Liturgia (134)
“Comeram todos e ficaram saciados” (Evangelho)
Paramentos verdes
Um grande pensamento domina toda a liturgia de hoje: a necessidade de destruir o pecado por meio dum arrependimento sincero e de pedir a Deus a graça de não recair nele. É no Batismo que morremos para o pecado e é na Eucaristia que encontramos aquela energia que nos permite caminhar sem desfalecer no caminho da virtude. A Igreja impregnada ainda do pensamento destes dois sacramentos que conferiu aos fiéis na Páscoa e no Pentecostes, continua a falar-nos deles neste tempo. As lições de Matinas contam-nos, com efeito, o caso lamentável de Davi, em que este poderoso monarca sucumbiu às insinuações malignas da serpente, demonstrando que todo o homem, qualquer que seja o grau de dignidade ou virtude a que tenha ascendido, conserva sempre a lama original de que Deus o formou.
Queria Davi casar-se com Betsabé, esposa dum dos oficiais do exército. Para o conseguir enviou o seu marido Urias que andava em campanha para um lugar perigoso onde o risco de morte era iminente. Urias efetivamente morreu e Davi casou-se com Betsabé, de quem teve um filho. Mandou então o Senhor o profeta Natan a dizer-lhe: “Ó Rei, havia na cidade dois homens, um rico outro pobre. O rico tinha ovelhas e manadas de bois em grande número, o pobre não tinha coisa alguma senão uma ovelhinha que ele comprara e criara e que tinha crescido em sua casa juntamente com seus filhos, comendo do seu pão, bebendo do seu mesmo copo e dormindo no seu regaço. Ele lhe queria como filha. Como, pois, um forasteiro viesse ver o rico, não querendo este tocar nas suas ovelhas nem nos seus bois, para dar um banquete àquele forasteiro tomou a ovelhinha do pobre e preparou-a para dar de comer ao hóspede”. Davi indignado exclamou: “Por Deus, que tal homem é merecedor de morte” E tornou Natan: “Pois és tu esse homem. Tinhas todas as donzelas de Israel para escolheres como esposa e violentaste a mulher de Urias. Por isso, Deus suscitará da tua própria casa a desgraça contra ti” Então, Davi, arrependido, exclamou: “Ai de mim que pequei contra o Senhor” E tornou-lhe Natan: “Por causa do teu arrependimento o Senhor perdoou-te. Não morrerás. Mas serás castigado e o filho de Betsabé perecerá”. Passado algum tempo o pequeno morria e Davi oprimido pela dor ia prostrar-se no templo diante de Jeová.
Davi, comenta S. Ambrósio, não pôde tolerar o peso do pecado que o oprimia e sem dilação confessou diante do Senhor o seu crime. A generalidade dos homens não faz assim. Onde se encontra hoje um indivíduo um pouco mais rico que os seus vizinhos, que se não agaste como de coisa indigna da sua considerada posição, se o confessor o repreender e aconselhar a meter-se por caminhos mais retos e mais santos! Mas os santos do Senhor que ardem por avançar nas apertadas sendas de Deus, se lhes acontece de cair, levantam-se com mais ardor para a carreira e, estimulados pela vergonha da queda, redobram de coragem no combate para ressarcir, e sempre com vantagem, o inadvertido lapso.
A Missa completa perfeitamente as instruções do Breviário. Na Epístola, S. Paulo recorda-nos, e com que insistência, que, uma vez mortos para o pecado no Batismo, devemos viver a vida nova, a vida que é sem pecado e vem de Deus. E se pecarmos, se tivermos a grande desgraça de nos despojar dessa vida nova, então vamos aos pés de Deus implorar o seu perdão (Gradual), para continuarmos a louvá-lO em torno do seu altar (Comunhão). E Deus não deixará de ouvir a nossa prece e de firmar os nossos passos na vereda dos seus mandamentos, porque Ele diz que é coragem, escudo e guia para o seu povo. O Evangelho, finalmente, aponta-nos a fonte divina onde devemos beber a força de que precisamos para seguir o Senhor até o Céu sem desfalecer pelo caminho.
A multiplicação dos pães é com efeito figura da Eucaristia, que é viático para todos nós, não apenas no fim da vida quando se empreende a viagem para além, mas durante a vida toda. Ela aperfeiçoa a graça do Batismo, dando-nos força para não cair, e alentando e desenvolvendo a vida de Deus em nós até desabrocharmos na plenitude perfeita da pátria para onde vamos.
Missal Quotidiano e Vesperal por Dom Gaspar Lefebvre, Beneditino da Abadia de S. André. Bruges, Bélgica: Desclée de Brouwer e Cie, 1952.
“Vai primeiro conciliar-te com o teu irmão” (Evangelho)
Paramentos verdes
A liturgia deste domingo ensina-nos o modo como devemos perdoar as injúrias e, como no anterior, tem aqui esta doutrina dois elementos por base: a história de Davi que continua a ler-se no Breviário e um passo da Epístola de S. Pedro cuja festa se celebra nesta altura. Esta semana era até chamada outrora, por este motivo, a dos Apóstolos .
Logo que Davi derrotou Golias, Israel triunfante vitoriava os soldados e cantava: “Saul matou mil e Davi dez mil”. Saul irritou-se com isto e a inveja mordeu-lhe o coração. “Mil eu e dez mil Davi, dizia. Então será Davi mais do que eu? Que lhe falta senão ser rei?”
E desde esse dia, nunca mais o pôde ver com bons olhos, como se adivinhasse que Davi fora escolhido por Deus. A inveja fê-lo criminoso. Por duas vezes tentou mata-lo e por outras tantas Davi evitou o golpe. Então mandou-o para a guerra, na esperança de que lá morreria. Davi, porém, regressou vitorioso à frente do exército. Saul desesperou e entrou de persegui-lo abertamente. Um dia que andava a procura-lo desceu para repousar a uma caverna tenebrosa onde Davi se ocultara; desceu e dormiu. Disse então a Davi um dos seus companheiros: “Eis o rei; o Senhor entregou-o nas tuas mãos. É sem dúvida o momento de o matares”. “Não, respondeu Davi. Não permita Deus que eu desrespeite jamais o que recebeu a unção santa”.
E contentou-se de lhe cortar a orla do manto e de lha mostrar de longe quando o dia rompeu. Então Saul chorou e disse: “O meu vassalo Davi é melhor do que eu”. Surpreendeu-o ainda outra vez Davi em pleno sono, com a lança à cabeceira e apenas lhe pegou nela e na taça, Saul abençoou de novo Davi sem, no entanto, deixar de o perseguir. Mais tarde os filisteus recomeçaram a guerra e os Israelitas foram derrotados. Suicidou-se Saul, lançando-se sobre a própria espada. Davi, longe de se alegrar com a morte do rei, rasgou as vestes e chorou amargamente e mandou cortar a cabeça ao amalecita que se atribuía o pretendido mérito de matar o monarca e lhe trouxera a notícia com a coroa. “Montanhas de Gelboé, exclamou, que nem o orvalho nem a chuva descem jamais sobre vós, que vistes tombar os heróis de Israel, Saul e Jonatas, tão amáveis e tão belos durante a vida e que a morte não pôde separar”.
A grande lição de caridade se depreende destas considerações e compreendemos agora a escolha do Evangelho e da Epístola que nos pregam ambos o dever impreterível de perdoar. “Sede, pois, unânimes na oração e não deis mal por mal, nem ultraje por ultraje”, diz a Epístola. “Se apresentares a tua oferta no altar, diz o Evangelho, e te lembrares de que o teu irmão tem contra ti alguma coisa, deixa diante do altar a oferta e vai reconciliar-te primeiro com o teu irmão”. A comunhão da Missa exprime os sentimentos de Davi ao apoderar-se da cidade de Sião e mandar colocar nela a Arca do Senhor. Isto foi a recompensa da sua invencível caridade, dessa virtude indispensável para que o culto tributado a Deus pelo homem no seu templo santo Lhe seja verdadeiramente agradável. A Epístola e o Evangelho salientam que é sobretudo quando nos reunimos para orar que mais nos devemos unir. E o melhor meio para alcançar esta virtude é o amor de Deus e o desejo veemente dos bens eternos e daquela felicidade que reina na corte do Deus vivo, onde se não entra senão pela porta estreita da renúncia e da abnegação cristã.
Da Epístola: A caridade é a virtude cristã por excelência porque, quando se pratica, põe em ação todas as demais virtudes. E então se a exercemos com aqueles que nos perseguem pela fé, torna-se a mais perfeita apologia do Cristianismo.
Missal Quotidiano e Vesperal por Dom Gaspar Lefebvre, Beneditino da Abadia de S. André. Bruges, Bélgica: Desclée de Brouwer e Cie, 1952.
“Ele a procura até a encontrar” Evangelho
Paramentos verdes
A liturgia de hoje canta os tesouros insondáveis da misericórdia divina para com os homens. Como Jesus, que não veio chamar os justos senão os pecadores, o Espírito Santo, que continua a ação benéfica e redentora de Cristo entre os homens, estabelece o Reino de Deus na alma pecadora. É o que a Igreja nos diz no Breviário e no Missal. Senão, vejamos. Dizem as lições de Matinas que os israelitas depois da morte de Heli se submeteram a Samuel e que, estando este já velho, lhe pediram um rei. Ora, havia então na tribo de Benjamin um jovem chamado Saul que era o mais belo e o mais forte de Israel. E aconteceu que, andando à procura do gado que perdera, se dirigiu a Rama, onde se encontrava Samuel, e lhe perguntou se sabia dizer do paradeiro das reses. Disse-lhe o profeta que já tinham sido encontradas; e sabendo do Senhor que era aquele o escolhido para reinar em Israel, derramou-lhe sobre a cabeça o óleo da unção e disse-lhe: O Senhor te ungiu para cabeça da sua herança e tu salvarás o seu povo das mãos do inimigo. Diz São Gregório que Saul, que fora enviado pelo pai à procura dos muares perdidos, é figura de Jesus Cristo que foi mandado também pelo Pai celeste à procura das ovelhas extraviadas. E o é ainda também pelo fato de receber a unção real para libertar o povo, do mesmo modo que Jesus Cristo, o ungido por excelência, veio libertar-nos do poder do demônio, que continua a rodear-nos como leão rugidor. Daqui, sem dúvida, a escolha do Evangelho e da Epístola de hoje. O Evangelho é o da ovelha perdida e do bom pastor, que deixa as noventa e nove no deserto e vai procura-la pelas fragas e algares das ilusões da vida e a reconduz aos ombros para a segurança e fartura do aprisco. A Epístola expõe, por sua vez, os perigos a que as ovelhas do Senhor andam continuamente expostas. Vigiai, diz S. Pedro, porque o diabo inimigo rodeia-vos como leão rugidor, resisti-lhe inabaláveis na fé. E este aviso anda, evidentemente, sempre acompanhado da certeza de que Deus é o nosso protetor e de que não nos poderá faltar se O invocarmos. E lembrando-nos de Saul e do fim que teve por se ter orgulhado contra o Senhor e desobedecido às suas leis, façamos da nossa miséria motivo para pedir a Deus “sem o qual nada é santo”, que leve a cabo em nós a sua obra de misericórdia, a fim de que guiados por Ele não percamos os bens eternos pelo engano dos temporais.
Missal Quotidiano e Vesperal por Dom Gaspar Lefebvre, Beneditino da Abadia de S. André. Bruges, Bélgica: Desclée de Brouwer e Cie, 1952.
“Trazei aqui os pobres, os estropiados...” Evangelho
Paramentos brancos
A Igreja fixou a celebração da festa do Corpo de Deus na 5ª feira que segue o primeiro domingo depois de Pentecostes. Uma coincidência feliz colocou-a entre dois domingos, cuja Epístola e o Evangelho nos falam da misericórdia de Deus e do dever da caridade fraterna que daí deriva para todos os homens. No Evangelho do segundo domingo lemos que o Reino dos Céus é semelhante a um banquete nupcial.[1] E nada pode simbolizar melhor, com efeito, a Sagrada Eucaristia, que é o banquete por excelência da união das almas com Jesus Cristo, seu esposo, e com todos os membros do Corpo Místico. No Breviário, a história de Samuel, destinado por Deus para guarda da arca do Senhor e Sacerdote do Altíssimo, harmoniza-se perfeitamente com a liturgia Eucarística. Naquele tempo, diz o Breviário, a palavra do Senhor fez-se rara e não havia visões em Israel, porque Heli era orgulhoso e fraco e os seus filhos infiéis e desleixados no serviço do Senhor. Então o Senhor manifestou-se a Samuel, menino ainda, e anunciou-lhe o castigo que estava reservado à casa de Heli. E não tardou muito que a arca fosse violada pelos filisteus e que Heli e os seus dois filhos morressem. A censura mais amarga com que a Sagrada Escritura repreende Heli é por haver colocado os seus interesses particulares e a solicitude das coisas materiais acima do interesse e da solicitude das coisas do espírito. Comentando a parábola do banquete, S. Gregório tem observações de fina penetração psicológica, quando, depois de notar que o homem é naturalmente inclinado a arrastar o coração pelas alegrias da terra, constata que, sempre que o faz, não tarda a sentir o tédio; ao passo que basta que prove as do espírito para nunca mais delas se saciar e crescer continuamente em si o desejo delas. E depois continua o santo: provai e vede como o Senhor é bom. Não lhe podereis conhecer a suavidade se o não provais. Mas tocai com o paladar do coração o alimento da vida, para que, verificando quanto é bom e suave, o possais realmente amar como convém. O homem quando pecou no Paraíso, perdeu o direito e o prazer destas delícias, e saiu de lá, quando fechou a boca ao alimento das suavidades eternas. De onde, nascidos neste exílio amargo, viemos já com fastio e ignoramos o que devemos desejar. O que é necessário é escutar o apelo do Evangelho de hoje e desprendermo-nos dos bens da terra para nos prendermos aos do Céu. A Eucaristia ser-nos-á um poderoso e indispensável meio. Procuremos evitar o orgulho e o amor das coisas da terra e, solidamente firmados no amor de Deus, poderemos crescer dia a dia na prática duma vida toda celeste e pura.
Missal Quotidiano e Vesperal por Dom Gaspar Lefebvre, Beneditino da Abadia de S. André. Bruges, Bélgica: Desclée de Brouwer e Cie, 1952.
[1] - Esta Missa já existia com todas as suas partes antes de ser instituída a Festa do Corpo de Deus.
Paramentos brancos
O Espírito Santo cujo advento celebramos no Pentecostes veio-nos recordar nesta última parte do ano (do Pentecostes ao Advento, 6 meses) o que Jesus nos ensinou já na primeira (do Advento à SS. Trindade, 6 meses). O dogma fundamental em torno do qual todo o Cristianismo gravita é este da SS. Trindade, de Quem tudo nos vem e a Quem todos os que receberam o sinete do Seu nome devem regressar. Depois de nos lembrar no decorrer do ano litúrgico o Pai Criador, o Filho Redentor e o Espírito Santo Santificador e Regenerador das almas, a Igreja recapitula hoje antes de mais nada os elementos concernentes ao grande mistério em que adoramos a Deus uno em Natureza e trino em Pessoas.
“Depois de celebrarmos a efusão do Espírito Santo, dizia S. Roberto no século XII, festejamos logo a seguir, no primeiro domingo, a Trindade Santíssima; e é bem feita esta escolha, porque logo depois da vinda do Divino Espírito começou a pregação da fé e com a pregação da fé a administração do Batismo em nome do Pai, do Filho e do Espírito Santo”
O dogma da Santíssima Trindade aparece constantemente na liturgia. É em nome do Pai, do Filho e do Espírito Santo que se começa e acaba a Missa e o Ofício e se conferem os Sacramentos. Todos os salmos fecham pelo Glória Patri, os hinos pela doxologia e todas as orações concluem em termos cheios de devoção e de ternura para com as três Pessoas divinas. O dogma da Santíssima Trindade resplandece ainda nos nossos templos. Os nossos avós compraziam-se em simbolizá-lo na altura, na largura e no comprimento admiravelmente proporcionados das igrejas, no coro, nas naves, no trifório, nas três portas e muitas vezes até nas três torres. Sempre e em toda parte, no mais pequeno pormenor da ornamentação, o número três tem lugar de honra, marca um plano refletido, um pensamento de fé na Santíssima Trindade. A iconografia cristã também nos traduz, de diferente maneira, o mesmo pensamento. Até o século XII era vulgar representar o Pai por uma mão que saía dentre as nuvens do Céu a abençoar. Nos séculos XIII e XIV começou a aparecer primeiramente a face e depois todo o busto. A partir do século XV começou o Pai a ser figurado por um ancião revestido das vestes pontificais. — Até o século XII a Segunda Pessoa da Santíssima Trindade era figurada com mais frequência pela cruz ou pelo cordeiro e ainda por um gracioso jovem no jeito do Apolo do paganismo. Do século XI ao XV, é o Cristo forte, já no vigor da idade, que nos aparece. A partir do XVI entra o costume de lhe pôr a cruz e de o representar frequentemente pelo cordeiro. — O Espírito Santo aparecia nos primeiros séculos sob a figura tradicional da pomba, tocando com as asas abertas na boca do Pai e na do Filho como argumento da sua procedência. A partir do século XI é na figura dum menino que o encontramos por vezes. No século XV, a Terceira Pessoa da Santíssima Trindade, assume as proporções dum homem feito semelhante ao Pai e ao Filho, somente com a pomba na mão ou na cabeça para se distinguir das outras Pessoas. Depois do século XVI, a pomba volta a tomar o lugar exclusivo na representação do Espírito Santo. A geometria concorreu também para a simbólica da SS. Trindade. O trevo teve por sua vez lugar de relevo na simbologia tradicional, e igualmente os três círculos enlaçados com a palavra unidade inscrita no lugar vazio pela interseção. Foi ainda representada por uma cabeça com três faces distintas. Urbano VIII, porém, em 1628 proibiu reproduzir esta perigosa e ridícula interpretação do grande mistério do Cristianismo.
A festa da SS. Trindade deve a sua origem ao fato de as ordenações do Sábado das Quatro Têmporas se celebrarem à tarde e se prolongarem até de manhã, não tendo o Domingo por este motivo liturgia própria. Como todos os domingos são consagrados à SS. Trindade, celebra-se no primeiro depois de Pentecostes a Missa votiva, composta no século VII em honra deste mistério.
Façamos hoje, conformando-nos ao espírito da Liturgia, profissão de fé na Santíssima e Eterna Trindade e na Sua indivisível unidade.
Missal Quotidiano e Vesperal por Dom Gaspar Lefebvre, Beneditino da Abadia de S. André. Bruges, Bélgica: Desclée de Brouwer e Cie, 1952.
Paramentos vermelhos
“O Dom da Sabedoria é a iluminação do Espírito Santo, mercê da qual a nossa inteligência contempla as verdades da fé a uma luz deslumbrante e experimenta nela indizível prazer” (Pe. Meschler).
Lançara Jesus os fundamentos da Igreja e enriquecera-a com os seus poderes. Faltava ainda o Espírito Santo para acabar a formação dos apóstolos. “O Espírito Santo virá sobre vós. Deixai-vos ficar, pois, na cidade até receberdes a força do Alto”. A festa de hoje é a festa comemorativa da expansão da Igreja no mundo e foi sem dúvida por este motivo que se escolheu para estação de hoje a Basílica de S. Pedro dedicada ao Príncipe dos Apóstolos.
Dissera o Mestre que o divino Paráclito viria e a Epístola mostra-nos o cumprimento da promessa. Era a hora de Tércia, por volta das nove horas, quando se fez de repente sentir um vento impetuoso que encheu toda a casa, e línguas de fogo desceram sobre os apóstolos. Iluminados por esta luz e a transbordar deste fogo sagrado os apóstolos sentem-se novos e vão realmente renovar a face da terra. Este dom maravilhoso consiste para cada um de nós na plenitude da graça que recebemos no batismo e que se vai progressivamente desenvolvendo e ampliando até a maturação perfeita do céu. Para os apóstolos era isto mesmo com mais o dever, de que em parte não podemos também prescindir sem trair ainda que veladamente a nossa dignidade e a nossa vocação, de a transmitir a todos os homens. Remissão dos pecados, justificação, redenção, filiação divina, caridade cristã, comunhão dos santos, tudo isto, que constitui a riqueza e a vida da Igreja, nos foi e continuará a ser dado pelos sucessores dos apóstolos.
O Pentecostes neste sentido não é apenas a data comemorativa dum acontecimento passado, mas uma realidade presente, sempre viva no seio da Igreja e em nós. “Vinde Espírito Santo, enchei o coração dos vossos fiéis e acendei neles o fogo do vosso amor”: é a prece suplicante da Igreja ao Aleluia da missa. Façamo-la nossa e o Espírito Santo virá sobre nós.
Missal Quotidiano e Vesperal por Dom Gaspar Lefebvre, Beneditino da Abadia de S. André. Bruges, Bélgica: Desclée de Brouwer e Cie, 1952.
“O Consolador que vos enviarei da parte do Pai, é o Espírito de verdade que procede do Pai” Evangelho.
Paramentos brancos
Este domingo prepara-nos para a festa de Pentecostes. Antes de subir ao céu, o Senhor prometera aos apóstolos que os não deixaria sós, mas lhes enviaria o Espírito consolador que os havia de acompanhar em todas as dificuldades e contingências até a consumação dos tempos. E os evangelhos dos domingos seguintes recordam-nos todos esta promessa do Senhor, como para recolher o sentido profundo da missão do Paráclito. Lembremo-nos no entanto, em conformidade com a doutrina exposta noutro lugar, que é sempre o espírito de Jesus que fecunda e governa a Igreja, que nos santifica e introduz pela graça no seio vivo e vivificante das três Pessoas divinas. Preparemo-nos, pois, para a festa integrando-nos no sentimento de Fé e de Esperança que animava os apóstolos reunidos no cenáculo e peçamos ao Senhor que assegure à Santa Igreja a presença e a ação renovadora do seu Espírito, que a santifica e a vivifica.
Missal Quotidiano e Vesperal por Dom Gaspar Lefebvre, Beneditino da Abadia de S. André. Bruges, Bélgica: Desclée de Brouwer e Cie, 1952.
“Deixo o mundo e vou para o Pai” Evangelho.
Paramentos brancos
A liturgia continua a cantar o triunfo de Cristo e a liberdade do povo cristão que Ele resgatou.
E nesta semana das Rogações convida-nos particularmente a unir com a sua a nossa prece, como no-lo diz a Missa das Ladainhas e até a oração e o Evangelho de hoje. Mas é preciso pedir em nome do Senhor e pedir coisas realmente de valor e de interesse para nós, a salvação em primeiro lugar, evidentemente, e então sem falta nos concederá o que pedimos: para que seja perfeita a nossa alegria e para que crendo que Ele saiu de Deus, mereçamos entrar com Ele na glória do Pai.
Cautela, pois, não nos iludamos. A Epístola de S. Tiago frisa este ponto com insistência. Não basta orar, é preciso orar bem.
Evangelho: “Para pedir em nome do Senhor, diz S. Agostinho, é preciso pedir aquilo que nos deve proporcionar a alegria perfeita, a perfeita alegria espiritual. E isto pediremos se o objeto da nossa prece for unicamente a vida verdadeiramente ditosa. Porque pedir outra coisa é não pedir nada, pois em comparação deste grande bem, tudo o mais é nada”
Missal Quotidiano e Vesperal por Dom Gaspar Lefebvre, Beneditino da Abadia de S. André. Bruges, Bélgica: Desclée de Brouwer e Cie, 1952.
“Ainda mais um pouco e não me vereis” Evangelho.
Paramentos brancos
A Santa Igreja, cheia ainda das alegrias da Páscoa, irrompe num cântico de júbilo e proclama a glória de Deus. “Ainda mais um pouco, disse Jesus no cenáculo, e não me vereis”; haveis de chorar então e de vos lamentar. E mais um pouco ainda, e ver-me-eis de novo e o vosso coração se alegrará”
Os apóstolos sentiram de feito esta alegria iluminante, de que transborda a liturgia pascal, ao contemplar de novo a carne e as feições do Amigo e do Mestre ressuscitado.
A Páscoa da terra é a preparação e a representação da Páscoa eterna, da Páscoa das alegrias totais, de que há de partilhar a Igreja depois de dar à luz no exílio e na dor os que foram marcados na fronte com o sinete da vida. E esta alegria já começa aqui na terra, começa na esperança, spe gaudentes, e por aquela presença de Cristo, invisível mas real, que prometeu aos que O buscam.
Peregrinos e estrangeiros vamos a caminho do céu, animemo-nos daquela alegria cristã que nos leva para Deus, o qual nos virá em auxílio e conduzirá ao termo da viagem e à vitória.
Evangelho: “Este pouco, de que falava o Senhor aos discípulos, parece-nos longo, diz S. Agostinho, porque ainda andamos cá no exílio. Mas quando ele acabar, então veremos com surpresa como foi breve.
Que a nossa alegria se não assemelhe, de longe sequer, com a de que se há de alegrar e se alegra de fato o mundo na breve ausência do Senhor. Mas, enquanto se não realizar o objeto dos nossos desejos, cultivemos aquela alegria santa que é florir da alma entre espinhos e que se alimenta da esperança do fruto que há de vir”
Missal Quotidiano e Vesperal por Dom Gaspar Lefebvre, Beneditino da Abadia de S. André. Bruges, Bélgica: Desclée de Brouwer e Cie, 1952.
“Se Eu não me for, o Espírito consolador não virá a vós; mas Eu vo-lo enviarei” Evangelho.
Paramentos brancos
A liturgia de hoje louva a justiça de Deus, que se manifestou no triunfo do Senhor e pela descida do Espírito Santo, que, de volta ao céu, o Senhor prometera.
Deus que dera testemunho de Seu Filho, ressuscitando-O dos mortos, condena o mundo que O crucificou. Este testemunho brilhante da justiça divina deve nos consolar a alma das amarguras e das dificuldades da vida presente.
Jesus abriu-nos o caminho; Ele é o caminho, a verdade e a vida. Enquanto vivermos na terra temos de beber sem dúvida o travor do exílio, de amargar com a perseguição e a hostilidade dos elementos adversos, mas quando desabrochar no dia pleno e luminoso, que antevemos, a aurora que nos leva, se olharmos então para trás, para esses pedaços de noite e dia por onde passamos, havemos de sentir com certeza como foi breve o caminho e suave o sofrimento que nos conduziram a tão grande vitória.
São Tiago exorta-nos a sofrer com paciência, com paciência cristã evidentemente, as arestas e fadigas da jornada, porque a paciência, diz o apóstolo, dá perfeição à obra, à obra da nossa santificação, e assemelha-nos a Deus “em quem não há vicissitudes nem mudança”
Evangelho: “O Espírito Santo convencerá o mundo do pecado”, do pecado tão grave como jamais se viu e que os judeus, sem advertir na gravidade do ato que faziam, perpetraram, rejeitando Cristo, o Redentor.
“O Espírito Santo convencerá o mundo da justiça”, da justiça de Cristo que o mundo desprezou, crendo-se a si mesmo justo, e que Deus glorificou, com os prodígios que se seguiram à tragédia do Calvário.
“Convencerá, finalmente, o mundo do juízo”, demonstrando pela santificação das almas e pelas conquistas sempre crescentes da Igreja, que “o príncipe deste mundo já está julgado”
Missal Quotidiano e Vesperal por Dom Gaspar Lefebvre, Beneditino da Abadia de S. André. Bruges, Bélgica: Desclée de Brouwer e Cie, 1952.