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Category: Tempo da SeptuagésimaConteúdo sindicalizado

Introdução ao domingo da Quinquagésima

Jesus disse-lhe: Vê; a tua fé te salvou.” (Evangelho)

Paramentos roxos

A Igreja estuda com particular diligência, nas três semanas da Septuagésima, as grandes figuras de Adão, Noé e Abraão, que respectivamente apelida: pai do gênero humano; pai de numerosa descendência; e pai dos crentes. Já estudamos nos domingos da Septuagésima e da Sexagésima os dois primeiros. Vamos estudar hoje Abraão. Na liturgia ambrosiana o Domingo da Paixão era chamado Domingo de Abraão e liam-se no ofício os responsórios de Abraão. Na liturgia romana o Evangelho desse Domingo é consagrado ainda ao grande patriarca. Mas depois, quando se juntou à Quaresma o Tempo da Septuagésima, reservou-se o Domingo da Quinquagésima para o Patriarca.

Querendo Deus criar um povo para Si e preservá-lo do contágio da idolatria, deu-lhe um chefe que o governasse, a quem chamou Abraão, que quer dizer pai de muitos povos. Retirou-o de Ur, cidade da Caldeia, e conduziu-o para a terra que lhe prometera e guardou-o em todos os seus caminhos. Foi pela fé, diz a Epístola aos Hebreus, que Abraão obedeceu ao apelo divino e partiu para o país que devia receber em herança. Partiu cheio de fé sem saber para onde ia. Foi pela sua fé que chegou a Canaã onde viveu 25 anos como estrangeiro. Foi pela sua fé que já na velhice se tornou pai de Isaac e que não duvidou, à voz de Deus, sacrificá-lo, não obstante, ser o filho único em quem tinha posta a esperança de ver realizar-se a promessa divina duma posteridade numerosa. Bem sabia o Patriarca que Deus era assaz poderoso para ressuscitar lhe o filho de entre os mortos. E por este motivo o recuperou, e isto em figura. De fato, Isaac, escolhido para ser gloriosa vítima de seu pai, foi uma figura de Jesus Cristo. Como Ele, levou às costas o instrumento do sacrifício e foi arrancado miraculosamente às garras da morte. Foi assim que Abraão, com a sua fé, acreditando sem hesitar na palavra de Deus, contemplou de longe o triunfo do Senhor na Cruz e alegrou-se. E foi então que Deus lhe confirmou a promessa: “Porque não recusaste sacrificar-Me o teu filho único, abençoar-te-ei e dar-te-ei uma descendência numerosa como as estrelas do Céu e como as areias das praias”. Estas promessas realizou-as Jesus Cristo com a sua Paixão. Jesus Cristo resgatou-nos, diz São Paulo, e deixou-se morrer na Cruz, a fim de que a benção de Abraão fosse comunicada por Ele aos gentios e recebêssemos pela fé a promessa do Espírito, quer dizer, do Espírito de adoção que nos fora prometido. E é por isso que a oração da 5ª leitura do Sábado Santo nos diz que Deus “Pai soberano dos crentes, derramando abundantemente sobre a Terra a graça da adoção, multiplica os filhos da promessa pelo mistério pascal constitui Abraão, seu servo, pai de todos os povos. É com efeito pelo Batismo (que outrora se ministrava na Páscoa e no Pentecostes) que nos tornamos filhos de Abraão e entramos na herança que Deus prometeu a nossos pais e que é a Igreja, simbolizada pela terra prometida”.

A fé em Jesus Cristo, que mereceu a Abraão a prerrogativa de pai dos crentes e nos dá a faculdade de nos tornarmos seus filhos, constitui o tema do Evangelho de hoje. Jesus Cristo anuncia a sua Paixão e triunfo e cura um cego dizendo-lhe: a tua fé te salvou. Este cego recobrou a vista, diz S. Gregório, na presença dos Apóstolos. E isto foi para confirmar a fé dos que não podiam ainda suportar toda a luz da revelação dum mistério celeste. Porque era necessário que, vendo-O mais tarde morrer pelo modo que lhes predissera, não duvidassem de que havia de ressuscitar também. A Epístola por seu lado põe em plena evidência a fé de Abraão. E não é como filhos carnais de Abraão que nos havemos de salvar, mas como filhos duma fé semelhante à de Abraão. Em Jesus Cristo, diz S. Paulo, nem a circuncisão (os Judeus), nem a não circuncisão (os Gentios) valem nada, mas a fé que opera na caridade. “Andai no amor, continua o Apóstolo, naquele amor de que nos amou Cristo”.

Neste domingo e nos dois dias seguintes costuma fazer-se uma adoração solene do SS. Sacramento, denominada, Adoração das 40 horas, pelos excessos cometidos nestes dias. Foi instituída por S. Antonio Maria Zacaria († 1539) e enriquecida com numerosas indulgências por Clemente XIII.

 

Do Evangelho: Este cego de que nos fala o Evangelho representa sem dúvida o gênero humano. Depois que foi expulso do Paraíso na pessoa do primeiro homem, ignora as claridades da luz sobrenatural e sofre as consequências do seu erro, mergulhado nas trevas do exílio.

 

Missal Quotidiano e Vesperal por Dom Gaspar Lefebvre, Beneditino da Abadia de S. André. Bruges, Bélgica: Desclée de Brouwer e Cie, 1952.

Introdução ao domingo da Sexagésima

“A semente é a palavra de Deus” (Evangelho)

 

Paramentos roxos

 

O Breviário fala-nos de Noé toda semana.

“Vendo Deus que era grande a malícia do homem sobre a Terra, disse: Vou exterminar o homem que criei. Faze, pois, uma arca de madeira e entra nela, que estabelecerei contigo a minha aliança. E Deus fez então chover sobre a Terra, quarenta dias e quarenta noites. A arca flutuava à superfície das águas que se elevaram acima das grandes montanhas. Os homens pereceram e Noé salvou-se com os seus na arca... Passou algum tempo e Noé soltou uma pomba, que regressou com um ramo de oliveira. Noé compreendeu que as águas tinham baixado. E então disse-lhe Deus: Sai da arca e multiplicai-vos sobre a Terra. E Noé levantou um altar e ofereceu a Deus um sacrifício de agradável odor”.

Esta narração, referida ao mistério pascal, é comentada por uma bela oração de Sábado Santo. Ei-la: “A justa cólera do Criador submergiu o mundo culpado nas águas da vingança, e só Noé se salvou na arca. Depois a virtude admirável do amor lavou o universo no sangue”. Foi o madeiro da arca que salvou o gênero humano e foi o da Cruz que resgatou o mundo. “Só tu foste digna, diz a Igreja ao falar da Cruz, de seres para o mundo naufragado a arca que o leva ao porto”. A porta aberta no costado da arca e por onde entraram os que se haviam de salvar do dilúvio nos é apresentada na liturgia como figura do mistério da Redenção; porque do lado de Jesus saiu sangue e água simbolizando os sacramentos do Batismo e da Eucaristia.

“Ó Deus que, lavando nas águas os crimes do mundo corrompido, nos destes no mesmo dilúvio a imagem da regeneração, para que um mesmo elemento fosse o fim dos vícios e a imagem das virtudes, olhai com bondade para a vossa Igreja e multiplicai nela a vossa intervenção regeneradora, abrindo por toda a Terra as fontes do batismais que devem renovar os povos”.

No tempo de Noé, diz S. Pedro, salvaram-se do dilúvio 8 pessoas somente, e isto foi símbolo do Batismo que nos salva a todos. E quando o Bispo benze na Quinta-feira Santa o azeite de oliveira que há de servir para os sacramentos diz:

“Quando os crimes do mundo tinham já sido expiados nas águas do dilúvio, veio uma pomba anunciar a paz à Terra com o ramo de oliveira no bico, que era símbolo então das graças que nos reservava o futuro. Este símbolo realiza-se, quando a unção do azeite, depois que água do Batismo nos lavou, nos vem dar ao rosto paz e beleza”.

Mas no que Noé se assemelha mais com Jesus Cristo é na missão que Deus lhe confiou de ser o pai de numerosos povos. Noé é, com efeito, o segundo progenitor do gênero humano e o símbolo da vida renascida.

“O ramo da oliveira simboliza a feliz fecundidade que Deus concederia a Noé depois de sair da arca, e a arca é denominada no Ofício de hoje por S. Ambrósio “seminarium”, quer dizer, lugar onde se guarda a semente da vida que deve recobrir o mundo. Ora, bem melhor que Noé, Jesus Cristo repovoou o mundo com a prodigiosa descendência das almas crentes e fiéis a Deus. É por isso que a oração da 2ª profecia do Sábado Santo pede ao Senhor que realize os seus desígnios eternos e complete na paz a obra da redenção do homem: “... possa ver o mundo sentir a reparação do que estava caído e a renovação do que envelhecera e todas as coisas restabelecidas na integridade primeira por aquele mesmo que deu a todos o ser”.

No princípio, foi pelo Verbo, quer dizer, pela Palavra, que Deus fez o mundo. E foi pela pregação do Evangelho, que Jesus, o Verbo de Deus, veio regenerar os homens. Fomos regenerados, diz S. Pedro, por uma semente incorruptível, que é a palavra de Deus, que nos foi anunciada pelo Evangelho. A esta luz, já vemos todo o relevo da parábola do Semeador, que vem na Missa de hoje.

Se nos tempos de Noé os homens pereceram, diz S. Paulo, foi por serem incrédulos. Noé que acreditou salvou-se na arca. Do mesmo modo, os que acreditarem e guardarem a palavra do Senhor serão salvos. E S. Paulo enumera na Epístola de hoje tudo o que é necessário para levar aos povos a fé no nome de Deus. Ele foi, com efeito, o pregador por excelência, o Ministro de Cristo que Deus escolheu para levar aos povos os clarões da Boa-Nova do Verbo Encarnado.

Do Evangelho: Jesus deita a semente da palavra nos corações bem dispostos. Procuremos recebe-la bem e façamo-la frutificar na paciência para que Aquele que passou a vida a lançar nas almas a boa doutrina continuando a fazê-lo por meio da sua Igreja, nos possa recompensar com o cêntuplo que prometeu aos que O escutarem e seguirem fielmente.

 

Missal Quotidiano e Vesperal por Dom Gaspar Lefebvre, Beneditino da Abadia de S. André. Bruges, Bélgica: Desclée de Brouwer e Cie, 1952.

Introdução ao domingo da Septuagésima

“Ide vós também para a minha vinha” (Evangelho)

 

Paramentos roxos

 

A aproximação dos textos do Breviário e do Missal, esta semana, esclarece-lhes singularmente o sentido e a importância. As lições e os responsórios do Ofício da noite são tirados do Gênese e relatam a história da criação do mundo e do homem, a queda dos primeiros pais, a promessa do Redentor e finalmente a morte de Abel e a sequela das gerações até Noé. “No princípio, diz o Livro Santo, Deus criou o Céu e a Terra, formou o homem e colocou-o num jardim delicioso para o cultivar”. Jesus Cristo, observa São Gregório, diz-nos que o Reino dos Céus é semelhante a um pai de família que assalaria operários para a sua vinha. Ora, quem pode melhor representar o pai de família do que o Criador, que governa com a sua Providência tudo o criado e traz neste mundo os seus escolhidos como o Senhor traz os servos em sua casa? A vinha é a Igreja. Todos os que se aplicaram com retidão à prática do bem e exortaram os outros com a palavra ou com o exemplo a enveredar pelos caminhos da virtude, são operários desta vinha. Pelos da primeira, da terceira, da sexta e da nona hora, quis o Senhor designar o povo judeu, que desde o princípio se esforçou por servir a Deus na pessoa dos seus profetas e dos seus santos e não cessou de trabalhar no cultivo da vinha. Pelos da undécima, designou os gentios e a eles se dirige: “Porque estais aqui o dia todo sem fazer nada? ”Todos os homens são, pois, convidados a trabalhar na vinha do Senhor, quer dizer, na própria santificação e na alheia, e glorificar por este modo a Deus. Mas Adão, falhou à sua missão: “porque tu comeste do fruto da árvore que te ordenara não comesse, a terra será maldita e tirarás dela o teu sustento à força de trabalho. Só dará espinhos e cardos. Comerás o pão no suor do teu rosto até que voltes à terra donde saíste”. Exilados do Paraíso, diz S. Agostinho, o primeiro homem comunicou a pena de morte e reprovação a todos os descendentes. O gênero humano, assim condenado, foi, por assim dizer, afundado na desgraça que vai arrastando consigo através das misérias da vida. Os textos da Missa estão cheios dos mesmos pensamentos. “Dores de morte me cercaram”, diz o Intróito. E é com justiça, diz a Oração, que sofremos pelos nossos pecados. A Epístola apresenta-nos a vida como um circo onde é necessário lutar para ganhar a coroa. O denário da vida eterna, acrescenta o Evangelho, será dado só àquele que trabalhar na vinha do Senhor. Deus na sua sabedoria preferiu, diz S. Agostinho, tirar o bem do mal a não permitir mal algum. Deus com efeito compadeceu-se dos homens e prometeu-lhes um segundo Adão que restabeleceria a ordem perturbada pelo primeiro. O Paraíso era “a sombra duma vida mais perfeita”. Exilados de lá com Adão, perdêramos o direito a essa vida que ele representava. Porém, o segundo Adão veio reabrir-nos a porta e dar possibilidade de lá reentrarmos. Senhor, canta a Igreja, Vós sois o nosso auxílio na angústia e na indigência. Tendes o perdão convosco, iluminai sobre nós a Vossa face e salvai-nos.

A Missa da Septuagésima assim estudada prepara-nos para começar este novo período do ano litúrgico com uma compreensão mais perfeita dos mistérios pascais. Aprende-se melhor deste modo tudo o que a Páscoa representa e o que a Igreja nos ensina quando diz: “Deus criou o homem duma maneira admirável e resgatou-o de maneira mais admirável ainda”.

 

Do Evangelho: O amanhecer do mundo, a primeira hora, diz S. Gregório, pode entender-se do tempo que vai de Adão até Noé; a terceira, de Noé até Abraão; a sexta, de Abraão até Moisés; a nona, de Moisés até a vinda do Salvador; a undécima, desde a vinda do Salvador até o fim do mundo. Todos os homens são, portanto, chamados a trabalhar para a glória de Deus e a receber como salário o denário da vida eterna.

 

Missal Quotidiano e Vesperal por Dom Gaspar Lefebvre, Beneditino da Abadia de S. André. Bruges, Bélgica: Desclée de Brouwer e Cie, 1952.

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