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5. O pecado original é propriamente um pecado

Capítulo quinto

O pecado original é real e propriamente um pecado.

 

O santo Concílio de Trento, no quinto de seus cânones relativos ao pecado original, afirma:

“Se alguém negar que, pela graça de Jesus Cristo Senhor Nosso, o Batismo confira a remissão do reato do pecado original, ou declarar ainda que não suprime tudo o que tem verdadeira e própria razão de pecado, mas que este é tão-somente resvalado ou não imputado – seja anátema!”[1]

Nessas palavras graves e solenes com que o santo Concílio reafirma a doutrina católica, devemos reconhecer a insistência com que se esforça por nos inculcar a realidade do pecado original, que se torna próprio a cada um de nós, e sua remissão plena e inteira pelo batismo.

Mas nós queremos destacar especialmente estas palavras: “tudo o que tem verdadeira e própria razão de pecado”, pelas quais o Concílio – ou melhor, o Espírito Santo, falando pelo Concílio – nos faz saber que o pecado original é real e propriamente um pecado.

Não há pois que duvidar ou hesitar, nem buscar subterfúgios. O Apóstolo diz muito claramente em sua Epístola: “Pelo pecado de um só, incorreram todos os homens na condenação” (Rom 5, 18). É preciso entender a palavra “condenação” não como metáfora, mas em seu sentido próprio e real. A criança que nasce de Adão é realmente um pecador.

A criança que nasce de uma família real nasce realmente príncipe: e essa qualidade de príncipe ele a tira de seu próprio nascimento. Do mesmo modo, o filho de Adão nasce pecador e seu pecado lhe vem de seu próprio nascimento: o pecado lhe é transfundido, assim como ao filho do rei é transfundido a nobreza, o principado, a realeza. Do mesmo modo que a nobreza, a realeza são bens hereditários em certas famílias, o pecado de Adão tornou-se hereditário em sua descendência.

Dito isto, podem-se levantar questões intermináveis e perguntar-se: como? Mas é preciso saber que em todas as coisas a última palavra é de Deus, e somente d’Ele. E é assim não somente quanto à questão do pecado original, não somente quanto a todos os dogmas da fé, mas quanto a todas as coisas, mesmo as mais naturais e comuns.

Quem então sabe como a alma se une ao corpo? É um segredo de Deus e, no entanto, o fato está diante de nossos olhos, e o aceitamos sem titubear.

Quem sabe como o pão que comemos se transforma em carne e osso, em unhas e cabelos em nosso corpo? Ninguém sabe como, e, no entanto, o fato está diante dos nossos olhos, e ninguém sequer sonha em contestá-lo, ainda que esse como nos escape.

Do mesmo modo, na questão do pecado original, nós conhecemos o fato pela revelação de Deus, mas o como nos escapa, assim como ocorre em outros casos, e nem por isso devemos hesitar em crer na palavra de Deus. E o cristão que se recusa a crer na verdade revelada porque não compreende o como das coisas, será tão pouco razoável quanto o homem que se recusasse a comer porque não vê como o pão é necessário para a conservação da vida.

 

 


[1] Eis o texto original: “Si quis per Iesu Christi Domini nostri gratiam quae in baptismate confertur reatum originalis peccati remitti negat aut etiam asserit non tolli totum id quod veram et propriam peccati rationem habet sed illud dicit tantum radi aut non imputari: anathema sit.” [N. do E.]

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