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Category: Santo Tomás de AquinoConteúdo sindicalizado

O Sacramento da Penitência

Em seguida devemos tratar do sacramento da penitência.
 
Sobre o que devemos tratar primeiro, da penitência em si mesma. Segundo, do seu efeito. Terceiro, das suas partes. Quarto, dos Que re­cebem este sacramento. Quinto, do poder dos ministros. Sexto, da solenidade deste sacra­mento. No primeiro ponto há duas questões a se considerarem. Primeiro, da penitência enquanto sacramento. Segundo, da penitência enquanto virtude.

Art. 1 — Se a informidade da matéria precedeu, no tempo, à formação da mesma.

O primeiro discute-se assim. — Parece que a informidade da matéria precedeu, no tempo, à formação da mesma.
 
1. — Pois, diz a Escritura: A terra, porém, estava informe e vazia, ou, invisível e descomposta, segundo outra letra; pelo que se designa a informidade da matéria, conforme Agostinho. Logo, houve um tempo em que a matéria, antes de ser formada, foi informe.
 
2. Demais. — O operar da natureza imita o de Deus, assim como a causa segunda imita a primeira. Ora, na operação da natureza, a informidade precede, no tempo, à formação. Logo, também na de Deus.
 
3. Demais. — Como parte da substância, a matéria tem preponderância sobre o acidente. Ora, Deus pode fazer existir o acidente sem o sujeito, como se vê no Sacramento do Altar. Logo, podia ter feito a matéria existir sem a forma.
 
Mas, em contrário. A imperfeição do efeito atesta a do agente. Ora, Deus é agente perfeitíssimo, pelo que dele se diz: As obras de Deus são perfeitas. Logo, a obra por ele criada nunca foi informe.
 
Demais. — a formação da criatura corporal foi realizada pela obra da distinção. Ora, à esta se opõe a confusão como, à formação, a informidade. Se, pois, a informidade precedeu no tempo à formação da matéria, segue-se que, no princípio, houve a confusão, na criatura corporal, a qual os antigos chamavam Caos.
 
Solução. — Neste assunto diversas são as opiniões dos Santos Padres. Agostinho pretende que a informidade da matéria corporal não precedeu, no tempo, mas só pela origem ou pela ordem da natureza, à formação da mesma. Outros porém, como Basílio, Ambrósio e Crisóstomo, opinam que a informidade precedeu, no tempo, à formação. E embora essas opiniões pareçam contrárias, contudo pouco entre si diferem. Pois, Agostinho compreende a informidade da matéria diferentemente dos outros.
 
Para ele, essa informidade significa carência de qualquer forma; sendo, portanto, impossível dizer-se que tal informidade precedeu, no tempo, quer à formação, quer à distinção da matéria. O que é manifesto, quanto à formação; pois, se precedeu, na duração, a matéria informe já era atual, porque a duração, sendo termo da criação, importa o ato e este, em si mesmo, é forma. Dizer, portanto, que a matéria precedeu, sem forma, é idêntico a dizer que o ser atual não o é, o que implica contradição. Nem mesmo se pode dizer que tinha alguma forma comum, sobrevindo-lhe, depois, formas diversas, pelas quais se tornou distinta. Pois, tal opinião seria idêntica à dos antigos físicos, que ensinavam ser a matéria prima algum corpo em ato, como o fogo, o ar, a água ou um corpo médio. Donde resultaria que o vir-a-ser não seria senão o alterar-se. Porque essa forma precedente, dando o ser atual, no gênero da substância, e tornando o ser tal e não tal outro, resultaria que a forma superveniente não causaria simplesmente o ser atual, mas um ser atual, o que é próprio à forma acidental; e portanto, as formas seguintes seriam acidentes, em relação aos quais não há geração, mas alteração. Portanto, deve-se dizer que a matéria prima nem foi criada completamente sem forma, nem com forma comum, senão com formas distintas. Por onde, se a informidade da matéria, se refere à condição da matéria prima, que, de si mesma, nenhuma forma tem, tal informidade não precedeu à formação ou à distinção da mesma, no tempo, como diz Agostinho; senão somente pela origem ou pela natureza, do modo pelo qual a potência é anterior ao ato e a parte, ao todo.
 
Outros Santos Padres, porém, compreendem a informidade como exclusiva, não de qualquer forma, mas só da formosura e da beleza que, atualmente, se manifesta na criatura corpórea. E, assim, sentem que tal informidade da matéria corporal precedeu, pela duração, à formação da mesma. Por onde, neste sentido, Agostinho concorda com eles, em parte, e, em parte, discorda, como a seguir se virá.
 
Quanto à expressão do Gênesis, ela pode significar que, faltando-lhe uma tríplice formosura, por isso informe era chamada a criatura corporal. Assim, faltando ao corpo diáfano total, chamado céu, a beleza da luz, por isso se diz que as trevas cobriam a face do abismo. Faltava também, à terra, dupla beleza. Uma, a que tem por estar descoberta das águas e, por isso, se diz que a terra estava informe ou invisível; pois, o seu aspecto corporal não podia aparecer, por causa das águas que de todos os lados a cobriam. Outra, a que tem, por estar ornada de ervas e plantas, dizendo-se, por isso, que era vazia ou descomposta, i. é., não ornada, segundo diferente lição. E assim, tendo preestabelecido duas naturezas criadas, o céu e a terra, exprimiu a informidade do céu dizendo: as trevas cobriam a face do abismo, incluindo no céu também o ar; e a informidade da terra, dizendo: A terra estava informe e vazia.
 
Donde a resposta à primeira objeção. — Terra, aqui, é tomada em sentidos diferentes por Agostinho e pelos outros Santos Padres. Conforme Agostinho, pelos nomes terra e água, deve se entender neste passo a matéria prima em si mesma. Porque Moisés não podia dar a compreender a matéria prima a um povo rude, a não ser por semelhança com coisas desse povo conhecidas. Por isso, exprimiu-a sob multíplice semelhança, não a denominando somente água, ou somente terra, para não parecer que, na verdade das coisas, a matéria prima fosse a terra ou a água. Se bem tenha semelhança com a terra, como fundamento que é das formas; e com a água, como apta a ser informada por diversas formas. Assim, neste sentido, é chamada a terra informe e vazia, ou invisível e descomposta, pois a matéria é conhecida pela forma. Por onde, em si mesma considerada, é chamada invisível, ou vazia, completando-se a sua potência pela forma. Por isso também Platão chamou à matéria lugar. — Outros Santos Padres porém, entendem por terra o elemento mesmo da terra, e a opinião deles sobre a sua informidade, já a referimos.
 
Resposta à segunda. — A natureza produz o efeito atual, do ser em potência; sendo, portanto, necessário que, na sua operação, a potência preceda ao ato, no tempo; assim como a informidade, à formação. Mas Deus produz do nada o ser atual; e, portanto pode produzir imediatamente um ser perfeito, pela magnitude do seu poder.
 
Resposta à terceira. — O acidente, sendo forma, é um certo ato; porém a matéria, em si mesma, é ser em potência. Por onde, mais repugna à matéria existir em ato, sem a forma, do que ao acidente sem o sujeito.
 
Resposta à primeira objeção em contrário. — Se, segundo outros Santos Padres a informidade precedeu, no tempo, à formação da matéria, isso não foi por impotência de Deus, mas pela sua sapiência, para que se conservasse a ordem na condição das coisas, de modo a que fossem levadas do imperfeito ao perfeito.
 
Resposta à segunda. — Alguns físicos antigos ensinavam a confusão, exclusiva de toda distinção, salvo Anaxágoras que admitia somente o intelecto como distinto e sem imisção. Mas, antes da obra da distinção, a Escritura Sagrada coloca múltiplas distinções. — Assim, primeiro, a do céu e da terra, na qual também se mostra a distinção quanto à matéria, como a seguir se verá; e tudo isto, quando diz: No princípio criou Deus o céu e a terra. — Segundo, a distinção dos elementos, quanto às suas formas, nomeando a terra e a água, sem nomear o ar e o fogo, por não ser claro aos rudes, aos quais Moisés falava, que tais seres são corpos, como manifestamente o são a terra e a água. Embora Platão (no Timeu) entendesse, pelo ar, o espírito do Senhor, porque o ar também se chama espírito, e, pelo fogo, o céu, porque dizia ser este de natureza ígnea, como refere Agostinho. Mas Rabbi Moisés, concordando em outros pontos com Platão, diz que o fogo é expresso pelas trevas; pois, como afirma, o fogo não luz na esfera própria. Porém, parece mais conveniente o que já antes ficou dito, a saber, que, na Escritura, Espírito do Senhor costuma ser tomado pelo Espírito Santo, do qual se diz que é conduzido na superfície das águas, não corporalmente, mas do mesmo modo que a vontade do artífice é conduzida na superfície da matéria a que quer dar forma. — A terceira distinção é expressa em relação à situação, porque a terra estava debaixo das águas, que a tornavam invisível; e quanto ao ar, sujeito das trevas, dele se afirma que estava sobre as águas, quando se diz as trevas cobriam a face do abismo. E o que restava a distinguir, pelo que se segue se verá.

Questão 66: Da ordem da criação quanto à distinção.

Em seguida, devemos tratar da obra da distinção.
 
E, primeiro, da ordem da criação, quanto à distinção. Segundo, da distinção em si mesma.

Art. 6 — Se se pode obviar suficientemente às deficiências ocorrentes. na celebração deste sacramento, observando-se às determinações da Igreja.

O sexto discute-se assim. — Parece que não se pode obviar suficientemente às deficiências ocorrentes na celebração deste sacramento, observando-se as determinações da Igreja.
 
1. — Pois. pode acontecer que o sacerdote, antes ou depois da consagração, morra, fique alienado ou impedido por qualquer outra doença de receber o sacramento e acabar a missa. Logo, não poderá cumprir a determinação da Igreja, que ordena ao sacerdote participar do seu sacri­fício, depois de haver consagrado.
 
2. Demais. — Pode acontecer que o sacer­dote, antes ou depois da consagração se lem­bre de ter comido ou bebido ou de estar em estado de pecado mortal, ou excomungado, do que antes não se lembrava. Logo e necessaria­mente, quem está nessa situação, peca mortal­mente agindo contra o estatuído pela Igreja, quer receba quer não receba o sacramento.
 
3. Demais. — Pode acontecer que, depois da consagração, caia no cálice uma mosca, uma aranha ou um animal venenoso. Ou ainda que o sacerdote tenha conhecimento de ter sido posto veneno no cálice por algum malévolo, para matá-lo. Em cujo caso recebendo o sacramen­to, pecará mortalmente suicidando-se ou tentan­do a Deus. Semelhantemente se não o receber, peca agindo contra o estatuído pela Igreja. E assim ficará perplexo e sujeito à necessidade de pecar. O que é inadmissível.
 
4. Demais. — Pode acontecer por negligên­cia do ministro, que não foi posta água no cálice ou nem vinho, e o sacerdote o descobre. Logo, também neste caso ficará perplexo: quer toman­do o corpo sem o sangue, caso em que fará um sacrifício imperfeito; quer não tomando nem o corpo nem o sangue.
 
5. Demais. — Pode acontecer que o sacer­dote não se lembre de ter pronunciado as pala­vras da consagração ou ainda outras que são ditas na celebração deste sacramento. Logo, neste caso pecará, quer reiterando as palavras sobre a mesma matéria, as quais talvez já pronunciasse; quer usando do pão e do vinho não consagrados, como se o tivessem sido.
 
6. Demais. — Pode acontecer, por causa do frio, que o sacerdote deixe cair à hóstia no cálice, quer antes, quer depois da fração. Neste caso não poderá observar o rito da Igreja quan­to à fração, ou a disposição que só a terça parte dela deve ser posta no cálice.
 
7. Demais. — Pode acontecer, por negligên­cia do sacerdote, que o sangue de Cristo se derrame; ou ainda que vomite o sacramento toma­do; ou também que as hóstias conservadas o sejam a ponto de putrefazerem-se; ou mesmo, que sejam roídas pelos ratos; ou enfim, perdi­das de qualquer maneira. Em cujos casos não poderá prestar a este sacramento a reverência devida, segundo o estatuído pela Igreja. Logo, parece que a tais deficiências ou perigos não pode o sacerdote obviar, observando-se as deter­minações da Igreja.
 
Mas, em contrário, como Deus, também a Igreja nada manda de impossível.
 
SOLUÇÃO. — Aos perigos ou deficiências ocor­rentes com este sacramento pode o sacerdote obviar de dois modos. Primeiro, prevenin­do, para não haver perigo. Depois, reparando, isto é, emendando o acontecido ou dando remédio, ou pelo menos arrependendo-se do que fez ne­gligentemente na consagração do sacramento.
 
DONDE A RESPOSTA À PRIMEIRA OBJEÇÃO. — ­O sacerdote surpreendido pela morte ou por uma grave enfermidade, antes da consagração do corpo e do sangue do Senhor, não deve ser substituído por outro. - Mas se isso se der depois de começada a consagração, por exemplo, depois de consagrado o corpo e antes da consagração do sangue, ou ainda depois da consagração de ambos, a celebração da missa deve ser continuada por outro. Por onde, como está nas De­cretais, lemos no Concílio Toledano: Somos de parecer que, o sacerdote sendo surpreendido por uma enfermidade, estando a ponto de consa­grar, na missa, os santos mistérios, de modo a não poder terminar a consagração, possa então o bispo ou outro presbítero continuar a consa­gração começada. Pois, começados, os santos mistérios nenhum outro complemento podem ter, senão o da bênção completa do sacerdote que os iniciou do que os acabar; porque não podem ser considerados perfeitos senão celebrados exata­mente na ordem prescrita. Porquanto, sendo nós, todos, um só, em Cristo, a diversidade de pessoas nenhuma contrariedade causa, onde a unidade da fé é o sinal da eficácia da ação. Nem degenera em abuso, inspirado na presun­ção, o estabelecido para obviar às misérias da nossa natureza. Assim, nenhum ministro ou sa­cerdote, sem ser claramente surpreendido pela doença, ouse de nenhum modo deixar imperfeita a celebração começada. E o temerário que ousar fazê-lo incorrerá na sentença de excomunhão.
 
RESPOSTA À SEGUNDA. — Ocorrendo uma difi­culdade, devemos sempre obviá-la por onde se oferece um perigo menor. Ora, mais perigoso é, no caso vertente, o que vai contra a perfeição deste sacramento; porque tal é um enorme sa­crilégio. Menor perigo porém é o relativo à qualidade de quem o recebe. Por onde, o sa­cerdote que, depois de começada a consagração se lembra de ter comido ou bebido, deve contudo, terminar o sacrifício e receber o sacramento. ­Semelhantemente, se se lembrar de ter come­tido um pecado, deve arrepender-se com o pro­pósito de o confessar e satisfazer; e então não receberá como indigno o sacramento, mas, fru­tuosamente. - E o mesmo deveremos dizer de quem se lembrar que está excomungado. Pois deve fazer o propósito de pedir humildemente a absolvição; e assim, pelo invisível Pontífice Jesus Cristo, alcançará a absolvição no tocante ao ato de celebrar os divinos mistérios. - se se lembrar porém, de alguma dessas coisas supra ­referidas, mais seguro julgaria eu, sobretudo no caso da quebra do jejum e da excomunhão, que deixasse a missa começada, salvo se temesse grave escândalo.
 
RESPOSTA À TERCEIRA. — Se, antes da consa­gração, cair uma mosca ou aranha no cálice, ou o sacerdote verificar que nele foi posto veneno, deve pôr fora o vinho, lavar o cálice e de novo deitar nele vinho para ser consagrado. - Se porém o incidente se der depois da consagração, deve tomar o animal com cautela, lavá-lo dili­gentemente, queimá-lo e pôr no sacrário a água da ablução com as cinzas. - Se porém verificar que foi posto veneno, de nenhum modo deve be­ber o cálice, nem o dar a outrem, a fim de que não redunde em morte o cálice da vida. Mas deve diligentemente conservar o líquido num pequeno vaso, para isso preparado, junto com as relíquias. E a fim de o sacramento não ficar imperfeito, deve pôr outro vinho no cálice e de novo retomar o sacrifício, desde a consagração do sangue, para que não fique imperfeito.
 
RESPOSTA À QUARTA. — O sacerdote, perce­bendo, antes da consagração do sangue e, depois da consagração do corpo, que não há vinho ou água no cálice, deve pô-los logo e consagrar. - Percebendo porém, depois da consagração, a fal­ta da água, deve sem tempo continuar; porque a mistura da água não é de necessidade para o sacramento, como dissemos. Deve porém ser pu­nido quem foi a causa, dessa negligência. Mas de nenhum modo deve ser misturada água com o vinho já consagrado, o que causaria a corrupção parcial do sacramento, como dissemos. - Perce­bendo porém, depois das palavras da consagra­ção, que não foi posto vinho no cálice, se o per­ceber antes de receber o corpo, deve, posta fora a água que já ele contivesse, nele introduzir vinho com água e recomeçar desde as palavras da con­sagração do sangue. - Mas se o perceber, depois de ter tomado o corpo, deve colocar outra hóstia a ser consagrada de novo juntamente com o sangue. E assim o digo porque, se o sacerdote pro­nunciasse e só as palavras da consagração do sangue, não observaria a ordem devida na consagra­ção; ora, como dispõe o referido capítulo do con­cílio Toledano, não se podem considerar perfeitos os sacrifícios, se não se observar a ordem presen­te. Pois, se o sacerdote recomeçasse da consagra­ção do sangue e repetisse todas as palavras subsequentes, não produziriam efeito se já não esti­vesse sobre o altar uma hóstia consagrada. Por­que há, na seqüência do canon, certas palavras e certos atos concernentes não só ao sangue, mas também ao corpo. E deve o sacramento, no fim, de novo tomar a hóstia consagrada e o san­gue, sem embargo de já ter tomado a água que estava antes no cálice. Porque o preceito relativo à perfeição do sacramento é de maior peso do que o em virtude do qual deve ser tomado em je­jum, como dissemos.
 
RESPOSTA À QUINTA. — Embora o sacerdote não se lembre se já pronunciou certas palavras que deveria ter pronunciado, nem por isso se lhe perturba o espírito. Pois, quem muito disse não pode lembrar-se de tudo o que disse, a menos que não apreenda o que disse, sob a razão de já dito; sendo assim que as coisas se tornam objeto da memória. Por onde, quando pensamos atenta­mente no que dizemos, mas pensamos que o di­zemos, não muito depois nos lembramos de o ha­ver dito. E é assim que as coisas se tornam objetos da memória pelas tomarmos, enquanto passadas, como o ensina Aristóteles. - Se pois, o sacerdote constar com probabilidade que omi­tem certas coisas, se estas não forem de necessi­dade para o sacramento, não penso que por isso as deva repetir, alterando a ordem do sacrifício, mas deve continuar o sacrifício. - Se porém se certificar que omitiu algo de essencial ao sacra­mento, por exemplo, a forma da consagração, sendo esta de tanta necessidade, para o sacramento como a matéria, então deve fazer o mesmo que dissemos quanto à falta da matéria; isto é, repetir a forma da consagração e o mais, conforme a ordem para não alterar a seqüência do sacrifício.
 
RESPOSTA À SEXTA. — A fração da hóstia con­sagrada e o ato de colocar-se só uma parte dela no cálice, respeita o corpo místico; assim como a mistura da água significa o povo. Por onde, a omissão destes atos não induz imperfeição do sacramento, a ponto de ser necessário reiterar nada em a celebração dele.
 
RESPOSTA À SÉTIMA. — Assim dispõe um de­creto do Papa Pio (I): Se por negligência cair uma gota de sangue na tábua aderente ao chão seja absorvida com a língua e a tábua arrancada. Se não houver assoalho, a terra seja raspada e consumida no fogo e a cinza depositada dentro do altar. E o sacerdote faça penitência por qua­renta dias. - Se porém o cálice gotejar sobre o altar, o ministro absorva as gotas. E faça peni­tência por três dias. - Se as gotas caírem sobre a primeira toalha do altar penetrar até a segun­da, faça penitência por quatro dias. Se penetrar até a terceira, faça nove dias de penitência. Se até a quarta, vinte dias de penitência. E os panos que foram umedecidos, pelas gotas, o ministro os lave por três vezes, recebendo a água o cálice, tome a água da ablução e a ponha perto do altar. Poderia também ser bebida pelo ministro, se não temer rejeitá-la, pela repugnância. Certos, além disso, cortam e queimam a parte do pano que foi molhada e depositam as cinzas no altar ou no sacrário. Mas na mesma disposição legal se acrescen­ta: Quem por voracidade ou embriaguez expulsar, por vômito, a Eucaristia, faça penitência por quarenta dias, sendo leigo; os clérigos ou mon­ges, ou diáconos e presbíteros, por setenta dias o bispo, por noventa. Se a expulsar em vômitos, por doença, taça sete dias de penitência. E no mesmo assunto, dispõe o Concílio Aurelianense: Quem não guardar bem o sacramen­to, de modo que um rato ou qualquer outro ani­mal o coma na igreja, faça quarenta dias de pe­nitência. - Quem o perder na igreja ou lhe dei­xar cair uma parte, que não mais se ache faça trinta dias de penitência. - E da mesma peni­tência é digno o sacerdote por cuja negligência as hóstias consagradas vierem a putrefazer-se. Assim, nos referidos dias o penitente deve jejuar e abster-se da comunhão. Ponderadas porém as condições do caso e da pessoa, a penitên­cia em questão pode ser aumentada ou diminuí­da. Deve-se porém notar, que em toda parte onde as espécies forem conservadas íntegras, devem ser reverentemente conservadas ou também consumidas; pois, enquanto permanecerem as espécies, nelas permanecerá o corpo de Cristo, como se disse. E o lugar onde forem encontra­das devem, sendo possível, queimar-se e depositarem-se as cinzas no sacrário, como dissemos a respeito da rasura da tábua.

Art. 5 — Se as cerimônias usadas na celebração deste mistério são convenientes.

O quinto discute-se assim. — Parece que as cerimônias usadas na celebração deste sacramento não são convenientes.
 
1. — Pois, este sacramento pertence ao Testamento Novo, como o mostra a sua própria forma. Ora, na vigência do Testamento Novo não se devem observar as cerimônias do Velho, nas quais o sacerdote e os ministros lavavam-se com água quando iam oferecer o sacrifício. Assim, lemos na Escritura: Arão e os seus filhos lavarão as suas mãos e os pés, quando houverem de entrar ao altar. Logo, não é con­veniente o sacerdote lavar as mãos na solenida­de da missa.
 
2. Demais. — Como lemos no mesmo lugar, o Senhor mandou que o sacerdote queimasse um incenso de suave fragrância sobre o altar que estava diante do propiciatório. O que também era uma das cerimônias do Testamento Velho. Logo, não deve o sacerdote oferecer incenso, du­rante a missa.
 
3. Demais. — As cerimônias realizadas nos sacramentos da Igreja não devem reiterar-se. Logo, não deve o sacerdote reiterar os sinais da cruz sobre este sacramento.
 
4. Demais. — O Apóstolo diz: Sem nenhu­ma contradição, o que é inferior recebe a bên­ção do que é superior. Ora, Cristo, que está neste sacramento, depois da consagração é muito maior que o sacerdote. Logo, inconvenientemente o sacerdote benze, depois da con­sagração, este sacramento, fazendo sobre ele o sinal da cruz.
 
5. Demais. — Nos sacramentos da Igre­ja não deve haver nada que seja ridículo. Ora é ridículo fazer gesticulações como quando o sacerdote estende os braços, põe as mãos, junta os dedos e se inclina. Logo, tais coisas se não deviam fazer neste sacramento.
 
6. Demais. — Também é ridículo o sacer­dote voltar-se tantas vezes para o povo, tantas vezes saudá-lo. Logo, nada disso devia fazer-se na celebração deste sacramento.
 
7. Demais. —- O Apóstolo diz que Cristo não deve ser dividido. Ora, depois da consagração Cristo está neste sacramento. Logo, o sacerdote não devia fracionar a hóstia.
 
8. Demais. — As cerimônias deste sacra­mento representam a paixão de Cristo. Ora, na paixão, o corpo de Cristo foi dividido nos luga­res das cinco chagas. Logo, o corpo de Cristo devia ser dividido antes em cinco que em três partes.
 
9. Demais. — O corpo de Cristo é totalmen­te consagrado neste sacramento, em separado do sangue. Logo, não se devia misturar com o san­gue uma parte dele.
 
10. Demais. — Assim como o corpo de Cris­to é dado neste sacramento como comida, assim o sangue de Cristo, como bebida. Ora, à recepção do corpo de Cristo, ao celebrar a missa, não se lhe acrescenta nenhuma outra comida corpó­rea. Logo, não devia o sacerdote, depois de ter bebido o sangue de Cristo, tomar vinho não con­sagrado.
 
11. Demais. — O verdadeiro deve corresponder ao figurado. Ora, do cordeiro pascal, que foi a figura deste sacramento, a lei orde­nava que nada se conservasse para o dia seguin­te. Logo, não se deviam conservar hóstias consagradas, mas consumi-las logo.
 
12. Demais. — O sacerdote fala aos ouvin­tes, no plural; por exemplo, quando diz - O Senhor seja convosco (Dominus vobiscum), e, Demos graças (Gratias agamus). Ora, não devemos falar no plural quando nos dirigimos a um só, sobretudo inferior. Logo, não devia o sacerdote celebrar a missa, estando presente só um mi­nistro. Por onde, parece que certas práticas deste sacramento são inconvenientes.
 
Mas, em contrário, o costume da Igreja, que não pode errar, por inspirada pelo Espírito Santo.
 
SOLUÇÃO. — Como dissemos, para ser mais perfeita a significação, tudo o que se faz nos sacramentos é significado duplamente por pala­vras e por atos. Ora, certos passos da paixão de Cristo, representados na celebração deste sa­cramento, são significados por palavras. Ou ainda certas causas concernentes ao corpo mís­tico, que esse sacramento representa; e outras referentes ao uso do mesmo, que deve ser com devoção e reverência. Por isso, na celebração deste mistério, certas práticas representam a paixão de Cristo; ou ainda, a disposição do cor­po místico; e certas outras concernem a devo­ção e a reverência devidas a este sacramento.
 
DONDE A RESPOSTA À PRIMEIRA OBJEÇÃO. — ­A ablução das mãos se faz, na celebração da missa, pela reverência devida a este sacramento. E isto por duas razões. - Primeiro, por ser cos­tume geral tocarmos em coisas preciosas com as mãos lavadas. Por onde, faltaria à decência quem se achegasse a tão grande sacramento com as mãos sujas, mesmo no sentido material. ­Segundo, pelo significado da ablução. - Pois, como diz Dionísio, o lavarmos as extremidades significa a purificação, ainda dos mínimos peca­dos, segundo aquilo do Evangelho: Aquele que está lavado não tem necessidade de lavar senão os pés. E essa purificação é necessária em quem se achega a este sacramento. O que também é significado pela confissão, que se faz antes do começo da missa. E o mesmo significava a ablu­ção dos sacerdotes da Lei Velha, conforme o en­sina Dionísio no mesmo lugar. - Mas a Igreja não o observa como preceito cerimonial da Lei Velha, senão como instituído por ela, e na prá­tica em si mesma conveniente. Por isso, não é observado do mesmo modo por que o era anti­gamente. Também se omite a ablução dos pés, conservando-se só a das mãos, por poder fazer-­se mais facilmente e por bastar a significar a perfeita purificação. Pois, sendo as mãos o órgão dos órgãos, na expressão de Aristóteles, todas as obras se lhes atribuem a elas. Donde o dizer o Salmo: Lavarei as minhas mãos entre os inocentes.
 
RESPOSTA À SEGUNDA. — Não usamos incen­sar, como se fosse um preceito cerimonial da lei, mas pelo determinar a Igreja. Por isso não o fazemos do mesmo modo pelo qual o estatuía a Lei Velha. - E o fazemos por duas razões. ­Primeiro, para reverenciar este sacramento: para, que o bom cheiro do incenso, expulse algum mau odor do local, que pudesse provocar re­pugnância. Segundo, para representar o efeito da graça da qual, como de bom odor, Cristo tinha a plenitude; segundo aquilo da Escritura: Eis o cheiro de meu filho bem como o cheiro de um campo cheio. E o qual deriva de Cristo para os fiéis, por meio dos ministros, segundo aquilo do Apóstolo: Por nosso meio difunde o cheiro do conhecimento de si mesmo em todo o lugar. Por isso, depois de incensado todo o altar, que de­signa a Cristo, incensam-se os demais, numa certa ordem.
 
RESPOSTA À TERCEIRA. — O sacerdote, na ce­lebração da missa, faz o sinal da cruz para ex­primir a paixão de Cristo, que na cruz se con­sumou. Ora, a paixão de Cristo se consumou como que por graus. - Assim, primeiro, teve lugar a entrega de Cristo, causada por Deus, por Judas e pelos judeus. E isso significa a tríplice crucesignação, acompanhada das palavras: Estes dons, estes presentes, estes santos sacri­fícios e sem mancha. - Depois foi Cristo ven­dido, pelos sacerdotes, escribas e fariseus. Para o significar, o sacerdote faz de novo por três vezes o sinal da cruz, dizendo: Bendita, aprovada, ratificada. Ou para mostrar o preço da venda, que foram os trinta dinheiros. E acres­centa duplo sinal da cruz, às palavras - A fim de que para nós o corpo e o sangue, etc., a fim de designar a pessoa de Judas, o vendedor, e o de Cristo, o vendido. - Em terceiro lugar, na Ceia foi prenunciada a paixão de Cristo. Para designá-lo o sacerdote faz, em terceiro lugar, o sinal da cruz por duas vezes - uma ao consa­grar o corpo; outra, ao consagrar o sangue, di­zendo em ambas as vezes - Abençoou. - Em quarto lugar, consumou-se a paixão mesma de Cristo. E, para representar as cinco chagas de Cristo o sacerdote faz pela quarta vez um quin­tuplo sinal da cruz, dizendo: a hóstia pura, a hóstia santa, a hóstia imaculada, o pão santo da vida eterna e o cálice de salvação perpétua. ­Em quinto lugar, representa a tensão do corpo, a efusão do sangue e o fruto da paixão, um triplice sinal da cruz, acompanhado das palavras - recebermos o sacrosanto do corpo e o sangue, enriquecidos de todas as bênçãos etc. - Em sexto lugar é representada a tríplice oração que Cristo fez na cruz. - Uma pelos seus persegui­dores, quando disse: Pai, perdoai-lhes. A segun­da - para libertar-se da morte, quando disse: Meu Deus, meu Deus, por que me abandonaste? A terceira, para alcançar a glória, quando ex­clamou: Pai em tuas mãos entrego o meu es­pírito. E para significá-lo, o sacerdote faz três vezes o sinal da cruz, dizendo: santificas, vivi­ficas, abençoas etc. - Em sétimo lugar, representam-se as três horas durante as quais ficou suspenso na cruz, isto é, desde a sexta até a nona hora. E para significá-lo, faz de novo o sacer­dote por três vezes o sinal da cruz, pronunciando as palavras - por ele, com ele e nele. - Em oitavo lugar, representa-se a separação entre a alma e o corpo, por duas crucesignações subse­qüentes, fora do cálice. - Enfim, em nono lugar, é representada a ressurreição operada no ter­ceiro dia, por três cruzes, acompanhadas das pa­lavras: A paz do Senhor esteja sempre convosco. - Mas, podemos dizer, mais brevemente, que a consagração deste sacramento e a aceitação deste sacrifício, bem como o seu fruto, procedem da virtude da cruz de Cristo. Por isso, sem­pre que o sacerdote fizer menção de alguma dessas três coisas, faz o sinal da cruz.
 
RESPOSTA À QUARTA. — O sacerdote, depois da consagração, não faz o sinal da cruz para benzer e consagrar, mas só para comemorar o sinal da cruz e o modo da paixão de Cristo, como do sobredito se colhe.
 
RESPOSTA À QUINTA. — Nenhum dos gestos do sacerdote, na missa, constitui gesticulação ri­dícula, pois têm o fim de representar alguma coisa. - Assim, o estender os braços depois da consagração significa o Cristo com eles esten­didos na cruz. - Também levanta as mãos ao orar, para significar que a sua oração se dirige a Deus, pelo povo, segundo aquilo da Escritura - Levantemos ao Senhor os nossos corações com as mãos para os céus. E noutro lugar: Quando Moisés tinha as mãos levantadas vencia Israel. - Quando põe as mãos, inclina-se, orando sú­plice e humildemente, designa assim a humil­dade e a obediência com que Cristo sofreu. ­Junta os dedos polegar e índice, com que tocou o corpo consagrado de Cristo a fim de que não se disperse alguma partícula que a eles se tivesse apegado. O que constitui reverência para com o sacramento.
 
RESPOSTA À SEXTA. — O sacerdote volta-se cinco vezes para o povo, para significar que o Senhor se manifestou cinco vezes no dia da res­surreição, como dissemos quando tratamos da ressurreição de Cristo. - Saúda sete vezes o povo – isto é, cinco vezes quando se volta para ele; e duas, em que não se volta, isto é, quando ante, do prefácio diz - O Senhor seja convosco (Dominus vobiscum); e quando diz - A Paz do Senhor seja sempre convosco, para designar a septiforme graça do Espírito Santo. Quanto ao bispo, quando celebra nos dias festivos, diz, na primeira saudação - A paz seja convosco, o que depois da ressurreição o Senhor o disse aos dis­cípulos, cujas pessoas sobretudo as representa o bispo.
 
RESPOSTA À SÉTIMA. — A fração da hóstia significa três causas. Primeiro, a divisão mes­ma do corpo de Cristo, que se operou na paixão. Segundo, a distinção do corpo místico em diver­sos estados. Terceiro, a distribuição das graças procedentes da paixão de Cristo, como diz Dio­nísio. Por onde, tal fração não induz divisão de Cristo.
 
RESPOSTA À OITAVA. — Como diz Sérgio Papa: Triforme é o corpo do Senhor. A parte ofere­cida, posta no cálice, representa o corpo de Cris­to já ressurrecto. Isto é, o próprio Cristo e a San­ta Virgem, ou outros santos já em corpo na glória. A parte que se come significa os que ainda vivem nesta terra; pois, os peregrinos neste mundo se unem com Cristo pelo sacra­mento; e ficam alquebrados pelo sofrimento como o pão comido é triturado pelos dentes. A parte remanescente no altar até o fim da missa significa o corpo jacente no sepulcro; por­que até o fim dos séculos os corpos dos santos estarão nos sepulcros; mas as almas estão no purgatório ou no céu. Este rito porém não se observa atualmente, isto é, o de conservar uma parte até ao fim da missa. Mas permanece a mesma significação das partes. O que certos exprimiram em versos, dizendo: A hóstia se divide em partes; molhada, significa os que gozam da plena beatitude; seca, os vivos; conservada, os sepultos. Certos porém dizem, que a parte posta no cálice significa os viventes neste mundo; a con­servada fora do cálice significa os plenamente bem aventurados, isto é, em corpo e alma; a parte comida significa os outros.
 
RESPOSTA À NONA. — O cálice pode ter dupla significação. - Numa, é a paixão mesma, repre­sentada neste sacramento. E então, a parte posta no cálice significa os ainda participantes dos sofrimentos de Cristo. - Noutra significa­ção pode simbolizar o gozo dos bem aventurados, também prefigurado neste sacramento. Por onde, aqueles cujos corpos já gozam da plena beatitude são simbolizados pela parte posta no cálice. - E devemos notar que a parte posta no cálice não deve ser dada ao povo como complemento da comunhão, porque o pão molhado Cristo não o deu senão ao traidor Judas.
 
RESPOSTA À DÉCIMA. — O vinho, em razão da sua umidade, serve para lavar. Por isso, é tomado depois da suscepção deste sacramento, para lavar a boca, para que nenhuma partícula nela fique; o que constitui reverência para com este sacramento. Por isso, uma disposição ca­nônica determina: O sacerdote deve sempre lavar a boca com o vinho, depois de ter recebido completamente o sacramento da Eucaristia; sal­vo se dever no mesmo dia celebrar outra missa; a fim de que o vinho tomado para lavar a boca não impedisse celebrar outra vez. E pela mesma razão lava com vinho os dedos, com que tocou o corpo de Cristo.
 
RESPOSTA À UNDÉCIMA. - A verdade deve, de certo modo, corresponder à figura; porque não deve a parte da hóstia consagrada, da qual o sacerdote e os ministros ou também o povo co­mungam, ser conservada para o dia seguinte. Por isso uma determinação do Papa Clemente estatuiu: Tantas hóstias se ofereçam no altar, quantas bastem para o povo. As que sobrarem não se reservem para o dia seguinte; mas sejam consumidas pela diligência dos clérigos, com temor e tremor. - Mas devendo este sacramen­to ser recebido todos os dias, o que não se dava com o cordeiro pascal, por isso é necessário con­servar outras hóstias consagradas para os en­fermos. Por onde, na mesma legislação se dis­põe: O presbítero tenha sempre preparada a Eucaristia de modo que quando alguém adoe­cer, dê-lhe logo a comunhão, não vá morrer sem ela.
 
RESPOSTA À DUODÉCIMA. - Na celebração so­lene da missa, vários devem estar presentes. Donde o dizer o Papa Sotero: Também isto foi estabelecido, que nenhum sacerdote ouse cele­brar as solenidades da missa sem dois ministros presentes, que lhe respondam, a ele como ter­ceiro; porque, quando diz no plural - O Senhor seja convosco (Dominus vobiscum); e a oração secreta - Orai por mim, é necessário evidentemente que lhe alguém responda à saudação. Por isso, para maior solenidade, lemos no mes­mo lugar como estatuída, que o bispo celebre, com vários ministros, a solenidade da missa. ­Mas, nas missas privadas, basta haver um mi­nistro, representante de todo o povo católico, em nome do qual responde no plural ao sacerdote.

Art. 4 — Se foram convenientemente ordenadas as palavras proferidas neste sacramento.

O quarto discute-se assim. — Parece que fo­ram inconvenientemente ordenadas as palavras proferidas neste sacramento.
 
1. — Pois, este sacramento é consagrado pe­las palavras de Cristo, como diz Ambrósio. Logo, nele não se deve proferir nada mais senão as pa­lavras de Cristo.
 
2. Demais. — As palavras e os atos de Cris­to nós os conhecemos pelo Evangelho. Ora, na consagração deste sacramento se alude a atos que não estão no Evangelho. Assim, aí não lemos que Cristo, na consagração deste sacramento, ele­vasse os olhos para o céu. Semelhantemente, os Evangelhos referem que Cristo disse - Tomai e comei, sem dizer - todos. Pois, na celebração deste sacramento se diz: Tendo elevado os olhos ao céu; e de novo: Tomai e comei disto todos. Logo, essas palavras não deviam ser proferidas na celebração deste sacramento.
 
3. Demais. — Os demais sacramentos se ordenam à salvação de todos os fiéis. Ora, na cele­bração daqueles sacramentos não se faz oração co­mum pela salvação de todos os fiéis e dos defun­tos. Logo, também não se devia assim proceder neste sacramento.
 
4. Demais. O batismo é especialmente chamado o sacramento da fé. Logo, o concernen­te à instrução da fé deve ser conferido antes no batismo, que neste sacramento; assim, a doutrina Apostólica e a Evangélica.
 
5. Demais. — Todo sacramento supõe a devoção dos fiéis. Logo, não se deve, mais por este sacramento que pelos outros, despertar-lhes a devoção mediante louvores divinos e advertên­cias; por exemplo, quando se diz - corações para o alto.
 
6. Demais. — O ministro deste sacramento é o sacerdote, como se disse. Logo, tudo quanto nele se reza devia ser proferido pelo sacerdote e não, certas coisas pelos ministros e certas outras, pelo coro.
 
7. Demais. — Este sacramento é certamen­te obra do poder divino. Logo, é supérfluo o pedido do sacerdote para que essa obra se cumpra: Cuja oblação tu, Deus, em todos etc.
 
8 Demais. — O sacrifício da Lei Nova é mui­to mais excelente que o dos antigos Patriarcas. Logo, o sacerdote não devia pedir a aceitação desse sacrifício, como o de Abel, Abraão e Melqui­sedegue.
 
9. Demais. — O corpo de Cristo, assim como não começa a estar neste sacramento por mudança de lugar, como dissemos, assim tam­bém nem, por esse modo, deixa de nele estar. Logo, não tem lugar a petição do sacerdote: Or­dena sejam estes dons levados ao teu altar pelas mãos do teu santo anjo.
 
Mas, em contrário, um Decreto diz: Tiago, irmão carnal do Senhor, e Basílio Cesarense Bis­po, regularam a celebração da missa. De cuja autoridade resulta que nada se profere na missa que não deva sê-lo.
 
SOLUÇÃO. — Este sacramento, compreendendo todo o mistério da nossa salvação, por isso é cele­brado com mais solenidade que todos os outros. E porque lemos na Escritura - Vê onde põe o teu pé quando entras na casa de Deus; e: Pre­para a tua alma antes da oração - por isso, an­tes da celebração deste mistério, vem em primei­ro lugar a preparação, para se bem fazer o que se segue. - Dessa preparação a primeira parte é o louvar a Deus, que se faz no intróito, segundo àquilo da Escritura: Sacrifício de louvor me honrará; e ali o caminho por onde lhe mostrarei a salvação de Deus. E esse louvor é tirado, no mais das vezes, dos salmos, ou pelo menos é can­tado com um salmo; porque, como Dionísio diz, os salmos, como louvores, abrangem tudo o con­tido na Escritura. - A segunda parte contém a comemoração da nossa miséria presente, quando o sacerdote implora misericórdia, dizendo Kyrie Eleison, três vezes pela pessoa do Pai; três pela pessoa do Filho, quando diz Christe Eleíson; e três pela pessoa do Espírito Santo, quando acres­centa Kyrie Eleíson. Três súplicas contra a nossa tríplice miséria - da ignorância, da culpa e da pena; ou para significar que as três pessoas es­tão reciprocamente uma na outra. - A terceira parte comemora a glória celeste, a que tendemos depois da miséria presente, quando se diz: Glória a Deus nas alturas. O que se canta nas festas em que se comemora a glória celeste, e se omite nos ofícios fúnebres, que só comemoram a miséria da vida presente. - A quarta parte contém a ora­ção que o sacerdote faz pelo povo, para que seja este digno de tão grandes mistérios. Em segundo lugar vem a instrução do povo fiel, porque este sacramento é o mistério da fé, como dissemos. - E essa instrução dispositiva­mente se faz pela doutrina dos Profetas e dos Apóstolos, lida na Igreja pelos leitores e subdiá­conos. E depois dessa lição o coro canta o gra­dual, que significa o progresso na vida espiritual; o aleluia, símbolo da exultação espiritual; ou o trato, nos ofícios fúnebres, que significa os gemidos espirituais. Porque de tudo isso o povo deve dar mostras. - Pela doutrina de Cristo contida no Evangelho o povo é perfeitamente instruído; e é lida pelos diáconos, ministros do grau mais elevado. E por crermos em Cristo, como na ver­dade divina segundo aquilo do Evangelho - Se eu vos digo a verdade, porque me não credes? ­Lido o Evangelho, canta-se o símbolo da fé, pelo qual todo o povo mostra o seu assentimento à fé, na doutrina de Cristo. Este símbolo se canta nas festas de que se faz nele alguma menção, como nas de Cristo e da Santa Virgem. E nas dos Após­tolos, que fundaram essa fé, e em outras seme­lhantes.
 
Assim, pois, preparado e instruído o povo, passa o sacerdote à celebração do mistério. E es­te é oferecido como sacrifício, e consagrado e to­mado como sacramento. E então, primeiro, se realiza a oblação; segundo, a consagração da matéria oferecida; terceiro, a recepção dela. A oblação de compõe de duas partes: o louvor do povo no canto do ofertório, símbolo da alegria dos oferentes; e a oração do sacerdote, que pede seja aceita de Deus a oblação do povo. Por isso disse David: Eu te ofereci alegre todas estas coisas na simplicidade do meu coração; e eu vi que o teu povo, que aqui está junto, te ofereceu os seus presentes com grande alegria. E depois diz a oração: Senhor Deus, conserva eternamente esta vontade. Em seguida vem a consagração, que, primeiro, no prefácio procura despertar a devoção do povo; por isso adverte-o a ter os corações eleva­dos para o Senhor. Donde, acabado o prefácio, o povo louva devotamente a divindade de Cristo, dizendo com os anjos: Santo, Santo, Santo. E a humanidade, com os meninos: Bendito o que vem. - Depois, o sacerdote comemora, em secre­to, primeiro, aqueles por quem oferece o sacrifí­cio, isto é, pela: Igreja universal e pelos que estão elevados em dignidade; e especialmente certos que oferecem ou por quem é oferecido. - Em segundo lugar, comemora os santos, quando lhes implora o patrocínio pelo que acabou de reco­mendar, ao dizer: Unidos numa mesma comu­nhão, honremos a memória. - Enfim, terceiro. conclui a petição, quando diz: Assim, pois esta oblação, etc., para que se faça a oblação por aqueles por quem é oferecido o sacramento.
 
Em seguida passa propriamente à consagração. Na qual - primeiro - pede o efeito dela, quando diz: Cuja oblação tu, ó Deus. - Segun­do, faz a consagração, pronunciando as palavras do Senhor quando disse: O qual, na véspera, etc. - Terceiro, excusa-se da sua ousadia por obe­diência ao mandado de Cristo, quando diz: É por­que, lembrando-nos. Quarto pede seja aceito de Deus o sacrifício celebrado, quando diz: Sobre os quais com propício, etc. - Quinto, pede o efeito deste sacrifício e sacramento - primeiro, para os que o receberem, quando diz: Súplices te roga­mos; segundo, para os mortos que já não no po­dem receber, quando diz: Lembra-te também, Senhor, etc.; terceiro, especialmente para os sa­cerdotes mesmos que o oferecem, quando diz: A nós também, pecadores. A seguir, vem a recepção do sacramento - E primeiro, o povo é preparado para o receber - primeiramente, pela oração comum de todo o povo, que é a oração dominical, na qual pedimos - o pão nosso de cada dia nos dai hoje; e também pela oração particular, que o sacerdote especialmente oferece pelo povo, quando diz ­livrai-nos, Senhor, nós vo-lo pedimos. - Segun­do, o povo é preparado pela paz, dada quando reza - Cordeiro de Deus; pois, este é o sacra­mento da unidade e da paz, como se disse, mas nas missas dos defuntos, nas quais o sacrifício é oferecido, não pela paz presente, mas pelo des­canso dos mortos, omite-se a paz.
 
Segue-se depois a recepção do sacramento, pelo sacerdote, primeiro, que o distribui depois aos outros; porque, como diz Dionísio, quem dis­pensa o sacrifício aos outros deve, primeiro, par­ticipar dele. E por último, a celebração completa da missa termina pela ação de graças - o povo exultando pela recepção deste mistério, como o signifi­cam os cantos depois da comunhão; e o sacerdo­te, dando graças pela oração, assim como Cristo, celebrada a ceia com os discípulos, disse o hino, como o referem os Evangelhos.
 
DONDE A RESPOSTA À PRIMEIRA OBJEÇÃO. — ­A consagração se opera pelas sós palavras de Cristo. Mas é necessário fazer-lhes acréscimos para a preparação do povo, que recebe o sacra­mento, como dissemos.
 
RESPOSTA À SEGUNDA. — Como diz o Evange­lho, muitas coisas fez e disse o Senhor, pelos Evangelistas não referidas. Entre elas está que o Senhor, na Ceia, elevou os olhos para o céu, o que a Igreja o recebeu pela tradição dos Após­tolos. Pois é racional, que quem, na ressurreição de Lázaro e na oração que fez pelos discípulos, levantou os olhos para o Pai, como o narra o evangelista, com maior razão o fizesse ao insti­tuir este sacramento, coisa mais importante. ­Quanto às expressões - manducate, e não ­comedite (comei), não diferem de sentido, nem importa qual delas se diga; sobretudo que essas palavras não fazem parte da forma, como disse­mos. - E o vocábulo – todos, subentende-se en­tre as palavras do Evangelho, embora não esteja nele expresso. Pois, Cristo disse: Se não comerdes a carne do Filho do homem, não tereis vida em vós.
 
RESPOSTA À TERCEIRA. — A Eucaristia é o sa­cramento de toda a unidade eclesiástica. Por isto, mais especialmente neste que nos outros sacra­mentos, deve-se fazer menção de tudo o concer­nente à salvação de toda a Igreja.
 
RESPOSTA À QUARTA. — Há duas espécies de instrução na fé. - Uma é a dos catecumenos, que acabam de receber a fé. E essa instrução é dada no batismo. - Outra é a recebida pelo povo fiel, que participa deste mistério. E essa é dada neste sacramento. Contudo, dela não ficam privadas também os catecúmenos e os infiéis. Por isso dispõe um cânone: O bispo não proíba a ninguém entrar na igreja e ouvir a palavra de Deus, quer se trate de gentio, quer de herético ou judeu, até a missa dos catecúmenos, na qual está contida a instrução da fé.
 
RESPOSTA À QUINTA. — Este sacramento re­quer maior devoção que os outros, porque nele está contido todo Cristo. É também mais geral; porque exige a devoção de todo o povo, porque é o sacrifício oferecido, e não só dos que o recebem, como se dá com os outros sacramentos. Por isso, no dizer de Cipriano, o sacerdote, recitado o pre­fácio, prepara as almas dos seus irmãos, excla­mando - Corações para o alto, e respondendo o povo - Tenhamo-nos ao Senhor, é advertido a pôr. todos os seus pensamentos em Deus.
 
RESPOSTA À SEXTA. — Neste sacramento men­ciona-se, como se disse, o concernente a toda a Igreja. Por isso, o coro recita certas partes ati­nentes ao povo. - Dessas, umas o coro as conti­nua até ao fim; e esses são os sugeridos ao todo o povo. - Outros o sacerdote, que faz as vezes de Deus, começa e o povo continua; em sinal de que tais coisas, como a fé na glória celeste, che­gavam ao povo por divina revelação. Por isso, o sacerdote começa a recitar o Símbolo da fé e o glória a Deus nas alturas. - Outros são recitados pelos ministros, como a doutrina do Velho e do Novo Testamento; como sinal que ela foi anun­ciada aos povos pelos ministros mandados por Deus. Outras partes porém só o sacerdote é quem as recita; e são as que lhe concerne ao ofício pró­prio, que é oferecer dons e sacrifícios pelo povo. Mas, ai, o concernente ao sacerdote e ao povo, o sacerdote o recita em voz alta, e tais são as orações comuns. - Mas certas outras, como a oblação e a consagração, concernem só ao sacer­dote. Por isso reza em voz submissa o que a constitui. - Mas em ambas, desperta a atenção do povo, dizendo - O Senhor seja convosco, es­perando o assentimento dos assistentes, com o seu amém. Pela mesma razão diz em voz alta - O Senhor seja convosco, antes do que diz secretamente, e acrescenta: - Por todos os séculos dos séculos. - Ou, o que reza secretamente é o sinal de que, na paixão de Cristo, só às ocultas os discípulos o confessavam.
 
RESPOSTA À SÉTIMA. — A eficácia das pala­vras sacramentais pode ficar impedida pela in­tenção do sacerdote. - Nem há inconveniente em pedirmos a Deus o que sabemos com certeza ele o fará; assim Cristo pediu a sua glorificação. - No caso vertente, o sacerdote não ora para que se faça a consagração, mas para nos ser ela frutuosa; donde o dizer sinaladamente - para que ele se torne para nós o corpo e o sangue. E isto significam as palavras que proferiu antes: Digna-te tornar esta oblação bendita, isto é, como o explica Agostinho, pela qual sejamos abençoa­dos, pela graça; aprovada, isto é, pela qual sejamos recebidos no céu; ratificada, isto é, que por ela se­jamos unidos ao coração de Cristo: racionável, isto é, pela qual sejamos livres do senso animal; aceitável, isto é, a fim de que, descontentes de nós mesmos por meio dela sejamos aceitáveis ao seu Filho único.
 
RESPOSTA À OITAVA. — Embora este sacra­mento seja, em si mesmo, superior a todos os antigos sacrifícios, contudo os sacrifícios dos antigos foram muito aceitos de Deus, por causa da devoção deles. Por isso o sacerdote pede que este sacrifício seja aceito de Deus, pela devoção dos oferentes, como o foram aquel'outros.
 
RESPOSTA À NONA. — O sacerdote não pede nem que as espécies sacramentais sejam levadas ao céu; nem que o seja o verdadeiro corpo de Cristo, que lá está sempre. Mas o pede para o corpo místico, simbolizado neste sacramento; isto é, que as orações, tanto do povo como do sacer­dote, os apresente a Deus o anjo assistente aos divinos mistérios, segundo aquilo da Escritura: Subiu o fumo dos perfumes das orações dos san­tos da mão do anjo. Quanto à expressão - su­blime altar de Deus - significa ou a própria Igreja triunfante, a que pedimos sejamos trans­feridos; ou Deus mesmo, do qual pedimos par­ticipar. Pois, deste altar diz a Escritura: Não subirás por degraus ao meu altar, isto é, não in­troduzirás graus na Trindade. - Ou, pelo anjo entende-se o próprio Cristo, o Anjo do grande conselho, que uniu o seu corpo místico a Deus Padre e à Igreja triunfante. Donde também a denominação de missa; porque pelo anjo o sa­cerdote emite (mittit) as suas preces a Deus, como o povo, mediante o sacerdote. Por isso, no fim da missa o diácono diz, nos dias festivos - Ite, missa est (ide, foi oferecida) isto é, a hóstia a Deus pelo anjo, de modo a ser de Deus aceita.

Art. 3 — Se é necessário celebrar este sacramento em edifício e vasos sagrados.

O terceiro discute-se assim. — Parece não ser necessário celebrar este sacramento em edifício e vasos sagrados.
 
1. — Pois, este sacramento é representativo da paixão do Senhor. Ora, Cristo não sofreu num edifício, mas ora da porta da cidade, se­gundo aquilo do Apostolo: Jesus, para que santificasse ao povo pelo seu sangue, padeceu fora da porta. Logo, parece que este sacramento não deve ser celebrado num edifício, mas antes, ao ar livre.
 
2. Demais. — Na celebração deste sacra­mento a Igreja deve imitar o costume de Cristo e dos Apóstolos. Ora, o edifício onde primeiro Cristo instituiu este sacramento não era consa­grado; antes, era um cenáculo comum preparado por um chefe de família, como o refere o Evan­gelho. E conforme a Escritura, os Apóstolos todos os dias perseveravam unanimemente no templo e, partindo o pão pelas casas, tomavam a comida com regozijo. Logo, também agora não se deve celebrar este sacramento só em edifícios consagrados.
 
3. Demais. — Na Igreja, governada pelo Espírito Santo, nada deve fazer-se de inútil. Ora, inutilmente se consagra uma igreja, um altar ou coisas semelhantes inanimadas, que não são susceptíveis de graça nem de virtude espiritual. Logo, não se deviam fazer consagrações de igrejas.
 
4. Demais. — Só as obras divinas devem ser celebradas com certa solenidade, segundo aquilo da Escritura: Nas obras das tuas mãos me rego­zijarei. Ora, a igreja e o altar são consagrados por obra humana; bem como o cálice, os minis­tros e o mais. Mas não se celebra na Igreja a comemoração dessas consagrações. Logo, tam­bém não deve ser comemorada com solenidade a consagração de uma igreja ou de um altar.
 
5. Demais. — A realidade deve corresponder ao figurado. Ora, no Testamento Velho, figura do novo não se faziam altares de pedras lavra­das. Assim, diz a Escritura: Farme-eis um altar de terra. Se me edificares porém algum altar de pedra não o edificarás de pedras lavra­das. E noutro lugar se manda fazer o altar de pau de setim revestido de cobre; e também de ouro. Logo, parece que não devia ser costume na Igreja fazer o altar só de pedra.
 
6. Demais. — O cálice e a patena repre­sentam o sepulcro de Cristo, que foi cavado na pedra, como lemos no Evangelho. Logo, o cálice deve ser feito de pedra e não só de prata, ouro ou ainda de estanho.
 
7. Demais. — Assim como o ouro é a ma­téria mais preciosa para os vasos, assim também os panos de seda são mais preciosos que os outros. Logo, assim como o cálice se faz de ouro, assim também os panos do altar devem ser feitos de seda e não só de linho.
 
8. Demais. — A dispensação e o rito dos sacramentos incumbem aos ministros da Igreja, assim como a dispensação dos bens temporais depende da ordem dos chefes seculares. Donde o dizer o Apóstolo: Os homens devem-nos con­siderar como uns ministros de Cristo e como uns dispensadores dos mistérios de Deus. O que porém, na dispensação dos bens temporais for feito contra as determinações dos chefes, será nulo. Se pois as prescrições referidas foram con­venientemente estatuídas pelos Prelados da Igre­ja, parece que em oposição a elas, o corpo de Cristo não pode ser consagrado. Donde resulta não serem suficientes as palavras de Cristo para a celebração deste sacramento, o que é inadmis­sível. Logo, a Igreja não regulou conveniente­mente a celebração deste sacramento.
 
Mas, em contrário, o estatuído pela Igreja é ordenado pelo próprio Cristo, segundo aquilo do Evangelho: Onde se acham dois ou três congre­gados em meu nome, ai estou eu no meio deles.
 
SOLUÇÃO. — As coisas que acompanham a celebração deste sacramento têm dupla significação: representar o que se passou na paixão do Senhor, e reverenciar este sacramento, em que Cristo está realmente e não só figuradamente contido. Por isso, consagram-se as coisas que servem à celebração dele; quer para reverenciar o sacramento, quer para reverenciar a santidade, efeito resultante da paixão de Cristo, segundo aquilo do Apóstolo: Jesus, para que santificasse ao povo pelo seu sangue, etc.
 
DONDE A RESPOSTA À PRIMEIRA OBJEÇÃO. — ­Regularmente este sacramento deve ser celebra­do numa casa, que é a Igreja, segundo aquilo do Apóstolo: Para que saibas como deves portar-te na casa de Deus, que é a Igreja de Deus vivo. Pois, fora da Igreja não é lugar do verdadeiro sacrifício, como diz Agostinho. E como a Igreja não devia encerrar-se nos limites da nação ju­daica, mas difundir-se por todo o mundo, por isso a paixão de Cristo não foi celebrada dentro da cidade dos judeus, mas debaixo do céu, para assim todo o mundo fosse como o templo da paixão de Cristo. – E, contudo dispõe um câno­ne: Aos sacerdotes em viagem permitimos cele­brar a solenidade da missa, na falta de igreja, a céu aberto ou em tendas, contanto que haja um altar consagrado e tudo o mais necessário a esse sagrado ministério.
 
RESPOSTA À SEGUNDA. — Como o edifício onde se celebra este sacramento significa a Igreja e igreja se chama, é justamente consagrado. Como para representar, a santificação que à Igreja ad­veio da paixão de Cristo, quer também para sig­nificar a santidade exigida nos que devem rece­ber o sacramento. - Quanto ao altar, ele significa o próprio Cristo, do qual diz o Apóstolo: Por ele ofereçamos a Deus sacrifício de louvor. Por isso, a consagração do altar significa a santidade de Cristo, do qual diz o Evangelho: O santo que há de nascer de ti será chamado Filho de Deus. E também dispõe um cânone: Determina­mos que os altares sejam consagrados não só pela unção do crisma, mas também pela bênção sa­cerdotal. Por isso não é lícito regularmente receber este sacramento senão em edifícios consagrados. Donde a disposição canônica: Nenhum sacerdo­te ouse celebrar missa senão em lugares sagrados pelo bispo. E também, por não pertencerem à Igreja os pagãos nem os outros infiéis, por isso na mesma disposição se lê: Não é lícito santifi­car uma igreja onde se sepultaram os cadáveres de infiéis mortos; mas se for apta para nela se consagrar, seja reedificada, depois de retirados dela os corpos e arrasadas as paredes ou arranca­do o madeiramento do lugar. Se porém essa igre­ja foi antes consagrada, é lícito nela celebrar missas, contanto que sejam fiéis os nela sepultados. Havendo necessidade porém, pode este sacramento ser celebrado em casas não consagradas ou violadas, mas com o consentimento do bispo. Por isso a referida ordenação determina: Estabe­lecemos que a solenidade da missa não pode ser celebrada em toda parte, mas em lugares con­sagrados pelo bispo, ou onde ele permitir que se celebre. Não contudo sem um altar portátil consagrado pelo bispo. Daí o dispor o mesmo cânone: Permitimos celebrar, se as igrejas foram queima­das ou consumidas pelas chamas, em capelas com altar consagrados. Mas como a santidade de Cris­to é a fonte de toda a santidade da Igreja, por isso, em caso de necessidade, basta um altar san­tificado, para celebrar-se este sacramento. Por isso nunca é consagrada uma igreja sem altares. Contudo, sem igreja, às vezes é consagrado um altar com relíquias dos santos, cuja vida está escondida com Cristo em Deus. Donde a disposição canônica: Determinamos que os altares onde se verificar não haver nenhum corpo ou nenhumas relíquias dos mártires, sejam, se possível, destuí­dos pelos bispos que governam a região.
 
RESPOSTA À TERCEIRA. — A igreja, os altares e outros objetos inanimados tais são consagra­dos, não por serem suscetíveis de graça, mas porque, pela consagração, ficam dotados de uma certa virtude espiritual, que os torna aptos ao culto divino, de modo que tiremos deles aumento à nossa devoção, que nos faça progredir na vida da graça, salvo se a nossa irreverência o impedir. Por isso diz a Escritura: Verdadeiramente naque­le templo há uma virtude divina; porque aquele mesmo que tem a sua habitação nos céus, esse mesmo é visitador e protetor daquele lugar. Por isso, antes da consagração são levadas e exorcizadas, para que, desde então força do inimigo seja destruída. E pela mesma razão, as igrejas que foram profanadas pelo derramamento de sangue ou por qualquer espécie de torpeza devem ser reconciliadas: pois pelo pecado aí cometido manifesta·se de alguma forma a ação do inimigo. Por isso lê-se na mesma distinção: Onde quer que encontreis igrejas dos arianos, sem a menor demora consagrai· as como católicas por meio de preces e obras di­vinas. Por isso, certos afirmam com probabilidade que, entrando numa igreja consagrada, alcança­mos a remissão dos pecados venais, como pela as­persão da água benta, baseados no lugar da Escritura: Abençoaste, Senhor, a tua terra; per­doaste a maldade do teu povo. E é a razão por que, pela virtude que a consagração confere à igreja, não se pode reiterar essa consagração. Por isso uma disposição canô­nica do concílio Niceno, determina: As igrejas uma vez consagradas a Deus não se lhe deve rei­terar a consagração, salvo se forem consumidas pelo fogo, ou profanadas com derramamento de sangue ou por alguma torpeza. Porque assim como uma criança, uma vez batizada por qual­quer sacerdote, em nome do Padre, do Filho e do Espírito Santo, não deve ser de novo batiza­da, assim também em lugar dedicado a Deus não deve ser consagrado de novo, salvo pelas causas supra-referidas; se contudo conservaram a fé na santa Trindade os que a consagraram. Do con­trário, os que estão fora da Igreja, não podem consagrar. Mas, acrescenta a mesma disposição: As Igrejas ou os altares, cuja consagração é du­vidosa, sejam de novo consagrados. Mas, a essa razão acresce ainda que as igre­jas consagradas, adquirem uma certa virtude espiritual, como diz uma disposição canônica: A madeira empregada na construção de uma igre­ja não deve ser usada em outras obras, salvo em outra igreja; ou deve queimar-se ou dar-se aos frades de um mosteiro para que a usem; mas não poderão servir ao uso à leigos. E ainda: Quando à pala do altar, o púlpito, os candelabros e o véu estiverem consumidos pelo uso sejam queimados, sendo as cinzas colocadas no batistério, na mu­ralha ou atiradas em fossas do pavimento, a fim de não serem calcadas pelos pés dos fiéis.
 
RESPOSTA À QUARTA. — Como a consagração do altar representa a santidade de Cristo, e a de um edifício, a santidade de toda a Igreja, por isso se deve celebrar com solenidade a consagração de uma igreja. E é a razão por que se celebra du­rante oito dias a solenidade da consagração, para significar a santa ressurreição de Cristo e dos membros da Igreja. Nem é a consagração da Igreja e do altar obra só do homem, pois que im­prime uma virtude espiritual. Donde a disposi­ção canônica: As cerimônias da consagração das igrejas devem ser celebradas solenemente todos os anos. E a razão de se celebrarem a dedicação dos templos durante oito dias. acha-la-eis se ler­des no III livro dos Reis as solenidades da consa­gração do templo. (Isto é, VIII, 66).
 
RESPOSTA À QUINTA. — Dispõe um cânone: Altares, não sendo de pedra, não sejam consagra­dos com unção de óleo - O que concorda com a significação deste sacramento. Quer porque o altar significa a Cristo, como diz o Apóstolo - e esta pedra era Cristo; quer também parque o corpo de Cristo foi sepultado num monumento de pedra. Concorda ainda com o uso do sacra­mento, pois, a pedra, sobre sólida, pode facilmen­te ser encontrada em toda parte. O que não era necessário na Lei Velha, porque se fazia num só lugar um único altar. Quanto a se ordenar fosse o altar feito de terra ou de pedras lavradas, foi por evitar a idolatria.
 
RESPOSTA À SEXTA. — A referida disposição diz: Outrora os sacerdotes usavam de cálices, não de ouro, senão de madeira; mas o Papa Zeferino ordenou que se celebrassem as missas com pate­nas de vidro; e depois Urbano mandou fosse tudo de prata. Mais tarde, porém, foi estatuído que o cálice do Senhor e a patena, não sendo de ouro, fossem feitos totalmente de prata; ou pelo menos o cálice fosse de estanho. Não se fizessem porém de bronze nem de cobre, por criarem o azi­nhavre, em contato com o vinho, e por isso provocarem vômitos. Mas ninguém ouse cantar mis­sa com cálice de madeira ou de vidro; porque a madeira, sendo porosa, ficaria nela restos do sangue consagrado; e o vidro, por frágil, correria perigo de quebrar-se. O mesmo se diga da pedra. Por isso, pela reverência devida a este sacramen­to, ficou estatuído que o cálice fosse feito das ma­térias referidas.
 
RESPOSTA À SÉTIMA. — Onde podia fazer-se sem perigo, a Igreja determinou, relativamente a este sacramento, o que mais expressamente em relação ao corpo, colocado no corporal, como, quanto ao sangue, posto no cálice. Por onde, em­bora o cálice não se faça de pedra, o corporal, contudo se faz de pano de linho, em que o corpo de Cristo foi envolvido. Por isso lemos, na Epís­tola do Papa Silvestre, a disposição canônica: Deliberadamente estatuímos qua o sacrifício do altar ninguém ouse celebrá-lo com pano de seda ou de cor, mas com pano de puro linho consagra­do pelo bispo, assim como o corpo de Cristo foi sepultado envolto num alvo lençol de linho. Deve também ser de linho o pano, por causa da sua alvura, para significar a pureza da consciência; e por causa do muito trabalho exigido pela sua preparação, para significar a paixão de Cristo.
 
RESPOSTA À OITAVA. — Dispensar os sacramentos pertence aos ministros da Igreja; mas a con­sagração deles, ao próprio Deus. Por isso, os mi­nistros da Igreja não têm nada que estatuir so­bre a forma da consagração; mas só sobre o uso do sacramento e o modo de o celebrar. Por onde, se o sacerdote proferir as palavras da consagra­ção sobre a matéria devida, com a intenção de consagrar, sem nada do o que nos referimos, isto é, sem templo, altar, cálice e corporal consagrados e condições semelhantes instituídas pela Igreja, consagra realmente o corpo de Cristo; mas gravemente peca, por não observar o rito da Igreja.

Art. 2 — Se foi convenientemente determinado o tempo da celebração deste mistério.

O segundo discute-se assim. Parece que foi inconvenientemente determinado o tempo da celebração deste mistério.
 
1. — Pois, este sacramento é representativo da paixão do Senhor, como dissemos. Ora, a comemoração da paixão do Senhor se faz na Igreja uma vez no ano. Assim, diz Agostinho: Pois, quantas vezes se celebra a Páscoa não mor­re Cristo outras tantas? Contudo a recordação aniversária representa o que outrora se passou e nos comove como se víssemos o Senhor pen­dente da cruz. Logo, este sacramento não deve celebrar-se senão uma vez no ano.
 
2. Demais. — A paixão de Cristo a come­mora a Igreja na sexta-feira antes da Páscoa, mas não na festa do Natal. Sendo porém este sacramento comemorativo da paixão do Senhor, parece inconveniente celebrarem-se no Natal três vezes este sacramento, e deixá-lo totalmente de fazer, na Parasceve.
 
3. Demais. — Na celebração deste sacramento a Igreja deve imitar a instituição de Cristo. Ora, Cristo consagrou este sacramento de tarde. Logo, parece que deve ser celebrado nes­sa hora.
 
4. Demais. — Uma disposição canônica determina, segundo a resposta de Leão Papa (I), a Dióscoro Alexandrino, bispo, que é lícito celebrar missa na primeira parte do dia. Ora, o dia começa à meia-noite, como se disse. Logo, parece lícito celebrar também depois de meia-­noite.
 
5. Demais. — Uma certa oração dominical secreta reza: Concede-nos, Senhor, nós te supli­camos, o freqüentar estes mistérios. Ora, maior será a freqüência se o sacerdote celebrar, mesmo várias horas por dia. Logo, parece que não deve o sacerdote ser proibido de celebrar várias vezes por dia.
 
Mas, em contrário, o costume observado pela Igreja segundo o estatuído pelos cânones.
 
SOLUÇÃO. — Como dissemos, na celebração deste mistério considera-se a representação da paixão do Senhor e a participação do seu fruto. E tanto em relação àquela como a esta, era ne­cessário determinar o tempo conveniente à sua celebração. - Pois, como quotidianamente pre­cisamos, por causa dos nossos quotidianos defei­tos, do fruto da paixão do Senhor, todos os dias na Igreja regularmente é oferecido este sacra­mento. Por isso o Senhor nos ensinou a pedir: O pão nosso quotidiano nos dai hoje. O que Agostinho assim expõe: Se o pão é quotidiano, porque esperais um ano para o receber, como os gregos costumam fazê-lo no Oriente? Recebe todos os dias o que todos os dias te aproveita. ­Mas, tendo sido a paixão do Senhor celebrada desde a terceira até a nona hora, por isso regu­larmente nessa parte do dia a Igreja celebra solenemente este sacramento.
 
DONDE A RESPOSTA À PRIMEIRA OBJEÇÃO. — Este sacramento rememora a paixão de Cristo, enquanto os seus efeitos derivam para os fiéis. Mas no tempo da paixão se remem ora a paixão de Cristo só enquanto sofrida pelo nosso chefe. E isso só se fez uma vez; ao passo que quotidia­namente os fiéis colhem o fruto da paixão do Senhor. Por isso, ao passo que a primeira comemoração se faz só uma vez no ano, esta se faz todos os dias, tanto por causa do fruto como para perpetuar a memória da paixão.
 
RESPOSTA À SEGUNDA. — Com o advento da realidade cessa o figurado. Ora, este sacramen­to é uma figura e o exemplo da paixão do Se­nhor, como se disse. Por onde, no dia mesmo em que se rememora a paixão do Senhor, en­quanto realmente consumada, não se celebra a consagração deste sacramento. Contudo, para que nem nesse dia a Igreja se veja privada do fruto da paixão conferido pela Eucaristia, por isso o corpo de Cristo consagra-se no dia ante­cedente e conserva-se para ser tomado na sexta-­feira da paixão. Não porém o sangue, pelo pe­rigo que correria de ser infundido no chão; e por ser o sangue a imagem mais especial da paixão do Senhor, como dissemos. Nem é ver­dade o dito de certos, que pela introdução de uma partícula do corpo de Cristo no vinho, con­verte-se este no seu sangue. Pois, isso não pode dar-se senão pela consagração feita sob a devida forma das palavras. - Quanto ao dia da Nativi­dade, nele se celebram várias missas, por causa da tríplice natividade de Cristo das quais, uma é a eterna, oculta para nós; por isso se canta uma missa de noite, em cujo intróito se reza: O Senhor me disse - Tu és meu filho, eu te gerei hoje. Outra é a temporal, mas espiritual, pela qual Cristo nasce como um luzeiro em nossos corações, na expressão da Escritura. E por isso se canta uma missa na aurora, em cujo intróito se reza: A luz refulgirá hoje sobre nós. A ter­ceira é a natividade temporal e corporal de Cris­to, enquanto visivelmente para nós, revestido de carne, nasceu do ventre virginal de Maria: E por isso se canta a terceira missa em pleno dia, em cujo intróito se reza: Nasceu-nos um menino. Embora se possa também dizer, ao inverso, que a natividade eterna, em si mesma, dá-se em ple­no dia, e por isso no Evangelho da terceira missa se faz menção da natividade eterna. Mas quan­to à natividade corporal, literalmente, Cristo nasceu de noite, em sinal de que vinha para as trevas de nossa miséria; e por isso na missa noturna se reza o Evangelho do nascimento cor­poral de Cristo. Assim como também nos outros dias em que devemos celebrar ou pedir vários benefícios de Deus, celebram-se três missas no mesmo dia: uma, da festa; outra, pelo jejum; e uma terceira pelos mortos.
 
RESPOSTA À TERCEIRA. — Como dissemos, Cris­to quis, por último, deixar este sacramento aos seus discípulos, para que se lhes imprimisse mais profundamente no coração. Por isso, depois da ceia e ao fim do dia, consagrou-o e deu-o aos discípulos. Celebramo-lo nós porém à hora da paixão do Senhor, a saber: nos dias festivos, na terceira hora, quando Jesus foi crucificado pelas línguas dos judeus, na expressão do Evangelho, e quando o Espírito Santo desceu sobre os dis­cípulos. Ou nos dias de trabalho, na sexta hora, quando foi crucificado às mãos dos soldados, como o narra o Evangelho. Ou nos dias de je­jum, na hora nona, quando, dando um grande grito, se lhe desatou o espírito, segundo o evan­gelista. - Pode-se porém retardar a celebração, sobretudo quando se devem fazer ordenações e principalmente no sábado santo, quer pela dura­ção do ofício, quer por se deverem as ordenações fazer no domingo, como o dispõe a legislação. - Mas também as missas podem ser celebradas na primeira parte do dia, por alguma necessida­de, por decisão canônica.
 
RESPOSTA À QUARTA. — Regularmente a missa deve celebrar-se de dia e não de noite, porque o próprio Cristo, presente neste sacramento, dis­se: Importa que eu faça as obras de aquele que me enviou, enquanto é dia; a noite vem, quan­do ninguém pode obrar. Eu que estou no mundo sou a luz do mundo. Mas, de modo que se con­sidere como princípio do dia, não a meia-noite: nem também o nascer do sol, isto é, quando o seu disco aparece a iluminar a terra, mas quando surge a aurora. Pois então, dizemos ter o sol de certo modo nascido, pelo manifestar-se a clari­dade dos seus raios. E nesse sentido, o Evan­gelho diz que as mulheres chegaram ao sepulcro quando já o sol era nascido, embora tivessem vindo, ao monumento, quando fazia ainda escuro na expressão do evangelista. E é assim que Agostinho resolve essa contradição. Na noite do Natal do Senhor, porém, especialmente se cele­bra a missa, porque o Senhor nasceu de noite como o diz o direito canônico. - E semelhante­mente também no sábado santo, ao começo da noite, por ter o Senhor ressurgido de noite, isto é, quando ainda fazia escuro, antes do pleno nascimento do sol.
 
RESPOSTA À QUINTA. — Como o determina um decreto de Alexandre Papa (II), basta ao sacer­dote celebrar uma missa por dia, porque Cristo sofreu uma vez só e redimiu todo o mundo; e é muito feliz quem pode celebrar uma missa digna­mente. Certos sacerdotes porém celebram uma missa pelos defuntos, e outra de dia, sendo ne­cessário. Aqueles que porém ousarem celebrar várias missas num dia, por dinheiro ou para lisonjear seculares, penso que não podem escapar à danação. E Inocêncio III determina que exceto no dia da Natividade do Senhor - salvo se algum caso de necessidade persuadir o con­trário, - basta ao sacerdote celebrar uma só missa uma vez ao dia.

Art. 1 — Se na celebração diste sacramento Cristo é imolado.

O primeiro discute-se assim. — Parece que Cristo não é imolado na celebração deste sacra­mento.
 
1. — Pois, diz o Apóstolo: Cristo, com uma só oferenda, fez perfeitos para sempre aos que tem santificado. Ora, essa oferenda foi a sua imolação. Logo, Cristo não é imolado na celebração deste sacramento.
 
2. Demais. — A imolação de Cristo foi feita na cruz, na qual, como diz o Apóstolo, se entregou a si mesmo por nós outros, como oferenda e hóstia a Deus em odor de suavidade. Ora, na celebração deste mistério Cristo não é crucifi­cado. Logo, não é imolado.
 
3. Demais. — Como diz Agostinho, na imolação de Cristo, sacerdote e hóstia se identificam. Ora, não se identifica o sacerdote com a hóstia na celebração deste sacramento. Logo, a cele­bração deste sacramento não é a imolação de Cristo.
 
Mas, em contrário, Agostinho: Cristo imo­lou-se uma vez em si mesmo e, contudo todos os dias é imolado no sacramento.
 
SOLUÇÃO. — Por duas razões se diz que a celebração deste sacramento é a imolação de Cris­to. - Primeiro, porque, como diz Agostinho, cos­tumamos dar às imagens o mesmo nome que têm os seres representados por elas, assim, con­templando um quadro ou uma parede pintada, dizemos - aquele é Cícero, aquel'outro é Salús­tio. Ora, a celebração deste sacramento, como dissemos, é uma imagem representativa da paixão de Cristo, que é uma verdadeira imola­ção. Por isso Ambrósio diz: Em Cristo foi ofe­recida uma só vez a hóstia, eficaz para produzir a salvação eterna. Por que, pois, a oferecemos nós todos os dias? Para recordar a morte de Cristo. - Em segundo lugar, quanto ao efeito da paixão; pois, por este sacramento tornamo-nos participantes dos frutos da paixão do Senhor. Por isso uma certa oração dominical secreta diz: Quantas vezes se celebrar a comemoração, outras tantas se renovará a obra da nossa redenção. Quanto, pois, à primeira razão, poderíamos dizer que Cristo foi imolado mesmo nas figuras do Testamento Velho. Por isso diz o Apocalipse: Aqueles cujos nomes não esta escritos no livro da vida do Cordeiro, que foi imolado desde o princípio do mundo. Mas, quanto à segunda, é próprio à celebração deste sacramento que Cris­to seja nele imolado.
 
DONDE A RESPOSTA À PRIMEIRA OBJEÇÃO. — ­Como Ambrósio diz no mesmo lugar, uma só é a hóstia, que Cristo ofereceu e nós oferecemos, e não muitas, porque Cristo foi oferecido uma vez só; pois, este sacrifício é a representação da­quele; e assim como o que é oferecido em toda parte é um só corpo e não muitos, assim também o sacrifício é um só.
 
RESPOSTA À SEGUNDA. — Assim como a celebração deste sacramento é a imagem representativa da paixão de Cristo, assim o altar é repre­sentativo da sua cruz, na qual Cristo imolou o seu próprio corpo.
 
RESPOSTA À TERCEIRA. — Pela mesma razão também o sacerdote representa a imagem de Cristo, em cujo nome e por cujo poder pronun­cia as Palavras da consagração, como do sobre­dito se colhe. E assim, de certo modo, sacerdote e hóstia se identificam.

Questão 83: Do rito deste sacramento

Em seguida devemos tratar do rito deste sacramento.
 
E nesta questão discutem-se seis artigos:

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