Pe. Pierpaolo Maria Petrucci, FSSPX
São Pio X, na sua primeira encíclica, constatando a existência de uma “guerra ímpia suscitada contra Deus, que progredi em quase toda a parte”, chega a se indagar se “uma tal perversão dos espíritos” não seria “o começo dos males anunciados para o fim dos tempos”, e se “o filho de perdição de que fala o Apóstolo” já não teria “feito o seu advento entre nós”1. É claro que o papa fala do anticristo. Mas, o que ele é?
Segundo São João, “Quem é mentiroso senão aquele que nega que Jesus é o Cristo? Este é um anticristo, que nega o Pai e o Filho”2. E ainda: “porque muitos sedutores se têm levantado no mundo, que não confessam que Jesus Cristo tenha vindo em carne; estes tais são os sedutores, são o anticristo”3. São Paulo nos diz que o anticristo virá num tempo de apostasia e o apresenta como o homem do pecado, o filho da perdição, e diz que ele se oporá a tudo que se chama Deus. É o iníquo cuja vinda é por obra de Satanás, e que se apresentará como se fosse Deus. Empregará todo tipo de poder e sinais prodigiosos. Virá no dia do Senhor, ou seja, antes do julgamento final, para seduzir o mundo4.
São João apresenta a sua vinda como iminente5. Contudo, é preciso compreender essa passagem no seu contexto: ele fala dos precursores do anticristo. Com efeito, São Paulo escrevia aos tessalonicenses para não se deixarem quebrar facilmente, nem se alarmar, como se o dia do Senhor fosse iminente. Com efeito, um obstáculo retém a manifestação do anticristo e terá de ser levantado antes que ele venha6. Alguns Padres da Igreja, como São Cirilo, julgaram que esse obstáculo fosse o Império Romano, mas Santo Tomás afirma que se trata do Império Romano espiritual, ou seja, a Igreja católica e o Papa, sobre o qual ela se funda, único poder capaz de deter as forças do mal7.
Estamos nos tempos do anticristo? É o que podemos nos perguntar. Que diria São Pio X dos nossos tempos, ao ver as leis ímpias que regem os Estados outrora católicos? Que diria diante dessa crise terrível que assola a Igreja, na qual o próprio papa tornou-se a ponta de lança da revolução, e se insurge contra a fé e a moral católica8. A ditadura sanitária a qual o mundo inteiro se submeteu atualmente, é um indício suplementar: o poder capaz de reter a manifestação das forças das trevas parece desfalecer e, sem uma intervenção da Providência, é bem provável que as forças das trevas avancem até às últimas consequências.
Contudo, se é lícito nos colocarmos essas questões diante desse mistério de iniquidade, convém nos lembrar que o plano de Deus é sempre regido por seu amor misericordioso. É Ele que detém as rédeas da história e de todos esses acontecimentos, para o grande bem dos que o amam.
Nosso futuro está nas suas mãos -- logo, está em mãos excelentes. Qual deverá ser o nosso papel? Devemos, à luz da fé, buscar enxergar claro nessa época tão difícil, e combater pelo reino de Jesus Cristo; instaurá-lo nas nossas almas pela vida da graça, pela prática das virtudes e pelo cumprimento quotidiano das vontades divinas: preservar nossas famílias do espírito mundano, pois elas são os últimos bastiões contra as trevas atuais; esforçarmo-nos, enfim, para conquistar almas pelo nosso espírito apostólico. Assim, aconteça o que acontecer, alcançaremos a vitória sobre a terra e, na hora de nossa morte, Nosso Senhor nos receberá como bons e fiéis servidores.
(Le Chardonnet, Outubro de 2020)