23 de Janeiro
« Estando Maria, sua mãe, desposada com José » (Mt 1, 18)
I. — Foi um verdadeiro matrimônio? Devemos responder que sim, pois verifica-se aqui os três bens do matrimônio: prole, no caso, o próprio Deus; fidelidade, pois não há adultério; e sacramento, pois as almas uniram-se indivisivelmente.
(In Matth, I et 3)
II. — Era conveniente que Cristo nascesse de uma virgem casada: quer por causa dele próprio, quer por causa da sua mãe, quer também por causa de nós.
Por causa do próprio Cristo, por quatro razões:
1. Primeiro, para que não fosse rejeitado dos infiéis como ilegítimo de nascimento. Donde o dizer Ambrósio: « Que se poderia censurar aos Judeus e a Herodes se tivessem perseguido a quem nasceu de um adultério? ».
2. Segundo, para que, ao modo acostumado, fosse descrita a sua genealogia pela linha paterna. Por isso, diz Ambrósio: « Quem veio ao século deve ser descrito ao modo do século. Pois, no Senado e nas outras assembléias, procura-se um varão a quem caibam as honras devidas a sua família. E o mesmo costume testemunham as Escrituras, que sempre buscam a origem viril. »
3. Terceiro, em defesa do menino nascido: para o diabo não suscitar mais violentas ciladas contra ele. Por isso diz Inácio que a Virgem foi desposada para que seu parto ficasse oculto ao diabo.
4. Quarto, para que fosse educado por José. Por isso este foi chamado seu pai, quase o educador.
Foi também conveniente relativamente à Virgem:
1. Primeiro, porque assim ficou imune da pena, i.é., para que não fosse lapidada pelos Judeus, como adúltera.
2. Segundo, para que assim ficasse livre da infâmia. Donde o dizer Ambrósio: « Foi desposada para não ser marcada com a infâmia de uma virgindade profanada, quando a gravidez pudesse ser sinal da corrupção. »
3. Terceiro, para que José lhe prestasse o seu ministério, como diz Jerônimo.
Também foi conveniente relativamente a nós:
1. Primeiro, porque pelo testemunho de José ficou comprovado o nascimento de Cristo de uma virgem. Donde o dizer Ambrósio: « O testemunho do marido é o melhor testemunho do pudor da mulher; pois, se não tivesse conhecido o mistério, o marido é quem teria maior direito a se afligir com a injúria e vingar o opróbrio. »
2. Segundo, porque as palavra mesmas da Virgem se tornaram mais dignas de crédito quando afirmava a sua virgindade. Por isso diz Ambrósio: « A fé nas palavras de Maria é mais firme, que remove as causas de mentira. Se tivesse ficado grávida, sem ser casada, parecia querer, mentirosamente, esconder a sua culpa. Ao passo que casada, nenhum motivo tinha para mentir, pois, o prêmio do casamento e a glória das núpcias é, para as mulheres, o parto. » E essas duas razões concernem à firmeza da nossa fé.
3. Terceiro, para que não tivessem desculpa as virgens que, por incautela, não evitam a infâmia. Por isso, diz Ambrósio: « Não convinha deixar às virgens, que vivem com má reputação, pudessem velar-se com a escusa de que também a Mãe do Senhor ter tido uma semelhante reputação ».
4. Quarto, porque os desposórios da Virgem são o símbolo da Igreja universal, que, sendo virgem, desposou contudo um esposo, o Cristo, como diz Agostinho.
5. Pode-se ainda aduzir uma quinta razão, a saber, que a Mãe do Senhor foi casada e virgem, porque na sua pessoa, é honrada tanto a virgindade como o matrimônio, contra os heréticos que detraem àquela a este.
III q. XXIX, a. 1
(P. D. Mézard, O. P., Meditationes ex Operibus S. Thomae.)