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A que, precisamente, o preceito de amar nossos inimigos nos obriga?

“Inimigos” são aqueles que nos odeiam, ou que nos fizeram algum mal sem uma justa compensação ou a quem sentimos aversão por algum motivo (desgosto natural, inveja, etc).

Há um preceito divino especial de amar esses inimigos, não enquanto inimigos, mas na medida em que são capazes da bem-aventurança eterna e, de fato, estão destinados a ela. A inimizade deles é um mal e, como tal, deve ser rejeitada, mas as pessoas que são nossas inimigas devem ser amadas pelos dons que Deus lhes deu – elas devem ser amadas por Deus. O preceito é “especial” no sentido de ter sido promulgado por Nosso Senhor em pessoa (Mt 5, 4) e em razão da dificuldade de colocá-lo em prática. Na verdade, ele não é diferente do preceito de amar ao próximo.

Portanto não devemos odiá-los, isto é, não devemos desejar-lhes mal algum, nem nos alegrarmos com algum mal que lhes suceda. Mesmo sendo nossos inimigos, não deixam de ser filhos de Deus e de terem sido chamados à bem-aventurança; odiá-los seria um pecado, é  incompatível com o amor de Deus.

Não podemos vingar-nos deles, isto é, não podemos retribuir o mal com o mal, pois essa intenção deriva do ódio ou de outro motivo desordenado. Em teoria, é permitido desejar algum mal, algum tipo de punição ou sofrimento a eles, mas apenas se formos motivados por motivos de justiça ou de caridade genuína – isto é, para por um freio ao malfeitor e restaurar a ordem da justiça, ou para ajudá-lo a corrigir-se e a voltar-se para Deus. Mas, na prática, em razão da nossa fraqueza, é muito difícil agir baseado puramente nesses motivos. Portanto, é melhor abster-se de desejar mal a qualquer um.

Somos obrigados a dar aos nossos inimigos os sinais comuns de caridade dados a qualquer homem (por exemplo, responder a um cumprimento ou a uma pergunta) ou a aqueles que estão em condições específicas (por exemplo, ser misericordioso com os pobres).

Dentro de certas circunstâncias extraordinárias, quando certos sinais especiais de caridade são devidos pois sua omissão ou negação seria interpretada como ódio ou inimizade, podemos estar até mesmo obrigados a mostrar sinais especiais de caridade que não seriam devidos a qualquer pessoa (ou seja, aqueles que não são exigidos por sua condição, estado ou pelos costumes), mas dados por liberdade e numa amizade especial.

Somos obrigados a perdoar nossos inimigos, pois não fazer isso nos levaria de volta ao ódio da inimizade – mas não somos obrigados a aceitá-los novamente como amigos e a dar-lhes os sinais de afeição que antes dávamos.

Finalmente, o ofensor é obrigado a buscar reconciliação o quanto antes. Mas ele está isento disso se tiver certeza moral de que terá o perdão negado, ou que vai aumentar ainda mais a tensão entre as partes, ou se o ofendido não estiver disposto a aceitar nada além da total humilhação do ofensor.

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