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Category: Santo Tomás de AquinoConteúdo sindicalizado

Art. 2 — Se a Santa Virgem foi santificada antes de ser animada.

 

O segundo discute-se assim. — Parece que a Santa Virgem foi santificada antes de ser animada.
 
1 - Pois, como se disse, mais graças foram conferidas à Virgem Mãe de Deus, que a qualquer santo. Ora, a certos foi concedido o serem santificados antes da animação. Pois, diz a Escritura: Antes que eu te formasse no ventre de tua mãe, te conheci; ora, a alma não é infundida antes da formação do corpo. Semelhantemente, diz, de João Batista, Ambrósio: Ainda não tinha o espírito da vida e já nele existia o Espírito da graça. Logo, com muito maior razão, a Santa Virgem podia ser santificada, antes da animação.
 
2. Demais. — Era conveniente, como diz Anselmo, que a Santa Virgem resplendesse pela maior pureza possível, logo abaixo de Deus. Donde o dizer a Escritura: Toda tu és formosa, amiga minha, e em ti não há mácula. Ora, maior seria a pureza da Santa Virgem se nunca a sua alma tivesse sido inquinada do contágio do pecado original. Logo, foi-lhe concedida a santificação da carne, antes de animada.
 
3. Demais. — Como se disse, não se celebra festa senão de quem é santo. Ora, certos celebram a festa da Conceição da Santa Virgem. Logo, parece que foi santa na sua concepção mesma. E assim foi santificada antes da animação.
 
4. Demais. — O Apóstolo diz: Se a raiz é Santa, também os ramos. Ora, a raiz dos filhos são os seus pais. Logo, a Santa Virgem também podia ser santificada nos seus pais antes da animação.
 
Mas, em contrário, as coisas do Antigo Testamento são as figuras do Novo, conforme aquilo do Apóstolo: Todas estas coisas lhes aconteciam a eles em figura. Ora, parece que a santificação do tabernáculo, do qual diz a Escritura  santificou o seu tabernáculo o Altíssimo  significa a santificação da Mãe de Deus, chamada também pela Escritura, tabernáculo de Deus, como se lê: No sol pôs o seu tabernáculo. E do tabernáculo foi ainda dito: Depois de acabadas todas estas coisas, cobriu uma nuvem o tabernáculo do testemunho e a glória do Senhor o encheu. Logo, também a Santa Virgem não foi santificada, senão depois de perfeitas todas as suas partes, isto é, o corpo e a alma.
 
SOLUÇÃO. — Dupla razão podemos dar, da santificação da Santa Virgem, antes de animada. A primeira é que, a santificação, de que tratamos não é mais que a purificação do pecado original; pois, a santidade é a pureza perfeita, como diz Dionísio. Ora, a culpa só pode ser delida pela graça, cujo sujeito só é a criatura racional. E por isso, antes, da infusão da alma racional, a Santa Virgem não foi purificada.  Segundo, porque, sendo susceptível de culpa só a criatura racional, o ser concebido não é contaminado pela culpa senão depois da infusão da alma racional. Assim, de qualquer modo que a Santa Virgem fosse santificada, antes da animação, não teria nunca incorrido na mácula da culpa original; e, portanto, não teria precisado da redenção e da salvação, operada por Cristo, de quem diz o Evangelho: Ele salvará o seu povo dos pecados deles. Ora, é inadmissível que Cristo não seja o Salvador de todos os homens, como diz o Apóstolo. - Donde se conclui, que a santificação da Santa Virgem se deu depois da sua animação.
 
DONDE A RESPOSTA À PRIMEIRA OBJEÇÃO. — Quando o Senhor diz que conheceu Jeremias, antes de formado no ventre materno, isso se entende, pela ciência de predestinação; mas diz que o santificou, não antes de formado, mas antes de saído do ventre materno.  Quanto ao dizer Ambrósio, que João Batista ainda não tinha o espírito da vida e já tinha o Espírito da graça, não se deve entender como significando o espírito da vida a alma vivificante, mas significando espírito o ar exterior respirado. Ou podemos dizer, que ainda não tinha o espírito da vida, isto é, a alma, nas suas operações manifestas e completas.
 
RESPOSTA À SEGUNDA. — O não ter sido nunca a alma da Santa Virgem inquinada do contágio do pecado original, se oporia à dignidade de Cristo, como Salvador universal de todos. Por isso, logo abaixo de Cristo, que não precisava ser salvo, como Salvador universal, a máxima pureza foi a de Santa. Virgem. Pois, Cristo de nenhum modo contraiu o pecado original, mas foi santo desde a sua conceição, segundo aquilo do Evangelho: O santo que há de nascer de ti será chamado Filho de Deus. Mas, a Santa Virgem contraiu por certo o pecado original, sendo contudo dele purificada, antes de nascida do ventre materno. E é o que significa a Escritura quando diz, referindo-se à noite do pecado original. Espere a luz, isto é, Cristo, e não a veja – porque nada mais manchado cai nela; nem o nascimento da aurora quando raia, isto é, da Santa Virgem, que, no seu nascimento, foi imune do pecado original.
 
RESPOSTA À TERCEIRA. — Embora não celebre a Igreja Romana a Conceição da Santa Virgem, tolera contudo o costume de certas igrejas celebrarem essa festividade. Por isso, não deve essa celebração ser totalmente reprovada. Nem o fato, porém, de ser celebrada a festa da Conceição, significa que a Virgem foi santa na sua Conceição. Mas sim, que por se lhe ignorar o tempo da santificação, celebram-lhe a festa da santificação, antes que a da conceição, no dia da conceição.
 
RESPOSTA À QUARTA. — Há duas espécies de santificação.  Uma, de toda a natureza, isto é, enquanto que toda a natureza é liberada totalmente da corrupção da culpa e da pena. O que se dará na ressurreição. — Outra é a santificação pessoal, que não se transmite à prole carnalmente gerada, porque não diz respeito essa santificação à carne, mas, ao espírito. Por onde, se os pais da Santa Virgem foram purificados do pecado original, contudo a Santa Virgem não deixou de contrair o pecado original, por ter sido concebida na concupiscência da carne e pela conjunção do homem e da mulher. Assim, diz Agostinho: Tudo o nascido do concúbito é carne de pecado.

 

 

Art. 1 — Se a Santa Virgem foi santificada antes de nascer, no ventre materno.

 O primeiro discute-se assim. — Parece que a Santa Virgem não foi santificada antes de nascer, no ventre materno. 

1 — Pois, diz o Apóstolo: Não primeiro o que é espiritual, senão o que é animal, depois o que é espiritual. Ora, pela graça da santificação o homem nasce espiritualmente filho de Deus, segundo aquilo do Evangelho: Nasceram de Deus. Mas, a natividade, do ventre, é uma natividade corpórea. Logo, a Santa Virgem não foi santificada, antes de nascer do ventre materno.
 
2 — Demais. Agostinho diz: A santificação, que nos torna templos de Deus, só é a dos renascidos. Ora, ninguém renasce senão depois de nascer. Logo, a Santa Virgem não foi santificada, ante de nascida do ventre materno.
 
3 — Demais. Todo santificado pela graça é purificado do pecado original e do atual. Se, pois, a Santa Virgem foi santificada antes da natividade no ventre materno, foi então, por consequência purificada do pecado original. Ora, só o pecado original podia impedir-lhe a entrada no reino celeste. Se, portanto, tivesse morrido, então, teria transposto as portas do reino celeste. O que contudo não podia dar-se, antes da paixão de Cristo; pois, como diz o Apóstolo, temos confiança de entrar no santuário, pelo sangue de Cristo. Donde se conclui, portanto, que a Santa Virgem não foi santificada antes de nascida do ventre materno.
 
4 — Demais. O pecado original é o que vem de origem, assim como o pecado atual, o que pressupõe um ato. Ora, enquanto praticamos o ato de pecar não podemos ser purificados do pecado. Logo, também a Beata Virgem não podia ser purificada do pecado original, enquanto existia original e atualmente no ventre materno.
 
Mas, em contrário, a Igreja celebra a natividade da Santa Virgem; ora, a Igreja não celebra nenhuma festa senão por algum santo. Logo, a Santa Virgem, na sua natividade mesma, foi santa. Logo, foi santificada no ventre materno.
 
SOLUÇÃO. — Sobre se a Santa Virgem foi santificada no ventre materno, nada nos ensina a Escritura canônica, a qual também não faz menção da sua atividade. Mas, assim como Agostinho prova com razões que a Virgem foi assunta ao céu em corpo, o que contudo não o diz a Escritura, assim também podemos pensar racionalmente que foi santificada no ventre materno. Pois, é racional crermos, que aquela que gerou o Unigênito do Pai, cheio de graça e de verdade, recebeu maiores privilégios de graça que as demais mulheres. E por isso diz o Evangelho, que o Anjo lhe anunciou: Ave, cheia de graça. Pois, sabemos que a certos foi concedido esse privilégio da santificação no ventre materno; assim, a Jeremias, a quem foi dito – Antes que tu saísses da clausura do ventre materno, te santifiquei. E a João Batista, de quem foi dito. Já desde o ventre de sua mãe será cheio do Espírito Santo. Por onde e racionalmente, cremos que a Santa Virgem foi santificada, antes de nascer, no ventre materno.
 
DONDE A RESPOSTA À PRIMEIRA OBJEÇÃO. — Também na Santa Virgem primeiro existiu o corpo e depois, o espírito; pois, foi primeiro concebida carnalmente e depois, santificada no seu espírito.
 
RESPOSTA À SEGUNDA. — Agostinho se exprime segundo a lei comum, pela qual ninguém se regenera pelos sacramentos senão depois de ter nascido. Mas Deus não sujeitou o seu poder a essa lei dos sacramentos, que não pudesse conferir a sua graça, por um especial privilégio, a certos, mesmo antes de nascidos do ventre materno.
 
RESPOSTA À TERCEIRA. — A Santa Virgem foi purificada, no ventre materno, do pecado original, quanto à mácula pessoal; mas não ficou isenta do reato, a que toda natureza estava sujeita, não podendo por isso entrar no paraíso, senão mediante o sacrifício de Cristo; como também se deu com os santos Patriarcas que existiram antes de Cristo.
 
RESPOSTA À QUARTA. — O pecado original foi contraído na origem, pois é pela origem que se comunica a natureza humana, a que propriamente respeita o pecado original. O que se dá quando a criatura concebida recebe a alma. E por isso nada impede seja ela purificada, depois de recebida a alma; pois, depois disso, se ainda continua no ventre materno, é para receber, não a natureza humana, mas uma certa perfeição da natureza já recebida.

Art. 2 — Se Cristo enquanto homem é o mediador entre Deus e os homens.

 O segundo discute-se assim. Parece que Cristo, enquanto homem não é o mediador entre Deus e os homens. 

1. — Pois, diz Agostinho: Uma só é a pessoa de Cristo, a fim de que não deixe de ser um. Cristo, não uma substância; a fim de afastada a benefício de mediador, não ser considerado Filho ou só de Deus ou só do homem. Ora, enquanto homem, não é Filho de Deus e do homem; mas simultaneamente, enquanto Deus e homem. Logo, não devemos dizer que seja mediador entre Deus e o homem, só enquanto homem.
 
2. Demais. — Assim como Cristo, enquanto Deus, tem a mesma natureza que o Pai e o Espírito Santo, assim, enquanto homem, tem a mesma natureza que os homens. Ora, por ter, como Deus, a mesma natureza que o Pai e o Espírito Santo, não pode chamar-se mediador. Assim, aquilo do Apóstolo: Ele é mediador entre Deus e os homens, a Glosa: Enquanto Verbo não é mediador, por ser igual a Deus, Deus perante Deus e simultaneamente uno com Deus. Logo, também enquanto homem não pode chamar-se mediador, por ter a mesma natureza que os homens.
 
3. Demais. — Cristo é chamado mediador, por nos ter reconciliado com Deus, o que realizou, delindo-nos do pecado, que nos separava de Deus. Ora, delir o pecado fá-lo Cristo, não como homem, mas como Deus. Logo, Cristo, enquanto homem, não é mediador, mas, como Deus.
 
Mas, em contrário, diz Agostinho: Cristo não é mediador por ser o Verbo; pois, o Verbo, absolutamente imortal e absolutamente feliz, está acima das misérias dos mortais. Mas é mediador enquanto homem.
 
SOLUÇÃO. — Duas coisas podemos considerar no mediador: primeiro, a natureza de mediador; segundo, o ofício de unir. Ora, da natureza do mediador é distar de um e outro extremo. E quanto a unir, o mediador o faz, transferindo a um dos extremos o que é do outro. Ora, nada disto pode convir a Cristo, enquanto Deus, mas só enquanto homem. Pois, enquanto Deus, não difere do Pai e do Espírito Santo em natureza nem em poder de domínio. Nem o Padre e o Espírito Santo tem nada que não seja do Filho; de modo que pudesse deferir a outros o que é do Pai ou do Espírito Santo, como se de outrem o fosse. Pois, enquanto homem, difere de Deus em natureza; e dos homens, em dignidade e graça. E como homem, cabe-lhe unir os homens com Deus, transmitindo-lhes os preceitos e os dons, e satisfazer e interceder pelos homens, perante Deus. Por isso, verdadeirissimante se chama mediador, enquanto homem.
 
DONDE A REPOSTA À PRIMEIRA OBJEÇÃO. - Eliminada de Cristo a natureza divina, ser-lhe à por consequência eliminada a singular plenitude das graças, que lhe convém, enquanto unigênito do Pai, como diz o Evangelho. De cuja plenitude lhe resulta o ser constituído superior de todos os homens, e mais próximo de Deus.
 
RESPOSTA À SEGUNDA. — Cristo, enquanto Deus, é em tudo igual ao Pai. Mas também pela natureza humana excede os outros homens. Por isso, enquanto homem, pode ser mediador; mas não como Deus.
 
RESPOSTA À TERCEIRA. — Embora convenha a Cristo, enquanto Deus, delir o pecado por autoridade própria, contudo, satisfazer pelo pecado do gênero humano só lhe convém; como homem. E, por isso, chama-se mediador entre Deus e os homens.

Art. 1 — Se é próprio de Cristo ser o medianeiro entre Deus e os homens.

O primeiro discute-se assim. — Parece que não é próprio de Cristo ser o medianeiro entre Deus e os homens. 

1. — Pois, assim como o sacerdote, assim também o profeta é mediador entre Deus e os homens, segundo a Escritura: Eu fui o que intervim como mediador entre o Senhor e vós, naquele tempo. Ora, ser sacerdote e profeta não convém a Cristo. Logo, nem ser medianeiro.
 
2. Demais. — O que convém aos anjos bons e maus não pode ser considerado próprio de Cristo. Ora, ser medianeiro entre Deus e os homens convém aos anjos bons, como diz Dionísio. E convém também aos anjos maus, isto é, aos demônios, que tem certa comunidade com Deus, pela sua imortalidade; e certa outra com os homens, a saber, um espírito passível e, por consequência, sujeito à dor, como está claro em Agostinho. Logo, ser o medianeiro entre Deus e os homens não é próprio de Cristo.
 
3. Demais. — Ao ofício do medianeiro pertence aproximar aqueles entre os quais se interpõe. Ora, o Espírito Santo, no dizer do Apóstolo, intercede por nós a Deus com gemidos inexplicáveis. Logo, o Espírito Santo é o medianeiro entre Deus e os homens. O que, portanto, não é próprio de Cristo.
 
Mas, em contrário, o Apóstolo: Só há um mediador entre Deus e os homens, que é Jesus Cristo homem.
 
SOLUÇÃO. — É ofício próprio do mediador unir aqueles entre os quais se interpôs; pois os extremos se unem no meio. Ora, unir os homens a Deus, de modo perfeito, convém a Cristo, por meio de quem os homens se reconciliaram com Deus, segundo o Apóstolo: Deus estava em Cristo reconciliando o mundo consigo. Logo, só Cristo é o perfeito medianeiro entre Deus e os homens, por ter reconciliado o gênero humano com Deus, pela sua morte. E por isso, depois de o Apóstolo ter dito – Mediador entre Deus e os homens, que é Jesus Cristo homem – acrescenta: Que se deu a si mesmo para redenção de todos. Mas nada impede certos outros serem, de algum modo, considerados mediadores entre Deus e os homens; isto é, se cooperam para a união dos homens com Deus, por via de preparação ou de ministério.
 
DONDE A REPOSTA À PRIMEIRA OBJEÇÃO. — Os profetas e os sacerdotes da lei antiga foram chamados mediadores entre Deus e os homens, por via de preparação e de ministério; isto é, enquanto prenunciavam e prefiguravam o verdadeiro e perfeito mediador entre Deus e os homens. Ao passo que os sacerdotes do Novo Testamento podem chamar-se mediadores entre Deus e os homens, enquanto ministros do verdadeiro mediador, ministrando aos homens, em nome dele, os sacramentos da salvação.
 
RESPOSTA À SEGUNDA. — Os anjos bons, como diz Agostinho, não podem chamar-se com propriedade mediadores entre Deus e os homens. Pois, tendo de comum com Deus a beatitude e a imortalidade, mas não as tendo em comum com os homens miseráveis e mortais, como não hão de antes, estar afastados dos homens e unidos com Deus, do que serem constituídos medianeiros entre ambos? E Dionísio também diz que são medianeiros, porque, segundo o grau da natureza, foram constituídos inferiores a Deus e superiores aos homens, E exercem o ofício de mediador, não principal e perfeitamente, mas ministerial e dispositivamente. Por isso, o Evangelho diz, que chegaram os anjos e o serviam isto é, a Cristo.  Quanto aos demônios, eles tem de comum com Deus a imortalidade e, com os homens, a miséria. E entre um ser imortal e outro sujeito a misérias, o demônio se interpõe como mediador, a fim de impedir o homem de chegar à imortalidade feliz, fazendo cair na miséria imortal. Por isso, é um mau medianeiro, que separa os amigos. Quanto a Cristo, ele tinha de comum com Deus a beatitude, e com os homens, a mortalidade. Por isso, interpôs-se como mediador para que, depois de passada a sua mortalidade, os fizesse, de mortos, imortais, o que demonstrou pela sua ressurreição; e para que, de miseráveis, os tornasse felizes, nunca deixou de ter a felicidade. Donde o ser ele o bom mediador, que reconcilia os inimigos.
 
RESPOSTA À TERCEIRA. — O Espírito Santo, sendo em tudo igual a Deus, não pode chamar-se mediador entre Deus e os homens; mas só Cristo, que, embora pela divindade seja igual ao Pai, contudo, pela humanidade é menor que o Pai, como se disse. Por isso, àquilo do Apóstolo  Cristo é mediador  diz a Glosa: Não o Pai nem o Espírito Santo. Mas dizemos que o Espírito Santo intercede por nós, por nos fazer orar.

 

 

Questão 30: Da Anunciação da Santa Virgem

Em seguida devemos tratar da anunciação da Santa Virgem.
E nesta questão discutem-se quatro artigos:

Art. 5 — Se foi conveniente Cristo encarnar-se desde o princípio do gênero humano.

 O quinto discute-se assim. — Parece que era conveniente que Deus se tivesse encarnado desde o princípio do gênero humano.

1. — Pois, a obra da Encarnação procede da imensidade da caridade divina, segundo aquilo do Apóstolo (Ef 2, 4): Deus que é rico em misericórdia, pela sua extrema caridade com que nos amou, ainda quando estavam os mortos pelos pecados nos deu vida juntamente em Cristo. Ora, a caridade não tarda em socorrer ao amigo que padece necessidade, segundo a Escritura (Pr 3, 28): Não digas ao teu amigo: Vai e torna, amanhã te darei, quando tu lhe podes dar logo. Portanto Deus não devia ter diferido a obra da Encarnação, mas, imediatamente, desde o princípio, devia ter socorrido o gênero humano pela sua encarnação.

2. Demais. — O Apóstolo diz (1Tim 1, 15): Jesus Cristo veio a este mundo para salvar os pecadores. Ora, os salvos teriam sido em maior número se desde o princípio do gênero humano Deus se tivesse encarnado; pois, muitos, ignorando Deus, pereceram no seu pecado, em diversos séculos. Logo, era mais conveniente que Deus se tivesse encarnado desde o princípio do gênero humano.

3. Demais. — A obra de graça não é menos ordenada que a da natureza. Ora, a natureza começa pelo perfeito, como diz Boécio. Logo, a obra da graça devia ter sido perfeita desde o começo. Ora, na obra da Encarnação consideramos a perfeição da graça, segundo o Evangelho (Jo 1, 14): O Verbo se fez carne; e depois acrescenta: Cheio de graça e de verdade. Logo, Cristo devia ter-se encarnado desde o princípio do gênero humano.

Mas, em contrário, o Apóstolo (Gl 4, 4): Mas quando veio o cumprimento do tempo, enviou Deus a seu Filho, feito de mulher, feito sujeito à lei  ao que diz a Glosa, que a plenitude do tempo foi a predeterminada por Deus Padre para quando houvesse de mandar o seu Filho. Ora, Deus determina tudo pela sua sabedoria. Logo, Deus encarnou-se no tempo convenientíssimo. E, assim, não era conveniente que Deus se tivesse encarnado desde o princípio do gênero humano.

SOLUÇÃO. — Sendo a obra da Encarnação principalmente ordenada à reparação da natureza humana pela abolição do pecado, é manifesto que não foi conveniente, desde o princípio do gênero humano, antes do pecado, que Deus se tivesse encarnado. Pois, remédio não se dá senão aos doentes. Donde o dizer o próprio Senhor (Mt 9, 12): Os sãos não têm necessidade de médico, mas sim os enfermos; eu não vim chamar os justos, mas os pecadores.

Mas, nem ainda imediatamente, depois do pecado, era conveniente que Deus se tivesse encarnado.  Primeiro, por causa da condição do pecado humano, que proviera da soberba; por onde, o homem devia ser libertado de modo que, humilhado, se reconhecesse necessitado de um libertador. Por isso, àquilo do Apóstolo (Gl 3, 19): Ordenada por anjos na mão de um mediador, diz a Glosa: Foi obra de um grande conselho o não ter sido o Filho de Deus enviado imediatamente depois da queda do homem. Pois, Deus primeiro abandonou o homem à liberdade do arbítrio, na lei natural, para que assim reconhecesse as forças da sua natureza. E então, quando essa se tornou deficiente, recebeu a lei. Dada ela, o morbo se fortificou, não por vício da lei, mas, da natureza; de modo que, reconhecendo assim a sua fraqueza, chamasse pelo médico e buscasse o auxílio da graça.  Segundo por causa da ordem da promoção no bem, pela qual do imperfeito se chega ao perfeito. Donde o dizer o Apóstolo (1Cor 15, 46): Não primeiro o que é espiritual, senão o que é animal, depois o que é espiritual. O primeiro homem formado da terra é terreno, o segundo homem, do céu, celestial.  Terceiro, por causa da dignidade do próprio Verbo encarnado. Pois, àquilo do Apóstolo (Gl 4, 4): Mas quanto veio o cumprimento do tempo, diz a Glosa: Quanto maior era o juiz que vinha, tanto mais longa devia ser a série dos arautos que o precedessem  Quarto, a fim de não se entibiar, pela longura do tempo, o fervor da fé e a caridade de muitos. Donde o dizer o Evangelho (Lc 18, 8): Quando vier o Filho do homem, julgais vós que achará ele alguma fé na terra?

DONDE A RESPOSTA À PRIMEIRA OBJEÇÃO. — A caridade não tarda em socorrer ao amigo, salva contudo a oportunidade do seu ato e a condição da pessoa. Se, pois, um médico, logo desde o princípio da doença, desse o remédio ao doente, o remédio lhe aproveitaria menos ou até mesmo faria mal em lugar de curar. Por isso também o Senhor não deu desde logo ao gênero humano o remédio da Encarnação, a fim de que ele por soberba não o desprezasse sem ter antes reconhecido a
sua enfermidade.

RESPOSTA À SEGUNDA. — À objeção Agostinho responde do modo seguinte: Cristo quis aparecer aos homens e pregar-lhes a sua doutrina quando e onde sabia que haveria quem acreditasse nele. Pois, nesses tempos e nesses lugares, em que o seu Evangelho não foi pregado, previa que as gentes haveriam de ser todas, relativamente à sua pregação, tais quais eram, senão todos, a maior parte dos que lhe viam a presença corporal, que nele não quiseram crer, mesmo depois de ressuscitado dos mortos. Mas, reprovando essa resposta diz o mesmo Agostinho: Porventura podemos dizer que os Sírios e os Sidônios não queriam crer nos prodígios que presenciassem, ou não houvessem de crer se eles se fizessem, pois que o próprio Deus atestava que haveriam de fazer penitência com grande humildade, se na presença deles se tivessem operados aqueles prodígios do poder divino?  Donde, ele próprio solvendo a dificuldade, acrescenta: Como diz o Apóstolo, isto não depende do que quer nem do que corre, mas de usar Deus da sua misericórdia; o qual, de um lado, quis socorrer aqueles que previa haveriam de acreditar nos seus milagres, se entre eles tivessem sido feitos; de outro lado, não socorreu aqueles que julgou de maneira diferente, ocultamente, é certo, mas justamente, na sua predestinação. Por onde, acreditamos, sem duvidar, na sua misericórdia, em relação aos que são salvos, e na sua verdade, em relação aos que são punidos.

RESPOSTA À TERCEIRA. — O perfeito é anterior ao imperfeito em seres diversos pelo tempo e pela natureza; pois, há de necessariamente ser o perfeito que leve os seres imperfeitos à perfeição, mas, relativamente a um mesmo ser, o imperfeito tem anterioridade no tempo, embora seja posterior por natureza. Assim, pois, a perfeição eterna de Deus precede, na duração, a imperfeição da natureza humana; mas é posterior a ela a perfeição consumada na união com Deus.

Questão 59: Do poder judiciário de Cristo

Em seguida devemos tratar do poder judiciário de Cristo. Da execução do juízo final trataremos mais desenvolvidamente quanto examinarmos o concernente ao fim do mundo. Por agora basta tratarmos só do que respeita à dignidade de Cristo. 

E nesta questão discutem-se seis artigos:

Questão 58: De Cristo sentado à direita do Pai

Em seguida devemos tratar de Cristo enquanto sentado à direita do Pai.

E nesta questão discutem-se quatro artigos:

 

Questão 57: Da Ascensão de Cristo

Em seguida devemos tratar da ascensão de Cristo.

E nesta questão discutem-se seis artigos:

 

Questão 56: Da causalidade da ressurreição de Cristo

Em seguida devemos tratar da causalidade da ressurreição de Cristo. E nesta questão discutem-se dois artigos:

 

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