“A doutrina católica nos ensina que o primeiro dever da caridade não está na tolerância das convicções errôneas, por sinceras que sejam, nem na indiferença teórica ou prática ao erro ou vício em que vemos mergulhados nossos irmãos... se Jesus foi bom para os transviados e pecadores, não respeitou suas convicções errôneas por sinceras que parecessem; amou-os a todos para os instruir,converter e salvar.. São Pio X, Notre charge apostolique, 25 de outubro de 1910” (condenação do Sillon).
“Desejo que se desenvolva o respeito pela liberdade de consciência e de culto para todo ser humano”. João Paulo II, encontro com os muçulmanos de Guiné, 25 de fevereiro de 1992. (O.R. em língua francesa de 17 de março de 1992, pág. 9).
Um certo número de livros e estudos foi publicado nos últimos anos para tentar provar que a declaração do Concílio Vaticano II sobre a liberdade religiosa pode ser conciliada com a doutrina tradicional da Igreja católica a esse respeito. Sem pretender esgotar a questão, pretendemos refutar os principais argumentos apresentados e mostrar, de modo acessível a todo católico de boa fé, que uma tal conciliação é impossível sem negar a infalibilidade e a indefectibilidade da Igreja.
Com o intuito de apresentar este estudo de modo bastante preciso, utilizaremos a forma adotada por santo Tomás na resolução das questões que lhe são formuladas.
1. OBJEÇÕES
Sob este título, veremos os argumentos dos partidários da conciliação entre a Dignitatis Humanae e a doutrina tradicional.
1. Antes de mais nada, parece que o católico não tem o direito de colocar tal questão:
a. Todo concílio ecumênico é infalível;
b. Como todos os bispos católicos estavam reunidos, estamos em presença de um ato do magistério ordinário universal, cuja infalibilidade nos é garantida pelo Concílio Vaticano I (Dz 1792);
c. É preciso ao menos reconhecer que se trata de um ato do magistério autêntico da Igreja e, por conseqüência, um simples fiel não pode julgá-lo e deve acatá-lo com respeito religioso.
2. Em seguida, pode-se mostrar que não há contradição aqui, uma vez que a liberdade religiosa ensinada pelo Vaticano II não é idêntica a que fora condenada pelo magistério anterior da Igreja:
a. A liberdade religiosa do Concílio Vaticano II é limitada pelas exigências da ordem moral objetiva. Os papas precedentes condenaram uma liberdade religiosa ilimitada ou, ao menos, compreendida sob outros limites.
b. A liberdade religiosa do Concílio Vaticano II é um direito negativo, isto é, um direito de não ser impedido de agir. Os papas precedentes condenaram os liberais que reivindicavam um direito positivo, um direito de agir.
c. A liberdade religiosa do Concílio Vaticano II é a liberdade de agir (em matéria religiosa) segundo a própria consciência. Os papas precedentes condenaram a liberdade de agir (em matéria religiosa) como quiséssemos.
3. Enfim, eis ainda duas objeções decisivas:
a. Em seu preâmbulo, a declaração conciliar afirma que “em nada afeta a doutrina católica tradicional acerca do dever moral que os homens e as sociedades têm para com a verdadeira religião e a única Igreja de Cristo”.
b. O próprio Mons. Lefebvre teria assinado este famoso decreto...
2. EM CONTRÁRIO.
A seguir, alguns argumentos de autoridade que vão em sentido contrário:
1. “É com este objetivo (abolir a religião católica) que se estabeleceu, como um direito do homem na sociedade, essa liberdade absoluta, que não só assegura o direito de não ser impedido sobre as suas opiniões religiosas, mas que dá ao indivíduo esta licença de pensar, de dizer, de escrever, e mesmo de fazer injúria impunemente em matéria de religião, tudo o que possa se sugerir à imaginação mais desregrada: direito monstruoso, mas que parece para a Assembléia resultar da igualdade e da liberdade naturais a todos os homens. Mas que poderia aí existir de mais insensato...?" Pio VI, Quod aliquantulum, 10 de março de 1791.
Lembremos aqui os dois artigos da “Declaração dos direitos humanos” de 1789, os mais particularmente atingidos por esta condenação:
Art. 10: "Ninguém deve ser incomodado por suas opiniões, mesmo religiosas, contanto que a sua manifestação não perturbe a ordem pública estabelecida pela lei".
Art. 11: “A livre comunicação de pensamentos e opiniões é um dos direitos mais preciosos do homem; portanto, todo o homem deve poder falar, escrever, imprimir livremente, salvo em casos de abuso dessa liberdade determinados pela lei”.
2. “Um novo motivo de pesar aflige ainda mais vivamente o nosso coração e, confessamos, causa-nos abatimento, angustia e tormento extremos: trata-se do 22º. artigo da Constituição... Certamente, não será preciso longos discursos ao nos dirigirmos a um bispo como vós, para vos fazer reconhecer que este artigo golpeia a religião católica na França e lhe abre uma chaga mortal. Justamente por estabelecer a liberdade de todos os cultos de forma indiscriminada, confunde a verdade com o erro, e nivela às seitas heréticas e até à impiedade judaica a Esposa santa e imaculada de Cristo, a Igreja fora da qual não pode haver salvação. Ademais, ao se prometer apoio e favores às seitas heréticas e aos seus ministros, tolera-se e se favorece não apenas as suas pessoas, mais ainda os seus erros”. Pio VII Post tam diuturnas, 29 de abril de 1814.
3. “Dessa fonte lodosa do indiferentismo promana aquela sentença absurda e errônea, melhor dizer, disparate que afirma e defende a liberdade de consciência. Este erro corrupto abre alas, escudado na imoderada liberdade de opiniões que, para confusão das coisas sagradas e civis, se estende por toda parte, chegando a imprudência de se declarar que nela há grande proveito para a causa da religião. Que morte pior há para a alma, do que a liberdade do erro? dizia Santo Agostinho”. Gregório XVI Mirari vos 15 de agosto de 1832.
4. “E contra a doutrina da Sagrada Escritura, da Igreja e dos Santos Padres, eles não temem afirmar que "o melhor governo é aquele no qual não se reconhece ao poder político a obrigação de reprimir com sanções penais os violadores da religião católica, a não ser quando a tranqüilidade pública o exija". Desta idéia absolutamente falsa do regime social não receiam passar a fomentar aquela opinião errônea e mortal para a Igreja Católica e a salvação das almas, chamada por nosso predecessor de feliz memória, Gregório XVI, loucura, a saber que "a liberdade de consciência e de cultos é um direito próprio de cada homem, que deve ser proclamado e garantido em toda sociedade retamente constituída.... Ora, sustentando tais temeridades, não pensam, não percebem que pregam uma liberdade de danação...”. Pio IX Quanta Cura, 8 de dezembro de 1864.
5. "Na nossa época não é mais necessário que a religião católica seja considerada como a única religião do Estado, excluídos os outros cultos”. Pio XI Syllabus, proposição (condenada) 77, em referência à alocução Nemo vestrum, 26/07/1855, relativa à situação na Espanha.
“Por isso é de louvar que em regiões católicas, se tenha providenciado por lei que aos imigrantes naquelas regiões se permita o culto público próprio a eles.". Id. 78, referindo-se à alocução Acerbissimum, 27/09/1852 relativa à situação na Nova-Granada (Colômbia).
6. "A soberania de Deus é passada em silêncio, exatamente como se Deus não existisse, ou não se ocupasse em nada com a sociedade do gênero humano; ou então como se os homens, quer em particular, quer em sociedade, não devessem nada a Deus, ou como se pudesse imaginar um poder qualquer cuja causa, força, autoridade não residisse inteira no próprio Deus... segue-se que o Estado não se julga jungido a nenhuma obrigação para com Deus, não professa oficialmente nenhuma religião, não é obrigado a perquirir qual é a única verdadeira entre todas, nem a preferir uma às outras, nem a favorecer uma em particular, mas a todas deve atribuir a igualdade de direito, com o fim de apenas impedir a perturbação da ordem pública" Leão XIII, Immortale Dei, 1/11/1885.
7. Entre os princípios maléficos que destruíam a ordem civil e os fundamentos da sociedade católica, Bento XV citava este: “a liberdade de pensar e divulgar tudo o que quisermos em matéria religiosa não deve ser limitada, desde que não faça mal a ninguém”. Epist. Anno iam exeunte, ad R. P. Ios Hiss, 7/03/1917 (A.A.S., 9/1917, p. 172).
8. “O poder civil pode, por si mesmo, refrear as manifestações públicas dos outros cultos e defender seus cidadãos contra a difusão das falsas doutrinas que, no julgamento da Igreja, coloquem em perigo sua salvação eterna”. Esquema da constituição da Igreja preparada para o Concílio Vaticano II (pelo Cardeal Ottaviani).
9. “O Estado tem o dever de proibir os falsos cultos, a não ser em caso de uma verdadeira necessidade de tolerância”. Card. Billot, Tractatus de Ecclesia, qu. 19, art. 1, §3. O Cardeal ainda conta entre os sofismas dos liberais a seguinte proposição: “Pertence ao Estado interessar-se em questões religiosas, não enquanto tais, mas somente na medida em que concernem a tranqüilidade pública ou política, ou enquanto estejam envolvidas a defesa e a proteção dos direitos humanos”.
3. ARGUMENTAÇÃO.
Vejamos o que é ensinado na Dignitatis Humanae:
Este Concílio Vaticano declara que a pessoa humana tem direito à liberdade religiosa. Esta liberdade consiste no seguinte: todos os homens devem estar livres de coacção, quer por parte dos indivíduos, quer dos grupos sociais ou qualquer autoridade humana; e de tal modo que, em matéria religiosa, ninguém seja forçado a agir contra a própria consciência, nem impedido de proceder segundo a mesma, em privado e em público, só ou associado com outros, dentro dos devidos limites. §2
Declara, além disso, que o direito à liberdade religiosa se funda realmente na própria dignidade da pessoa humana, como a palavra revelada de Deus e a própria razão a dão a conhecer.
Este direito da pessoa humana à liberdade religiosa na ordem jurídica da sociedade deve ser de tal modo reconhecido que se torne um direito civil...
O direito a esta imunidade permanece ainda naqueles que não satisfazem à obrigação de buscar e aderir à verdade; e, desde que se guarde a justa ordem pública, o seu exercício não pode ser impedido. §2
Por conseguinte, desde que não se violem as justas exigências da ordem pública, deve-se em justiça a tais comunidades a imunidade que lhes permita regerem-se segundo as suas próprias normas, prestarem culto público ao Ser supremo, ajudarem os seus membros no exercício da vida religiosa e sustentarem-nos com o ensino e promoverem, enfim, instituições em que os membros cooperem na orientação da própria vida segundo os seus princípios religiosos. §4 (...)
Os grupos religiosos têm ainda o direito de não serem impedidos de ensinar e testemunhar publicamente, por palavra e por escrito a sua fé. §4 (...)
Na natureza social do homem e na própria índole da religião se funda o direito que os homens têm de, levados pelas suas convicções religiosas, se reunirem livremente ou estabelecerem associações educativas, culturais, caritativas e sociais. §4
Finalmente, a autoridade civil deve tomar providências para que a igualdade jurídica dos cidadãos – a qual também pertence ao bem comum da sociedade nunca seja lesada, clara ou larvadamente, por motivos religiosos, nem entre eles se faça qualquer discriminação. §6
Além disso, uma vez que a sociedade civil tem o direito de se proteger contra os abusos que, sob pretexto de liberdade religiosa, se poderiam verificar, é sobretudo ao poder civil que pertence assegurar esta proteção. Isto, porém, não se deve fazer de modo arbitrário, ou favorecendo injustamente uma parte; mas segundo as normas jurídicas, conformes à ordem objetiva, postuladas pela tutela eficaz dos direitos de todos os cidadãos e sua pacífica harmonia, pelo suficiente cuidado da honesta paz pública que consiste na ordenada convivência sobre a base duma verdadeira justiça, e ainda pela guarda que se deve ter da moralidade pública.
Todas estas coisas são parte fundamental do bem comum e pertencem à ordem pública.
De resto, deve manter-se o princípio de assegurar a liberdade integral na sociedade, segundo o qual se há-de reconhecer ao homem o maior grau possível de liberdade, só restringindo esta quando e na medida em que for necessário. §7
Poderíamos completar este ensinamento conciliar com textos mais recentes do magistério, que lhe são como um comentário autorizado. Citemos entre mil:
“Pois, quando a liberdade civil reinar e a liberdade religiosa for plenamente garantida, a fé crescerá em vigor no renovado confronto com a descrença, e o ateísmo compreenderá suas limitações no confronto com a fé” .
“A toda pessoa deve ser dada a possibilidade, no contexto de nossa vida coletiva,
de professar sua fé e sua crença, sozinha ou em grupo, em privado e em público”.
“O Concílio Vaticano II (...) declara que a pessoa humana “tem o direito à liberdade religiosa” (Dignitatis Humanae, no. 2). Com este documento o concílio se sente aliado às milhões de pessoas no mundo que aderem, em todas suas aplicações práticas, ao artigo 18 da Declaração Universal dos Direitos Humanos das Nações Unidas, que afirma: “Cada um tem o direito à liberdade de pensamento, de consciência e de religião”.
“O direito à liberdade religiosa é a faculdade de corresponder aos imperativos da própria consciência na procura da verdade e de professar publicamente sua própria fé na livre associação a uma comunidade religiosa organizada”. Esse direito constitui a razão de ser de todas as outras liberdades fundamentais do homem”.
“Em certo sentido, a fonte e a síntese destes direitos (os direitos humanos) é a liberdade religiosa entendida como o direito de viver na verdade de sua fé e em conformidade com a dignidade transcendente de sua pessoa”.
Salta aos olhos que esse ensinamento se opõe aos textos que citamos acima, no item 2 (“Em contrário”). Diante de uma tão manifesta oposição, os partidários da Dignitatis Humanae elaboraram toda uma série de argumentos dos quais resumimos os principais no item 1 (“Objeções”). Podemos responder a estes argumentos, e é o que faremos no item 4 (“Resposta às objeções”). Mas, antes de nos lançarmos nesta discussão um pouco árdua, há um meio bem mais simples de mostrar a absoluta incompatibilidade de Dignitatis Humanae com a Tradição: considerar a prática constante e multissecular da Igreja. Eis, portanto, nosso raciocínio:
Maior: “O costume da Igreja goza de enorme autoridade, e deve ser colocado antes de tudo o mais... Deve-se dar mais importância à autoridade da Igreja do que a de Santo Agostinho ou de São Jerônimo ou de qualquer outro doutor. (S.T. IIa. IIae., q. 10, a. 12, c). Podemos hoje acrescentar: ...”ou de qualquer concílio pastoral”.
Menor: Desde Constantino até Vaticano II, a Igreja sempre exigiu que os príncipes católicos proibissem os falsos cultos, “nisi vera urgeat tolerantiae necessitas”. Ela jamais considerou que o fato de “não perturbar a ordem pública” fosse um motivo necessário de tolerância, ao menos que se queira dar a esta expressão um sentido diferente daquele do Vaticano II (Cf. resposta à objeção 2-a, página 16).
*Explicação da maior: trata-se pura e simplesmente da indefectibilidade da Igreja. Se essa pudesse se enganar gravemente em sua prática por longos períodos, significaria que ela não foi assistida pelo Espírito de verdade e por aquele que disse (Mt 28, 20): “Eu estarei convosco todos os dias, até ao fim do mundo”.
Também Santo Tomás utiliza freqüentemente esse argumento. Eis alguns exemplos:
― Ele defende o costume de oferecer filhos a um mosteiro, por ser o costume da
Igreja, o qual tem mais autoridade (quae maximum habet auctoritatis pondus). Em seguida, cita o exemplo dos santos: São Gregório, São Bento, São João Batista.
― Para explicar que os bispos têm direito de possuir bens próprios, dá ainda o exemplo de santos prelados e conclui: “Não se pode crer que aquilo que varões santos comumente fizeram seja contrário ao preceito divino”
― Santo Tomás defende também a legitimidade dos votos referindo-se à prática da Igreja que os encoraja. Assim, a posição daqueles que combatem essa legitimidade é contrária ao que a Igreja comumente sustenta e pensa: por conseqüência, sua posição tem de ser tida por herética.
― Ao comentar 1 Cor 11, 16, santo Tomás retoma esta frase de Santo Agostinho (Ep. 36, al. 86): “Para tudo aquilo que não se encontra definido pelas Sagradas Escrituras, o costume do povo de Deus e as instituições dos antigos devem ser tidos como lei”.
* Explicação da menor: podemos ler a esse respeito todas as (boas) “Histórias da Igreja” e as obras de história do direito eclesiástico, em particular, a obra de Lo Grasso “Ecclesia et Status - fontes selecti”, Roma, 1952 passim.
A religião mais “tolerada” pela Igreja foi a religião judaica, pelas razões indicadas por Santo Tomás (IIa IIae, q. 10, a. 11). Não obstante, ela estava longe de se beneficiar da liberdade reclamada pelo Vaticano II, posto que os judeus não se beneficiaram, em regiões cristãs, de igualdade jurídica com os cristãos (estado civil, acesso a todas profissões, direito de possuir imóveis...). Ora, citamos acima a passagem da Dignitatis Humanae reclamando esta igualdade jurídica.
É notável que os santos, longe de combater esta prática da Igreja, fossem os primeiros a reclamar esta “intolerância” do Estado.
― Assim fez São Pio V com Maximiliano, ameaçando-o de todas as execrações e penas eclesiásticas se não rescindisse um decreto de tolerância.
― Assim fez igualmente São Francisco de Sales no conselho do duque Charles-Emmanuel, em Thonon, a 4 de outubro de 1598: vendo que a maior parte dos conselheiros não o seguiam, ele se levantou e disse à sua Alteza, com grande zelo e força de espírito: “Ora, Monsenhor, deixar os ministros nessa região significaria perder vossas terras e o paraíso, do qual um metro quadrado vale mais que todo o Mundo”. No dia seguinte, ele apresentou ao duque os artigos de seu programa: o afastamento do mestre-escola protestante e sua substituição por um católico; o afastamento do ministro Viret; a supressão dos protestantes dos ofícios e responsabilidades... o duque lhe concedeu tudo e um pouco mais.
― Lemos na vida de São Casimiro que este santo “lançava-se com grande zelo ao estimulo da fé católica e a extinção do cisma dos Rutenos: para isso, levou o rei Casimiro, seu pai, a proibir pela lei que os cismáticos construíssem novas igrejas ou consertassem as antigas, que caiam em ruína”
― Nas vésperas da Revolução Francesa, Santo Afonso de Ligório escreveu a todos os príncipes católicos para lhes advertir de seu dever de lutar contra os inimigos da Religião. Ele os conjurava, em particular “de não hesitar em banir de seus reinos todo pregador de coisas ímpias, nem a confiscar nas fronteiras as obras impregnadas de doutrinas más. É seu imperioso dever...”. Santo Afonso não se preocupa em saber se esses pregadores ou essas obras caem ou não dentro de uma ordem pública justa. Para ele, como para todos os santos de antes do Vaticano II, desde que se trate de um pregador de coisas ímpias, ou de um livro de má doutrina, não tem direito à liberdade (mesmo negativa) e, se possível, é dever detê-los.
Poderíamos certamente encontrar muitos outros exemplos de santos, mas estes quatro bastam para este breve estudo, e podemos fazer nossa a frase de Santo Tomás: “nimis praesumptuosum videretur asserere tantos Ecclesiae doctores a sana doctrina pietatis deviasse” (pareceria presunçoso afirmar que tantos doutores da Igreja se desviaram da sã doutrina da piedade).
Conclusão: se aceitamos o ensinamento da Dignitatis Humanae, devemos, por isso mesmo, admitir que a Igreja contradisse por 16 séculos um dos direitos naturais mais importantes. Daí, negaríamos a infalibilidade e a indefectibilidade da Igreja.
― Os mais ou menos influenciados pelo modernismo não hesitarão em dizer que a Igreja se enganou sobre este ponto ao longo dos séculos, como se enganou sobre as Cruzadas, a Inquisição, a pena de morte. É isto o que claramente pensa o próprio Papa: “Neste ponto, parece-me importante lembrar que é no humus do cristianismo que a Europa moderna colheu o princípio ― freqüentemente esquecido nos séculos da “cristandade” ― que mais fundamentalmente rege sua vida pública: ou seja, o princípio, proclamado pela primeira vez pelo Cristo, da
distinção entre “o que é de César” e “o que é de Deus” (cf. Mt 22, 21). Esta distinção essencial entre a esfera da organização exterior da cidade terrestre e da autonomia das pessoas se ilumina a partir da respectiva natureza da comunidade política a qual pertence necessariamente todos os cidadãos e da comunidade religiosa a qual livremente aderem os crentes.
“Nossa história mostra de modo abundante a freqüência com que a fronteira entre “o que é de César” e “o que é de Deus” foi transpassada nos dois sentidos. A cristandade latina medieval ― para ficarmos só nela ― apesar de ter elaborado teoricamente a concepção natural do Estado, retomando a grande tradição de Aristóteles, nem sempre escapou à tentação integralista de excluir da comunidade temporal os que não professavam a verdadeira fé. O integralismo religioso, sem distinguir entre a esfera da fé e da vida civil, é ainda hoje praticada em outras paragens e parece incompatível com o gênio próprio da Europa, tal como o moldou a mensagem cristã”.
Dirão ainda, os mais ou menos influenciados pelo modernismo, que a verdade evolui com o tempo, que não estamos mais nos tempos do Syllabus, menos ainda nos de Teodosio ou São Luís. Vide o exemplo do cardeal Ratzinger: “Existem decisões do magistério que podem não constituir a última palavra sobre uma dada matéria, mas um encorajamento substancial relativo ao problema e, sobretudo, uma expressão da prudência pastoral, uma espécie de disposição provisória (...) A esse respeito, pode-se pensar tanto nas decisões dos Papas do século passado sobre a liberdade religiosa como nas decisões antimodernistas do início deste século...”.
― O padre de Blignières, que queria aceitar Dignitatis Humanae e não é modernista, diz que, nos séculos da cristandade, o Estado podia reprimir as demais religiões, quer em razão de uma concessão do poder eclesiástico, quer em virtude de seu direito próprio, caso perturbassem a paz pública. É fácil mostrar que uma tal concessão está aqui fora de lugar: a Igreja não pode dar ao Estado uma concessão que lhe dispense de observar a lei natural; ademais, os não-batizados (judeus, muçulmanos...) não pertencem à Igreja. Logo, ela não poderia dar ao Estado qualquer poder coercitivo sobre essas pessoas.
Quanto à repressão em nome da paz pública, isto está longe de explicar tudo: os judeus, por exemplo, jamais se beneficiaram da liberdade reclamada pela Dignitatis
Humanae, mesmo quando não perturbavam a paz pública.
Deve-se notar que, assim que as idéias sobre liberdade religiosa começaram a ser promovidas por Lamennais, a Igreja lhe opôs sua prática milenar. O cardeal Pacca escreveu a Lamennais: “As doutrinas de l´Avenir sobre a liberdade de cultos e liberdade de imprensa... são muito repreensíveis e se opõem ao ensino, às máximas e à prática constante da Igreja”.
O padre Rozaven, em visita a Roma, foi consultado por Gregório XVI sobre qual resposta deveria ser dada a Lamennais, e fez a mesma reflexão: “Diremos que a Igreja sempre se opôs a um direito que não se poderia subtrair legitimamente de ninguém?”
4. RESPOSTA ÀS OBJEÇÕES.
[N. da P] O leitor melhor aproveitará o que segue se tiver presente no espírito as objeções formuladas na primeira parte desse trabalho. Recomendamos, pois, a releitura das mesmas.
Objeção 1. a) Na audiência de 12/01/1966, Paulo VI declarou que o concílio “evitou
proclamar de modo extraordinário dogmas dotados da nota de infalibilidade”.
Ademais, podemos sublinhar o fato de que Dignitatis Humanae é uma simples declaração, cujo peso teológico é certamente inferior ao de uma constituição dogmática, como a constituição sobre a Igreja. Ora, quanto à essa última, a Secretaria Geral do Concílio publicou em 16/11/1964 uma notificação que lembra a declaração da Comissão Doutrinária em 16/3/1964: “Dado o costume geral dos concílios e a finalidade pastoral do Concílio atual, este define que somente tem de ser sustentados pela Igreja em matéria de fé e moral os pontos declarados como tais.
“Quanto aos outros pontos propostos pelo Concílio, sendo um ensinamento do Magistério supremo da Igreja, todos os fiéis devem recebê-los e compreendê-los segundo o próprio espírito do Concílio, como resulta tanto da matéria tratada quanto da maneira pela qual ele se exprime, segundo as regras da interpretação teológica”.
Objeção 1. b) A declaração também não pode gozar de infalibilidade na qualidade de magistério ordinário universal. Com efeito, não basta que todos os bispos juntos façam uma declaração para que ela goze de infalibilidade.
A Igreja não considera infalível aquilo que, num concílio, não faz parte dos ensinamentos solenes. Como os concílios habitualmente colhem na doutrina tradicional (Vaticano II é exceção), seria temerário rejeitar seus ensinamentos mesmo quando não estão assegurados pela infalibilidade. Não obstante, ocorre por vezes que opiniões opostas a ensinamentos conciliares continuem a ser licitamente ensinadas na Igreja. Eis alguns exemplos:
― O quarto Concílio de Latrão e o primeiro Concílio do Vaticano afirmam que os anjos foram criados ao mesmo tempo (simul) que a criação corporal. Mas os teólogos discutem sobre o valor deste texto: alguns dizem que seria temerário negar a simultaneidade no tempo; outros, dando ao termo simul um sentido um pouco derivado, dizem que não é senão a opinião mais provável. Santo Tomás é favorável a esta interpretação
― O Concílio de Florença enumera, ao falar do sacramento da ordem, sete ordens maiores e menores; a opinião que ensina que as ordens menores não são sacramentos é defendida por muitos teólogos (Cajetano, Santo Afonso de Ligório, Bento XIV...). Os teólogos pensam normalmente hoje que o decreto do Concílio de Florença é uma instrução prática: o Papa não define, mas ensina aos armênios o rito latino.
― O Concílio de Florença declarou que a matéria do sacramento da ordem é a porrecção dos instrumentos. Pio XII, definindo a matéria e a forma, declarou que o Concílio de Florença não quis ensinar que a porrecção dos instrumentos fosse necessária por vontade de Nosso Senhor Jesus Cristo, sem resolver a questão de saber se a porrecção dos instrumentos podia fazer parte da matéria do sacramento
pelo poder da Igreja. Certos teólogos o negam, o que significa que o Concílio de Florença se equivocou sobre o assunto.
Sobre esta questão do magistério ordinário universal, pode-se consultar com proveito os estudos do pde. Marcille (em manuscrito com o autor) e o do padre René-Marie (bulletin 01/1981 de Una Voce Helvetica).
Objeção 1. c) É verdade que todo fiel deve (em casos normais) assentimento interno e religioso aos atos do magistério. Mas, digamos logo que esse ato do magistério não foi recebido em paz na Igreja docente: 70 padres do concílio votaram contra este texto, o que é considerável, e dois bispos seguiram recusando-o publicamente.
Ademais, todo fiel pode facilmente constatar que Dignitatis Humanae está em contradição com a prática multissecular da Igreja, bem como a dificuldade de se considerar a declaração como estando em conformidade com os atos autênticos e infalíveis do magistério precedente.
Se acrescentarmos a isso os frutos envenenados que a declaração produziu no mundo católico, torna-se inteiramente legítimo a um católico duvidar da possibilidade de conciliar Dignitatis Humanae com a Tradição.
Objeção 2. a) O magistério não condenou tão-somente a liberdade religiosa ilimitada, mas também a liberdade religiosa limitada pelas exigências da ordem ou da paz pública. V. em particular os textos citados na segunda parte: números 1, 3, 6, 7, 9.
Réplica de nossos contraditores: os limites não são os mesmos nos textos do Vaticano II e nas condenações precedentes (de um lado a paz pública dos naturalistas, de outro, a ordem pública justa do Vaticano II). Assim, a liberdade religiosa condenada é formalmente diferente47 da que foi proclamada pelo concílio.
Resposta à réplica:
― Dignitatis Humanae utilizou uma expressão ambígua de modo que essa declaração pudesse ser aceita até por governos naturalistas como, por exemplo, os comunistas. Portanto, é possível interpretar esses .limites. como os naturalistas os interpretam, e esta interpretação, desejada pelos padres conciliares, foi condenada pelo magistério anterior.
― Seria possível corrigir o texto conciliar acrescenta-lhe uma Nota Praevia, como se fez para corrigir a constituição sobre a Igreja deste mesmo concílio?
Isto não nos parece possível. Com efeito, num país católico, o Estado tem o dever de manter a ordem católica e, num país não-católico, o de manter a ordem natural. A Nota Praevia deveria então precisar: a ordem pública justa que as religiões devem respeitar para se beneficiarem da liberdade religiosa, é a ordem católica (em país católico) ou a ordem natural (em país não-católico).
Mas quais são as religiões que respeitam a ordem natural? Quais, por exemplo, são as que ensinam a unidade e indissolubilidade do casamento? Ora, esse é um ponto de moral natural da mais alta importância para a ordem pública, uma vez que a família é a base da sociedade civil. Nem falemos do Islã, que favorece a poligamia e muitas outras imoralidades, do hinduísmo com seu sistema de castas e seus párias, ou de outros casos particulares!
Nos países católicos, somente a religião católica se beneficiaria da liberdade religiosa e, nos países não-católicos, não haveria muitas mais... em outras palavras, a declaração seria esvaziada e, ao invés de redigir uma Nota Praevia, parece ser mais simples suprimir a Dignitatis Humanae.
Objeção 2. b) Os textos que citamos na parte 2 condenam igualmente um simples direito negativo aos que praticam as falsas religiões. Veja em particular os textos 1 (o art. 10 da Declaração dos direitos humanos também o apresenta como um direito negativo, Dignitatis Humanae não inventou nada!), 4, 6, 7, 9.
Ademais, Lammenais, o pai do liberalismo católico, reconhecia perfeitamente que o homem não tem a liberdade moral de escolher sua religião, o que não o impedia de pregar a liberdade civil, isto é, a liberdade quanto ao poder civil.
Enfim, a argumentação que demos mostra bem que, na sua prática, a Igreja nega até a existência de um direito meramente negativo: ela não se contentou em lembrar o dever moral de se abraçar a verdadeira Religião, mas exigiu que os Estados limitassem ou proibissem as falsas religiões.
Objeção 2. c) Para uma discussão mais completa desta nova tentativa de conciliar Dignitatis Humanae com a Tradição, veja ainda neste número de Le Sel de la Terre a rubrica “Resenhas de livros e revistas”. Digamos aqui apenas duas coisas:
― O pde. Lucien nos apresenta aqui um “direito de agir segundo a sua consciência”. Esse foi o primeiro argumento utilizado por Mons. De Smedt, responsável pela subcomissão redatora, no seu discurso introdutório. “A tolice deste raciocínio foi logo revelada”, nos diz Mons. Lefebvre: mesmo se a consciência é errônea sem ser culpada, a ação segue má e não pode ser objeto de um direito afirmativo (direito de agir). Poderia ser objeto de um direito negativo (direito à imunidade de coação)? Certamente não no caso da liberdade religiosa pública, pois o bem comum pode exigir que se impeça alguém de fazer o mal.
― Independente desta discussão teórica, pode-se ver rapidamente que tal escapatória não se sustenta melhor que as precedentes quando a confrontamos com a prática multissecular da Igreja. A Igreja encorajou o Estado a exercer a coerção quanto às falsas religiões, sem lhe pedir que distinguisse entre os que erravam de boa fé e os que estavam de má fé.
O pde. Lucien explica isso dizendo que a Igreja presumiu, nos tempos da cristandade, que todos os partidários das falsas religiões necessariamente estariam de má fé! Atualmente, tal não se daria, pois os motivos de credibilidade não seriam mais suficientemente apresentados aos homens, mesmo nos países católicos!!
Tudo isso não se mantém de pé. Mesmo antes de Vaticano II era perfeitamente possível que existissem não-católicos de boa fé!
Ademais, não se vê porque, em países como a Colômbia ou a Espanha, onde só existiam católicos até a aplicação de Vaticano II, os motivos de credibilidade da Igreja teriam subitamente desaparecido com a morte de Pio XII. Em tais países a apostasia não precedeu a liberdade religiosa: proclamou-se a liberdade religiosa, e isto conduziu à apostasia. Pe. Lucien confunde causa e efeito!
Enfim, e sobretudo, a liberdade religiosa não seria um direito senão nos tempos atuais de apostasia. Não teria sido antes, nos tempos da cristandade, e talvez não venha a ser amanhã, se é verdade que “No fim, meu Coração Imaculado triunfará”. No entanto, Dignitatis Humanae coloca a questão em termos de direito natural, universalmente válido. Assim, seria preciso apresentar essa declaração como uma espécie de restrição mental: a liberdade religiosa é um direito do homem... (subentenda-se: “...de geometria variável”, i. é, um direito que pode existir e desaparecer conforme os tempos). Esta explicação do padre Lucien é surpreendente, mas duvidamos muito que fosse a intenção dos padres conciliares!
Objeção 3. a) O mínimo que se pode dizer é que esse texto é contraditório: com efeito, entre os deveres do Estado para com a verdadeira Religião, está o dever de reprimir as falsas religiões. Ora, esse dever é explicitamente negado na seqüência do texto, já que se afirma como direito da pessoa humana não sofrer coação por parte do Estado, desde que não perturbe a ordem pública justa.
Mas, podemos ainda nos questionar se o termo sociedades (societatum) não foi escolhido de propósito. Seria muito mais claro se dissesse Sociedade civil ou Estado. Poder-se-ia hoje dizer que “sociedades” não se refere senão às sociedades privadas e, de modo algum, ao Estado, sobretudo — sendo mais exato — pelo fato do Estado moderno ser um Estado de Direito. Sobre esse ponto, as explicações do Redator não são inteiramente satisfatórias.
Objeção 3. b) Mons. Lefebvre declarou diversas vezes não ter assinado nem este documento, nem Gaudium et Spes. Ele sempre protestou, com muita energia, contra os que diziam que ele teria assinado. Pode-se aqui consultar o no. 79 de Fideliter, pág. 7, por exemplo.
Que pensar então da assinatura fotocopiada pelo padre de Blignières e apresentada como uma assinatura de aprovação? Duas explicações possíveis:
― ou esta assinatura é uma falsificação. Hipótese que não se deve excluir quando se conhece o ódio dos modernistas contra a Tradição e, particularmente, contra Mons. Lefebvre. Seria, portanto, oportuno considerá-la seriamente.
― ou é necessário distinguir entre duas assinaturas: uma primeira, dada no momento do voto final de cada documento separadamente, para significar que se aprova ou desaprova o documento em questão; e uma segunda, dada no final dos quatro documentos promulgados pelo Papa neste dia.
Qual das duas assinaturas comprometem verdadeiramente os que a fazem? Tudo leva a crer que é a primeira, a que Mons. Lefebvre recusou-se a dar com mais de 70 outros padres. Eis alguns argumentos:
1. Durante a audiência que lhe foi concedida em 1976, o Papa Paulo VI repreendeu Mons. Lefebvre por não ter assinado o documento. O Papa mandara pesquisar os arquivos antes da audiência! Não poderia evidentemente repreender Mons. Lefebvre se este tivesse dado uma assinatura em sinal de aprovação ao texto, como afirma o padre de Blignières.
2. A segunda assinatura era comum para os quatro textos promulgados naquele dia. Se um padre quisesse assinalar sua reprovação a um ou outro texto promulgado, diz o padre de Blignières, seria preciso indicar ao lado de sua assinatura: mas não vemos nenhum sinal desta menção imaginada pelo padre de Blignière ao lado das milhares de assinaturas dos padres conciliares! No entanto, Mons. Lefebvre não foi o único a se opor a este texto: será necessário admitir que todos subitamente se “traíram” ao mesmo tempo? Não, é muito mais simples julgar que os padres se contentaram de não ter dado a primeira assinatura: isto bastava para marcar a sua reprovação.
3. Na segunda assinatura, era possível ser representado por outrem: vê-se na lista publicada pelo padre de Blignières que Mons. Lefebvre assinou por um ausente. Ora, não era possível se fazer representar na primeira assinatura, o que é um sinal de que ela comprometia principalmente os que a assinavam.
4. A fórmula da promulgação prevista no art. 49 do regulamento inicial do Concílio (Acta, periodus II, pág. 40) faz menção dos que se recusaram a assinar: o Papa promulga os decretos que foram lidos pelos Padres e aprovados por eles, “tot numero exceptis” (à exceção de tal número). O que parece indicar que os que não quiseram assinar não se associaram à promulgação feita pelo Papa.
5. Enfim, parece mais natural confiar quanto à isso em Mons. Lefebvre, que estava presente no concílio e não tinha o costume de mentir, do que em detetives amadores, que tentaram reconstruir o ocorrido trinta anos depois com pistas dadas por inimigos irredutíveis deste prelado que acabavam de excomungar!
É lastimável que os propagadores deste rumor não levem em conta as explicações de Mons. Lefebvre. Essa calunia continua a circular.
(Tradução: Permanência. Originalmente publicado em Le Sel de la Terre, no. 2, pp. 7-25)