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Art. 4 ─ Se o limbo do inferno é o mesmo que o seio de Abraão.

O quarto discute-se assim. ─ Parece que o limbo do inferno não é o mesmo que o seio de Abraão.

1. ─ Pois, diz Agostinho: Ainda não encontrei tomada em bom sentido a palavra interno, na Escritura. Ora, a expressão ─ seio de Abraão ─ é tomada em bom sentido. Por isso Agostinho acrescenta: Ninguém poderia aceitar a opinião, que não se deve tomar em bom sentido o seio de Abraão, e aquele descanso para onde foi levado pelos anjos o pobre Lázaro. Logo, o seio de Abraão não é o mesmo que o limbo do inferno.

2. Demais. ─ Os que estão no inferno não vêem a Deus. Ora, no seio de Abraão Se vê a Deus. Assim Agostinho, falando de Nebridio, diz: Entenda-se o que se quiser pelo seio de Abraão, lá vive o meu Nebridio. E mais adiante: Já não dá ouvidos às minhas palavras, mas aproxima os lábios do seu espírito à fonte da tua verdade; e sorve a longos tragos a tua sabedoria ─ eternamente feliz. Logo, o seio de Abraão
não é o mesmo que o limbo do inferno.

3. Demais. ─ A Igreja não reza para ninguém ser levado ao inferno. Ora, reza para que os anjos levem para o seio de Abraão as almas dos defuntos. Logo, parece que o seio de Abraão não é o mesmo que o limbo.

Mas, em contrário. ─ Seio de Abraão se chama ao lugar para onde foi conduzido o mendigo Lázaro. Ora, ele foi levado ao inferno; pois, àquilo da Escritura ─ Onde há casa estabelecida para todo vivente ─ diz a Glosa: O inferno era a casa de todos os vivos, antes da vinda de Cristo. Logo, o seio de Abraão é o mesmo que o limbo.

2. Demais. ─ Jacó dizia a seus filhos: Levareis com essa dor a minha velhice ao inferno. Logo, Jacó sabia que, morrendo, iria ao inferno. E assim, pela mesma razão, Abraão foi transferido, pela morte, ao inferno.

SOLUÇÃO. - As almas humanas, depois da morte, não podem alcançar o descanso senão pelo mérito da fé: porquanto é necessário que o que se chega a Deus creia que há Deus. Ora, o primeiro exemplo da crença foi dado aos homens por Abraão, o primeiro que se separou da sociedade dos infiéis e recebeu um especial sinal da fé. Por isso, aquele repouso dado aos homens depois da morte se chama seio de Abraão, como está claro em Agostinho. Ora, as almas dos santos não tiveram em todos os tempos, depois da morte, o mesmo repouso. Pois, depois do advento de Cristo, gozam do pleno descanso, fruindo da visão divina. Antes do advento de Cristo, porém, tinham certo repouso, pela imunidade da pena, mas não tinham a quietude dos desejos, que dá a consecução do fim. Por isso, o estado dos santos, antes do advento de Cristo, pode ser considerado pelo que tinham de descanso, e assim se chama seio de Abraão; ou quanto ao que de descanso lhe faltava, e então se chama limbo do interno. Por onde, o limbo do inferno e o seio de Abraão eram, antes do advento de Cristo, a mesma cousa, acidental e não essencialmente falando. Por isso, nada impede, depois do advento de Cristo, existir um seio de Abraão absolutamente diverso do limbo; porque cousas unidas por acidente podem separar-se.

DONDE A RESPOSTA À PRIMEIRA OBJEÇÃO. ─ Pelo que tinha de bom, o estado dos santos Patriarcas era chamado seio de Abraão. Mas, pela sua deficiência, era denominado inferno. Assim, nem o seio de Abraão é tomado em mau sentido, nem em bom o inferno, embora de certo modo sejam a mesma cousa.

RESPOSTA À SEGUNDA. ─ Assim como o lugar do repouso dos santos Patriarcas, antes do advento de Cristo, se chamava seio de Abraão, assim depois desse advento, mas em sentido diverso. Pois, como antes do advento de Cristo, o descanso dos santos era incompleto, a mesma cousa significavam o inferno e o seio de Abraão, porque aí não se via a Deus. Mas como depois do advento de Cristo o descanso dos santos é completo, pois vêem a Deus, esse lugar de descanso se chama seio de Abraão, e não mais inferno. E a esse seio de Abraão a Igreja reza para os fiéis serem conduzidos.

DONDE SE DEDUZ A RESPOSTA À TERCEIRA OBJEÇÃO. ─ E assim também deve entender-se a Glosa àquilo do Evangelho ─ Sucedeu morrer este mendigo, etc. ─ que diz: O seio de Abraão é o lugar do repouso dos bem-aventurados, dos quais é o reino dos céus.

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