O segundo discute-se assim. ─ Parece que as crianças e os que carecem do uso da razão não podem receber as ordens.
1. ─ Pois, como diz o Mestre, os sagrados cânones estatuíram uma determinada e certa idade para se receberem as ordens. Ora, isso não se daria se as crianças pudessem receber o sacramento da ordem.
2. Demais. ─ O sacramento da ordem é mais digno que o do matrimônio. Ora, as crianças e os privados da razão não podem contrair matrimônio. Logo, nem receber as ordens.
3. Demais. ─ A potência e o ato são correlativos, como diz o Filósofo. Ora, o ato de exercer as ordens requer o uso da razão. Logo, também o poder das ordens.
Mas, em contrário. ─ Quem foi promovido às ordens, antes da idade de razão, pode às vezes exercê-las sem que precise de as ter renovadas. Ora, tal não se daria se não tivesse recebido a ordem. Logo, uma criança pode receber as ordens.
2. Demais. ─ Os outros sacramentos que imprimem caráter, como o batismo e a confirmação, as crianças podem recebê-los. Logo, pela mesma razão, as ordens.
SOLUÇÃO. ─ A puerícia e outras deficiências, que privam do uso da razão, impedem a ação. Por onde, todos aqueles sacramentos, que supõem uma atividade por parte de quem os recebe, não podem receber os privados do uso da razão. Tal a penitência, o matrimônio e outros. Mas, por um lado as potências infusas, como as naturais, são anteriores aos atos, embora as adquiridas lhes sejam posteriores. Por outro lado, removido o posterior, não fica por isso removido o anterior. Por onde, todos os sacramentos, que não requerem, para serem válidos, nenhuma cooperação da parte de quem os recebe, por lhes ser dado por Deus um poder espiritual, podem as crianças recebê-los e os demais carecentes do uso da razão. Deve-se porém fazer notar que para receber as ordens menores, é necessária a discrição racional, pelo respeito que a dignidade do sacramento exige, embora não seja ela necessária, nem por necessidade de preceito, nem para a validade do sacramento. Por isso, urgindo a necessidade e havendo esperança de aproveitamento espiritual, os que ainda não chegaram à idade de discernimento podem ser promovidos, sem pecados, às ordens menores; porque, embora não sejam ainda idôneos para o exercício das funções que lhe são cometidas, o costume contudo os tornará tais. Mas, para se receberem as ordens maiores, é necessário o uso da razão, tanto por causa da dignidade delas, como por ser de necessidade de preceito. Pois, implicam elas o voto de continência; e além disso, é nos cometido o poder de conferir os sacramentos. Quanto ao episcopado, como o poder que ele confere se exerce, ademais, sobre o corpo místico de Jesus Cristo, sua colação demanda concurso ativo de quem o recebe, por causa da cura pastoral das almas. Por isso, a consagração episcopal supõe necessariamente o uso da razão.
Mas certos dizem, que todas as ordens implicam o uso da razão, para a validade do sacramento. Mas essa opinião não é corroborada pela razão nem por nenhuma autoridade.
DONDE A RESPOSTA À PRIMEIRA OBJEÇÃO. ─ Nem tudo o que é de necessidade de preceito o é para a validade do sacramento, como dissemos.
RESPOSTA À SEGUNDA. ─ O matrimônio supõe o consentimento que não pode existir sem o uso da razão. Ora, para receber a ordem não é necessária nenhuma cooperação da parte de quem a recebe. O que é demonstrado pelo fato de não mencionar nenhuma cooperação deles o cerimonial da consagração. Logo, não há símile.
RESPOSTA À TERCEIRA. ─ Ato e potência são correlativos, contudo às vezes a potência precede, como no caso do livre arbítrio e do uso da razão. Tal o caso proposto.