inimigo atrocíssimo não o mata logo, mas o deixa viver algum tempo na vergonha e na dor, assim Cristo começou limitando primeiro a pena, para fazê-la desaparecer de todo no futuro.
 
RESPOSTA À SEGUNDA. — Como diz a Glosa no mesmo lugar, dupla é a pena do pecado - a da geena e a temporal. A da geena Cristo aboliu completamente, de modo que os batizados e os verdadeiramente penitentes não a sintam. Quan­to à temporal, não a aboliu ainda de todo, pois, aí estão a sede, a fome e a morte. Mas, tirou-­lhe o domínio e o reinado, fazendo o homem não na temer; e por fim, no último dia, a extermi­nara de todo.
 
RESPOSTA À TERCEIRA. — Como dissemos na Segunda Parte, o pecado original produz um contágio tal, que foi primeiro a pessoa a conta­minar a natureza, e depois a natureza, a pes­soa. Mas Cristo, na ordem inversa, restaura em primeiro lugar a pessoa para depois restaurar em todos ao mesmo tempo a natureza. Por isso, o batismo faz-nos desaparecer imediatamente a culpa do pecado original e também a pena da privação da visão de Deus, concernentes à pes­soa. As penalidades da vida presente, porém, como a morte, a fome, a sede e outras semelhan­tes respeitam a natureza, de cujos princípios são causadas por ter ela decaído da justiça original. Por isso essas deficiências só desaparece­rão na restauração derradeira da natureza, pela ressurreição gloriosa.

Art. 2 — Se o batismo nos libera totalmente do reato do pecado.

O segundo discute-se assim. — Parece que o batismo não nos libera totalmente do reato do pecado.
 
1. — Pois, diz o Apóstolo: As coisas de Deus são ordenadas. Ora, é a culpa que faz entrar na ordem a pena, como diz Agostinho. Logo, o batismo não exclui o reato da pena dos pecados precedentes.
 
2. Demais. — O efeito do sacramento tem alguma semelhança com o próprio sacramento; pois, os sacramentos da lei nova realizam real­mente o que figuram como se disse. Ora, a ablução batismal, tem por certo alguma seme­lhança com a ablução da mácula, mas nenhuma tem com a liberação do reato da pena. Logo, o batismo não dele o reato da pena.
 
3. Demais. — Excluído o reato da pena, já ninguém continua digno dela, e portanto a punição é injusta. Se, pois, o batismo tira o reato da pena, seria injusto depois do batismo enfor­car um ladrão que antes praticou um homicídio. E assim o batismo faria desaparecer o rigor da disciplina humana, o que é inconveniente. Logo, a batismo não tira o reato da pena.
 
Mas, em contrário, àquilo do Apóstolo - Os dons e a vocação de Deus são imutáveis - diz Ambrósio: A graça de Deus no batismo, tudo perdoa gratuitamente.
 
SOLUÇÃO. — Como dissemos pelo batismo nos incorporamos à paixão e à morte de Cristo, se­gundo aquilo do Apóstolo: Se somos mortos com Cristo cremos que juntamente viveremos também com Cristo. Por onde é claro que a todo batizado é comunicada a paixão de Cristo como remédio, como se esse próprio batizado a tivesse sofrido e tivesses satisfação suficiente por todos os pecados de todos os homens. Logo, o batizado fica livre totalmente do reato da pena que deve­ria sofrer, por causa do pecado, como se tivesse suficientemente satisfeito por todos os seus pe­cados.
 
DONDE A RESPOSTA À PRIMEIRA OBJEÇÃO. — A pena da paixão de Cristo se comunica ao bati­zado, enquanto se torna membro de Cristo, como se ele próprio tivesse sofrido essa pena; por isso pela pena da paixão de Cristo os pecados do batizado reentram na ordem.
 
RESPOSTA À SEGUNDA. — A água não somente lava, mas também refresca. E assim, o seu re­frigério significa o reato da pena, como a sua ablução significa a purificação da culpa.
 
RESPOSTA À TERCEIRA. — As penas impostas pelo juízo humano não só levam em conta a pena merecida por um homem, relativamente a Deus, mas ainda em que fica obrigado para com os outros homens, lesados e escandalizados pelo seu pecado. Por isso embora o homicida seja liberado pelo batismo do reato da pena devida a Deus, fica ainda contudo obrigado a ela perante os homens, que é justo se edifiquem pela pena assim como foram escandalizados pela culpa. Contudo e por um sentimento de piedade, o príncipe poderá exercer a sua clemência para com esses tais.

Art. 1 — Se o batismo dele todos os pecados.

O primeiro discute-se assim. — Parece que o batismo não dele todos os pecados.
 
1. — Pois, o batismo é um renascimento espiritual, correspondente à geração carnal. Ora, pela geração carnal só contraímos o pecado ori­ginal. Logo, o batismo nos livra só do pecado original.
 
2. Demais. — A penitência é a causa sufi­ciente da remissão dos pecados atuais. Ora, antes de receberem o batismo, os adultos devem fazer penitência, segundo aquilo da Escritura: Fazei penitência e cada um de vós seja batizado. Logo, o batismo não tem nenhum efeito, quanto à remissão dos pecados atuais.
 
3. Demais. — Para doenças diversas, remédios diversos; pois, como diz Jerônimo, não cura os olhos o que cura o calcanhar. Ora, o pecado original, delido pelo batismo, é genericamente diferente do pecado atual. Logo, o batismo não remite todos os pecados.
 
Mas, em contrário, a Escritura: Derramarei sobre vós uma água pura e sereis purificados de todas as vossas imundícias.
 
SOLUÇÃO. — Diz o Apóstolo: Todos os que fomos batizados em Jesus Cristo fomos batizados em sua morte. E depois conclui: Assim também vós considerai-vos que estais certamente mortos ao pecado, porém vivos para Deus em Nosso Senhor Jesus Cristo. Por onde é claro que, pelo batismo, morremos à vetustez do pecado e começamos a viver em a novidade da graça. Ora, todo pecado se prende a vetustez primitiva. Logo e consequentemente, todo pecado é delido pelo batismo.
 
DONDE A RESPOSTA À PRIMEIRA OBJEÇÃO. — ­Como diz o Apóstolo, o pecado de Adão não pode tanto quanto o dom de Cristo, que recebemos no batismo: Porque o juízo se originou de um pecado para condenação, mas a graça procedeu de muitos delitos para justificação. Donde o dizer Agostinho: Com a geração da carne contraímos somente o pecado original; mas a rege­neração pelo Espírito produz a remissão, não só do pecado original, mas também dos voluntários.
 
RESPOSTA À SEGUNDA. — A remissão de ne­nhum pecado pode dar-se, senão por virtude da paixão de Cristo; por isso diz o Apóstolo, que sem efusão de sangue não há remissão. Por onde, o movimento da vontade arrependida não basta­ria para a remissão da culpa sem a fé na paixão de Cristo e o propósito de participar dela, quer pelo recebimento do batismo, quer pela sujeição aos chefes da Igreja. Portanto, quando um adulto penitente se achega ao batismo, recebe a remissão de todos os pecados, pelo desejo desse sacramento; mais perfeitamente porém quando realmente o recebe.
 
RESPOSTA À TERCEIRA. — A objeção colhe quanto aos remédios particulares. Ora, o ba­tismo obra em virtude da paixão de Cristo re­médio universal de todos os pecados; portanto, o batismo dele todos os pecados.

Questão 69: Dos efeitos do batismo

Em seguida devemos tratar dos efeitos do batismo.
 
E nesta questão discutem-se dez artigos:

 

Art. 12 — Se os loucos e os dementes devem ser batizados.

O duodécimo discute-se assim. — Parece que os loucos e os dementes não devem ser batizados.
 
1. — Pois, quem vai ser batizado deve ter a intenção de receber o batismo, como se disse. Ora, os loucos e os dementes, não tendo o uso da razão, não podem ter senão uma intenção desor­denada. Logo, não devem ser batizados.
 
2. Demais. — O homem supera os brutos por ter o uso da razão. Ora, os loucos e os dementes não têm esse uso; e às vezes nem mesmo se pode esperar que o venham a ter, como sa­bemos que o terão as crianças. Logo, não po­dendo os irracionais ser batizados, também não o devem ser os loucos e os dementes.
 
3. Demais. — Mais privados estão do uso da razão os loucos e os dementes que os adormecidos. Ora, não se costuma conferir o ba­tismo aos adormecidos. Logo, não deve ser tam­bém conferido aos loucos e aos furiosos.
 
Mas, em contrário, Agostinho refere o caso de ter sido batizado um amigo seu, de quem se tinha desesperado. E contudo, o batismo nele foi válido. Logo, aos sem o uso da razão o batismo deve ser às vezes conferido.
 
SOLUÇÃO. — Sobre os loucos e os dementes é necessário distinguir. Certos o são de nascença, sem nenhum intervalo lúcido, não manifestando nenhum uso da razão. E esses, quanto ao rece­bimento do batismo, devemos tratá-los do mes­mo modo que as crianças, batizados na fé da Igreja, como se disse. - outros, porém, são de­mentes, caídos nesse estado depois de terem tido o uso da razão. E a esses devemos tratá-los le­vando em conta a vontade que tinham quando eram sãos. Assim, se então manifestaram a vontade de receber o batismo, devemos minis­trá-lo, quando loucos mesmo se a isso opuserem resistência. Ao contrário, se antes nunca manifestaram a vontade de o receber, quando es­tavam em juízo perfeito, não devem ser batiza­dos. - Outros há, porém, loucos ou dementes de nascença, dotados contudo de certos intervalos lúcidos, podendo então usar bem da razão se, pois, num desses intervalos quiserem ser batiza­dos, podem sê-lo mesmo quando em estado de loucura; e há dever de lhe conferir o sacramen­to, estando em caso de perigo; do contrário é melhor esperar o tempo da lucidez, a fim de receberem o batismo com maior devoção. Se, porém, no intervalo de lucidez, não manifesta­rem o desejo do batismo, não devem ser bati­zados quando caírem de novo na loucura. ­Outros há ainda que, embora não sendo total­mente sãos de mente, têm o uso suficiente da razão para poderem pensar na salvação e com­preender a virtude do sacramento. E com esses devemos proceder como com os sãos: batizá-los, se o quiserem; mas não, se forem contrários.
 
DONDE A RESPOSTA À PRIMEIRA OBJEÇÃO. — ­Os loucos, que nunca tiveram o uso da razão, são batizados de acordo com a intenção da Igreja, assim como por ato da Igreja crêem e fazem penitência, tal como dissemos a respeito das crianças. Os que porém em certo tempo tiveram ou têm o uso da razão são batizados conforme a intenção própria que têm ou tiveram quando estavam sãos.
 
RESPOSTA À SEGUNDA. — Os loucos e os de­mentes estão privados acidentalmente do uso da razão, isto é, por insuficiência de algum órgão cor­póreo; não porem por deficiência da alma ra­cional, como é o caso dos brutos. Logo, a com­paração não colhe.
 
RESPOSTA À TERCEIRA. — Os adormecidos não devem ser batizados senão em perigo de morte iminente. E então devem ser batizados, se antes manifestaram o desejo de o ser, como o dissemos a propósito dos loucos. Assim, Agostinho conta, de um seu amigo, que foi batizado sem o saber, por estar em perigo de morte.

Art. 11 — Se se deve batizar as crianças ainda no ventre materno.

O undécimo discute-se assim. — Parece que se deve batizar as crianças ainda no ventre materno.
 
1. — Pois, mais eficaz é o dom de Cristo para a nossa salvação que o pecado de Adão para nos condenar, como diz o Apóstolo. Ora, as crianças ainda no ventre materno são condena­das por causa do pecado de Adão. Logo e muito mais, podem se salvar pelo dom de Cristo.
 
2. Demais. — A criança ainda no ventre materno faz parte da mãe. Ora batizada a mãe, tudo o nela existente está batizado. Logo, bati­zada a mãe estará batizada a criança existente no ventre.
 
3. Demais. — A morte eterna é pior que a do corpo. Ora, de dois males devemos escolher o menor. Se, pois, a criança no ventre materno não pode ser batizada, melhor seria abrir o ven­tre e extrair a criança do que deixá-la conde­nar-se eternamente, morrendo sem batismo.
 
4. Demais. — Acontece às vezes uma parte da criança nascer primeiro. Assim, lemos na Escritura: No parto de Tamar, na mesma ação de parir os meninos, um deitou fora a mão, na qual a parteira atou uma fita encarnada, dizen­do - este sairá primeiro. Porém, recolhendo ele a mão, saiu o outro. Outras vezes é iminente em tal caso o perigo de morte. Logo, parece dever ser batizada a parte susceptível de atingir-se, embora a criança esteja ainda no ventre ma­terno.
 
Mas, em contrário, diz Agostinho: Ninguém renasce senão depois de haver nascido. Ora, o batismo é de certo modo um renascimento espi­ritual. Logo, ninguém deve ser batizado antes de nascer do ventre.
 
SOLUÇÃO. — Para o batismo ser válido é necessário ser o corpo do batizando de certo modo abluído com água, pois, o batismo é uma ablução, como se disse. Ora, o corpo da criança, antes de nascer do ventre materno, não pode receber a ablução da água; salvo se se disser que a ablução batismal, lavando o ventre ma­terno, atinge o filho nele existente. Mas isto não pode ser, quer por ser a alma da criança, a cuja santificação se ordena o batismo, distinta da alma da mãe; quer por ser o corpo da crian­ça animada já formado e por consequência dis­tinto do corpo da mãe. E portanto o batismo recebido pela mãe não redunda em benefício do filho existente no ventre. Por isso diz Agosti­nho: Se se considera o feto como pertencendo à mãe a ponto de fazer parte dela, tendo esta sido já batizada, a criança não deve ser bati­zada mesmo se, durante a gravidez, sobrevier perigo de morte. Como entretanto costuma-se batizar a criança, é por não fazer parte da mãe, mesmo enquanto ainda no ventre. Donde se conclui que de nenhum modo as crianças ainda existentes no ventre materno podem ser bati­zadas.
 
DONDE A RESPOSTA À PRIMEIRA OBJEÇÃO. — ­As crianças existentes no ventre materno ainda não vieram à luz, para fazer parte da sociedade humana. Não podem portanto estar sujeitas à ação dos homens de modo a receberem por mi­nistério deles, os sacramentos da salvação. Po­dem, porém sofrer a ação de Deus, junto de quem vivem, de modo a conseguirem a santifi­cação por um privilégio da graça; tal o caso dos santificados no ventre materno.
 
RESPOSTA À SEGUNDA. — Os órgãos internos da mãe fazem parte dela pela continuidade e unidade da parte material com o todo. Mas, o feto existente no ventre da mãe faz parte desta por uma ligação de dois corpos distintos. Logo, a comparação não colhe.
 
RESPOSTA À TERCEIRA. — Não façamos males para que venham bens, diz o Apóstolo. Logo, não se deve matar a mãe para batizar o filho. Se porém, morta a mãe, ainda lhe sobrevive o filho no ventre, deve este ser aberto e a criança ba­tizada.
 
RESPOSTA À QUARTA. — É preciso esperar a total expulsão do filho do ventre materno, para batizá-lo, salvo se houver perigo de morte. Se porém se mostrar primeiro a cabeça, sede de to­dos os sentidos, deve-se batizar, em perigo de morte; nem se reiterará o batismo, se vier a criança a nascer perfeita. E se deve fazer o mesmo seja qual for a parte que nasça primeiro, havendo perigo de morte. Como porem a inte­gridade da vida em nenhum dos membros exter­nos se manifesta como na cabeça, certos opinam que, na dúvida, seja qual for a parte do corpo em que se tiver feito a ablução, a criança deve, depois de totalmente nascida, ser batizada sob esta forma: Se não és batizada, eu te batizo, etc.

Art. 10 — Se os filhos dos judeus ou de outros infiéis devem ser batizados, mesmo contra a vontade dos pais.

O décimo discute-se assim. — Parece que os filhos dos judeus ou de outros infiéis devem ser batizados, mesmo contra a vontade dos pais.
 
1. — Pois, o homem deve ser preservado, antes contra o perigo da morte eterna, que con­tra o da morte temporal. Ora, a criança em perigo de morte temporal, deve ser preservada, mesmo se por malícia os pais a isso se opuserem. Logo, com maior razão, deve-se preservar às crianças filhos dos infiéis, pelo batismo, contra o perigo de morte eterna, mesmo contra a von­tade dos pais.
 
2. Demais. — Os filhos dos escravos são servos e estão sob o poder do senhor. Ora, os judeus são escravos dos reis e dos príncipes, bem como quaisquer outros infiéis. Logo, sem nenhuma injustiça podem os príncipes fazer batizar os filhos dos judeus ou de outros escravos infiéis.
 
3. Demais. — Qualquer homem pertence mais a Deus, de quem recebeu a alma, do que do pai carnal, de quem recebeu o corpo. Logo, não é injusto tirar as crianças, filhos de infiéis, aos pais carnais, para as consagrar a Deus pelo batismo.
 
Mas, em contrário, uma Decretal assim dispõe: O santo Sínodo, ordena que, no futuro, nenhum judeu sela compelido por força a crer, pois, não devem ser salvos contra a vontade, mas se o quiserem, para ser integral a forma da justiça.
 
SOLUÇÃO. — As crianças, filhos de infiéis, ou têm ou não têm o uso da razão. - Se a têm, já então, no concernente ao direito divino natural começam a depender de si mesmas. E portanto, podem, por vontade própria e contra a dos pais, receber o batismo, bem como contrair matrimô­nio. E portanto, podem licitamente ser adverti­das e induzidas a receber o batismo. - Se po­rém não têm ainda o uso do livre arbítrio, estão por direito natural sujeitas à direção dos pais, enquanto não puderem se bastar a si mesmos. Por isso se diz que os filhos dos antigos se sal­vavam na fé dos pais. Seria portanto contra a justiça natural se essas crianças fossem batiza­das contra a vontade dos pais, como o seria batizar contra a vontade a quem tem o uso da razão. Alem disso seria perigoso batizar desse modo os filhos dos infiéis, pois facilmente vol­tariam à infidelidade, pelo afeto natural para com os pais. Por isso, a Igreja não tem o cos­tume de batizar os filhos dos infiéis contra a vontade destes.
 
DONDE A RESPOSTA À PRIMEIRA OBJEÇÃO. — Ninguém deve ser subtraído à condenação à morte, contra as exigências da lei civil; assim, o condenado à morte pelo juiz competente nin­guém o deve livrar dela com violência. Por onde, ninguém deve violar a ordem do direito natural, pelo qual o filho está sob o poder do pai, a fim de o arrancar ao perigo da morte eterna.
 
RESPOSTA À SEGUNDA. — Os judeus são escra­vos dos príncipes por uma servidão civil, não ex­clusiva ela ordem do direito natural ou divino.
 
RESPOSTA À TERCEIRA. — O homem se ordena a Deus pela razão, pela qual pode conhecê-lo. Por isso, a criança, antes do uso da razão, orde­na-se naturalmente para Deus pela razão dos pais, de quem por natureza depender. E é a disposição deles que indica como se deve agir com ela no concernente às coisas divinas.

Art. 9 — Se as crianças devem ser batizadas.

O nono discute-se assim. — Parece que não devem as crianças ser batizadas.
 
1. — Pois, de quem se apresenta ao batismo exige-se a intenção de recebê-lo, como se disse. Ora, tal intenção não na podem ter as crianças, que não têm o uso do livre arbítrio. Logo, pa­rece que não podem receber o sacramento do batismo.
 
2. Demais. — O batismo é o sacramento da fé, como se disse. Ora, as crianças não têm fé, que consiste na vontade do crente, como diz Agostinho. Nem se pode dizer que se salvem pela fé dos pais; pois estes às vezes são infiéis e, então, seriam antes condenadas pela infide­lidade deles. Logo, parece que as crianças não podem ser batizadas.
 
3. Demais. — A Escritura diz: O batismo nos salva; não a purificação das imundícies da carne, mas a promessa da boa consciência para com Deus. Ora, as crianças, não tendo o uso da razão, não têm consciência boa nem má; nem podem ser convenientemente interrogados por não terem compreensão. Logo, as crianças não devem ser batizadas.
 
Mas, em contrário, diz Dionísio: Os nossos divinos chefes, isto é, os Apóstolos aprovaram que as crianças recebessem o batismo.
 
SOLUÇÃO. — Como diz o Apóstolo se pelo pecado de um reinou a morte por um só homem, isto é, por Adão, muito mais reinarão em vida por um só, que é Jesus Cristo, os que rece­bem abundância da graça e do dom e da justiça. Ora, as crianças, pelo pecado de Adão, contraem o pecado original, como o mostra o fato de es­tarem sujeitos à morte que, pelo pecado do pri­meiro homem passou para todos, na linguagem do Apóstolo. Logo, com muito maior razão, podem elas, mediante Cristo, receber a graça, para reinarem na vida eterna. Pois, o próprio Senhor diz: Quem não renascer da água e do Espírito Santo não pode entrar no reino de Deus. Por isso é necessário batizá-las, para que, assim como por Adão incorreram na condenação ao nascer, assim, renascendo, consigam a salva­ção por Cristo. - É também conveniente sejam as crianças batiza das a fim de, educa das desde a puerícía nas verdades da vida cristã mais firmemente nela perseverem - segundo aquilo da Escritura: O homem, segundo o caminho que tomou sendo mancebo, dele se não apartará, ainda quando for velho. E essa razão a apre­senta Dionísio.
 
DONDE A RESPOSTA À PRIMEIRA OBJEÇÃO. — - A regeneração espiritual produzida pelo batis­mo, é de certo modo semelhante à natividade carnal. Pois, assim como as crianças, formadas no ventre materno, não se nutrem por si mesmas, mas se sustentam da nutrição materna, assim também as que ainda não têm o uso da razão, como se fossem constituídas no ventre da madre Igreja, alcançam a salvação, não por si mesmas, mas por ato da Igreja. Donde o dizer Agosti­nho: A Madre Igreja deixa os seus filhinhos se servirem da sua boca maternal, para que se abe­berem dos sagrados mistérios; pois, ainda não podem crer de próprio coração na justiça, nem por boca própria confessar a fé, para se salva­rem. Se porém podem ser chamados fiéis por proclamarem de certo modo a sua fé pela boca de quem os traz no seu seio, por que não podem também ser considerados como penitentes, pois, por essa mesma boca, mostraram ter renunciado ao diabo e a este mundo? E pela mesma razão podemos dizer que têm intenção, não por ato próprio, pois, às vezes se lhe opõem e choram, mas pelo ato de quem os apresenta.
 
RESPOSTA À SEGUNDA. — Como diz Agostinho, escrevendo a Bonifácio, na Igreja do Salvador, as crianças crêem pelos outros, como pelos outros é que contraíram os pecados de que os livra o batismo. Nem lhes impede a salvação o fato de serem os pais infiéis. Pois, como diz Agostinho, escrevendo ao mesmo Bonifácio, as crianças são apresentadas a receberem a graça espiritual, não tanto pelos que os carregam nos braços (embora também por eles, se forem bons fiéis), como por toda a sociedade dos santos e dos fiéis. E temos razão de crer que os apresentam todos aqueles a quem é agradável que sejam oferecidos e por cuja caridade são admitido à comunhão do Espírito Santo. Quanto à infidelidade mesma dos pais, mesmo se depois do batismo dos filhos se esforçarem pelos iniciar no culto dos demônios, ela não prejudica aos filhos. Pois, como diz Agostinho no mesmo lugar, a criança, uma vez gerada por vontade alheia, não pode depois ficar adstrita ao vínculo da alheia iniquidade, a que de nenhum modo deu o consentimento da sua vontade, segundo aquilo da Escritura ­assim como é minha a alma do pai, assim tam­bém o é a da filha, a alma que pecar, essa morrerá. E se a alma contraiu de Adão a mácula de que o pecado há de lavar, é que ela não vivia ainda por si mesma. Ora a fé de um só, antes, de toda a Igreja, aproveita a criança por obra do Espírito Santo, que une a Igreja e comunica o bem de um aos outros.
 
RESPOSTA À TERCEIRA. — Assim como a criança batizada não crê por si mesma, mas por outrem, assim não por si mesma, mas por outrem é interrogada; e os interrogados confessam a fé da Igreja· na pessoa da criança, a qual é a ela incorporada pelo sacramento da fé. Quanto à boa consciência a criança a tem por si mesma, não certo em ato, mas por hábito pela graça justificante.

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