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Category: Santo Tomás de AquinoConteúdo sindicalizado

Art. 3 — Se pode o excomungado ser absolvido de uma excomunhão, sem o ser de todas.

O terceiro discute-se assim. Parece que não pode o excomungado ser absolvido de uma excomunhão, sem o ser de todas.
 
1. Pois, o efeito deve ser proporcionado à causa. Ora, a causa da excomunhão é o pecado. E como ninguém pode ser absolvido de um pecado sem o ser de todos, também não poderá ser de uma excomunhão sem o ser de todas.
 
2. Demais. A absolvição da excomunhão se faz na Igreja. Ora, quem já está sob o peso de uma excomunhão está fora da Igreja. Logo, enquanto uma permanece, não pode ser absolvido de outra.
 
Mas, em contrário. A excomunhão é uma pena. Ora, podemos ficar livres de uma pena, sem o ficarmos de outra. Logo, pode o excomungado ser absolvido de uma excomunhão sem o ser de outra.
 
SOLUÇÃO. As excomunhões não tem entre si nenhuma conexão. Por isso pode o excomungado ser absolvido de uma sem o ser de outra.
 
Mas, nesta matéria, devemos saber que o excomungado às vezes o é por várias excomunhões lança das pelo mesmo juiz. E então, absolvido de uma, entende-se absolvido de todas, salvo determinação em contrário; ou quando o que está sob o peso de várias excomunhões e pede a absolvição de uma só das causas dela. Outras vezes porém é excomungado por várias excomunhões e por vários juízos. E então, o ser absolvido de uma não implica em o ser de outra; salvo se todos os juízes, a pedido do excomungado, confirmarem a absolvição; ou se todos derem ao excomungado uma mesma absolvição.
 
DONDE A RESPOSTA À PRIMEIRA OBJEÇÃO. Todos os pecados são conexos na aversão da vontade, de Deus, com cuja aversão não pode coexistir a remissão dos pecados; por isso um pecado pode ser absolvido sem o outro. Ora, as excomunhões não tem nenhuma conexão dessa natureza. Nem, além disso, a absolvição da excomunhão fica impedida por contrariedade com a vontade. Logo, a objeção não colhe.
 
RESPOSTA À SEGUNDA. Assim como o excomungado estava separado da Igreja por várias causas, assim é possível que essa separação seja removida quanto a uma causa e não quanto a outra.

Art. 2 — Se alguém pode ser absolvido contra a vontade.

O segundo discute-se assim. Parece que ninguém pode ser absolvido contra a vontade.
 
1. Pois, os bens espirituais não se conferem a ninguém contra a vontade. Ora, a absolvição da excomunhão é um benefício espiritual. Logo, a ninguém pode ser dada contra a vontade.
 
2. Demais. A causa da excomunhão é a contumácia. Ora, sobretudo contumaz é quem não quer ser absolvido, por desprezo pela excomunhão. Logo, não pode ser absolvido.
 
Mas, em contrário. A excomunhão pode ser imposta a alguém contra a sua vontade. Ora, o que adquirimos sem cooperação da nossa vontade também podemos perder sem essa cooperação, como o demonstram os bens da fortuna. Logo, pode-se impor a excomunhão a alguém contra a sua vontade.
 
SOLUÇÃO. - O mal da culpa e o da pena diferem em que o princípio da culpa esta em nós, por ser todo pecado voluntário. O princípio da pena porém esta às vezes fora de nós, pois, não é necessário seja a pena voluntária, antes, é da natureza dela ser contra a vontade. Por onde, assim como os pecados não os cometemos senão por vontade, assim a ninguém se lhe perdoam contra a vontade. Mas a excomunhão, assim como pode ser imposta contra a vontade do excomungado, assim também contra a sua vontade pode ser absolvido.
 
DONDE A RESPOSTA À PRIMEIRA OBJEÇÃO. A objeção é verdadeira relativamente aos bens espirituais que dependem da nossa vontade, tais as virtudes que não podemos involuntariamente perder. A ciência porém, embora bem espiritual, podemos perdê-la contra a nossa vontade, p. ex., por uma doença. Logo, a razão aduzida não vem a propósito.
 
RESPOSTA À SEGUNDA. Mesmo ao contumaz se lhe pode discreta e justamente levantar a excomunhão, se se vir que isso lhe convém à salvação, pois para seu remédio é que lhe foi ela lançada.
 

Art. 1 — Se qualquer sacerdote pode absolver o seu súdito da excomunhão.

O primeiro discute-se assim. Parece que qualquer sacerdote pode absolver o seu súdito da excomunhão.
 
1. Pois, mais forte é o vínculo do pecado que o da excomunhão. Ora, qualquer sacerdote pode absolver o seu súdito do pecado. Logo, com muito maior razão, da excomunhão.
 
2. Demais. Desaparecida a causa desaparece o efeito. Ora, a causa de excomunhão é o pecado mortal. Logo, como qualquer sacerdote possa absolver desse pecado mortal, poderá também absolver da excomunhão. Mas, em contrário. Quem pode excomungar também pode absolver o excomungado. Ora, os sacerdotes inferiores não podem excomungar os seus súditos. Logo, nem absolver.
 
SOLUÇÃO. De uma excomunhão menor pode absolver quem o pode da participação no pecado. Mas se a excomunhão for maior ou terá sido proferida pelo juiz, e então quem a aplicou, ou o seu superior, também poderá absolver dera; ou terá sido aplicada por direito, e então o bispo ou mesmo um sacerdote pode absolver, exceto seis casos que o autor do direito, isto é, o Papa, reservou a si. O primeiro é o de lançar mãos sobre um clérigo ou um religioso; o segundo, o do que foi denunciado por ter incendiado uma igreja;o terceiro, o denunciado de ter arrombado uma Igreja; quarto, o de quem comunica in divinis cientemente, com quem foi nominalmente excomungado pelo Papa; o quinto, o de quem falsifica as cartas da Sé Apostólica; o sexto, o de quem comunica com o crime do excomungado. Pois, não deve ser absolvido senão por quem excomungou, mesmo se não for seu súdito; salvo se, por dificuldade de ir ter com ele, o excomungado fosse absolvido pelo bispo, pelo seu sacerdote próprio, feito contudo o juramento, que obedecerá à ordem do juiz que proferiu a sentença.
 
No primeiro caso porém há oito exceções. A primeira, se é artigo de morte, quando de qualquer excomunhão pode o excomungado ser absolvido por qualquer sacerdote; a segunda, quanto se trata de porteiro de pessoa poderosa e que agrediu o clérigo ou sacerdote, mas não por ódio nem intencionalmente; a terceira, se quem o fez foi uma mulher; a quarta, se um escravo, cuja ausência, sem culpa sua, prejudicou o seu dono a quinta, se um regular agride outro, se não houver excesso no ato de violência; a sexta, se o culpado é um pobre; a sétima, se um impúbere, um velho ou um valetudinário; a oitava, se houver inimizade capital entre o agressor e a vítima.
 
Há também outros sete casos, em que quem agredir um clérigo não incorre em excomunhão. Primeiro se, por causa de disciplina, como mestre ou prelado, é que o fez; segundo, por jocosa leviandade; terceiro pelo ter apanhado praticando uma turpitude com a esposa, a mãe, a irmã ou a filha; quarto, se repelir imediatamente a força com a força; quinto, se ignorar que é clérigo; sexto, se o encontrar em estado de apostasia, depois da terceira advertência; sétimo se transferir-se o clérigo a uma situação que lhe é absolutamente contrária, como se se fizer soldado, ou cair em bigamia.
 
DONDE A RESPOSTA À PRIMEIRA OBJEÇÃO. Embora o vínculo do pecado seja, absolutamente falando, mais forte que o da excomunhão, contudo de certo modo o da excomunhão é mais forte, porque não somente obriga perante a Deus mas também perante a Igreja. Por Isso, para absolver da excomunhão é necessária a jurisdição no foro externo; não porém para a absolvição do pecado; nem se exige a garantia do juramento, como se exige para a absolvição da excomunhão, pois, o juramento faz desaparecer as dúvidas existentes entre os homens, segundo o Apóstolo,
 
RESPOSTA À SEGUNDA. Como o excomungado não participa dos sacramentos da Igreja, o sacerdote não no pode absolver da culpa, se não for este, primeiro, absolvido da excomunhão.

Questão 24: Da absolvição da excomunhão.

 

Em seguida devemos tratar da absolvição da excomunhão.
 

E nesta questão discutem-se três artigos:

 

Art. 3 — Se comunicar com o excomungado, nos casos não permitidos, é pecado mortal.

O terceiro discute-se assim. Parece que comunicar com o excomungado, nos casos não permitidos, é sempre pecado mortal.
 
1. Pois, uma decretal determina, que por medo da morte não deve ninguém comunicar com o excomungado, porque devemos antes sofrer a morte, que pecar mortalmente. Ora, esta razão seria nula, se não fosse sempre pecado mortal comunicar com o excomungado. Logo, etc.
 
2. Demais. Proceder contra o preceito da Igreja é pecado mortal. Ora, a Igreja ordena que ninguém comunique com um excomungado. Logo, comunicar com um excomungado é pecado mortal.
 
3. Demais. Ninguém é privado de receber a Eucaristia por motivo de pecado venial. Ora, quem comunica com o excomungado em casos não permitidos fica privado de receber a Eucaristia, porque incorre na pena de excomunhão menor. Logo, quem comunica com o excomungado em casos não permitidos peca mortalmente.
 
4. Demais. Ninguém deve ser excomungado por excomunhão maior senão por pecado mortal. Ora, segundo o direito, pode um ser excomungado com excomunhão maior por ter comunicado com o excomungado. Logo, comunicar com o excomungado é pecado mortal.
 
Mas, em contrário. Do pecado mortal ninguém pode absolver, salvo quem tiver jurisdição. Ora, qualquer sacerdote pode absolver da comunicação com o excomungado. Logo, não é pecado mortal.
 
2. Demais. A intensidade da pena é proporcional ao pecado. Ora, por comunicação com o excomungado, o costume comum não comina a pena devida ao pecado mortal, mas antes, a devida ao pecado venial. Logo, não é pecado mortal.
 
SOLUÇÃO. Certos dizem, que sempre que comunicamos com o excomungado por palavras ou por qualquer modo, por que não é lícito com ele comunicar, pecamos mortalmente, exceto nos casos excetuados pelo direito. Mas, como é demasiado rigoroso que pequemos mortalmente por uma única ligeira palavra que trocamos com o excomungado; e que os que excomungam enredariam a muitos nos laços da condenação, o que contra os primeiros redundaria, por isso, outros acham mais provável que nem sempre pecaremos mortalmente, mas só se participarmos do crime do excomungado, quer in divinis, quer no desprezo da Igreja.
 
DONDE A RESPOSTA À PRIMEIRA OBJEÇÃO. Essa decretal se refere à comunicação in divinis. Ou devemos responder que o pecado mortal e o venial tem isto de comum, que nem aquele nem este podem ser ações boas. Por onde, como devemos antes preferir a morte, que pecar mortalmente, assim também devemos preferi-la ao pecado venial, do modo pelo qual estamos obrigados a nos abster desse pecado.
 
RESPOSTA À SEGUNDA. O preceito da Igreja visa diretamente os bens espirituais e, por consequência, todo ato legítimo. Por isso, quem comunica com o excomungado in divinis, vai contra o preceito; quem com eles comunicar em outras matérias procede contra o preceito e peca venialmente.
 
RESPOSTA À TERCEIRA. Pode alguém, mesmo sem nenhuma culpa, ser às vezes privado da Eucaristia, como se dá com os suspensos ou os interditos; porque essas penas são aplicadas às vezes a um, por culpa de outro, que fica assim por elas punido.
 
RESPOSTA À QUARTA. Embora comunicar com um excomungado seja pecado venial, contudo, comunicar com ele pertinazmente é pecado mortal. Por isso pode um ser excomungado, segundo o direito.

Art. 2 — Se quem comunica com o excomungado fica excomungado.

O segundo discute-se assim. Parece que quem comunica com o excomungado não fica excomungado.
 
1 Pois, mais separado da Igreja está o gentio que o excomungado. Ora, quem comunica com o gentio ou com o judeu não fica excomungado. Logo, nem aquele que comunica com um excomungado cristão.
 
2. Demais. Quem comunica com um excomungado fica excomungado; pela mesma razão também o ficará quem comunica com quem com ele comunica, e assim ao Infinito. O que é absurdo. Logo, não fica excomungado quem comunica com ele.
 
Mas, em contrário, o excomungado está posto fora da comunhão. Logo, quem com ele comunica se afasta da comunhão da Igreja. E assim, considerar-se-á excomungado.
 
SOLUÇÃO. A excomunhão pode ser proferida contra alguém de dois modos. Ou de modo que fique excomungado juntamente com quem com ele comunicar. E então não há dúvida que quem comunicar com o excomungado incorrerá na pena de excomunhão maior. Ou o excomungado o é pura e simplesmente. E então quem lhe participar do crime, dando-lhe conselho, auxílio ou favor, incorrerá também na pena de excomunhão maior. E quem comunicar com ele, em outras causas, falando-lhe, saudando-o ou sentando-se à mesma mesa incorrerá na penalidade de excomunhão menor.
 
DONDE A RESPOSTA À PRIMEIRA OBJEÇÃO. A Igreja não pretende corrigir os infiéis como o faz aos seus fiéis, cujo governo lhe incumbe. Por isso não separa da comunhão dos infiéis, como o faz em relação à comunhão dos fiéis, aqueles que excomunga, s0bre os quais exerce o seu poder.
 
RESPOSTA À SEGUNDA. É lícito comunicar com o excomungado por excomunhão menor. Assim, a excomunhão não atinge terceira pessoa.

Art. 1 — Se é lícito comunicar com o excomungado, por necessidades puramente temporais.

O primeiro discute-se assim. Parece lícito comunicar com o excomungado por necessidades puramente temporais.
 
1. Pois, a excomunhão é um ato do poder das chaves. Ora, o poder das chaves se estende só à ordem espiritual. Logo, pela excomunhão não fica um proibido de comunicar com outro na ordem corporal.
 
2. Demais. O que foi instituído em vista da caridade não pode se lhe opor a ela. Ora, por um preceito de caridade estamos obrigados a socorrer os nossos inimigos, o que não é possível sem comunicação. Logo, é lícito comunicar com o excomungado nas suas necessidades corporais.
 
Mas, em contrário, o Apóstolo: Com esse tal nem comer deveis.
 
SOLUÇÃO. Há uma dupla excomunhão. A menor, que priva só da participação dos sacramentos, mas não da comunhão dos fiéis. E por isso com um tal excomungado é lícito comunicar, mas não é lícito conferir-lhe os sacramentos. Outra é a excomunhão maior; e essa priva o excomungado dos sacramentos da Igreja e da comunhão dos fiéis. Por onde, com o excomungado por tal excomunhão não é lícito comunicar. Mas como a Igreja recorre à excomunhão para curar os seus filhos e não para os perder, por isso excetuam-se dessa regra geral certas coisas, as relativas à salvação nas quais é lícito comunicar com o excomungado. Porque, no tocante a elas, podemos licitamente comunicar com ele, e mesmo trocar palavras em matéria diversa, de modo que mais facilmente, pela familiaridade, venha a receber a doutrina da salvação.
 
Excetuam-se também certas pessoas, às quais incumbe especialmente prover às necessidades do excomungado a saber: a esposa, o filho, o escravo, o empregado rural e o servo. Mas isto se entende, dos filhos não emancipados; do contrário, ficariam obrigados a evitar a sociedade do próprio pai. Dos outros, se entende que é lícito comunicar com o excomungado, se antes da excomunhão lhe estavam sujeitos, mas não se depois. Certos porém, entendem de maneira inversa, a, saber, que os superiores podem licitamente comunicar com os inferiores, mas outros pensam em sentido contrário. Mas pelo menos devem comunicar com eles em matéria a que estão obrigados; pois, assim como os inferiores estão obrigados ao serviço dos superiores, assim estes a providenciar sobre as necessidades daqueles.
 
Há ainda outros casos excetuados: Assim, quando se ignora a excomunhão; e quando se é estrangeiro ou viajante na terra dos excomungados, podendo-se então licitamente comprar, deles ou receber-lhes esmola. E do mesmo modo se vimos o excomungado em necessidade; porque então, por um preceito de caridade estamos obrigados a socorrê-lo. Coisas todas expressas neste versículo:
 
Utilidade, lei, humildade, causa ignorada, necessidade. A utilidade concerne às palavras de salvação: a lei, ao matrimônio; a humildade, à sujeição. O resto é claro.
 
DONDE A RESPOSTA À PRIMEIRA OBJEÇÃO. As coisas corporais se ordenam às espirituais. Por onde, o poder concernente à ordem espiritual, pode abranger também a ordem temporal; assim a arte que visa o fim ordena o que concerne os meios.
 
RESPOSTA À SEGUNDA. No caso em que por preceito de caridade estamos obrigados a comunicar com o excomungado, não ficamos proibidos de o fazer, como do sobredito se colhe.

Questão 23: Da comunicação com os excomungados.

Em seguida devemos tratar da comunicação com os excomungados.
 
E nesta questão discutem-se três artigos:

Art. 2 — Se as águas estão sobre o firmamento.

O segundo discute-se assim. — Parece que as águas não estão sobre o firmamento.
 
1. — Pois, a água é naturalmente pesada. Ora, o lugar mais próprio dos graves não é o superior, mas o inferior. Logo, as águas não estão sobre o firmamento.
 
2. Demais. — A água é naturalmente fluida. Ora, o fluido não pode se manter sobre um corpo redondo, como a experiência o mostra. Logo, sendo o firmamento um corpo redondo, a água não pode estar sobre ele.
 
3. Demais. — A água, sendo elemento, se ordena à geração do corpo misto, assim como o imperfeito se ordena ao perfeito. Ora, não é sobre o firmamento o lugar da mistão, mas sobre a terra. Logo, seria vão estar a água sobre o firmamento. Mas, como nada é vão nas obras de Deus, as águas aí não estão.
 
Mas, em contrário, diz a Escritura que dividiu as águas que estavam por baixo do firmamento das que estavam por cima do firmamento.
 
Solução. — Como diz Agostinho, maior é a autoridade desta Escritura do que a capacidade de todo o engenho humano. Donde, de nenhum modo duvidamos que aí estejam as águas, de qualquer maneira que seja e quaisquer que elas sejam. — Mas, quais sejam essas águas, todos não o explicam do mesmo modo. — Assim, Orígines diz que as águas que estão sobre os céus são substâncias espirituais. Por onde, diz a Escritura: Águas que estão sobre os céus louvem o nome do Senhor; e: Águas que estais por cima dos céus bendizei todas ao Senhor. — Mas, a isto responde Basílio, que tal não se diz porque sejam as águas criaturas racionais, mas significa que a consideração delas, contemplada prudentemente pelos que têm senso, completa a glorificação do Criador. Por onde, no mesmo lugar o mesmo se diz do fogo, da saraiva e de coisas semelhantes; coisas todas, sabemos, que não são criaturas racionais.
 
Logo, deve-se dizer, que se trata de águas materiais. Mas quais sejam, é mister defini-las diversamente, segundo as várias opiniões sobre o firmamento. — Se, pois, por firmamento se entende o céu sidéreo, que se admite ter a natureza dos quatro elementos, também as águas, que estão sobre os céus, poderão ser consideradas da mesma natureza que as águas elementais. — Se, porém, por firmamento se entende o céu sidéreo, que não tem a natureza dos quatro elementos, então, também essas águas, que estão sobre ele, não serão da natureza das águas elementais.
 
Mas, assim como, segundo Estrabo, o céu empíreo, isto é, ígneo, é assim chamado por causa do seu esplendor; assim também será chamado o outro céu, que está acima do sidéreo, aquoso, por causa da diafaneidade.
 
Posto, pois, que o firmamento é de outra natureza, que não a dos quatro elementos, ainda se pode dizer que ele divide as águas entendendo-se por água, não o elemento desse nome, mas a matéria informe dos corpos; pois então, como diz Agostinho, tudo o que está entre os corpos divide águas de águas.
 
Se porém, por firmamento se entende a parte do ar na qual as nuvens se condensam, então as águas que sobre ele estão são águas que, resolvidas pela evaporação, elevam-se sobre uma parte do ar, gerando-se delas as chuvas. Mas, admitir que as águas resolvidas pela evaporação, elevam-se acima do céu sidéreo, como alguns disseram e a cuja opinião alude Agostinho, é de todo impossível. Quer por causa da solidez do céu; ou da região média ígnea, que consumiria tais vapores; ou porque o lugar, para onde são levados os corpos leves e rarefeitos está abaixo do côncavo do orbe da luz; ou também porque, sensivelmente, é visível que os vapores não se elevam até os cumes de certos montes. E o que dizem da rarefação do corpo, até o infinito, por ser divisível até o infinito, é vão. Pois, o corpo natural não se divide nem se rarifica até o infinito, senão só até um certo limite.
 
Donde a resposta à primeira objeção. — Parece a alguns que se resolveria essa objeção, pelo fato de as águas, embora naturalmente graves, estarem contudo contidas sobre os céus, por virtude divina. — Mas essa solução Agostinho a exclui, dizendo que agora nos importa indagar como Deus instituiu as naturezas das causas; e não o que nelas quis obrar, para manifestação do seu poder. — Por onde, deve-se dizer, de outro modo, que, a solução resulta do que acabamos de dizer, segundo as duas últimas opiniões, sobre as águas e o firmamento. Assim, conforme a primeira opinião, é necessário estabelecer para os elementos uma ordem diferente da de Aristóteles; de modo que certas águas espessas estejam ao redor da terra, e outras tênues ao redor do céu; e que aquelas estejam para o céu como estas para a terra. Ou que, pela água se entenda a matéria dos corpos, como foi dito.
 
Resposta à segunda. — Resulta clara a resposta à segunda objeção das duas últimas opiniões. Assim, conforme a primeira, responde Basílio de dois modos. De um, dizendo não ser necessário que tudo o que aparece como redondo, na concavidade, seja também redondo ou convexo na parte superior. De outro, que as águas que estão sobre os céus não são fluidas, mas firmadas, fora do céu, por uma como solidez glacial. Por isso é chamado esse céu por alguns, céu cristalino.
 
Resposta à terceira. — Segundo a terceira opinião, as águas estão sobre o firmamento, elevadas por evaporação, por causa da utilidade das chuvas. Porém, conforme a segunda opinião, o firmamento sobre o qual estão as águas é o céu totalmente diáfano, sem estrelas; este céu, o consideram como o primeiro móvel, motor de todo o céu pelo movimento diurno, cujo movimento opera a continuidade da geração, assim como o céu em que estão os astros opera, pelo movimento zodiacal, a diversidade da geração e da corrupção, pelo acesso e recesso, e pelas diversas virtudes das estrelas. Porém, segundo a primeira opinião, as águas aí estão, conforme Basílio, para temperar o calor dos corpos celestes. E como sinal disso, alguns admitiram, conforme diz Agostinho, que a estrela de Saturno é frigidíssima por causa da vizinhança das águas superiores.

Art. 6 — Se quem já foi excomungado uma vez pode sê-lo de novo.

O sexto discute-se assim. Parece que quem já foi excomungado uma vez não pode sê-lo de novo.
 
1. Pois, pergunta o Apóstolo: Que me vai a mim julgar de aqueles que estão fora? Ora, os excomungados estão fora da Igreja. Logo, sobre eles já a Igreja não tem que formar nenhum juízo, de modo a poder de novo excomungá-las.
 
2. Demais. A excomunhão é uma separação da vida da Igreja e da comunhão dos fiéis. Ora, quem já foi privado de uma coisa não pode tornar a sê-la. Logo, um excomungado não pode sê-lo de novo.
 
Mas, em contrário. A excomunhão é uma pena e é um remédio curativo. Ora, todas as penas e remédios são renovados quando as circunstâncias o exigem. Logo, a excomunhão pode ser renovada.
 
SOLUÇÃO. Quem já sofreu uma excomunhão pode ser excomungado de novo, quer pela reiteração da mesma excomunhão, para mais confundir-se o excomungado e assim ser levado a afastar-se do pecado; ou por outras causas. E assim são tantas as excomunhões principais quantas as causas por que alguém é excomungado.
 
DONDE A RESPOSTA À PRIMEIRA OBJEÇÃO. O apóstolo se refere aos pagãos e aos outros infiéis, que não receberam o caráter que os torne membros do povo de Deus. Mas, como o caráter batismal, que torna cada um membro do povo de Deus, é indelével, por isso o batizado sempre pertence de certo modo à Igreja. E assim, a Igreja sempre tem o poder de o julgar.
 
RESPOSTA À SEGUNDA. Embora a privação não seja em si mesma susceptível de mais nem de menos, é o porém na sua causa. E assim, a excomunhão pode ser renovada. E mais afastado está dos sufrágios da Igreja quem foi várias vezes excomungado, que quem só uma vez o foi.

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