O sétimo discute-se assim. – Parece que a religião não tem nenhum ato externo.
1. –Pois, diz a Escritura: Deus é espírito, e em espirito e verdade é que o devem adorar os que o adoram. Ora, os atos externos não pertencem ao espírito, mas antes, ao corpo. Logo, a religião, a que pertence a adoração, não tem atos externos, mas internos.
2. Demais. –O fim na religião é prestar a Deus reverência e honra. Ora, é irreverência para com um ser excelente atribuir-lhe o que propriamente conviria a seres inferiores. Portanto, o que o homem manifesta pelos seus atos corporais, ordenando-se propriamente às suas necessidades ou à reverência das criaturas inferiores, tais atos não podem convenientemente ser aplicados à divina reverência.
3. Demais. – Agostinho aprova Séneca por vituperar certos que atribuíam aos ídolos o que só aos homens convém, porque aos imortais não convém o que é próprio só aos mortais. Ora, isto muitos menos convém ao Deus Verdadeiro, que é grande sobre todos os deuses. Logo, parece repreensível cultuarmos a Deus por meio de certos atos corpóreos, atos que, portanto, não podem ser próprios da religião.
Mas, em contrário, a Escritura: O meu coração e a minha carne se regozijaram no Deus vivo. Ora, assim como os atos interiores promanam do coração, assim os externos resultam nos membros do corpo. Donde resulta que Deus deve ser adorado por atos não só internos, mas também externos.
SOLUÇÃO. –Prestamos reverência e honra a Deus, não por si mesmo, por ter a plenitude da glória à qual a criatura não pode acrescentar nada; mas, por nossa causa. Pois, reverenciando e honrando a Deus, a nossa inteligência se lhe submete, consistindo nisso a perfeição dela. Porque, todo ser se aperfeiçoa sujeitando-se ao seu superior; assim, o corpo quando vivificado pela alma e o ar quando iluminado pelo sol.
Ora, a inteligência humana, para unir-se a Deus, precisa ser dirigida pelas coisas sensíveis; pois, como diz o Apóstolo, as coisas invisíveis de Deus se veem pelas obras que foram feitas. Por onde, o culto divino necessita a prática de certos atos corpóreos para que, por meio deles, como por uns quase determinados sinais, a inteligência do homem seja provocada aos atos espirituais, pelos quais se une com Deus. Portanto, a religião tem como principais os atos internos essencialmente próprios dela; e tem como secundários os atos externos, ordenados aos internos.
DONDE A RESPOSTA À PRIMEIRA OBJEÇÃO. –O Senhor se refere ao que é principal e constitui o objeto próprio do culto divino.
RESPOSTA À SEGUNDA. – Esses atos externos não são referidos a Deus como se deles precisasse, conforme àquilo da Escritura: Porventura comerei carne de touros? ou beberei sangue de cabritos? Mas lh'o são como uns sinais dos atos internos e espirituais, que em si mesmos, ele os aceita. Donde o dizer Agostinho: O sacrifício visível é o sacramento, isto é, o sinal sagrado, do sacrifício invisível.
RESPOSTA À TERCEIRA. –Os idólatras são objeto de irrisão por referirem aos ídolos o que é próprio dos homens, não como sinais para os excitarem a certas práticas espirituais, mas por serem, como tais, aceitas por eles. E, sobretudo por serem vãs e torpes.