Dom A. M
Nota da Permanência: Retomamos a publicação da série "Breve crônica da ocupação neo-modernista na Igreja Católica", utilíssima para quem quiser compreender como chegamos ao atual estado de coisas em Roma. Na foto ao lado, o Papa Paulo VI entrega seu anel episcopal ao "arcebispo" anglicano Ramsey.
Quanto a Paulo VI, é claro que um filo modernista como ele, chegando a ocupar – com a permissão de Deus e em punição de nossos pecados – a Sé de Pedro, não poderia ser senão um demolidor da Igreja. Além, evidentemente, de suas intenções pessoais, ou melhor, de suas utopias pessoais.
Admirador de personagens como Blondel, Teilhard de Chardin, Henri de Lubac, do "segundo" Jacques Maritain e de outros da mesma laia, o Papa Paulo VI se emprenhou, com obstinação digna das melhores causas, à aplicar em todos os domínios as novas doutrinas do Vaticano II. Ele desmantelou todas as defesas da Igreja, em particular pela reforma do Santo Ofício; promoveu a difusão da nova teologia em todas as faculdades pontificais, universitárias e seminários (ainda hoje, como já sublinhamos, Henri de Lubac e Von Balthasar, com Karl Rahner, dominam imperturbavelmente o currículo dos estudos teológicos); obrigou os religiosos dos dois sexos a um aggionarmento catastrófico de suas Regras e Constituições segundo o “espírito” do Vaticano II (resultado: conventos vazios e vocações raras); favoreceu também o aggionarmento de padres e seminaristas a fim de que se engajassem na abertura ao mundo promovida pelo Concílio (resultado: defecção súbita de dezenas de milhares de padres e a difusão lenta mas inexorável de um espírito secularizado, que se reflete até mesmo nas vestimentas); deixou completamente impunes os propagadores de heresias e de imoralidades que, imediatamente após o Vaticano II, espalharam-se como fogo no mundo católico. (Continue a ler)
"Por ocasião da morte do Papa João -- relembrava o Pe. Francisco Spadafora, célebre exegeta – dava-se como certa a eleição de Montini, e os membros do Sacro Colégio foram advertidos que isto constituiria um grave perigo para a fé. Foi tudo em vão: a maior parte dos eleitores devia as suas púrpuras aos bons ofícios de Montini, sob a influência do qual se tinha desenrolado o pontificado do Papa João: por esta razão também, sua eleição era certa.
"Depois que se tornou Papa, Giovanni Battista Montini teve entre as mãos o poder de impor desde o alto as orientações liberais e filo modernistas as quais aspirava desde sua juventude. Ele empreendeu assim a operação mais louca e catastrófica que jamais se poderia conceber: a experimentação na Igreja das novidades defendidas pelos modernistas. E é aqui que começa o “paralelismo antitético” que ocorre espontaneamente ao espírito de quem quer que corra o olhar sobre a vida de São Pio X, da sua infância até o episcopado, de quando era Patriarca de Veneza até tornar-se Soberano Pontífice. São Pio X armou contra o modernismo uma série de barreiras; Paulo VI jogou-as por terra, uma após a outra:
Hoje, o ex-Santo Ofício é simplesmente a Congregação para a Doutrina da Fé, que emite, de tempos em tempos, para assinalar um erro mais evidente em um mar de heresias, Notas que ninguém lê e do qual se pode em toda impunidade, não levar em conta.
Ora, por ocasião do septuagésimo aniversário da grande Encíclica os meios de comunicação do Vaticano (Rádio Vaticano de 4 e 6 de Setembro de 1977 e o L’Osservatore Romano de 8 de Setembro de 1977: repetita iuvant!) definiram a Encíclica Pascendi como uma revelação do modernismo “não inteiramente respeitosa do ponto de vista histórico”: exatamente a tese sustentada em seu tempo pelos modernistas. Mas isso não era suficiente: toda a luta anti-modernista de São Pio X foi denegrida por estes mesmos órgãos com a incrível afirmação: “não se soube, não se quis ou não se teve a respeitosa coragem de ler em sua realidade distinções e diferenças”.
São Pio X, em suma, teria sido um imbecil, um desonesto ou um pusilânime: estranha comemoração, que revelava na alma do Papa Montini uma corrosão de longa data. Os diferentes documentos oficiais ligados à Pascendi foram rejeitados do mesmo modo (Decreto Lamentabili e os diferentes Motu Proprio), como “um corte imprevidente aos botões que ainda estavam em crescimento” -- esses botões são hoje uma mata espessa abafando a boa semente na Igreja.
Hoje, graças a Paulo VI, o Instituto Bíblico Pontifical é um antro de modernistas, uma das principais fontes de contaminação da Igreja. Relembremos, entre outros, que em 1964 por vontade expressa do Papa Montini e por pressões exercidas pela Companhia, reclamaram ao Biblicum os jesuítas Zerwick e Lyonnet, outrora expulsos do ensino e condenados pelo Santo Ofício sob o pontificado de João XXIII. O penúltimo reitor do Biblicum, Carlo Maria Martini S.J., que em seguida foi feito arcebispo de Milão e cardeal por... méritos particulares.
Arcebispo de Milão, Giovanni Battista Montini declarava em 1958: “os limites da ortodoxia não coincidem com “os da caridade pastoral”. Uma vez Papa, seguiu na mesma direção. (Neste domínio, João Paulo II o excedeu, indo muito mais longe que seu “mestre”, como ele gostava de chamar Paulo VI).
Até aqui o relato do Pe. Spadafora1. Só nos resta agora denunciar, em uma ordem cronológica, alguns outros golpes de marreta dados na Santa Igreja por Paulo VI, em nome de suas utopias:
Cada um pode medir a gravidade das palavras de Paulo VI: a ONU, ou seja o humanitarismo maçônico, trará a paz ao mundo...
Deixando de lado toda a consideração, observamos que o caminho abria-se indiretamente à falsa doutrina das “Igrejas irmãs” (a Católica e as “ortodoxas”): como se Nosso Senhor Jesus Cristo não tivesse fundado uma só Igreja Católica sobre o rochedo de Pedro, ou como se a única Igreja Católica pudesse ser dividida em várias partes -- tese, como já vimos, condenada Pio IX na Encíclica Mortalium Animos.
Um clero laicizado, amando suas comodidades, desprovido do espírito de sacrifício e, finalmente, casado...Olhando bem ao redor de nós, já estamos quase atingindo este ponto.
Nesta Instrução, o Papa, contra a precedente e constante interdição da Igreja desde os tempos apostólicos, autorizou os leigos a distribuírem a santa Comunhão com o habitual e especioso pretexto de “circunstâncias particulares ou novas necessidades”. Como se tais “circunstâncias” e “necessidades” particulares inexistissem no passado, sem, entretanto que os Papas ousassem autorizar tais disposições. Tratava-se na realidade de outro gesto ecumênico (em vista de um futuro nivelamento entre o sacerdócio e o laicato, tal qual defendido por Lutero) e demo-conciliar: os leigos, homens e mulheres, entram no Santo dos Santos e substituem assim o dever reservado pelo Cristo aos apóstolos e ao clero.
Um passo após o outro, os dois sacerdócios (o sacerdócio hierárquico decorrente do sacramento da Ordem e o sacerdócio comum dos simples batizados), teoricamente ainda declarados distintos por essência, são gradualmente colocados em igualdade e assimilados na prática, ou seja, na liturgia e na pastoral, domínio de ação preferida desde sempre pelos modernistas de todos os tempos.
A matéria estava regrada, no antigo Código, pelo Cânon 1203 §1 e 2, que privava de funerais e de sepultura eclesiástica – em tanto que pecadores públicos – aqueles que tinham escolhido deliberadamente a cremação de seu corpo6, e condenava aqueles que cooperavam a este ato sob pena de excomunhão e interdição7. Desde os tempos apostólicos, com efeito, a Igreja tinha ordenado aos fiéis a prática da inumação ou sepultura “salvo caso de necessidades como as epidemias, guerras, e etc.” como manifestação da fé católica na ressurreição dos corpos. E é por esta razão que a propaganda para a prática crematória tinha sido um cavalo de batalha nas lojas maçônicas entre o final do século XIX e os primeiros decênios do século XX, na esperança de corromper progressivamente a fé do povo cristão. Hoje essa propaganda retorna sempre mais insidiosa e sustentada por argumentos astutos já refutados (exigência de lugar, de higiene, etc.), mas desta vez – está aí a triste novidade – com o apoio indireto da “hierarquia conciliar”. A explicação desta enésima mudança nos é dada na revista dos religiosos paulinos Vita Pastorale, um dos numerosos periódicos pseudo-católicos italianos (como, para um público mais largo, Famiglia Cristiana, Jesus e outros ainda) destinados à reciclagem conciliar do clero e dos religiosos: “A Igreja continua a preferir a inumação, mas ela apaga as sanções canônicas que atingiam a cremação. Deste modo, o caminho da reconciliação com a maçonaria foi facilitado”.
31 de março de 1970: Paulo VI, com o Motu Proprio Matrimonia mixta, aboliu a exigência feita aos cônjuges não católico de prometerem de forma solene a deixar que os filhos sejam batizados e educados na religião católica (como sempre fora feito: cf. Codex Iuris Canonici, de 1917, can. 1061). O cônjuge não católico doravante deverá ser simplesmente “informado" dos engajamentos assumidos pela parte católica, sem nenhum engajamento pessoal da sua própria parte.
Essa regra absurda e mortal passará em seguida para no novo Código de 1983 (can. 1125). E assim, graças à “magnânima caridade ecumênica e pastoral” de Paulo VI e do “clero conciliar”, só resta hoje imaginar quantas almas não puderam receber o batismo, a verdadeira fé e a salvação.
Mas, ainda resta o problema de saber quantos desses casamentos são efetivamente válidos, posto que se trata — não esqueçamos — de casamentos em si mesmos interditos de direito divino por conta do perigo de perversão espiritual do cônjuge católico e dos filhos. Sua validade é, portanto, condicionada ao afastamento do perigo em questão (evidentemente, deve tratar-se de um perigo próximo), a ponto de mesmo o bispo não poder validamente dar a dispensa na ausência desta garantia. Garantia que as novas regras ecumênicas não garantem mais, na maior parte.
21 de novembro de 1970: o Papa Paulo VI, pelo Motu Proprio Ingravescentem aetatem, proibiu aos cardeais com mais de 80 anos participarem no Conclave para a eleição do Soberano Pontífice. Tratou-se de uma disposição absolutamente inédita na Igreja, assim como o foi também a exortação que pressionava pela demissão dos bispos com mais de 75 anos de idade, pelo Motu Proprio Ecclesiae sanctae, de 6 de agosto de 1966. Deste modo, Paulo VI podia eliminar das dioceses, da Cúria e sobretudo do futuro Conclave, uma boa parte dos elementos ainda demasiado “tradicionais" que teriam perturbado a instauração da nova “Igreja conciliar”, nascida do Vaticano II. Ao mesmo tempo, Paulo VI cuidava para que os postos vagos fossem ocupados por candidatos selecionados segundo os novos critérios “conciliares”: adesão — ou ao menos aquiescência — à abertura ao mundo e às novidades conciliares. Quanto a isso, o Cardeal Ratzinger foi claríssimo: “Nos primeiros anos após o Vaticano II [e ainda é assim] — o candidato ao episcopado devia ser um padre que fosse, antes de tudo, ‘aberto ao mundo’: de todo modo, este pre-requisito foi posto em primeiro lugar”8.
Eis em que mãos caiu o pobre e iludido “povo de Deus”!
22 de julho de 1976: Paulo VI, por uma Notificação da Sagrada Congregação dos Bispos (Prot. n. 514/76), e por um abuso manifesto de poder, infringiu a pena da suspensão a divinis ao Arcebispo Marcel Lefebvre, após as ordenações sacerdotais que realizou, apesar da interdição papal.
O “erro" de Dom Lefebvre foi na realidade, como o próprio Papa Paulo VI afirmou, o ter se oposto às novidades protestantizantes e maçonizantes do Vaticano II, e de ter querido continuar a formar seminaristas conforme a Tradição perene da Igreja católica, exatamente como todos os bispo do mundo fizeram — ou deveriam ter feito — até apenas dez anos antes, segundo as graves diretrizes do Papa Pio XII.