Category: Pe. Luis Cláudio Camargo
Nosso caro amigo, o Pe. Luis Cláudio Camargo - FSSPX, é uma das vocações egressas de Pemanência.
Pe. Luis Cláudio Camargo - FSSPX
“Naquele dia os montes destilarão doçura e das colinas manará leite e mel. Porque virá o grande Profeta que renovará Jerusalém. E tu, Belém, terra de Judá, não serás a menor, pois de ti sairá o Rei que virá para reger meu povo Israel”.
“Na Igreja latina – diz Dom Guéranger em seu livro “O ano litúrgico” – dá-se o nome de Advento ao tempo destinado pela Igreja à preparação dos fiéis para a celebração da Festa do Natal, aniversário do nascimento de Nosso Senhor Jesus Cristo. O mistério deste grande dia merecia, sem dúvida, um prelúdio de oração e penitência. Contudo, é impossível assinalar com precisão a instituição primeira deste tempo de preparação, que recebeu mais tarde o nome de Advento”.
O Advento é, então, o tempo da preparação para a vinda de Nosso Senhor. Tempo de preparação, de espera, de penitência curiosamente misturada com alegria.
Santo Tomás, em um sermão que pronunciou no 1º Domingo de Advento, em Paris, por volta de 1270, comentando as palavras do profeta Malaquias – “Eis que teu Rei vem a ti com mansidão” – diz: “Para não cair em nenhuma ambigüidade, deveis saber que a vinda de Cristo pode entender-se de quatro maneiras: Sua vinda à carne ou Encarnação; Sua vinda a nossa alma; Sua vinda no momento da morte dos justos; Sua vinda final para julgar todos os homens”.
Na liturgia apresentam-se todos estes aspectos de modo muito profundo. Dizia também Santo Tomás que por cada uma destas vindas de Cristo, a Igreja celebra os quatro domingos do Advento. (Continue a ler)
Pe. Luis Cláudio Camargo - FSSPX
Eis aqui que no meio da vida nos assaltou a morte.
Que auxilio procurar, senão a Vós, Senhor, que por nossos pecados com razão vos irritais?
Deus Santo, Deus forte, Salvador misericordioso, não nos entregueis à morte amarga.
Em Vós nossos pais esperaram; esperaram e livraste-los.
A Vós clamaram nossos pais; clamaram e não foram confundidos .
Introdução
A preparação litúrgica para a festa da Páscoa se divide em muitas partes. Inicia-se com o tempo da Septuagésima (preparação remota que compreende três domingos) e se prolonga com o tempo da Quaresma propriamente dito (que compreende quatro domingos). Com a aproximação da festa principal do ano litúrgico nos deparamos com o tempo da Paixão (preparação imediata com dois domingos: 1º Domingo da Paixão e Domingo de Ramos). No fim desta última semana - Semana Maior- estão os dias mais importantes do ano: Quinta Feira Santa (Instituição da Eucaristia), Sexta feira Santa (Morte de N. Senhor), Sábado Santo (Vigília Solene) e o Domingo da Ressurreição.
Uma análise de todos os textos litúrgicos seria de grande interesse, porém, nos parece importante, antes de entrar em tal análise, fazer o leitor encontrar os pontos de unificação de todos esses elementos. A prática das penitências quaresmais é certamente um dos principais. Queremos no presente artigo atrair a atenção sobre este ponto tão crucial. (Continue a leitura)
(Esta conferência foi proferida na Jornada de Formação do MJCB em 2012. Apresentamos aqui a sua transcrição).
Pe. Luiz Cláudio Camargo FSSPX
A obra que estamos propondo realizar em nossos priorados consiste exatamente na idéia da universidade: versus unum. A universidade é a reunião de todas as faculdades, iluminadas pela Teologia. A nossa vida precisa alcançar essa unidade mais elevada, e o lugar privilegiado para isso, na situação em que nos encontramos hoje, são os nossos priorados.
Quero comparar aqui os elementos normais da vida intelectual — o ato, a estrutura da vida interior — com a sua deformação. Gostaria de comparar a vida intelectual com a vida de curiosidade, e daí tentar tirar os conselhos práticos para a vida especulativa.
Pode-se dizer que há duas partes no esforço intelectual. Em primeiro lugar, há o que se pode chamar de studium, o estudo. Em latim, a palavra studium significa esforço. É interessante notar que toda a primeira parte, a do esforço intelectual, por causa da união e da relação entre o corpo e a alma, é necessária para se chegar ao ato específico em que a inteligência enxerga o seu objeto. Ela exige um esforço muito grande. O modo pelo qual chegamos ao conhecimento é um modo laborioso, chamamo-lo de modo racional. É necessário ruminar até se chegar ao saber. Em seguida, temos um ato próprio, específico, e o efeito próprio pelo qual a inteligência vê o seu objeto, alcança-o, pode ser chamado de gaudium. Então, alcança-se a idéia e a alma repousa. Leia mais
Pe. Luis Cláudio Camargo, FSSPX
[Nota da Permanência: O texto seguinte é a transcrição de uma conferência do autor dada na Capela Nossa Senhora da Conceição, Pendotiba/RJ, em 24 de novembro de 2012, sobre a natureza do homem e da mulher na obra "Romeu e Julieta". Optamos por conservar o estilo oral]
Breve introdução sobre o catolicismo de Shakespeare
Por que Shakespeare? Shakespeare foi um católico que viveu no período da perseguição anglicana. Não terei tempo aqui para apresentar as provas do seu catolicismo, mas acreditem em mim. Chegou-se a dizer que ele foi um católico covarde; isso não é verdade. A sua família, tanto paterna como materna, está no centro da resistência católica contra a rainha Isabel I, “A Sangrenta”. Shakespeare presenciou a execução de seu confessor, o jesuíta São Roberto Southwell, que fora preso. Naquele período, ser católico era crime de alta traição (lesa-majestade), cujo castigo era a pena máxima denominada Hanged, drawn and quartered. Primeiro as vítimas eram enforcadas – mas sem que o condenado morresse –, em seguida lhes abriam o ventre, arrancavam as vísceras e depois cortavam os braços e as pernas. Era uma técnica satânica em que se tentava manter a pessoa viva com o intuito de que sofresse o máximo possível. Por fim, somente depois de a vítima estar morta, cortavam-lhe a cabeça. Era essa a pena aplicada aos católicos. A quantidade dos mártires isabelinos é enorme. A tortura, o grau de horror que sofreram foi algo terrível. Shakespeare pertencia a uma família de resistentes católicos. Seu pai fora preso por ser católico e não frequentar o rito reformado. Os católicos viviam clandestinamente, e na casa de Shakespeare celebrava-se uma das missas clandestinas de Londres.
Linhas de interpretação nas obras de Shakespeare
Nas obras de Shakespeare há quatro linhas de interpretação.
A primeira linha incide sobre a maneira como que ele escreve. Todos os grandes autores se deslumbram com a perfeição do movimento das linhas do enredo, a harmonia, o ritmo com o qual ele conduz as linhas do drama apresentado, a fineza da ironia nas palavras utilizadas. Shakespeare é intraduzível, pois usava muito o recurso que em inglês se chama pun, isto é, jogo de palavras. Ele é um mestre no uso desses jogos.
A segunda linha de interpretação incide sobre o que podemos chamar de drama humano, as considerações mais altas da vida do homem. Um dos temas mais recorrentes são os mecanismos que usamos para nos esconder, os mecanismos de hipocrisia com os quais enganamos o próximo e a nós mesmos. A fineza com que analisa essa série de mecanismos gera uma identificação do leitor com os personagens. Tomamos um susto quando nos vemos caricaturados no papel, pois as descrições são muito finas, claras, evidentes, e demonstram que o autor tinha um conhecimento incomum da alma humana, muito elevado e profundo. Ele trata da nobreza, do heroísmo, do amor verdadeiro, do amor falso, da sensualidade, da humildade verdadeira e de todas as grandes virtudes.
A terceira linha de interpretação das obras de Shakespeare, a mais velada, porém evidente para os católicos que sofriam a perseguição naquele momento, diz respeito à história da Inglaterra durante as perseguições. Os católicos entendiam perfeitamente a linguagem figurada e metafórica que o autor usava.
A quarta linha de interpretação é uma autobiografia. Ele se retrata, mostra e revela nos seus livros. Quem conhece a sua biografia e as circunstâncias histórias e lê as obras percebe que ele faz uma confissão, conta a sua vida, pecados e virtudes. É admirável. Ele consegue colocar essas quatro linhas de inteligência na mesma obra, e fazer com que as palavras se encaixem exatamente para cada uma delas, demonstrando genialidade sem igual. Comparo essa genialidade literária à genialidade musical de Bach.
Shakespeare portanto não é um autor fácil. Em razão da complexidade dos textos o leitor pode equivocar-se facilmente: por ex., na terceira linha de interpretação, a sua intenção é enganar os leitores não católicos. Ele escreve ao modo renascentista, utilizando-se de todas as más inclinações e a aparente futilidade renascentista. Nosso Senhor, citando Isaías, diz: “Para que vendo, não vejam e, ouvindo, não ouçam nem compreendam”. Shakespeare consegue concretizar tal ideia: ele raramente cria um enredo original – algo que certamente poderia fazer, pois era dotado de genialidade extraordinária – mas preferia sempre histórias que estavam “na moda” (contos, histórias antigas), a fim de não chamar atenção, pois às vezes queria denunciar algo terrível; quanto menos chamasse a atenção sobre o que estava dizendo, melhor. Romeu e Julieta, por ex., é uma obra que já existia, emprestando-a de um autor italiano, se não me engano. Juntamente às linhas de interpretação, estão os períodos da vida de Shakespeare.
Períodos da vida de Shakespeare
Podemos marcar três períodos muito claros na vida de Shakespeare.
O primeiro período (1590-1601) é o da adolescência e começo da vida adulta, em que se nota um catolicismo muito valente, no entanto há uma euforia ingênua, como se dissesse: “Já vencemos, tudo é fácil”. Romeu e Julieta data dessa época. A história dos jovens vencidos, que venceram apesar de perseguidos, e cuja morte motivou a união das duas famílias inimigas, transmite uma mensagem aos católicos: “Não se preocupem, em breve retomaremos o poder, e recuperaremos a coroa, estamos sendo perseguidos, muitos dos nossos estão sendo executados, mas isso é bobagem, em breve tudo ficará bem, já vencemos, já ganhamos.”
Por ser muito brilhante e suas obras muito admiradas, ele foi rapidamente associado à Companhia de Teatro Real (The King’s Men). A rainha percebeu que ele era católico, mas o achou inofensivo. Ela admirava tanto as obras dele que não conseguia lhe fazer mal. Quem estuda com cuidado a vida da rainha Isabel I percebe que ela dava sinais claros de possessão diabólica, era uma figura terrível. Poderíamos dizer que esse primeiro período é um pouco mais humanista que os seguintes e um pouco mais otimista, semelhante ao otimismo de um noviço que entra no mosteiro e pensa: “Já cheguei à sétima morada.” Desse período são as obras Henrique VIII, A comédia dos erros, A megera domada, Os dois fidalgos de Verona, Ricardo III, Rei João, Tito Andrônico, Trabalhos de amor perdidos, Romeu e Julieta, Ricardo II, Henrique IV, Henrique V, e Sonhos de uma noite de verão – obra esta que despertou a atenção de Isabel, que começava a suspeitar dele, após o que Shakespeare escreve a sua obra mais renascentista, que é quase uma adulação à rainha, a fim de desviar as suspeitas.
O segundo período (1601-1608), podemos dizer que é o período da crise. A perseguição não terminava, o número de mártires só aumentava e os católicos começavam a se cansar. Morre a rainha Isabel e há certa tranquilidade. Sobe ao trono Jaime I, casado com uma católica, e os católicos sentem-se aliviados. É desse período a obra Tudo bem quando termina bem; o título evidencia o alívio sentido após a morte da rainha. Mas os calvinistas puritanos se lançam contra Jaime I, o qual, diante da instabilidade do trono, retoma a perseguição aos católicos de forma ainda mais violenta que Isabel. É um período de perplexidade e desânimo entre os católicos, que chegam à pobreza, à miséria, perdendo os bens; são despojados e desamparados. Dois tios de Shakespeare, irmãos de sua mãe, são executados como traidores da pátria, por se terem envolvido na Conspiração da Pólvora, uma armadilha preparada pelo governo inglês, com o intuito de que os católicos tentassem assassinar o rei e assim a coroa pudesse ter a oportunidade de retomar as perseguições. Os católicos caíram como bobos. Até hoje se celebra o dia da Conspiração da Pólvora, em que o rei se salvou dos “pérfidos” católicos.
A obra emblemática desse período é Hamlet. O príncipe Hamlet é o próprio Shakespeare, que se pergunta: por que lutar contra a corrupção do reino da Dinamarca? A minha mãe (a Inglaterra) abandonou meu verdadeiro pai (a monarquia católica) e se juntou a essa monarquia corrupta e vil. Os reis são irmãos (Rei Hamlet e Rei Cláudio), mas há uma diferença infinita entre os dois, pois um deles é assassino e perverso. Eu, filho da pátria inglesa, que devo fazer? O espírito do meu pai pede que eu ponha as coisas no lugar, que devo fazer? “The time is out of joint/ O cursed spite, That ever I was born to set it right: O tempo está fora do seu eixo/ Ó desgraçada ventura de ter nascido para colocá-lo de volta no lugar.” Parece-me a descrição da vida de Monsenhor Lefèbvre, mas se trata dele, da tentação de suicídio que ele sofre – é autobiográfico.
Em Otelo, a esposa fiel ama o marido, no entanto, movido pelo pérfido Iago, o marido começa a se deixar influenciar até que a mata. Nessa obra ele mostra a fidelidade dos católicos, fiéis à Igreja, fiéis à Inglaterra, e que morrem fiéis. Desse período são também Antônio e Cleópatra e Coriolano.
O terceiro período (1609- 1623), a sua última época, pode ser chamado de o período da virtude teologal da esperança. A obra emblemática desse período é A tempestade, na qual um rei traído e abandonado tem a ocasião de se vingar e, no entanto, perdoa. É uma mensagem para os católicos: “Prestem atenção, a nossa solução é sobrenatural, não vamos recuperar o reino com a força dos braços, mas que a nossa resistência não nos faça perder o céu; resistamos, mas façamo-lo com as armas mais altas, não devemos cometer o mesmo erro que eles; se nos odeiam, nós os perdoamos.” Essa é a grande solução dele, é quando o seu coração descansa. Ele morre como católico fervoroso.
Romeu e Julieta
Essa obra está mais centrada nas duas primeiras linhas de interpretação. A briga entre as famílias é aparentemente o seu aspecto central, por ser a causa da morte dos jovens esposos, mas na verdade é um problema secundário, a tela de fundo.
A ideia central que Shakespeare quer abordar em Romeu e Julieta é uma comparação entre três homens: Frei Lourenço, Romeu, e Mercúcio. Frei Lourenço é a figura do homem sábio, Romeu é a figura do homem afetivo e Mercúcio a figura do homem carnal. São descritos de modo exímio.
Mercúcio, jovem rico e inteligente, parente do príncipe, parece estar afastado do antagonismo das duas famílias de Verona e, no entanto, é a primeira vítima da obra. As suas qualidades, como nobre que era, não lhe dissimulam os vícios profundos. Desbocado e libertino, contente com a vida viciosa, olha a mulher como simples ocasião de prazer; é cínico e burlesco, consegue desprezar absolutamente tudo ao redor, leva a desordem até a morte, e morre insultando. A morte dele é uma morte impenitente: a morte de um homem carnal.
Romeu é a figura do homem afetivo: trata-se dos sentimentos, pois estamos no campo das paixões. Certo, não é um homem carnal, mas ainda não é um homem sábio. Seus afetos são nobres, normalmente, mas ele é capaz de ira irracional, medo irracional e amor irracional, embora o seu amor seja apresentado com nobreza.
O campo dos afetos é enorme, é um mar infinito e sem fundo. É possível que o homem afetivo se mantenha flutuando na altura de sentimentos nobres, mas qualquer movimento, qualquer correnteza forte arrasta-o para tal ou qual paixão. Tanto o homem carnal como o homem afetivo não alcançam a realidade, não conseguem descobrir as coisas como são. O desespero de Frei Lourenço consistia em tentar fazer Romeu entendê-lo, mas Romeu não o entendia, não era capaz de fazê-lo.
Frei Lourenço é a figura do homem medieval: um frade franciscano, sábio, conhecedor dos segredos das ervas, do drama de seu povo, profundo entendedor das almas, da situação histórica e das famílias. Ele é admirado, mas não é seguido. Pedem-lhe conselhos, mas não lhe obedecem. É o Renascimento diante da Idade Média, o qual olha esta com certa admiração, mas lhe diz: “Já passou, agora estamos em nível mais alto.” Romeu é a figura do homem renascentista.
Tendo em mãos essa chave de leitura, é muito interessante notar a relação entre os três personagens. Frei Lourenço, por exemplo, nunca fala com Mercúcio, e Mercúcio não faz nenhuma alusão a Frei Lourenço. Romeu fala com Frei Lourenço, Frei Lourenço fala com Romeu, Romeu fala com Mercúcio e Mercúcio fala com Romeu.
Outro ponto interessante, sublinhado na obra, é que Frei Lourenço entende muito bem Romeu e Mercúcio, ou seja, de cima para baixo o entendimento é possível. Porque está acima, Frei Lourenço entende-os, compreende os afetos de Romeu, quer conduzi-lo, protegê-lo e salvá-lo, mas Romeu não entende Frei Lourenço. De baixo para cima não é possível entendê-lo. Romeu não consegue sentir a sabedoria de Frei Lourenço, mas Frei Lourenço consegue entender os afetos de Romeu.
Romeu olha Mercúcio com benignidade e amabilidade, mas nunca entra no seu campo. Romeu é nobre, e a nobreza dos seus sentimentos – superiores aos sentimentos de um homem carnal – convence-o de que está à altura de Julieta. Shakespeare queria mostrar justamente que Romeu não estava à altura de Julieta. Romeu era um homem afetivo, e só o afeto não basta para que um homem alcance a sua esposa. Nem o homem carnal nem o homem afetivo são capazes de alcançar a esposa.
A insensatez de Romeu diante de Frei Lourenço é muito impressionante. Romeu merecia uma surra, não é um herói de modo algum. O cinema o retrata como galã de cabelo ao vento, mas é um homem desprezível, pois não chegou a ser homem, e é isso o que Frei Lourenço vai afirmar quando, de pé, diz a Romeu, que está jogado no chão tentando suicidar-se, que a solução para os seus dramas é a filosofia; estas são as palavras centrais da obra. Etimologicamente, filosofia significa amor à sabedoria, ou seja, sair do campo afetivo e chegar a ser homem verdadeiro, alcançar a altura da natureza humana. E a resposta de Romeu para Frei Lourenço é esta:
“Põe a filosofia numa forca, a menos que a filosofia possa fazer uma Julieta, uma cidade mudar, ou deixar írrito um decreto. Se não, de nada vale, para nada pode servir-me. Não me fales nisso (...) Falar não podes sobre o que não sentes .”
(É claro que se pode falar do que não se sente; não se pode é sentir aquilo que não se pensa. Justamente por não sentir os afetos de Romeu e por saber domar os próprios afetos, Frei Lourenço lhe entende perfeitamente.)
“Se, como eu, fosses moço; se Julieta te pertencesse, por se ter tornado tua esposa há uma hora; se tivesses morto Tebaldo, e louco, apaixonado como eu te visses: bem, assim podias falar, arrepelar a cabeleira, jogar-te ao solo como o faço agora, para dar a medida de uma cova que ainda vai ser aberta.”
Frei Lourenço lhe responde:
“Detém essa desesperada mão. Acaso és homem? Tua postura o afirma, mas as lágrimas são de mulher, mostrando esses teus atos desesperados o furor selvagem dos próprios animais. Ó deformada mulher, sob a aparência de um mancebo, ó animal deturpado, sob a forma de ambos: pasmado estou. Pela minha ordem sagrada: sempre fiz outro juízo de teu temperamento. Não mataste Tebaldo? Agora queres suicidar-te e, assim, matar a tua própria esposa, que de tua vida vive, revertendo contra ti próprio esse ódio amaldiçoado?”
Essa resposta de Frei Lourenço é a demonstração de como o homem sábio enxerga o homem afetivo. Nós somos indulgentes demais: não sendo homem carnal parece-nos que já basta, parece-nos que já se é homem. Não é verdade.
Aqui tocamos o ponto central desta conferência: a obra do homem e a obra da mulher. A ideia é muito clara: a esposa vive dentro da alma do esposo, e a esposa vai estar na altura em que o esposo estiver. Se o esposo se matar, ele matará também a esposa. De fato, Julieta se suicida.
“(...) Por que insultas o berço, o céu e a terra? O berço, o céu e a terra unidos se acham em ti, e de uma vez perdê-los queres? Ora, envergonhas tua forma, o espírito, amor, que em barda tens, como usurário, sem que nada uses no seu vero emprego para te ornar a forma, o amor, o espírito. Tua nobre figura é como imagem de cera, se o vigor viril lhe falta; teu amor tão prezado, oco perjúrio que mata o amor que proteger juraste; espírito, esse ornato da postura, como do amor, se encontra deformado pela conduta de ambos, como pólvora no frasco de um soldado inexperiente (...)”
A razão está submetida aos afetos, e é capaz de explodir e lhe conduzir à morte.
“(...) que por tua própria ignorância explode, com tuas próprias armas desmembrando-te. Vamos, homem: levanta-te! Está viva tua Julieta, por quem te achas quase no ponto de morrer. Estás com sorte. Tebaldo quis matar-te; a morte deste-lhe. Nisso foste também mui venturoso. A lei se mostra tua amiga, a pena de morte atenuando para exílio: outra ventura. Sobre o dorso um fardo de bênçãos te caiu. Com seus mais ricos atavios te vem fazendo a corte sempre a felicidade; mas no jeito de um rapaz não polido e caprichoso, com a sorte e o amor amuado te revelas. Toma cuidado! Quem assim procede, acaba sempre mal."
Shakespeare consegue descrever a estrutura da alma humana e a grande obra do homem. É necessário chegar à sabedoria para chegar a ser homem, eis o ponto central de Romeu e Julieta. Só quem chega à verdadeira sabedoria merece o título de homem. Somente na sabedoria é possível buscar a esposa. É necessário subir a rude escada do balcão de Julieta para estar à altura dela.
A mulher, se me permitem a expressão, tem uma natureza que poderíamos chamar de espelho. Como o que define a mulher é a sua maternidade, quer física ou espiritual, há nela um aumento do campo afetivo, pois este é um elemento necessário para o cumprimento da sua obra. A mulher tem, em razão dessa natureza afetiva, uma capacidade de percepção do particular, do concreto, muito superior ao homem – abstrato.
O homem deve vencer os seus afetos e alcançar a abstração. Se o homem não transcender o concreto e o particular, não realiza a sua obra. A mulher, por sua vez, deve, tal como um espelho, refletir o abstrato em concreto e particular.
O homem tem uma visão do fim muito mais clara que a mulher, que enxerga com mais clareza os meios. A grande obra do homem, depois de chegar à sabedoria, é transmiti-la. O grande meio de transmissão dessa sabedoria é a esposa, é a natureza feminina, que consegue transformar o que vê no esposo em instituições concretas e tangíveis.
O esposo tem uma ideia abstrata do que é a autoridade paterna ou a relação familiar. A esposa deve pensar em que lugar da casa a mesa vai estar para que a relação familiar funcione, que lugar ela vai ocupar na mesa para que a autoridade paterna seja exercida quando a família estiver reunida, ou seja, ela precisa transformar os ideais do marido em instituições práticas. É nesse sentido que Frei Lourenço diz que a esposa estava dentro de Romeu.
Vocês poderiam acusar-me de estar diminuindo a atividade feminina. Não, de modo algum. O homem é incapaz da sua obra sem a mulher. E a mulher é incapaz da sua obra sem o homem.
Poderiam perguntar-me: “E quanto ao sacerdócio?” Pois bem, a Igreja é feminina. Diz-nos o direito canônico: “Não se pode usar a batina suja; é preciso barbear-se, etc.”; esta expressão é a mais feminina possível da Esposa de Cristo, que transforma o que vê na alma do Esposo em costumes, instituições e obras. Mas é preciso que a ideia do esposo seja clara, específica, explícita, que ele saiba o papel que a esposa deve cumprir, o que é o meio, o que vai em direção ao fim e o que desvia do fim; assim, ele deve pronunciar-se: “Isso sim, isso não.” É preciso que o fim ilumine constantemente os meios, ou seja, é preciso olhar o fim e concretizar os em meios. A grande obra são os filhos: a transmissão por meio da esposa.
A mulher consegue facilmente perceber o que está acontecendo na alma do filho. Todavia, se perde de vista o fim, ela como que acelera em ponto morto, porque os meios não passam de meios, e perdem importância, se o fim não os ilumina. Se se perde a referência do fim e deixa-se de ser iluminado por ele, bem, tudo passa a ser igual. E, quando há ausência da iluminação do fim, o mecanismo de defesa feminino é a multiplicação dos meios.
O grande perigo do homem é não alcançar à sabedoria, e o grande perigo da mulher é a destruição e deformação do campo afetivo, é a perda da fineza afetiva, por carência de virtude e descontrole dos afetos. Que o homem não tenha afeto é uma deformação, e é errado, porém não é tão grave. Uma moça que destruiu os próprios afetos sofreu o que podemos chamar “masculinização”. Na sociedade atual há a destruição dos afetos ou a exacerbação deles, de tal modo que não podem ser iluminados pela razão. Há portanto destruição de ambos os lados.
Iluminados pela sabedoria, os afetos encontram o lugar e o sentido verdadeiros, são domados; os afetos são como cavalos puxando a carruagem, mas sem a iluminação superior da inteligência, são como cavalos selvagens, não domados, que seguem direções opostas: é a destruição da pessoa.
(Originalmente publicado na Revista Permanência, 270)
Em suas aparições a Santa Margarida Maria, Nosso Senhor insiste que o culto a seu Sagrado Coração seja revestido do aspecto de reparação. Seus devotos devem não somente descobrir seu Amor insondável, mas também oferecer reparação pelas injúrias, friezas e ingratidão com que Ele é ofendido. De fato, o liberalismo, desconhecendo a submissão que o homem deve a Deus, põe na liberdade do homem o princípio de todas as leis da sociedade moderna. O liberalismo quer que o próprio Deus se submeta à liberdade do homem. Que blasfêmia!
A essência da devoção ao Sagrado Coração é o reconhecimento de que a submissão humilde do homem à lei de Deus é seu maior bem, e que o homem deve submeter-se não como um escravo ao seu tirano, mas como um filho que reconhece o amor de seu pai em suas disposições e ordens. A devoção ao Sagrado Coração é, portanto, essencialmente antiliberal.
As reclamações de Nosso Senhor sobre os jansenistas parecem definir nossos modernistas atuais: “Eis aqui o Coração que tanto amou os homens, que nada poupou até esgotar-se e consumir-se para dar-lhes testemunho do seu amor, e em paga não recebe da maior parte deles mais do que ingratidão, pelos desprezos, irreverências, sacrilégios e friezas que têm para comigo neste Sacramento de amor”. Irreverências, sacrilégios, friezas: Nosso Senhor parece aqui estar descrevendo a Missa Nova!
O modernismo é o esforço de teologia para justificar o sacrilégio do homem que se põe no lugar de Deus. A devoção ao Sagrado Coração de Jesus é a descoberta do amor de Jesus Crucificado e de como devemos obedecer a Ele.
I – Introdução
A devoção ao Sagrado Coração de Jesus foi apresentada oficialmente ao mundo católico pelo Papa Leão XIII, em 25 de maio de 1899, como meio extraordinário de salvação para a humanidade. “Hoje se oferece aos nossos olhos” – disse então o Papa – “um grande sinal de salvação, sinal todo infuso de divino amor e de suprema esperança. É o Sagrado Coração de Jesus, encimado pela Cruz, cercado de espinhos e resplandecente de uma claridade esplêndida, em meio às chamas de seu amor. N’Ele é necessário depositar toda a nossa confiança; a Ele é necessário pedir e esperar a salvação”.
Foi longo o caminho que essa devoção percorreu até chegar a uma proclamação tão solene e explícita por parte do Vigário de Cristo.
Certamente ela expressa a própria essência do catolicismo. Mas existe também, sem dúvida, algo de novo nela. Dom Columba Marmion, no capítulo que dedica à devoção do Sagrado Coração no seu livro “Jesus Cristo em seus mistérios”, mostra bem como ali se dão os dois aspectos de continuidade e de novidade.
Podemos dizer que o primeiro devoto do Sagrado Coração de Jesus foi o apóstolo São João, que ouviu suas palavras comovedoras na Última Ceia, e que o viu ser ferido pela lança e dele jorrar sangue e água.
Na Idade Média, o amor à santa humanidade de Nosso Senhor professado pelos místicos incluía, certamente, o aspecto central dessa devoção. Vemos São Bernardo inflamado em sua pregação, ouvimos as conversas íntimas entre Nosso Senhor e Santa Gertrudes, vemos o admirável Pobre de Assis reproduzir as chagas da Paixão do Salvador em sua própria carne.
São Boaventura assim convidava as almas: “Para que do lado de Cristo, adormecido na Cruz, se formasse a Igreja e se cumprisse a Escritura que diz ‘farão lamentações sobre Aquele que traspassaram’ (Zc 12, 10), um dos soldados o feriu com uma lança e abriu-lhe o lado. Isto foi permitido pela divina Providência, a fim de que, brotando sangue e água da ferida, se derramasse o preço de nossa salvação, o qual, manando do arcano do Coração, desse aos sacramentos da Igreja a virtude de conferir a vida da graça, e fosse, para os que vivem em Cristo, a taça levada à fonte viva que mana para a vida eterna. Essa é a mesma lança do pérfido Saul – figura do povo eleito castigado – que, errando o golpe, se cravou por divina misericórdia na parede, e abriu um buraco na pedra e um furo no muro. Aparece pois, alma amiga de Cristo, e sê como a pomba que faz seu ninho na parte mais alta da entrada da caverna: ali, como um pássaro, encontrarás morada; ali, onde o rouxinol de amor casto esconde os filhotes; põe ali tua boca para que bebas as águas das fontes do Salvador. Esta é a fonte que jorra no centro do paraíso e que, dividida em quatro rios, deságua nos corações devotos, rega e fecunda toda a terra.”
Mas essa devoção, que até então estava reservada aos altos místicos e contemplativos, encontrou uma nova expressão quando Nosso Senhor tomou, Ele próprio, a iniciativa de estendê-la a todos os fiéis. O que até então fora um segredo das almas mais santas e penitentes passou a ser uma oferta de amizade íntima a todos os católicos.
II – Divina Estratégia
Muitas devoções nascem espontaneamente do espírito do povo católico. Aparecem, crescem e se difundem, movidas pelo interesse e pela admiração dos fiéis. Mas a devoção ao Sagrado Coração de Jesus não foi assim. Não foi uma devoção espontânea, mas sim uma devoção ensinada e propagada pelo Céu. Serão as diversas intervenções de Nosso Senhor, Ele mesmo, que farão com que essa devoção se difunda de modo tão admirável.
Ela é uma resposta do Salvador à perfídia do humanismo renascentista, que se propôs a abalar a lei de Deus e de sua Igreja. Essa oferta é uma vingança amorosa diante do protestantismo e de seu sucedâneo, o Jansenismo. Nosso Senhor propõe essa devoção como um remédio para os males modernos, como um antídoto contra o espírito da revolução.
Assim considerada, essa devoção poderia parecer uma coisa antiga e sem importância, ou que, ao menos, teve sua importância no século XVII, mas já não mais hoje em dia. Que nos importam hoje as disputas protestantes? Que nos interessam as querelas dos jansenistas? Será então esta devoção algo fora de época? Pensar assim seria um engano grave da nossa parte. A crise modernista, que vivemos hoje com o Vaticano II e todas as suas reformas, é a continuação em linha direta da crise do protestantismo e do jansenismo, da revolução francesa e da revolução comunista.
Se as idéias são as mesmas, se a revolução é a mesma, podemos pensar, sem medo de engano, que o remédio para sua cura será exatamente o mesmo.
Qual será o plano do divino Salvador ao querer difundir deste modo a devoção ao seu Sagrado Coração? Qual será sua intenção ao revelar de modo tão amplo os segredos de sua divina amizade? E como esta devoção pode ser o antídoto para crise tão aguda?
Nosso Senhor quer curar os males dessa peste que se difunde entre nós usando o remédio contrário. A peste negra que dizima a cristandade desde o início do Renascimento é o egoísmo satânico que propõe a própria liberdade como princípio absoluto de todas as relações do homem com Deus. O liberalismo insolente que nascerá desse espírito malsão quer transformar essa rebelião contra Deus em lei e em fundamento da sociedade. E assim o fez.
O remédio apresentado pelo Salvador será a manifestação do Amor que o moveu a encarnar-se e a morrer na Cruz por nós. Amor desinteressado, amor generoso, capaz de curar todos os nossos males: “Eis aqui o Coração que tanto amou os homens e que é por eles tão ingratamente correspondido!”.
Ingratidão! Esse é o nome próprio da nossa sociedade moderna. Esse é o rosto verdadeiro da revolução. Nosso Salvador propõe a contemplação e o estudo do seu Amor como o grande remédio capaz de curar-nos dessa ingratidão.
Vejamos bem: Nosso Senhor não reclama da nossa desobediência. E bem que poderia reclamar. Poderia repreender-nos pelos nossos pecados. São enormes e sem número! Poderia lançar-nos ao rosto nossa malícia. Entorpecemos tudo aquilo que tocamos! Mas não, nada disso. Nosso Senhor aparece repetidas vezes para reclamar da nossa ingratidão.
II – Santa Margarida Maria
Em meio à tormenta do século XVII, entre a surda conspiração dos inimigos de seu reinado, Nosso Senhor elege como instrumento de seus desígnios uma religiosa tímida e escondida na clausura. Ela será o general que deverá, como nova Joana d’Arc, conduzir a batalha da cristandade.
Margarida Maria Alacoque nasceu em 22 de agosto de 1647, em Verosvres, na Borgonha. A formação da nossa santa foi marcada especialmente pelo sofrimento. Dos quatro aos sete anos, ou seja, entre 1652 e 1655, foi morar no castelo de sua madrinha, Madame de Corcheval, dama nobre da região, para ali começar, em ambiente sereno e austero, sua formação. Mas sua educação teve de ser interrompida quando Madame de Corcheval morreu. Sua afilhada então voltou à casa paterna. Em 1655, mesmo ano da morte de sua madrinha, falecem também sua irmã mais nova e seu pai, Cláudio de Alacoque. Sua mãe, Felisberta, colocou seus filhos maiores em colégios, e Margarida como interna no convento das Clarissas mitigadas de Charolles.
No convento das Clarissas, Margarida contraiu uma doença grave, sendo necessário mandá-la de volta para sua casa. Lá permaneceu cerca de quatro anos prostrada na cama, sem poder se levantar. Os médicos não sabiam mais o que fazer quando ela resolveu consagrar-se à Santíssima Virgem, prometendo-lhe que seria sua filha. “Bastou que eu fizesse o voto” – declarou Margarida – “e logo fui curada da doença com a nova proteção da Santíssima Virgem, que, tomando posse tão completa do meu coração, e tendo-me como sua filha, me governava como coisa que lhe era consagrada; me repreendia pelos meus erros e me ensinava a cumprir a vontade de Deus.”
Em sua casa, outra situação muito dolorosa a esperava. Sua mãe tinha deixado a gestão do seu patrimônio por conta de seu cunhado, Toussaint Delaroche, homem avarento e de temperamento irritável. Ele, sua mulher e sua mãe tomaram as rédeas da casa e começaram a tratar a senhora Alacoque e seus filhos como se fossem empregados. A santa suportou durante anos a semiescravidão a que era submetida pelas injustiças do tio. Às vezes tinha até que mendigar pão aos vizinhos. A casa materna se transformou numa prisão torturante. “Deus me deu tanto amor à Cruz que não consigo viver um momento que seja sem sofrer, mas sofrer em silêncio, sem consolo, alívio ou compaixão, e morrer com este Soberano da minha alma, sob o peso de toda sorte de opróbrios, dores, humilhações, esquecimentos e desprezos...”
Diante de seu desejo constante pela vida religiosa, e superadas as intenções de casar a jovem Margarida, sua família quis enviá-la a um convento das Ursulinas onde já vivia uma prima sua. Santa Margarida Maria – que tinha muito carinho por essa prima – deu uma resposta em que transparece seu grande desejo de perfeição: “Olha, se eu entrar no teu convento, será por amor a ti. Mas prefiro ir a um convento onde não tenha parentes nem conhecidos, para ser religiosa somente por amor a Deus.” Uma voz interior já a tinha avisado: “Não te quero lá, mas sim em Santa Maria”, que era o nome do convento das visitandinas de Paray-le-Monial. No entanto, as pressões familiares para que escolhesse as Ursulinas eram fortes. Doenças de sua mãe e de um dos seus irmãos a obrigaram de todas as maneiras a adiar seus planos de vida religiosa. Em certa ocasião, um sacerdote franciscano hospedou-se na casa dos Alacoque durante uma missão. Santa Margarida aproveitou a oportunidade para fazer uma confissão geral. Ao conhecer o alto grau de virtude e os desejos de vida religiosa da jovem, o sacerdote achou que ela devia seguir sua vocação. O religioso então conversou com o irmão dela e o convenceu a mudar de atitude. Nossa Santa foi então finalmente aceita como noviça em 20 de junho de 1671, vestiu o hábito em 25 de agosto do mesmo ano, e fez sua profissão solene em 6 de dezembro de 1672.
Nosso Senhor vinha misteriosamente dispondo de Santa Margarida de tal modo que ela era, humanamente falando, o instrumento menos apto possível para a tarefa a que a destinara. De caráter tímido, de saúde frágil, religiosa sob obediência estrita sem poder dispor de si mesma, levando uma vida de clausura sem jamais sair de dentro dos muros do seu convento, e que morreu antes de completar 45 anos, ela deveria ser o grande apóstolo que difundiria no mundo inteiro a devoção ao Sagrado Coração. Disposição surpreendente de Nosso Senhor, que quis com isso mostrar que essa difusão era obra inteiramente sua.
O Papa Pio XII, depois de fazer a lista dos Santos que a precederam na prática e difusão da devoção ao Sagrado Coração, disse a esse respeito: “Mas entre todos os promotores desta excelsa devoção, merece um lugar especial Santa Margarida Maria Alacoque, que, com a ajuda de seu diretor espiritual, o beato Cláudio de la Colombière, e com seu zelo ardente, conseguiu, não sem a admiração dos fiéis, que esse culto adquirisse um grande desenvolvimento e, revestido das características do amor e da reparação, se distinguisse das demais formas de piedade cristã.”
Durante a curta vida da nossa santa, Nosso Senhor lhe revelou os segredos do seu Amor incompreensível. Suas palavras ficarão registradas na autobiografia que Santa Margarida foi obrigada a escrever. Esse texto foi o grande meio para dar a conhecer as intenções de Nosso Senhor ao lamentável século XVII. Além dessas páginas, nossa santa conseguiu lançar seu confessor, Cláudio de la Colombière, e sua superiora, a Madre Greyfié, na obra de pregação desta devoção. Eles serão os braços de Santa Margarida em sua difusão.
III – As Promessas
Para mover vontades tão atrofiadas, para aquecer corações tão gelados, o divino Mestre uniu promessas surpreendentes à manifestação de seu insondável Amor.
Não se sabe quem foi que fez a compilação das famosas 12 promessas do Sagrado Coração. Mas esse devoto atento procurou cuidadosamente em todas as palavras de Nosso Senhor a Santa Margarida as promessas que associou à devoção ensinada, e as apresentou numa única lista.
1ª Promessa: “Eu darei aos devotos do meu Coração todas as graças necessárias a seu estado”.
É curioso como uma promessa tão grande como esta seja lida e vista com tanto desinteresse por parte dos católicos. Vejamos bem o que é que Nosso Senhor promete. Neste mundo submetido à Revolução, neste mundo apóstata, cumprir com os deveres do seu estado é, na maioria das vezes, uma situação dramática, que exige uma virtude heróica. Que pai de família nunca se viu atormentado diante das infinitas influências que empurram seus filhos na direção contrária daquilo que ele lhes ensina? Que professor católico nunca se sentiu perseguido por ensinar a seus alunos as verdades mais simples e evidentes? Que médico católico nunca teve medo de ser despedido do hospital em que trabalha por não querer receitar meios desonestos de contracepção? Que advogado católico nunca se viu compelido a mentir e a aceitar procedimentos desonrosos em seu trabalho cotidiano?
E o que mais assusta é vermos como todos estes procedimentos inadmissíveis para um católico vão se tornando lei comum em nosso mundo contemporâneo. Temos a impressão de que as garras da revolução vão se apertando e fechando todas as saídas. A desobediência à lei de Deus se torna a lei dos homens.
Pois bem: é diante desse mundo ameaçador que Nosso Senhor oferece sua ajuda ao católico indefeso. Promete a quem se torne devoto de seu Coração todas as graças necessárias, sua ajuda, sua intervenção em cada uma destas situações tão prementes. Promete abrir-nos uma porta quando o mundo nos tiver fechado todas elas. Promete Ele mesmo nos conduzir, como Capitão experiente, quando o barco da nossa vida enfrentar os recifes modernos em meio à tempestade.
2ª Promessa: “Eu estabelecerei e conservarei a paz em suas famílias”.
Há de fato duas promessas nesta pequena frase. A primeira é o estabelecimento da paz nas famílias, e a segunda é a sua conservação. Paz significa tranqüilidade na ordem. Portanto, estabelecer a paz significa alicerçar a vida daquela família que se fez devota do Sagrado Coração na ordem da verdade. E esse estabelecimento, para que seja pacífico, exige que seja também tranqüilo, que essa ordem estabelecida seja constante e estável. Que família não tem um filho, um pai, um irmão que esteja longe de Deus e de sua Lei? Que família não vê sua vida interna católica constantemente ameaçada? Pois Nosso Senhor promete estabelecer a paz e conservá-la, mesmo diante dos mais ferozes ataques. Nosso Senhor se oferece como o fundador e conservador das nossas famílias!
3ª Promessa: “Consolarei meu devoto em todas as suas aflições”.
Consideremos bem estas palavras. O divino Mestre não diz que seus devotos não terão aflições. Não! Estamos em tempo de apostasia, em tempo de guerra. O mundo está em fogo, a Santa Igreja é perseguida e humilhada, e nós, devotos do Sagrado Coração, ainda queremos ter uma vida cômoda? Não! É necessário que tomemos parte nas dores da Santa Igreja, é preciso que subamos com Nosso Senhor ao Calvário. Mas – e aqui entra a admirável promessa – o Salvador promete que estará ao nosso lado, e de cada pequena injúria, dor ou sofrimento que tenhamos, Ele mesmo virá consolar-nos! Virá mostrar-nos como superar nossos males, como tirar deles um bem maior, como os bens deste mundo passam, como teremos uma felicidade eterna. Nos consolará melhor do que um pai amoroso faria por um filho único afligido. Ele dirá em nosso interior dulcíssimas palavras que iluminem nossa inteligência inquieta e sustentem nosso coração cansado.
É tão grande o bem deste consolo que quase desejamos aflições que nos obtenham a promessa do Divino Consolador!
4ª Promessa: “Serei para eles um refúgio seguro na vida e principalmente na hora da morte”.
Refúgio é um lugar protegido, onde o perigo que ameaça não pode alcançar-nos, onde os males que nos perseguem encontram um escudo que os impede de chegar até nós. É um lugar que está sempre à nossa espera, para o qual podemos fugir em meio às tormentas.
O demônio, quando decide perder uma alma, se prepara longamente, estuda todos os seus passos, descobre todas as suas brechas, conhece todas as rachaduras em sua vontade e nos seus afetos, considera todos os erros que há em suas idéias. O tentador, então, vai conduzindo seu perseguido até a arapuca em que o fará cair irreparavelmente. Muitas vezes o demônio, nesse processo funesto, aceita perder um pouco para ganhar muito. Quando vemos uma inteligência angélica tão aguda dedicada inteiramente à nossa ruína, quão grande não é o nosso receio? Nos sentimos como presas fáceis diante de um predador voraz. Nos sentimos profundamente desamparados.
Nosso Senhor promete ao devoto do seu Coração ser seu refúgio. Nem toda a sutileza, nem toda a força e veemência, nem toda a astúcia do inferno inteiro reunido poderão alguma coisa contra nós, se Nosso Senhor oferecer seu Coração como refúgio. Quando o demônio, a carne e o mundo jurarem perdê-lo na hora de sua morte, o verdadeiro devoto do Coração de Jesus verá este refúgio que se abre consoladoramente para ele!
5ª Promessa: “Derramarei bênçãos abundantes sobre todos os seus trabalhos e empreendimentos”.
Como tudo hoje é difícil para um católico! O mundo moderno, fruto da revolução, dispôs todos os elementos da vida cotidiana de modo contrário não somente à lei de Deus e da Igreja, mas também contra a própria natureza humana. As instituições, os costumes, o trabalho, as famílias, as diversões, os estudos, tudo está organizado na direção contrária à qual um católico deveria ir. Nossos empreendimentos mais simples, as aspirações mais legítimas se vêem contrariadas constantemente. O católico parece estar diante de um frustrante dilema: ou lutar em vão, ou deixar-se levar pela corrente.
Nosso Senhor promete aqui a seu devoto que Ele mesmo conduzirá suas empreitadas e projetos. As obras realizadas deste modo terão o selo do Coração de Nosso Senhor, e, mais que uma simples ajuda em sua realização material, elas terão uma luz de vida eterna. Serão benditas para nossa salvação.
6ª Promessa: “Os pecadores encontrarão em meu Coração uma fonte inesgotável de misericórdias”.
Quantas vezes os sacerdotes encontram, em sua vida de apostolado, pessoas de grande valor que gostariam de sair deste ou daquele vício ou pecado, e pessoas que admiram a vida católica e gostariam de levar uma vida de piedade e que, apesar disso, terminam seus esforços com a dolorosa constatação: “Não consigo!”. Gostariam de sair do estado de pecado em que vivem, mas são tantos os laços e vínculos que os prendem a essa situação que concluem seus desejos com o grito: “Eu quero, mas não tenho valor!”.
Nosso Senhor promete ao pecador que abraçar a devoção ao seu Sagrado Coração que Ele mesmo descerá ao poço das suas misérias e debilidades. Promete conduzi-lo pela mão entre suas cadeias e amarras até trazê-lo de volta à vida da graça. Nosso Senhor promete ter paciência com ele. Ele mesmo abrirá as portas, Ele mesmo aplanará o caminho espinhoso e desfará os obstáculos que se opõem à sua conversão.
7ª Promessa: “As almas tíbias se tornarão fervorosas pela prática desta devoção”.
Com que facilidade os padres, pastores de almas, caem na idéia de que seja normal que a maioria dos seus paroquianos seja medíocre. Não se pode esperar que toda a paróquia seja fervorosa! Não se pode pretender que a grande maioria dos fiéis seja piedosa e bem formada! Devemos dar-nos por contentes com ter algumas almas que estejam um pouco acima da média.
Embora o fundamento deste pensamento seja uma desconfiança no valor da graça de Deus, e de certo modo quase uma blasfêmia, a experiência mostra que não é menor a dificuldade de um pecador para sair de seu estado habitual de pecado do que a de um católico medíocre para aproximar-se de uma vida fervorosa. Algumas vezes, este último é mais difícil de converter do que um pecador público! São Pio X dizia que tinha mais medo da tibieza dos bons do que da perversidade dos maus.
Pois Nosso Senhor promete a estas almas envelhecidas, a estas almas que já não se admiram com o sagrado, que não se sentem atraídas pelo céu, que já não temem sua condenação, a elas Ele promete uma renovação. Promete que do tronco velho e ressecado do seu catolicismo sairá um broto vigoroso, que dará flores e frutos surpreendentes. Estas almas que tantas vezes ouviram a pregação da Verdade, e que a recobriram com a poeira da sua banalidade, encontrarão na devoção ao Sagrado Coração uma renovada juventude.
8ª Promessa: “As almas fervorosas ascenderão em pouco tempo a uma alta perfeição”.
Os doutores místicos ensinam que, chegada certa altura da vida espiritual, os caminhos começam a fazer-se difíceis e sutis. Todos eles dizem que a complexidade dessas regiões espirituais é tal que as almas que atravessam o escolho do que chamam de a terceira conversão e entram na região que Santa Teresa chamou de Quarta Morada necessitam imperiosamente da ajuda de um diretor espiritual que os guie e conduza. Santa Teresa explica como, nesse momento, a falta de ajuda de um confessor bem instruído é geralmente causa de um acovardamento por parte da alma generosa. Então, ou bem regressam a uma vida de piedade comum, ou bem ficam paralisadas nesse desamparo.
Nosso Senhor promete ao generoso devoto de seu Coração que Ele mesmo será seu “Confessor instruído” ou seu “Diretor espiritual”. Ele mesmo será o Guia experiente nesses caminhos difíceis.
9ª Promessa: “Minha bênção permanecerá sobre as casas em que for exposta e venerada a imagem do meu Sagrado Coração”.
A bênção e proteção de Nosso Senhor e sua ação misericordiosa não serão algo passageiro, não será uma graça recebida em uma ocasião especial e memorável, mas será uma fonte constante e sempre viva. Nosso Senhor promete estar presente Ele mesmo como um fogo que mantenha a vida verdadeira da família que se fizer devota de seu Coração.
Nesta promessa vemos uma delicadeza de Nosso Senhor para conosco. A devoção consiste essencialmente em uma disposição interior, na prontidão da nossa vontade ao serviço de Deus. Mas a disposição interior necessita de uma prática exterior, tanto para expressar-se quanto para apoiar-se. É muito difícil encontrar uma prática exterior que não termine por afogar e substituir a devoção interior. Nosso Senhor aqui nos ensina Ele mesmo uma prática que possa concentrar e manifestar a devoção a seu Coração amoroso. Propõe que a família ponha no centro da casa uma imagem em que Ele apareça com seu Coração visível, e que diante dessa imagem a família venha a realizar suas práticas de piedade. Essa imagem deve ser o centro da família. Essa imagem deve ser exposta e deve ser honrada.
Nosso Senhor ali não deixará de ouvir o pai de família que venha rezar diante de sua imagem pedindo ajuda nas aflições para manter sua casa; atenderá prontamente a mãe que reze pelo filho que dá passos perigosos em sua vida incipiente; enfim, Nosso Senhor promete que Ele mesmo se tornará o Chefe daquela família, e dela cuidará como sua.
10ª Promessa: “Darei aos sacerdotes que pratiquem especialmente esta devoção o poder de tocar os corações mais endurecidos”.
Sacerdotes conformes ao Coração de Jesus! Nosso Senhor lhes promete que terão o poder de trazer as almas para Deus. Nos tempos da cristandade sempre houve sacerdotes generosos que, aceitando o sacrifício de suas vidas, eram enviados às terras de infiéis e pagãos. Lá deviam trabalhar, lutar e pregar sem fruto – ao menos, sem fruto aparente. E eram necessárias várias gerações de missionários para que os primeiros frutos começassem a aparecer. Que coisa terrível para um sacerdote é ver-se revestido do poder de Nosso Senhor, ser capaz de curar e salvar as almas que se condenam e, mesmo assim, ver que elas resistem ao seu chamado! Como um médico que tem nas mãos o remédio mais precioso e eficaz, e vê o doente morrer por não querer tomar o remédio que lhe é oferecido. Nosso Senhor aqui apresenta aos sacerdotes que abraçarem a devoção a seu Coração, e que façam dessa devoção o princípio da sua ação sacerdotal, a promessa de que Ele mesmo vencerá a obstinação dessas almas enfermas.
Noutros tempos, essa promessa já seria admirável; hoje, porém, ela é mais do que um tesouro raro, pois, se antigamente eram os pagãos e infiéis que mantinham seus corações inacessíveis à pregação da Verdade, hoje o mundo inteiro se tornou terra de missão: nossos países, que eram católicos, hoje vivem no mais desaforado indiferentismo. E não há nada que os faça sair dessa inação. A mais sábia pregação, os mais comovedores exemplos não causam nem sequer o mais mínimo interesse.
Pois Nosso Senhor promete que, nestes tempos de ineficácia, Ele dará poder aos pobres padres perdidos neste deserto de infidelidade para converter os corações mais endurecidos!
Uma última palavra sobre esta promessa. Embora ela se refira aos sacerdotes, podemos pensar que o próprio fato de haver sacerdotes conformes ao Coração de Jesus já é um dom do Divino Salvador. Um Priorado que tenha bem estabelecida a devoção ao Sagrado Coração não deixará de ter muitas e sólidas vocações sacerdotais.
11ª Promessa: “As pessoas que propagarem esta devoção terão seus nomes escritos para sempre no meu Coração”.
No dia da nossa confirmação recebemos o título de Soldados de Cristo. Este título nos deixa – nós, homens modernos – indiferentes. Soldado? O que quer dizer esta palavra que, desde então, passou a ser a nossa obrigação diante de Deus? Um rei, um duque ou um conde, em outros tempos, eram também chefes dos seus exércitos, e governavam seu reino por meio dos seus homens. Ser soldado, então, era ser um braço do rei; era participar do governo das posses de seu senhor. Nós, quando fomos armados cavaleiros, quando recebemos nosso título de nobreza de Soldados de Cristo pelas mãos do bispo, recebemos sobre os nossos ombros a obrigação de velar pela honra da Santa Igreja, pela difusão da Verdade, pela expansão do Reino de nosso divino Senhor.
Podemos dizer que, ao abraçar a devoção ao Sagrado Coração de Jesus, fomos recebidos na intimidade da sua amizade. O que é ainda mais do que ser seus soldados. Pois bem: tal título exige que disponhamos dos nossos bens, das nossas forças, das nossas atividades na difusão e expansão dessa mesma devoção. Seria uma ingratidão sem nome de nossa parte se não fizéssemos assim. Que nosso Rei seja conhecido, amado e obedecido! Qual não será a nossa glória se houvermos contribuído de alguma forma para que o Reino do Sagrado Coração tenha conquistado novas almas?
Mas isto, que não é mais do que a nossa obrigação, é visto e recompensado por Nosso Senhor como se fosse uma obra de grande valor, e Ele promete aos que assim se dediquem à expansão da sua devoção que “terão seus nomes escritos em seu Coração”. Vejam bem o que nos diz o Salvador: Ele, tomando a iniciativa, nos ofereceu sua amizade e intimidade; Ele, o Criador do céu e da terra, a quem devemos submissão. E é aqui, quando respondemos a esse convite imerecido e, orgulhosos da honra com que somos tratados, anunciamos aos nossos conterrâneos deste vale de lágrimas como é bom seu Coração generoso, que – oh, incompreensível grandeza – Nosso divino Rei se sente obrigado para conosco, e nos promete uma amizade ainda maior, colocando-nos em lugares de honra em seu amor!
12ª Promessa: “Eu prometo, na misericórdia excessiva do meu Coração, que concederei, a todos os que comungarem na primeira sexta-feira de nove meses consecutivos, a graça da perseverança final e da salvação eterna. Esses não morrerão em desgraça, nem sem receber os Sacramentos; e nesse transe extremo receberão asilo seguro no meu Coração”.
Esta é conhecida como A Grande Promessa. “Foi numa sexta-feira de maio de 1686” – escreve Santa Margarida Maria – “que, durante a Santa Comunhão, meu divino Mestre me disse estas palavras”. Vivemos tempos muito confusos e difíceis. A revolução chegou tão longe que tudo parece estar sob seu domínio. As almas que querem permanecer fiéis são arrastadas pelos ventos mais violentos. E esta gravíssima situação chegou ao paroxismo quando invadiu a própria Igreja e fez prisioneiras as próprias autoridades. A alma fiel parece abandonada por todos os lados, perseguida e desamparada.
Pois, em meio a esta tempestade sem igual, Nosso Senhor oferece um Porto Seguro aos que queiram atender a seu chamado. Como no pequeno barco do Evangelho. E é importante notar como em suas palavras essa devoção aparece associada ao momento de crise em que vivemos: “A devoção ao meu divino Coração é o último esforço do meu amor aos cristãos destes últimos séculos. Esta devoção, se realmente entendida, facilitará a salvação de todos, levando-os a amar-se mutuamente entre si, como Eu os amei. Quero reinar por meu divino Coração sobre a pobre humanidade destes tempos. E reinarei! Apesar da oposição de satanás e de todos os que ele instiga contra Mim.”