Deus é simples, ou seja, sem partes, sem nenhuma possibilidade de divisão e, portanto, de corrupção. Portanto, Deus é perfeito e eterno. Não pode mudar nem morrer. A Santíssima Trindade não pode perder nem diminuir a sua perfeita simplicidade e a unidade de sua substância; mesmo a própria Trindade das Pessoas exprime com a maior plenitude a perfeição da sua natureza divina.
Por isso, a simplicidade e a unidade são os sinais da perfeição ou da união da alma com Deus. Por conseguinte, quanto mais uma criatura é composta e complexa mais é imperfeita! Os Anjos são compostos somente de sua essência e da existência que receberam de Deus. O homem, ao invés, além desses dois elementos dos Anjos, é composto ainda de alma e corpo. Todos os outros seres (animais, vegetais e minerais) são ainda mais complexos, e precisamente toda essa composição é a fonte de sua decomposição, ou seja, de sua corrupção e morte.
Daí podemos constatar como a característica da divindade ou santidade de uma obra é sempre a simplicidade. Quando Deus quer significar sua presença — ou quando o homem quer significar a presença de Deus, ou procura fazer qualquer coisa de santo e divino — imprime à obra composta a marca da simplicidade. Todo “dualismo” introduziria na obra divina alguma imperfeição como germe da divisão, da corrupção e, por fim, a duplicidade!
Recordo-me a esse propósito de uma reflexão de meu diretor espiritual — um santo religioso — quando foi eleito papa o cardeal Luciani no ano de 1978, o qual escolheu o nome duplo de João Paulo. Ele me disse: “Desagrada-me ver que desse modo se estabelece a duplicidade no cimo da Igreja! O Corpo Místico de Cristo exige uma cabeça única para manter a unidade. Este nome duplo não me deixa esperar nada de bom...”. De fato, os sucessores de São Pedro tiveram sempre empenho em escolher um nome único para manifestar a vontade de governar a Igreja em nome de seu único chefe, Jesus Cristo. A escolha de um nome duplo destruiu esse símbolo muito significativo, preferindo-se significar no nome a referência aos dois papas do Concílio Vaticano II. O que poderia significar coisa de pouca importância, a mim me parece ser uma característica típica da Igreja conciliar, à qual apraz a duplicidade ou, ao menos, o dualismo, batizado com o nome de “abertura” ou “liberdade religiosa” ou “pluralismo”. Vemo-lo ainda hoje a propósito do conflito entre os sustentadores do antigo e os do novo rito da missa, quando se procura obviar com a introdução do bi-ritualismo (celebrar-se nos dois ritos). E isso me faz temer, porque toda história do sacrifício se resume no drama do conflito entre dois sacrifícios.
“Devemos amar uns aos outros. Não como Caim, que era do maligno e matou o irmão. E por qual motivo o matou? Porque suas obras eram más, ao passo que as do seu irmão eram boas” (I Jo, 3, 12).
De fato, sabemos que “Abel foi pastor de rebanho e Caim agricultor. Passado certo tempo, Caim ofereceu a Deus sacrifícios dos frutos da terra. Abel depois ofereceu os mais pingues dos primogênitos do seu rebanho. Deus olhou Abel e os seus dons, mas não olhou Caim e os seus dons” (Gen. 4, 2- 5).
Abel ofereceu o mais belo cordeiro de seu rebanho, enquanto Caim ofereceu os frutos da terra. Talvez a sua intenção era boa, mas não soube escolher a coisa mais bela para sacrifica-la a Deus: não ofereceu o mais belo fruto da terra.
A história do homem pode chamar-se a história do conflito entre os dois sacrifícios: o do cordeiro, que foi aceito, e o dos frutos da terra, que não foi aceito; o que foi oferecido sobre o altar em nome do Senhor, e o que foi feito em nome do homem.
O 1° Livro dos Reis (18, 21-40) narra um episódio análogo acontecido entre Elias e os profetas do Baal. Estes — eram quatrocentos e cinqüenta — puseram-se a invocar o nome de Baal de manhã ao meio-dia, depois se agitavam em torno do altar que tinham feito... mas “não se tinha ouvido nenhuma voz e ninguém respondia ou prestava atenção ao que eles pediam”. A primeira concelebração da história resultou em um tremendo conflito (todos foram mortos pelo profeta Elias). Elias, por seu turno, “edificou com pedras um altar em nome do Senhor”, pedindo-Lhe que manifestasse o seu poder: “Mostrai que sois o Deus de Israel e que eu sou teu servo”. E Deus se agradou de seu sacrifício e devorou o holocausto com o fogo.
Não é esse o drama que vivemos hoje? De fato temos a missa de Abel — na qual a Igreja oferece a Deus sobre o altar o seu bem mais precioso, ou seja, o Corpo e o Sangue do Cordeiro imaculado, o primogênito dos filhos de Deus; e temos a missa de Caim, que não tem mais nada a oferecer que “os frutos da terra e do trabalho do homem”, enquanto todos dançam e cantam em torno do altar que foi construído pelo homem como uma mesa.
Este dualismo não é tolerável, e um destes sacrifícios deverá perecer: o que não foi instituído por Deus para a sua glória! Deverá perecer porque Deus não poderá ser glorificado por um sacrifício inventado pelos não católicos (maçons, protestantes, modernistas) para agradar aos não católicos, como confessou Paulo VI a Jean Guitton.
Como a Igreja não é bicéfala, assim o seu sacrifício não pode ser senão único (embora seja expresso por ritos católicos diversos). Portanto, se a Missa Tridentina é válida, boa, santa..., como dizem aqueles mesmos que a vetaram há já trinta anos, por que inventaram outra? Por que querer manter a todo custo essa nova missa, quando já foi demonstrado tantas vezes que é dúbia, na sua história como na sua natureza? Como se podem fazer rezar ainda hoje os sacerdotes e o povo católico através dessas preces de um ofertório que não é outra coisa que uma fórmula da Cabala hebraica? Por que esta obstinação em impor o “bi-ritualismo” àqueles que querem conservar a Missa tridentina?
Queira Deus que nossa Mãe, a Santa Igreja Católica, não deva mais suportar esse falso sacrifício. É já muito que tenha sofrido trinta anos. Que a Santíssima Virgem venha logo esmagar esta serpente que quer morder o coração da Santa Igreja, a santa Missa de sempre.