Vimos que, pelo mesmo decreto da Encarnação ex Maria Virgine, a Santíssima Virgem Maria foi predestinada primeiro à Maternidade Divina e, como conseqüência, à glória e à graça. Mas há ainda outras razões que provam que a Maternidade Divina excede a plenitude da graça. Vamos expô-las.
Valor de uma dignidade de ordem hipostática
É necessário considerar o fim próprio para o qual a Maternidade Divina foi imediatamente ordenada, pois o valor de uma relação depende do fim para a qual tende e que a especifica, assim como a dignidade do conhecimento divino e do amor divino depende, nos eleitos, da sublimidade de seu objeto, da essência divina conhecida diretamente.
A Maternidade Divina é, por seu fim, de ordem hipostática, que supera a ordem da graça e da glória.
Maria, com efeito, por sua Maternidade Divina, tem uma relação real com o Verbo de Deus feito carne; essa relação se consuma na Pessoa incriada do Verbo encarnado, pois ela é a Mãe de Jesus, que é Deus; a Maternidade Divina não se consuma somente na humanidade de Jesus, mas no próprio Jesus em pessoa; Ele, e não sua humanidade, é o Filho de Maria1. E então, como diz Caetano, a Maternidade Divina “alcança as fronteiras da Divindade”2 e é, por seu fim, de ordem hipostática, ordem da união pessoal da humanidade de Jesus com o Verbo incriado. Isso decorre da própria definição da Maternidade Divina, tal como foi definida no Concílio de Éfeso3.
Ora, essa ordem da união hipostática supera imensamente a ordem da graça e a da glória, como esta última supera a ordem da natureza, da natureza humana e até a ordem das naturezas angélicas criadas e criáveis. Se as três ordens citadas por Pascal em seus Pensamentos, a dos corpos, a dos espíritos com suas faculdades naturais às vezes geniais e a da caridade sobrenatural, estão separadas por uma distância infinita, deve-se dizer o mesmo da ordem hipostática com respeito à ordem da graça e da glória, tal como se têm realizado nos maiores santos. “A Terra e seus impérios, o firmamento e suas estrelas não valem o que vale o mais ínfimo pensamento; todos os espíritos juntos (e suas faculdades naturais) não valem o menor pensamento; todos os espíritos juntos (e suas faculdades naturais) não valem o mais ínfimo ato de caridade, que é de uma ordem distinta, completamente sobrenatural”. Da mesma forma, todos os atos de caridade dos maiores santos, homens ou anjos e sua glória no Céu estão imensamente abaixo da união pessoal ou hipostática da humanidade de Jesus com o Verbo. A Maternidade Divina, que se consuma na Pessoa incriada do Verbo feito carne, supera, pois, pelo seu fim, de uma maneira infinita, a graça e a glória de todos os eleitos, e a plenitude de graça e de glória recebida pela própria Virgem Maria.
Santo Tomás diz4: “A humanidade de Cristo, por estar unida a Deus, a bem-aventurança dos eleitos, que consiste na posse de Deus, a Virgem Maria, por ser a Mãe de Deus, têm certa dignidade infinita por sua relação com o próprio Deus, e, por esse lado, nada pode ser melhor que elas, pois não pode existir nada melhor que o próprio Deus”. São Boaventura diz também: “Deus pode fazer um mundo maior, mas não pode fazer uma mãe mais perfeita que a Mãe de Deus”5.
Como nota o Pe. Hugon, O. P., “A Maternidade Divina é, por natureza, superior à filiação adotiva. Esta não estabelece mais que um parentesco espiritual e místico, mas a Maternidade Divina da Santíssima Virgem estabelece um parentesco de natureza, uma relação de consangüinidade com Jesus Cristo, e de afinidade com toda a Santíssima Trindade. A filiação adotiva não obriga tão estritamente Deus a nosso respeito; a Maternidade Divina impõe a Jesus os deveres de justiça que os filhos, por obrigação natural, têm para com seus pais, e confere a Maria domínio e poder sobre Jesus, pois não é mais que um direito natural intimamente unido à dignidade maternal”6.
A Maternidade Divina, por conseguinte, supera todas as graças gratis datae ou carismas, como o são a profecia, o conhecimento dos segredos dos corações, o dom de milagres ou de línguas, porque esses dons, de certo modo externos, são inferiores à graça santificante7. Notemos também que a Maternidade Divina não pode ser perdida, enquanto que a graça pode ser perdida aqui na Terra.
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O valor dessa eminente dignidade foi muito bem destacada por Bossuet, quando disse no Sermão sobre a concepção da Santíssima Virgem (próximo ao final do primeiro ponto): “De tal modo Deus amou o mundo ― disse nosso Salvador ― que lhe deu o seu Filho unigênito (Jo 3,16). (Mas) o amor inefável que tinha por vós, ó Maria, fê-lo conceber desígnios muito diferentes em vosso favor. Ordenou que estivesse em vós com a mesma qualidade que a Ele lhe pertence, e para estabelecer convosco uma sociedade eterna, quis que vós fôsseis a Mãe de seu Filho unigênito e ser Ele vosso Pai. Ó prodígio! Ó abismo de caridade! Que pensamento não se perderá na consideração dessas complacências incompreensíveis que Ele teve para convosco; desde que vós estais tão próxima a Ele por esse Filho comum, o nó inviolável de vossa santa aliança, a garantia de vossos afetos mútuos, que vos haveis dado amorosamente um ao outro. Ele, pleno de uma divindade impassível, e vós, para obedecer-lhe, o haveis envolto de uma carne mortal”.
Deus Pai comunicou a seu Filho unigênito a natureza divina; Maria deu-lhe a natureza humana, sujeita à dor e à morte, para nossa redenção; mas é o mesmo Filho único e isso constitui toda a grandeza da maternidade de Maria.
A razão de todas as graças concedidas a Maria
A eminente dignidade da Maternidade Divina manifesta-se ainda sob um novo aspecto, se considerarmos que ela é a razão pela qual a plenitude de graça foi concedida à Santíssima Virgem, e é a medida e o fim; é, portanto, superior a qualquer outra graça.
Se Maria, de fato, desde o primeiro instante, recebeu essa plenitude da graça, foi para que pudesse santamente conceber o Homem-Deus, dizendo com a mais perfeita conformidade seu fiat no dia da Anunciação, apesar de todas as penas e sofrimentos anunciados ao Messias; para que ela o conceba, permanecendo virgem; para que envolva o seu filho dos cuidados mais maternais e mais santos; para que se una a ele como só uma santa mãe pode fazê-lo, com uma perfeita conformidade de vontade, durante sua vida oculta, durante sua vida apostólica e durante sua vida dolorosa; para que diga heroicamente seu segundo fiat ao pé da Cruz, com Ele, por Ele e n'Ele.
Como diz o Pe. Hugon: “A Maternidade Divina exige uma íntima amizade com Deus. É uma lei natural e um mandamento que a mãe ame seu filho e que este ame sua mãe; é necessário, pois, que Maria e seu Filho amem-se mutuamente, e posto que essa maternidade é sobrenatural, requer uma amizade da mesma ordem, e certamente santificante, porque pelo fato de Deus amar uma alma, torna-a amável aos seus olhos e a santifica8. Existe, por conseguinte, a mais perfeita conformidade entre a vontade de Maria e a oblação de seu Filho, que foi como a alma do sacrifício da Cruz.
É claro que tal é a razão ou o fim pelo qual lhe foi concedida a plenitude inicial de graça, e depois a plenitude de graça completa ou de glória. É ao mesmo tempo sua medida e, portanto, evidentemente superior. Não será sempre possível deduzir dessa eminente dignidade cada um dos privilégios recebidos por Maria9, mas todos, não obstante, derivam-se dela. Se finalmente ela foi predestinada desde toda a eternidade ao mais alto grau de glória junto a Ele, é porque foi predestinada primeiro para ser sua digníssima Mãe, e para sê-lo por toda a eternidade, depois de tê-lo sido no tempo. Quando os santos contemplam no Céu o altíssimo grau de glória de Maria, muito superior ao de todos os anjos, compreendem que o motivo pelo qual foi predestinada é porque foi e continua sendo eternamente a excelsa e digna Mãe de Deus, Mater Creatoris, Mater Salvatoris, sancta Dei Genitrix.
Santo Alberto Magno o afirma em muitas passagens 10. Os poetas também têm cantado muitas vezes esse mistério; citaremos aqui um dos mais recentes 11.
O motivo do culto de hiperdulia
A doutrina que acabamos de expor confirma-se ainda por uma última consideração proposta por muitos teólogos.
É em razão da Maternidade Divina e não tanto por sua plenitude de graça que se deve a Maria um culto de hiperdulia, superior ao de todos os santos por eminente que seja seu grau de graça e de glória. Em outras palavras, se o culto de hiperdulia é tributado a Maria, não é porque tenha sido a maior santa, mas porque ela é a Mãe de Deus. Não lhe seria tributado, ainda que tivesse o mesmo grau de glória, sem ter sido predestinada à Maternidade Divina. Santo Tomás ensinou isso formalmente12.
Nas litanias da Bem-aventurada Virgem, o primeiro título de glória que se predica é este: Sancta Dei Genitrix; todos os que seguem são típicos e convenientes à Mãe de Deus: Sancta Virgo Virginum, Mater divinae gratiae, Mater purissima, Mater castissima, Mater inviolata, Mater intemerata, Mater admirabilis, Mater boni consilii, etc.
Conseqüências que se deduzem dos princípios enunciados
Decorre do que acabamos de dizer que, pura e simplesmente, simpliciter loquendo, a Maternidade Divina, etiam nude spectata, quer dizer, mesmo tomada isoladamente, é superior à plenitude de graça, seja inicial ou consumada, pois é, por seu fim, de uma ordem superior, de ordem hipostática 13.
Assim, a alma racional, que é de ordem substancial, mesmo considerada isoladamente, é mais perfeita que suas faculdades superiores, a inteligência e a vontade, pois ela é a razão de ser dessas faculdades, que se derivam dela como meros acidentes e propriedades, para que a alma mesma possa conhecer e querer. A Maternidade Divina, analogamente, mesmo considerada de forma isolada, é a razão da plenitude de graça, e por isso mesmo, superior a ela.
Compreenderemos assim a força da razão pela qual Maria foi predestinada primeiramente para ser a Mãe de Deus antes de sê-lo para o mais alto grau de glória, depois de Cristo. A dignidade de uma relação se mede mais pelo fim ao qual se almeja que por seu fundamento; ora, a Maternidade Divina é relativa à Pessoa do Verbo feito carne, assim, na ordem natural, a mãe de um rei o tem mais próximo a si que o melhor de seus advogados.
Não obstante, desde um ponto de vista secundário, secundum quid, dizem os teólogos, a graça santificante e a visão beatífica são mais perfeitas que a Maternidade Divina, porque a graça habitual santifica formalmente, o que a Maternidade Divina não pode fazer, pois não é mais que uma relação com o Verbo feito carne14; e a visão beatífica une imediatamente a inteligência criada dos eleitos à essência divina, sem a intermediação da humanidade de Cristo 15.
É evidente que, em Cristo, a união hipostática das duas naturezas supera simpliciter, pura e simplesmente, a visão beatífica, ainda que esta lhe acrescente uma nova perfeição na ordem do conhecimento, porque a união hipostática não santifica formalmente. Da mesma maneira, e guardando as proporções, a Maternidade Divina, sendo de ordem hipostática, supera simpliciter, pura e simplesmente, a plenitude de graça e de glória, ainda que estas sejam mais perfeitas secundum quid, de um ponto de vista secundário. A Maternidade Divina, não sendo mais que uma relação real com o Verbo feito carne, não foi suficiente para santificar Maria, mas exige ou postula a plenitude de graça que lhe foi outorgada para que estivesse e continuasse estando sempre à altura de sua excepcional missão. Ela não poderia ser predestinada a ser Mãe de Deus sem ser predestinada a ser sua digna Mãe16. Tudo se apóia nessa verdade absolutamente certa e domina toda a Mariologia, da mesma maneira que toda a Cristologia é derivada desta verdade: Jesus é o Filho de Deus17.
Pela finalidade de sua Maternidade Divina, que pertence à ordem hipostática, decorre que Maria é superior aos anjos e ao sacerdócio comunicado aos padres por Cristo18. Sem dúvida, não tendo recebido o caráter sacerdotal, ela não poderia consagrar como o faz o sacerdote no altar, mas a dignidade eminente de Mãe de Deus é, não obstante, superior ao nosso sacerdócio e ao episcopado, pois é de ordem hipostática. Maria deu-nos a santa Vítima oferecida na Cruz e no altar; deu-nos também o Sumo Sacerdote do sacrifício da Missa, e esteve unida a Ele mais intimamente que ninguém, mais que os estigmatizados e os mártires, ao pé da Cruz.
Desde esse ponto de vista, a ordenação sacerdotal, se tivesse recebido (o que não convinha à sua missão), teria lhe conferido algo inferior ao que exprime o título de Mãe de Deus. E este é o momento de recordar as palavras de Santo Alberto Magno: “Beata Virgo non est assumpta in ministerium a Domino, sed in consortium et adjutorium juxta illud: Faciamus ei adjutorium simile sibi” 19. Maria não foi escolhida para ser ministro do Salvador, mas para lhe ser associada e para ajudá-lo na obra da Redenção.
Essa divina maternidade é, como se ensina comumente, o fundamento, a raiz e a fonte de todos os privilégios e graças de Maria, seja que eles a precedam como disposição, seja que a acompanhem ou sigam-na como conseqüência.
É em vista dessa Maternidade Divina que Maria é a Imaculada Conceição, preservada do pecado original pelos méritos futuros de seu Filho; ela foi resgatada por Ele da maneira mais perfeita possível: não apenas curada, mas preservada da mancha original antes de ter sido conspurcada nem por um instante. Por essa Maternidade Divina, recebeu a plenitude inicial de graça que não deveria cessar de crescer nela até sua perfeita plenitude. É em vista dessa divina maternidade que ela foi isenta de toda falta pessoal, mesmo venial, e de toda imperfeição, pois estava sempre pronta a seguir as inspirações divinas, mesmo dadas por meio de simples conselho20.
A eminente dignidade de Mãe de Deus eleva-a, pois, acima de todos os santos reunidos. Pensemos que Maria teve a autoridade de uma mãe sobre o Verbo de Deus feito carne e contribuiu, desse modo, não para dar-lhe a visão beatífica, nem sua ciência infusa, mas para formar progressivamente sua ciência adquirida, que esclarecia a prudência adquirida com a qual Ele realizava os diversos atos proporcionados às fases de sua vida infantil e oculta. Nesse sentido, o Verbo feito carne esteve submetido à Maria com os mais profundos sentimentos de respeito e amor. Como não teremos nós esses sentimentos para com a Mãe de nosso Deus?
Num dos mais belos livros escritos sobre Maria, o Tratado da verdadeira devoção à Santíssima Virgem, diz São Luís Maria Grignion de Montfort21: “Deus, feito homem, encontrou sua liberdade em se ver aprisionado no seio da Virgem Mãe; patenteou a sua força em se deixar levar por essa Virgem santa; achou sua glória e a de seu Pai, escondendo seus esplendores a todas as criaturas deste mundo, para revelá-los somente a Maria; glorificou sua independência e majestade, dependendo dessa Virgem amável, em sua conceição, em seu nascimento, em sua apresentação no templo, em seus trinta anos de vida oculta, até à morte, a que ela deveria assistir, para fazerem ambos o mesmo sacrifício e para que ele fosse imolado ao Pai eterno com o consentimento de sua Mãe, como outrora Isaac, com o consentimento de Abraão à vontade de Deus. Foi ela quem o amamentou, nutriu, sustentou, criou e sacrificou por nós... [E, finalmente,] é certo que Nosso Senhor continua a ser, no Céu, tão Filho de Maria como o foi na Terra”.
Tal é o primeiro motivo da devoção do culto de hiperdulia, que devemos a ela. E por isso, toda a Tradição, e muito particularmente os Concílios de Éfeso e de Constantinopla, preocuparam-se acima de tudo em proclamar, com respeito à Virgem Maria, que ela é a Mãe de Deus, uma nova afirmação, contra o Nestorianismo, da divindade de Jesus.
Observemos, antes de terminar este capítulo, que para muitas almas espirituais e interiores é tão evidente que a prerrogativa de Mãe de Deus é o primeiro título glorioso de Maria, o qual encerra, explica e requer todos os demais títulos, que não podem compreender que se dispute sobre coisas tão evidentes. Parece-lhes claro que, se tivéssemos podido formar a nossa mãe, de quais dons não a teríamos enriquecido, se esses dons tivessem estado à nossa disposição.
Santo Tomás contenta-se em dizer22: “Maria, para ser a digna Mãe de Deus feito carne, teve de receber a plenitude da graça”. E Bossuet diz o mesmo, no Sermão sobre a Compaixão da Santíssima Virgem (1º Ponto, ao final): “Como a providência de Deus dispõe todas as coisas com precisão admirável, era necessário que imprimisse no coração da Santíssima Virgem uma afeição que excedesse todo o natural, e que chegasse até o último grau da graça, a fim de que tivesse, para com seu Filho, sentimentos dignos de uma mãe de Deus, e dignos de um homem Deus”.
“Ao final do mês de Junho, que é em ordem o terceiro depois da [Anunciação]
a mulher cheia de graça a quem Deus mesmo se uniu,
escutou o primeiro movimento, percebeu a primeira batida,
de um coração palpitante, sob o próprio coração.
No seio da Virgem concebida sem pecado,
nova era começou. O Menino que é anterior
ao tempo, tempo tomou,
em sua Mãe Soberana.
A respiração humana
invade o Primeiro motor.
Maria, sentindo o peso do divino esponsal,
afastada dos homens, retira-se à capela
subterrânea, da mesma forma
que a pomba do Cântico que habita no penhasco.
Ela não fala nem se move: Ela adora, ela venera.
Sendo ela interior ao mundo, Deus de seu ser não está fora.
Deus é sua obra, seu filhinho,
seu pequeno e de seu ventre o doce fruto bendito.
O mundo inteiro repousa. Augusto o templo de Jano
fechou; o cetro de Davi uma mão estrangeira empunha;
os profetas não falam mais ... Eis aqui, quando mais escura
está a noite, uma Aurora não anuncia a Satanás.
Satanás reina; o universo lhe oferece perfumes e ouro.
Neste Éden da morte, como um ladrão do tesouro,
Deus penetra. Uma mulher
foi enganada ao pé da árvore: Outra engana a Lúcifer.
Oh Deus escondido em Maria! Oh união unida!
Jerusalém não o sabe; José não suspeita de nada.
A Mãe está só com o Filho de sua vida
ainda não nascido, e recebe sua inefável sacudida.
Ad 1: “À mãe do rei não é devida honra igual à que o é ao rei; mas, é lhe devida uma honra semelhante, em razão de certa excelência”.
Ad 2: “A honra da mãe é referida ao filho”.
SÃO BOAVENTURA, in III Sentent., d. 9, q. 3, a. 1, falou no mesmo sentido e a Sagrada Congregação dos Ritos, em 1º de junho de 1884, disse assim: “À Rainha e senhora dos anjos, por ser mãe de Deus... é devida... não qualquer dulia, mas a hiperdulia”.
Mas, como disse o Pe. E. Dublanchy, ibid, col 2357: “A maior parte dos teólogos, apoiando-se no princípio de que a Maternidade Divina pertence à ordem hipostática, e que tudo o que pertence à ordem hipostática supera incomparavelmente os dons da graça, quaisquer que sejam, continuaram admitindo no século XVII e seguintes que a Maternidade Divina, ainda que considerada isoladamente, e até separada da graça santificante, se, o que é impossível, pudesse isso realizar-se, supera, ao menos como dignidade, a filiação adotiva”. E. Dublanchy cita (ibid, col. 2357) como teólogos que a admitem: S. de Saavedra, Ripalda, Jorge de Rhodes, Contenson, Morgott Sedlmayr, L. Janssens, Lepicier, Terrien, Bell, Pesch, Bucceroni. E essa conclusão ele mesmo a admite, col. 2365.
O Pe. hugon, em seu livro Marie, pleine de grâce, 5ª edição, 1926, p 213, diz: “A dignidade da Maternidade Divina exige a santidade e reclama todos os seus efeitos. Pede uma participação com o ser divino e a amizade divina. Supõe uma habitação especial da Santíssima Trindade; confere um poder sublime de impetração; assegura a impecabilidade. Confere um direito inalienável para a herança eterna e até para o domínio de todas as coisas. Pertence à ordem hipostática, superior à ordem da graça e da glória. A graça habitual pode ser perdida, mas a Maternidade Divina é imperdível. As outras graças, em Maria, não são mais que uma propriedade de sua maternidade, e por ela é a primogênita da criação”.