Category: Santo Tomás de Aquino
Em seguida, devemos tratar do sacramento da Eucaristia. E primeiro, do sacramento em si mesmo. Segundo, da sua matéria. Terceiro, da sua forma. Quarto; dos seus efeitos. Quinto, dos que o recebem. Sexto, do seu ministro. Sétimo, do seu rito.
O duodécimo discute-se assim. — Parece que rito deste sacramento não é o que deve ser.
1. — Pois o sacramento do batismo é de maior necessidade que o da confirmação, como se disse. Ora, o batismo se celebra nos tempos determinados da Páscoa e do Pentecostes. Logo, também a este sacramento deve ser prefinado um tempo certo.
2. Demais. — Assim como este sacramento requer a devoção em quem o confere e em quem o recebe, assim também o batismo. Ora, para receber o batismo não é necessário estar em jejum, nem para conferi-lo. Logo, parece que o Concílio Aurelianense não estatuiu acertadamente, que estejam em jejum os que vierem receber a confirmação. E nem o Concílio Meldense: Os bispos não dêem o Espírito Santo, pela imposição das mãos, senão em estado de jejum.
3. Demais. — A crisma é um sinal da plenitude do Espírito Santo, como se disse. Ora, a plenitude do Espírito Santo é dada aos fiéís de Cristo no dia de Pentecostes, como se lê na Escritura. Logo, com maior razão, a crisma deve ser confeccionado e bento, antes, na festa de Pentecostes que na da ceia do Senhor.
Mas em contrário, o uso da Igreja, governada pelo Espírito Santo.
SOLUÇÃO. — Deve-se dizer que o senhor fez a seguinte promessa aos seus fiéis: Onde se acham dois ou três congregados em meu nome, aí estou eu no meio deles. Por isso devemos crer firmemente que as ordenações da Igreja são dirigidas pela sabedoria de Cristo. E por isso, deve ser certo que o rito observado pela Igreja neste e nos outros sacramento é o que deve ser.
DONDE A RESPOSTA À PRIMEIRA OBJEÇÃO. — Como diz Melquiades Papa, este dois sacramentos, unidos, a saber, o batismo e a confirmação, de tal modo estão unidos, que salvo em perigo de morte, não podem ser separados um do outro, e não pode um ser ministrado sem o outro. Por isso, foram prefixados os mesmos tempos para a celebração solene do batismo e da confirmação. Mas, sendo a confirmação conferida só pelos bispos, que nem sempre estão presentes quando os presbíteros batizam, as exigências do uso comum levaram a diferir para tempos diferentes o sacramento da confirmação.
RESPOSTA À SEGUNDA. — Da referida proibição se excetuam os enfermos e os que estão em perigo de morte, como se lê nas atas do Concílio Meldense. Por isso, por causa da multidão dos fiéis e de perigos iminentes, admite-se que a confirmação, que pode ser conferida só pelos bispos, seja recebida e conferida mesmo por quem não estivesse em jejum. Porque um só bispo, sobretudo numa grande diocese, não bastaria para confirmar a todos, se o tempo lhe fosse determinado pelo jejum. Mas quando essa observância puder ser obedecida sem incômodo, é mais conveniente que observem o jejum tanto quem confere como quem recebe o sacramento.
RESPOSTA À TERCEIRA. — Como se determina no concílio de Martinho Papa, em qualquer tempo em lícito confeccionar a crisma. Mas como o batismo solene, que exige o uso da crisma; é celebrado na vigília da Páscoa, ordenou-se acertadamente que dois dias antes o crisma fosse bento pelo bispo, a fim de poder ser distribuído por toda a diocese. - Demais, esse dia é assaz próprio à bênção das matérias sacramentais, em que foi instituído o sacramento da Eucaristia, ao qual se ordenam de certo modo todos os outros sacramentos, como dissemos.
O undécimo discute-se assim. — Parece que nem só o bispo pode conferir este sacramento.
1. — Pois, Gregório, escrevendo o Januário bispo, diz: Chegou ao nosso conhecimento que certos se escandalizaram por termos proibido aos presbíteros ungir com o crisma os neófitos. Ora, nós o fizemos de conformidade com o uso antigo da nossa Igreja. Se houver porem quem demasiado se contriste com isso, permitimos que, na falta do bispo, também os presbíteros possam ungir os batizados com o crisma, mesmo na fronte. Ora, o necessário à validade do sacramento não deve mudar-se, por evitar escândalo. Logo, parece não ser de necessidade para este sacramento, que seja conferido pelo bispo.
2. Demais. — O sacramento do batismo tem maior eficácia que o da confirmação; porque o batismo confere o perdão pleno dos pecados, quanto à culpa e quanto à pena, o que a confirmação não faz. Ora, um simples sacerdote, pelo seu próprio ofício, pode ministrar o sacramento do batismo; e em caso de necessidade qualquer, mesmo um não-ordenado, pode fazê-lo. Logo não é necessário, para a validade deste sacramento, que seja ministrado pelo bispo.
3. Demais. — O vértice da cabeça, onde segundo os médicos se localiza a razão particular, chamada faculdade cognitiva, é mais nobre que a fronte, que é a sede da potência imaginativa. Ora, um simples sacerdote pode ungir os batizados com a crisma, no vértice. Logo, com muito maior razão pode assinalá-los na fronte com o crisma, o que constitui a confirmação.
Mas, em contrário, Eusébio Papa diz: O sacramento da imposição das mãos deve ser tido em grande reverência, pois, não pode ser conferido senão pelos sumos sacerdotes. Nem lemos nem chegou ao nosso conhecimento, que no tempo dos Apóstolos fosse conferido por outros que os próprios Apóstolos; nem pode nunca ser conferido nem deve ser ministrado senão por aqueles que estão no lugar deles. Portanto, se se agir de outro modo, o ato será írrito e nulo, nem será contado nunca entre os sacramentos da igreja. Logo, para ser válido, deve a confirmação, chamada Sacramento da imposição das mãos, ser conferida pelo bispo.
SOLUÇÃO. — A perfeição última de uma obra deve ser reservado à arte ou à virtude superior. Assim, a preparação da matéria pertence aos artífices inferiores; o superior dá a forma; e ao chefe supremo pertence o uso, fim das obras de arte; por isso a carta, escrita pelo notário, é assinalada pelo seu autor. Ora, os fiéis de Cristo constituem uma obra divina, segundo àquilo do Apóstolo: Vós sois edifício de Deus. São também uma como carta escrita com o Espírito de Deus, na expressão do Apóstolo. Ora, o sacramento da confirmação é como a última consumação do sacramento do batismo. Pois, no batismo o homem foi erigido numa como morada espiritual e escrito, como uma carta espiritual; e depois a confirmação, por assim dizer consagra a casa edificada como templo do Espírito Santo, e assim a carta escrita, com o sinal da cruz. Por isto a colação deste sacramento é reservada aos bispos, que têm o poder sumo da Igreja; assim como na primitiva Igreja pela imposição das mãos dos Apóstolos, cujas vezes fazem os bispos, era dada a plenitude do Espírito Santo, como se lê na Escritura. Por isso Urbano Papa (I) diz: Todos os fiéis, pela imposição das mãos dos bispos, devem receber o Espírito Santo, depois do batismo, para que se tornem plenamente cristãos.
DONDE A RESPOSTA À PRIMEIRA OBJEÇÃO. — O Papa tem na Igreja a plenitude do poder, em virtude da qual pode cometer a certos inferiores determinadas faculdades, da alçada de ordens superiores. Assim, a certos presbíteros concede o poder de conferir ordens menores, o que pertence ao poder episcopal. E por essa plenitude de poder S. Gregório Papa concedeu que simples sacerdotes conferissem esse sacramento, até cessar o escândalo.
RESPOSTA À SEGUNDA. — O sacramento do batismo é mais eficaz que a confirmação, quanto à remoção do mal; pois, é uma geração espiritual, e esta implica mudança do não ser para o ser. Mas, o sacramento da confirmação é mais eficaz para fazer-nos progredir no bem; pois, é um crescimento espiritual, do imperfeito para o perfeito. Por isso, este sacramento é cometido a um ministro mais digno.
RESPOSTA À TERCEIRA. — Rábano diz: O batizado é assinalado com a crisma no vértice da cabeça pelo sacerdote, pelo pontífice na fronte, a fim de a primeira unção significar a descida do Espírito Santo a uma morada que deve ser consagrada a Deus; e a segunda, a graça septiforme do mesmo Espírito Santo, descendo ao homem com toda a sua plenitude da santidade, de ciência e de virtude. Logo, essa unção é reservada aos bispos, não por causa da superioridade da parte do corpo que a recebe, mas pela sua maior eficácia.
O décimo discute-se assim. — Parece que o confirmado não deve ser sustido por ninguém ao receber a confirmação.
1. — Pois, este sacramento é conferido não só às crianças, mas também aos adultos. Ora, os adultos podem estar em pé por si mesmos. Logo, é ridículo serem sustidos por outrem.
2. Demais. — Quem já pertence à Igreja tem acesso livre ao príncipe dela, que é o bispo. Ora, este sacramento, como se disse, só é conferido ao batizado, que já é membro da Igreja. Logo, parece que não deve ser conduzido por outrem ao bispo, para receber esse sacramento.
3. Demais. — Este sacramento é conferido para nos dar a robustez espiritualmente. Ora esta é maior no homem que na mulher, segundo aquilo da Escritura: Quem achará uma mulher forte? Logo pelo menos a mulher não deve suster o homem, na confirmação.
Mas, em contrário, Inocêncio Papa diz e está nas Decretais: Se um dos dois cônjuges recebeu ao sair da fonte ou susteve para o crisma uma criança, filho ou filha de outra família, etc. Logo, assim como é necessário que outrem retire o batizado da sagrada fonte, assim é preciso que também alguém sustenha o que vai receber o sacramento da confirmação.
SOLUÇÃO. — Como dissemos, este sacramento é conferido para nos dar a força no combate espiritual. Pois, assim como um recém-nascido precisa de quem o guie na manutenção da vida segundo àquilo do Apóstolo - Na verdade tivemos a nossos pais carnais, que nos corrigiam, e os olhávamos, com respeito - assim também os que devem sustentar o combate precisam de guias que os instruam no pertinente ao modo de combater. Por isso, nas guerras deste mundo constituem-se chefes e centuriões pelos quais os outros são governados. Pela mesma razão também aquele que recebe este sacramento é sustido por outrem, que por assim dizer deverá atingi-lo no combate. - Semelhantemente como este sacramento nos confere a perfeição da idade espiritual, como se disse, por isso quem a ele se achega é sustido, como tendo espiritualmente a fraqueza da criança.
DONDE A RESPOSTA À PRIMEIRA OBJEÇÃO. — Embora o confirmado seja adulto corporalmente, não o é espiritualmente.
RESPOSTA À SEGUNDA. — Embora o batizado se torne membro da Igreja, contudo não está ainda adscrito na milícia cristã. Por isso é conduzido ao bispo, como ao chefe do exército, por outro já adscrito nessa milícia. Pois, não é quem ainda não recebeu a confirmação, que deve acompanhá-lo.
RESPOSTA À TERCEIRA. — Como diz o Apóstolo, em Jesus Cristo não há homem nem mulher. Por isso não importa que seja um homem ou uma mulher quem sustem o confirmando.
O nono discute-se assim. — Parece que não se deve conferir este sacramento na fronte.
1. — Pois, este sacramento é um complemento do batismo, como se disse. Ora, o sacramento do batismo é conferido em todo o corpo. Logo, este não deve ser conferido só na fronte.
2. Demais. — O fim deste sacramento é robustecer-nos espiritualmente, como se disse. Ora, a robustez espiritual reside sobretudo no coração. Logo, este sacramento devia ser conferido antes sobre o coração que na fronte.
3. Demais. — Este sacramento nos é conferido para confessarmos livremente a fé de Cristo. Mas com a boca se faz a confissão para conseguir a salvação, como diz o Apóstolo. Logo, este sacramento deve ser conferido antes ao redor da boca que na fronte.
Mas, em contrário Rabano diz: O batizado é assinalado com crisma no alto da cabeça pelo sacerdote, mas pelo pontífice na fronte.
SOLUÇÃO. — Como dissemos este sacramento nos faz receber o Espírito Santo para nos tornar robustos no combate espiritual, a fim de também confessarmos valorosamente à fé entre os adversários da fé de Cristo. Por onde, convenientemente é assinalado na fronte com a crisma o sinal da cruz, por duas razões. - Primeiro porque, como o soldado é marcado com o sinal do chefe, nós devemos sê-lo com o da cruz, o qual deve ser visível e manifesto. Ora, dentre todos os lugares do corpo humano, a fronte é a mais aparente, que, por assim dizer, nunca se cobre. Por isso o confirmado é ungido na fronte com o crisma a fim de mostrar·se manifestamente cristão; assim como os Apóstolos, depois de terem recebido o Espírito Santo se manifestaram, que antes estavam escondidos no cenáculo. - Segundo, porque duas causas nos impedem de confessarmos livremente o nome de Cristo, a saber, o temor e a vergonha. Ora, essas duas paixões se manifestam particularmente na fronte, por causa da vizinhança da imaginação e porque os espíritos vitais sobem diretamente do coração à fronte. Por isso os envergonhados enrubescem ao passo que os amedrontados empalidecem como diz Aristóteles. Por onde, o confirmado é assinalado na fronte com a crisma para não fugir a confessar o nome de Cristo, nem por temor nem por vergonha.
DONDE A RESPOSTA À PRIMEIRA OBJEÇÃO. — O batismo nos faz renascer para a vida espiritual, que abrange o homem na sua totalidade. Ao passo que a confirmação nos fortalece para o combate, cujo sinal devemos trazer na fronte, como num lugar visível.
RESPOSTA À SEGUNDA. — O principio da fortaleza está no coração, mas o sinal se manifesta na fronte. Por isso, diz a Escritura: Eis - aí te dei eu uma cara mais de aço que as suas caras. Por isso, O sacramento da Eucaristia, que nos firma dentro de nós mesmos, é o sacramento do coração, conforme àquilo da Escritura: O pão alegra o coração do homem. Mas, o sacramento da confirmação requer um sinal de fortaleza, em relação aos outros. Por isso é posto na fronte.
RESPOSTA À TERCEIRA. — Este sacramento é conferido para confessarmos livremente a fé; não porém para confessá-la pura e simplesmente, porque esse é o efeito do batismo. Por isso não devem ser assinalado na boca, mas na fronte, onde se manifestam os sinais das paixões que nos impedem a livre confissão.
O oitavo discute-se assim. — Parece que este sacramento não deve ser conferido a todos.
1. — Pois, este sacramento confere uma certa excelência, como se disse. Ora, o excelente não cabe a todos. Logo não deve a confirmação ser conferida a todos.
2. Demais. — Por este sacramento crescemos espiritualmente para atingir a idade perfeita. Ora, a idade perfeita exclui a idade pueril. Logo, ao menos às crianças não deve ser conferido.
3. Demais. — Como diz Melquíades Papa, depois do batismo somos confirmados, para o combate. Ora, combater não compete às mulheres, pela fraqueza do seu sexo. Logo, também às mulheres não deve a confirmação ser conferida.
4. Demais. — Melquíades Papa diz: Embora aos que vão partir bastem os benefícios da regeneração, aos que devem vencer são necessários os da confirmação. A confirmação arma e instrui os que ficam para os combates e os prélios deste mundo. Quanto ao que, depois do batismo, chegar à morte imaculado e com a inocência batismal, esse é confirmado pela morte pois, já não pode pecar depois da morte. Logo, aos moribundos não se lhes deve conferir a confirmação, que, portanto, não deve ser conferida a todos.
Mas, em contrário, diz a Escritura, que o Espírito Santo, chegando, encheu toda a casa - a que simboliza a Igreja. E depois acrescenta que foram todos cheios do Espírito Santo. Ora, este sacramento é conferido para a consecução dessa plenitude. Logo, deve sê-lo a todos que estão na Igreja:
SOLUÇÃO. — Como dissemos este sacramento nos eleva espiritualmente a idade perfeita. Ora, é da intenção ria natureza, que todos os nascidos corporalmente atinjam a idade perfeita; o que fica às vezes impedido pela corruptibilidade do corpo, prematuramente aniquilado pela morte. Mas, com maior razão, está na intenção de Deus conduzir todos os seres ao termo da sua perfeição, de cuja imitação a natureza participa. Por isso a Escritura diz: As obras de Deus são perfeitas. Ora, a alma, sujeito da natividade espiritual e capaz da perfeição da idade espiritual, é imortal; e assim como é capaz, na idade da velhice, da natividade espiritual, assim também, na da juventude ou da puerícia, pode atingir a idade perfeita, porque essas idades do corpo não prejudicam à alma. Logo, o sacramento da confirmação deve ser conferido a. todos.
DONDE A RESPOSTA À PRIMEIRA OBJEÇÃO. — Este sacramento confere uma certa excelência, não de um homem sôbre outro como o confere o sacramento da ordem, mas de nós sôbre nós mesmos no sentido em que quando adulto, temos excelência sôbre a idade que tínhamos quando eramos criança, o que é uma superioridade de nós sôbre nós mesmos.
RESPOSTA À SEGUNDA. — Como se disse, a idade do corpo não prejudica à da alma. Por isso, mesmo. na idade pueril é possível a consecução da perfeição da idade espiritual, da qual diz a Escritura: A velhice venerável não é a diuturna nem a computada pelo número dos anos. Donde vem que muitos, na idade pueril, fortalecidos pelo Espírito Santo, que receberam, lutaram corajosamente por Cristo até a efusão do sangue.
RESPOSTA À TERCEIRA. — Como diz Crisóstomo, as lutas deste mundo exigem certas qualidades de idade de forma e de nascimento, que as tornam interditas aos escravos, às mulheres, aos velhos e às crianças. Mas nos combates, cujo prêmio é o céu, o estádio está aberto a todos sem distinção de pessoa, nem de idade nem de sexo. E noutro lugar: Perante Deus, mesmo o sexo feminino combate; pois, muitas mulheres combateram o combate espiritual com ânimo viril. Assim, certas, nas lutas do martírio, igualaram os varões, pela força do homem interior; e outras se revelaram ainda mais fortes que eles. E por isso este sacramento deve ser conferido às mulheres.
RESPOSTA À QUARTA. — Como dissemos, a alma, sujeito da idade espiritual, é imortal. Por isso, este sacramento deve ser conferido também aos moribundos, para aparecerem perfeitos na ressurreição, segundo aquilo do Apóstolo: Até que todos cheguemos a estado de varão perfeito, segundo a medida da idade completa de Cristo. Donde o dizer Hugo de S. Victor: Seria muito perigoso o sair alguém desta vida sem a confirmação; não porque houvesse de se condenar, salvo se deixasse de receber esse sacramento por desprezo, mas porque sofreria detrimento na perfeição da glória. Por isso também as crianças mortas confirmadas alcançam uma glória maior, assim como nesta vida, uma graça maior. Por isso também as crianças mortas confirmadas alcançam uma glória maior, assim como nesta vida, uma graça maior. — Quanto à autoridade aduzida, significa que aos moribundos não é necessário este sacramento por causa do perigo do combate presente.
O sétimo discute-se assim. — Parece que este sacramento não confere a graça santificante.
1. — Pois, a graça santificante é um remédio contra a culpa. Ora, este sacramento como dissemos, só é conferido aos batizados, que estão purificados da culpa. Logo, este sacramento não confere a graça santificante.
2. Demais. — Sobretudo os pecadores é que precisam da graça santificante, que só os pode justificar. Se portanto este sacramento confere a graça santificante parece que devia ser dada aos que estão em estado de pecado. O que contudo não é verdade.
3. Demais. — A graça santificante não é susceptível de espécies, pois se ordena a um só efeito. Ora, duas formas da mesma espécie não podem coexistir no mesmo sujeito. Sendo, pois, a graça santificante conferida ao homem pelo batismo, parece que o sacramento da confirmação, conferido só ao batizado, não dá a graça santificante.
Mas, em contrário, Melquíades Papa diz: O Espírito Santo, na fonte batismal, dá a plenitude da inocência; e na confirmação, o aumento da graça.
SOLUÇÃO. — Este sacramento, como se disse, confere ao batizado o Espírito Santo para o robustecer como o foi aos Apóstolos no dia de Pentecostes e como o era aos batizados pela imposição das mãos dos Apóstolos, segundo o refere a Escritura. Ora conforme se mostrou na Primeira Parte, a missão ou a dação do Espírito Santo é acompanhada da graça santificante. Por onde é manifesto que o sacramento da confirmação confere a graça santificante.
DONDE A RESPOSTA À PRIMEIRA OBJEÇÃO. — Pela graça santificante fica perdoada a culpa. Mas também produz outros efeitos, pois basta a nos conduzir, por todos os graus, até a vida eterna. Por isso foi dito a Paulo: Basta-te a minha graça. E o próprio Apóstolo disse: Pela graça de Deus sou o que sou. Por onde, a graça santificante não só produz a remissão da culpa, mas também o aumento e a fortificação da justiça. E assim a confere o sacramento em questão.
RESPOSTA À SEGUNDA. — Como o próprio nome o diz, este sacramento é conferido para confirmar o que já existia. Por isso não deve sê-lo aos que não têm a graça; e portanto, assim como não o é aos não-batizados, também não deve sê-lo aos adultos pecadores, salvo aos que fizeram penitência dos pecados. Por isso no concílio aurelianense se dispõe: Venham à confirmação em jejum e sejam advertidos a se confessarem primeiro a fim de poderem, purificados, receber o dom do Espírito Santo. Assim, este sacramento completa o efeito da penitência, bem como o do batismo; porque, pela graça conferida por ele o penitente conseguirá uma remissão mais plena do pecado. E o adulto em estado de pecado, mas sem disso ter consciência, ou sem contrição perfeita, que receber a confirmação, alcançará a remissão dos pecados pela graça conferida por ela.
RESPOSTA À TERCEIRA. — Como dissemos, a graça sacramental acrescenta à santificante, geralmente considerada, o poder de produzir o efeito especial, a que se ordena o sacramento. Considerada, pois, a graça conferida neste sacramento, no que ela tem de geral, então ele não confere nenhuma outra graça além da conferida pelo batismo, mas aumenta a que já existia. Mas considerada na eficácia especial que é acrescentada, então é de espécie diferente.
O sexto discute-se assim. — Parece que o caráter da confirmação não pressupõe necessàriamente o caráter batismal.
1. — Pois, o sacramento da confirmação se ordena à confissão pública da fé de Cristo. Mas muitos mesmo antes do batismo, confessaram publicamente a fé de Cristo, derramando o sangue pela fé. Logo, o caráter da confirmação não pressupõe o caráter batismal.
2. Demais. — Não se lê dos Apóstolos, que fossem batizados; sobretudo que o Evangelho diz que o Cristo não batizava ele próprio, mas sim os seus discípulos. E contudo, foram depois confirmados pelo advento do Espírito Santo. Logo e semelhantemente, outros podem ser confirmados antes de batizados.
3. Demais. — A Escritura diz: Estando Pedro ainda proferindo estas palavras, desceu o Espírito Santo sobre todos os que ouviam a palavra e os ouviam falar diversas línguas. E depois Pedro mandou batizá-los. Logo, por igual razão, podem os demais ser confirmados antes de batizados.
Mas, em contrário, Rabano diz: Em último lugar, pela imposição das mãos do sumo sacerdote, o batizado recebe o Paráclito, a fim de ser fortificado pelo Espírito Santo, para pregar a fé.
SOLUÇÃO. — O caráter da confirmação necessàriamente supõe o batismal. De modo que o não-batizado que fosse confirmado nada receberia, mas seria necessário de novo receber a confirmação, depois de batizado. E a razão é que a confirmação está para o batismo como o crescimento para a geração, conforme do sobredito resulta. Ora, é manifesto que ninguém pode atingir a idade perfeita antes de nascido. E semelhantemente, quem não for primeiro batizado não pode receber a confirmação.
DONDE A RESPOSTA À PRIMEIRA OBJEÇÃO. — A virtude divina não está adstrita aos sacramentos. E por isso pode nos conferir a força espiritual para confessar publicamente a fé de Cristo sem o sacramento da confirmação; assim como também podemos alcançar a remissão dos pecados sem batismo. Contudo, assim como ninguém alcança o efeito do batismo sem o desejo deste, assim ninguém consegue o efeito da confirmação sem a desejar, o que se pode dar antes da recepção do batismo.
RESPOSTA À SEGUNDA. — Como diz Agostinho, pelo dito do Senhor - Aquele que está lavado não tem necessidade de lavar senão os pés, entendemos que Pedro e os outros discípulos de Cristo foram batizados, quer pelo batismo de João, como alguns pensam, e quer, como é mais crível, pelo batismo de Cristo. Pois, nem recusou o ministério de batizar, a fim de ter servos pelos quais batizasse os outros.
RESPOSTA À TERCEIRA. — Os ouvintes da pregação de Pedro receberam o efeito da confirmação milagrosamente, mas não o sacramento da confirmação. Pois como dissemos, o efeito da confirmação nos pode ser conferido antes do batismo; não porem o sacramento da confirmação. Porque assim como o efeito da confirmação, que é a robustez espiritual, pressupõe o efeito do batismo, que é a justificação, assim o sacramento da confirmação pressupõe o sacramento do batismo.
O quinto discute-se assim. Parece que o sacramento da confirmação não imprime caráter.
1. — Pois, o caráter implica um sinal distintivo. Ora, pelo sacramento da confirmação não se distingue o fiel do infiel, efeito do batismo; nem um fiel dos outros, porque este sacramento se ordena ao combate espiritual imposto a todos os fiéis. Logo, este sacramento não imprime nenhum caráter.
2. Demais. — Acima se disse ser o caráter uma potência espiritual. Ora a potência ou é ativa ou passiva. Mas, a potência ativa, nos sacramentos, é conferida pelo sacramento da ordem; e a passiva ou receptiva, pelo do batismo. Logo, o sacramento da confirmação nenhum caráter imprime.
3. Demais. — A circuncisão, que é um caráter impresso no corpo, não imprime nenhum caráter espiritual. Ora, este sacramento imprime um certo caráter corporal, pois, o confirmando é assinalado pela crisma com o sinal da cruz na fronte. Logo, este sacramento não imprime caráter espiritual.
Mas, em contrário. - Todo sacramento que não pode ser renovado imprime caráter. Ora, este sacramento não pode ser renovado, como o dispõe Gregório: Quanto ao que teria sido de novo confirmado pelo pontífice, essa reiteração deve ser proibida. Logo, a confirmação imprime caráter.
SOLUÇÃO. — Como dissemos, o caráter é um poder espiritual ordenado a certas ações sagradas. Ora, conforme foi dito, assim como o batismo é um renascimento espiritual para a vida cristã, assim também a confirmação é um crescimento espiritual que nos conduz à idade espiritual perfeita. Ora, é manifesto, por semelhança com a vida do corpo, que um é o modo de agir do recém-nascido e outro o do que já atingiu a idade perfeita. Por onde, o sacramento da confirmação nos confere o poder espiritual de fazer certas outras ações sagradas além das que o batismo nos torna possíveis. Pois, no batismo recebemos a faculdade de praticar o que conduz à nossa salvação própria, isto é, o que respeita à nossa vida individual; ao passo que a confirmação nos dá o poder de praticar atos pertinentes ao combate espiritual contra os inimigos da fé. Como o demonstra o exemplo dos Apóstolos, que antes de receberem a plenitude do Espírito Santo, estavam no cenáculo perseverando na oração; depois, porém, quando dele saíram, não temiam confessar publicamente a fé, mesmo perante os inimigos da fé cristã. Por onde é manifesto, que o sacramento da confirmação imprime caráter.
DONDE A RESPOSTA À PRIMEIRA OBJEÇÃO. — O combate espiritual contra os inimigos invisíveis todos devemos combatê-lo. Mas contra os inimigos visíveis, isto é, contra os perseguidores da fé só combatem os confirmados, confessando publicamente o nome de Cristo, pois já atingiram a idade viril espiritual. Tal o diz o Evangelho: Eu vos escrevo, moços, porque sois fortes e porque a palavra de Deus permanece em vós e porque vencestes o maligno. Por onde, o caráter da confirmação é o sinal distintivo não entre infiéis e fiéis, mas entre os espiritualmente provectos e aqueles de quem diz Pedro: Como a meninos recém-nascidos.
RESPOSTA À SEGUNDA. — Todos os sacramentos são umas profissões de fé. Assim, pois, como o batizado recebe o poder espiritual de confessar a fé pela recepção dos outros sacramentos, assim também o confirmado recebe o poder de confessar, como que por dever, pública e verbalmente a fé de Cristo.
RESPOSTA À TERCEIRA. — Aos sacramentos da Lei Velha o Apóstolo lhes chama justiça da carne, por não produzirem nenhum efeito interior. Por isso a circuncisão só imprimia um caráter no corpo, mas não na alma. Ao passo que a confirmação imprime por igual um caráter corpóreo e outro espiritual, por ser sacramento da lei nova.
O quarto discute-se assim. — Parece que esta não é a forma conveniente deste sacramento: Eu te assinalo com o sinal da cruz e te confirmo com o crisma da salvação, em nome do Padre e do Filho e do Espírito Santo, amém.
1. — Pois, o uso dos sacramentos deriva de Cristo e dos Apóstolos. Ora, nem Cristo instituiu essa forma nem lemos na Escritura que dela tivessem usado os Apóstolos. Logo, não é essa a forma conveniente deste sacramento.
2. Demais. — Assim como o sacramento é o mesmo entre todos, assim também a sua forma deve ser a mesma, porque qualquer ser terá a sua unidade, como o seu ser, da sua forma. Ora, da referida forma nem todos usam; pois, certos dizem: Eu te confirmo com a crisma da santificação. Logo, a forma supra não é a conveniente a este sacramento.
3. Demais. — Este sacramento deve conformar-se com o batismo como a perfeição com o perfectível, conforme se disse. Ora, a forma do batismo não faz menção da impressão do caráter, nem também da cruz de Cristo, embora pelo batismo morramos com Cristo, na frase do Apóstolo. Nem tão pouco se faz menção do efeito da salvação, embora o batismo seja necessário para a alcançarmos. E também a forma do batismo implica um ato único e é expressa a pessoa de quem batiza, quando diz: Eu te batizo. Ora, o contrário, aparece na forma supra-referida. Logo, não é a forma conveniente deste sacramento.
Mas, em contrário, a autoridade da Igreja, que usa comumente dessa forma.
SOLUÇÃO. — A referida forma é conveniente a este sacramento. Pois, assim como a forma de um ser físico lhe dá a espécie, assim a do sacramento deve conter tudo o que lhe pertence à espécie. Ora, como do sobredito se colhe, nesse sacramento recebemos o Espírito Santo para nos fortificar na luta espiritual. Por onde, três coisas são necessárias neste sacramento, contidas na referida forma. — A primeira delas é a causa que confere a plenitude da força espiritual, que é a santa Trindade, expressa quando se diz: Em nome do Padre, etc. - A segunda é a própria robustez espiritual, comunica da pelo sacramento de uma matéria visível, em vista da salvação. E é o que indicam as palavras — Eu te confirmo com a crisma da salvação. — A terceira é o sinal dado ao combatente, assim como na pugna corporal os soldados são marcados com as insígnias dos seus chefes. Tal é o significado das palavras: Eu te assinalo com o sinal da cruz, no qual triunfou o nosso Rei, no dizer do Apóstolo.
DONDE A RESPOSTA À PRIMEIRA OBJEÇÃO. — Como dissemos, pelo ministério dos Apóstolos às vezes era conferido o efeito deste sacramento, a saber, a plenitude do Espírito Santo, por certos sinais visíveis milagrosamente produzidos por Deus, que pode conferir os efeitos do sacramento sem conferir o sacramento. E então não era necessária nem a matéria nem a forma deste. - Outras vezes, porém, como ministros dos sacramentos é que conferiam a este. E então assim como da matéria, usavam também da forma dele, por mandado de Cristo. Pois, os Apóstolos, na colação dos sacramentos, observavam muitas cerimônias não outorgadas nas Escrituras comuns a todos. Por isso diz Dionísio: Não é justo os intérpretes das Escrituras tirar ocultamente e trazerem a público quer as invocações eficientes, isto é, as palavras constitutivas dos sacramentos, quer o mistério delas ou as virtudes obradas por Deus mediante elas; mas que o nosso santo ensino as comunique sem pompa, isto é, ocultamente. Por isso o Apóstolo diz, falando da celebração da Eucaristia: No tocante às demais causas, eu as ordenarei quando for.
RESPOSTA À SEGUNDA. — A santidade é a causa da salvação. Por isso vem a dar no mesmo dizer pela crisma da salvação e da santificação.
RESPOSTA À TERCEIRA. — O batismo é o renascer para a vida espiritual, que é a nossa vida individual. Por isso a forma do batismo não inclui senão o ato mesmo conducente à nossa santificação. Ao passo que o sacramento em questão não só se ordena à nossa santificação individual, mas também à luta exterior à qual estamos expostos. Por onde, nele se menciona não sô a santificação interior, quando se diz. Eu te confirmo, com a crisma da salvação, mas também se nos assinala exteriormente como que com o estandarte da cruz, para a luta espiritual externa, e isso significam as palavras. — Eu te assinalo com o sinal da cruz. — Quanto à palavra — batizar, significativo da ablução, podemos por ela compreender tanto a matéria, que é a água da ablução, como o efeito da salvação. O que não inclui a palavra confirmar, e por isso se lhe deviam acrescentar. — Como já dissemos a expressão pronominal — eu — não é de necessidade na forma batismal, pois está incluída no verbo da primeira pessoa. É acrescentada porem para exprimir a intenção. O que não é igualmente necessário na confirmação, conferida só pelos ministros superiores, como a seguir se dirá.