8.0 A tese historicamente infundada e doutrina perniciosa, segundo a qual “comunidades consideráveis” (haud exiguae) se separaram da Igreja Católica, melhor dizendo tornaram-se heréticas e cismaticas também por culpa de homens da Igreja: “muitas vezes por culpa das pessoas de uma e de outra parte” (Unitatis Reintegratio 3).
8.1 A afirmação “Os que hoje nascem em tais comunidades e que vivem da fé em Cristo, não podem ser acusados de pecado de divisão” (UR 3).
A afirmação é teologicamente errada, já que o “pecado de divisão” se consuma ainda hoje, quando o cismático e herético, que “vive” não da “fé em Cristo”, mas das doutrinas de sua seita, quando chega à idade adulta, dá a estas doutrinas a adesão consciente de sua inteligência e de sua vontade, passando do estado de herético e cismático material, de quem está no erro de boa fé, ao estado de herético e cismatico formal, de quem por um ato positivo pessoal, se recusa a submeter-se à doutrina revelada por Cristo e à autoridade que ele instituiu.
8.2 A afirmação “os que crêem no Cristo e receberam validamente o batismo, se acham em uma certa comunhão, se bem que imperfeita, com a Igreja Católica (quadam communione etsi non perfecta)” (UR 3) e a afirmação semelhante do artigo 4, segundo a qual os cismáticos e os heréticos “estão unidos pelo batismo” (baptismate appositi) à Igreja, “mas estão separados de sua plena comunhão” (UR 4), ambas contradizem a tradição universal da Igreja, reafirmada por Pio XII em Mystici corporis, a saber que” só se pode contar no numero dos membros da Igreja os que receberam o batismo de regeneração e que professam a verdadeira fé e não se separaram, infelizmente, deste corpo por si mesmos ou que, por faltas gravíssimas, dela estão separados pela autoridade legitima”. E isto é valido para todos os heréticos e cismaticos públicos, mesmo que estejam de boa fé (heréticos e cismaticos materiais).
Estes últimos, no entanto, diferentemente dos heréticos e cismáticos formais, são, por sua disponibilidade de professar a verdadeira fé na verdadeira Igreja (votum Ecclesiae), “ordenados”, “por um certo desejo inconsciente, ao Corpo místico do Redentor” e, se bem que se encontrem fora da entidade visível deste corpo, podem pertencer-lhe de modo invisível e chegar assim à justificação e à salvação. Entretanto, ficam “privados desses numerosos dons e dessas ajudas celestes dos quais só lhes é dado gozar na Igreja Católica”. Foi por isso que Pio XII, como seus predecessores, os convidaram “a favorecer os movimentos interiores da graça e saírem de seu estado, no qual não podem estar seguros de sua salvação”: “Que entrem então na unidade católica” (AAS 35 (1943) 242-243; DZ 2290/ 3821).
É preciso em seguida notar a falsidade da frase seguinte, contida na UR 3: “No entretanto, justificados pela fé recebida no batismo, [os “irmãos separados”] estão incorporados ao Cristo e levam a justo titulo o nome de cristãos”; frase pela qual se introduz a idéia de que em virtude só do batismo, os não católicos estão “incorporados ao Cristo” e que podem ser contados no número dos membros da Igreja, independentemente da profissão da verdadeira fé e da obediência aos Pastores legítimos.
A frase é o resultado da manipulação de uma passagem do Concilio de Florença (1439), ao qual se faz referencia em nota, extraída do celebre decreto pro Armenis que restabeleceu a unidade com a Igreja armeniana. Mas o decreto em questão ilustra os sete Sacramentos, tais como devem ser compreendidos pelos Católicos, sem fazer nenhuma referencia ao batismo dos heréticos e à sua significação: “O primeiro de todos os sacramentos é o batismo, porta da vida espiritual: graças a ele nos tornamos membros do Cristo e parte do Corpo da Igreja (per ipsum enim membra Christi ac de corpore efficiamur Ecclesiae)” (DZ696/1314). Aqueles que estão “incorporados” ao Cristo, à Igreja, são aqui católicos e não os heréticos e os cismaticos.
8.3 A ilustração na Lúmen Gentium 8 (cf.§2.0) da falsa noção segundo a qual o patrimônio de valores dos “irmãos separados”, estaria incluido nos “elementa plura sanctificationis et veritatis” que, fora da Igreja Católica, “pertencem de direito à única Igreja do Cristo” (UR 3). Esses “elementos de santificação e de verdade” seriam: “a palavra de Deus escrita, a vida da graça, a fé, a esperança e a caridade e outros dons interiores do Espírito Santo e de outros elementos visíveis”. Deveria-se, então, concluir que “essas Igreja e comunidades separadas, se bem que as cremos vitimas de deficiências [a heresia e o cisma tornaram-se simples “deficiências”], não são, de maneira nenhuma, privadas de significação e de valor no mistério da Salvação. O Espírito do Cristo, com efeito, não recusa se servir delas como meios de salvação cuja força deriva da plenitude da graça e da verdade que foi confiada à Igreja Católica” (UR 3).
Não se chega a compreender como a “vida da graça” e as três virtudes teologais (fé, esperança e caridade) possam ser conservadas em comunidades heréticas e cismáticas, rebeldes à autoridade da única Igreja legitima do Cristo, sabendo-se que aqui se trata de “comunidades”, organismos estrangeiros e opostos à única Igreja do Cristo e não de indivíduos (para os quais cf. §8.1 e 8.2) Alem disso, gostaríamos de saber quais as possibilidades de “santificação” e quais as “verdades” que estão contidas nas doutrinas e no modo de viver dessas comunidades heréticas e cismáticas orgulhosamente opostas ao Pontífice Romano e a tudo o que é católico e nas quais muitos negam a própria idéia de “santificação” e defendem uma noção inteiramente subjetiva da verdade incluindo a verdade revelada.
8.4 A afirmação segundo a qual os “cristãos não católicos” (que são heréticos e cismáticos formais ou aos menos materiais) gozariam, em quanto tais, de “uma união real no Espírito Santo, (immo vera quaedam in Spiritu Sancto coniunctio), pois o Espírito age igualmente neles por seus dons e suas graças com seu poder santificador; e ele deu a alguns dentre eles uma virtude que os fortificou até a efusão de seu sangue” (LG 15).
Afirmação doutrinariamente falsa porque os “irmãos separados” são “separados” precisamente porque se rebelaram contra o ensino da Igreja, resistindo assim ao Espírito Santo, que não pode então nem “se unir” a eles enquanto comunidades “separadas” e revoltadas, nem conferir a heréticos e cismáticos, enquanto os são, o dom do martírio pela verdadeira fé, que eles não professam e que até mesmo combateram. Os missionários protestantes mortos porque missionários não podem ser considerados como mártires, quer dizer testemunhos da verdadeira fé.
Certamente, um herético formal pode, pela graça de Deus, se converter e morrer pela verdadeira fé, mas então ele morre católico; um herético material pertence, de maneira invisível, pelo votum Ecclesiae, à Igreja Católica e pois, se for martirizado, morre também católico, não herético nem cismatico (mas isso – como diz Pio IX – é “o segredo de Deus”).Mas não é isso que os artigos citados querem dizer: estes afirmam suficientemente claro, ao contrario, que os “não católicos” seriam assistidos enquanto tais pelo Espírito de Verdade, a ponto de, alguns entre eles, terem “derramado seu sangue”, quer dizer suportado o martírio por sua fé, o que implicariam em dizer: por seus erros! Os textos se prestam a pior interpretação, que é essa de querer, por sua alusão aos “mártires” sem referir a sua “fé”, se referir também aos heréticos obstinados, tenazes corruptores de almas, justamente condenados no passado pela Igreja (ver também Dignitatis Humanae, que condena o uso da força para defender a fé, que foi praticada outrora pela Igreja).
8.5 O novo dever pastoral confiado à Igreja de “colaborar com o gênero humano [no lugar de o converter ao Cristo] para a instauração de uma fraternidade universal” (GS 3); daí a exortação dirigida aos católicos (em realidade uma ordem) para colaborar com os heréticos e os cismaticos (os “irmãos separados”) para elaborar traduções ecumênicas das Santas Escrituras (Sacrosantum Concilium 22); para colaborar na obra do apostolado cristão, em nome do “patrimônio evangélico comum”, que comportaria até “o dever comum (officium) do testemunho cristão” (Apostolicam Actuositatem 27; UR 24); para orar com eles em certas circunstancias especiais (UR 8).
Trata-se de uma pastoral totalmente nova, porque ensina exatamente o contrario do que foi ordenado pelos Apóstolos quanto à atitude que se deve ter em relação aos heréticos: “Foge do homem herege, depois da primeira e segunda correção; sabendo que um tal homem está pervertido e peca, condenado pelo seu próprio juízo”(Tito 3, 10-11); “Se alguém vem a vós e não traz esta doutrina, não o recebais em vossa casa, nem o saudeis. Porque quem o saúda, participa das suas obras más” (2 João, 10-11).
O erro doutrinal que subentende a “nova” pastoral é evidente: não existe e não pode existir “patrimônio comum” e “valores comuns” com os heréticos e os cismáticos. Os protestantes não reconhecem a Tradição como fonte do dogma, nem reconhecem a verdade de fé segundo a qual é o Magistério da Igreja, assistido pelo Espírito Santo, que define “o sentido e a interpretação das Escrituras” (DZ786/1507), Escrituras que eles deformam de mil modos, se fiando no livre exame individual, ao qual ousam submeter a aceitação de tal ou qual verdade revelada. Lutero, seu chefe, destruiu tudo o que ele pôde no dogma e na moral: negou a autoridade do Papa, da Tradição, o sacerdócio, alterou as Escrituras desnaturou a própria noção de Igreja, reduziu o numero dos Sacramentos de sete para dois e estes dois são abastardados, negou a transubstanciação e o sentido propiciatório do Santo Sacrifício, o Purgatório, a virgindade de Maria depois do parto, ridicularizou o principio da Santidade, a virgindade e a castidade, admitiu o divorcio, negou o livre arbítrio e o valor meritório da obras, fomentou os ódios entre cristãos incitando-os alem disso contra o principio da autoridade. Os anglicanos conservaram o episcopado, mas é como se não o tivessem porque suas consagrações e ordenações são nulas. Leão XIII declarou-o pelo julgamento dogmático em 1896 (DZ 1963/3315 ss. e 3317 a-b): são nulas por defeito de forma e de intenção.Os anglicanos são uma seita submissa ao poder político, uma “religião civil” com fachada cristã. Entre os protestantes está hoje espalhada a presença de “sacerdotisas”, forma de neopaganismo no qual os heréticos caíram depois da penetração do feminismo e que querem instaurar também na Igreja católica, tornada “ecumênica” (sobre os “ortodoxos” ver abaixo 8.6).
8.6 A terminologia ambígua “Igrejas ou comunidades eclesiais” ou ainda “Igrejas e comunidades separadas”, relacionadas “às denominações não católicas: “suas próprias Igrejas ou comunidades” (LG 15); “...estas Igrejas e comunidades separadas...” (UR 3).
Uma tal terminologia qualifica de “Igrejas” as seitas heréticas e cismáticas com um erro teológico evidente já que somente a Igreja católica é a Igreja fundada por Cristo. Nenhuma comunidade separada desta Igreja, fundada por Cristo sobre Pedro, pode pretender ser, nem individualmente nem reunida nas outras comunidades separadas, esta Igreja única e católica que Jesus Cristo instituiu; nenhuma pode, alem disso, pretender ser membro ou parte desta, estando visivelmente separada da unidade católica o que é também a situação dos Orientais cismaticos, como foi reafirmado, contra as pretensões do ecumenismo não católico, por todos os Pontífices Romanos, de Pio IX a Pio XII.
8.7 A exortação dirigida aos teólogos católicos, a fim de que “expondo a doutrina, lembrem-se de que há uma ordem ou uma “hierarquia” das verdades da doutrina católica, em razão de suas diferentes relações com os fundamentos da fé cristã” (UR 11).
Esta exortação contem a idéia errada, expressamente condenada por Pio XI em “Mortalium animos” (1929 DZ 2199/1683), da existência de verdades reveladas, de dogmas, que sejam mais ou menos importante aceitar, quando, em razão da autoridade de Deus, temos de aceitar, com a mesma obrigação, todas as verdades contidas na Revelação Divina, porque “à razão repugna que não se creia mesmo que seja em uma só coisa se foi dita por Deus” (Leão XIII Satis Cognitum).
A exortação leva à conclusão absurda de que, no “dialogo ecumênico”, se possa discutir com os hereges as “verdades doutrinais” que nessa pretensa “hierarquia”, ocupem uma posição menos importante; esta exortação desemboca, na continuação, no falso principio contido na conclusão do artigo 11, do qual falaremos no próximo parágrafo.
8.8 O principio segundo o qual, expondo as doutrinas da Igreja em face àquelas dos irmãos separados, levando em conta a “hierarquia” (inexistente) das verdades doutrinais, “será traçada a via que conduzirá a todos, por esta emulação fraterna, a um conhecimento mais profundo e uma manifestação mais evidente das insondáveis riquezas do Cristo (Efesios, 3,8)” (UR11).
Principio inaudito, no limite da heresia, porque confia o dever de “um mais profundo conhecimento” e “uma manifestação mais clara” das “insondáveis riquezas do Cristo” ao estudo teológico em comum com os heréticos. Como se não fosse o Magistério infalível encarregado de transmitir fielmente e de definir claramente a Verdade revelada e como se a Verdade católica pudesse andar ao par com os erros dos membros das seitas e dos cismáticos e até se colocar em uma “emulação fraterna” para nos fazer conhecer melhor as riquezas insondáveis de Nosso Senhor! São Paulo nos diz em Efesios 3,8 (traiçoeiramente citado pelo Concilio) que “lhe foi dada a graça de anunciar aos Gentios a insondável riqueza do Cristo”: de anuncia-la pela pregação da sã doutrina (2 Tim. 4,2-3), não pelo “dialogo” com os heréticos e os cismáticos, expressamente interdito por ele e por São João (e por todos os Papas) (cf. § 8.5)
8.9 O enfraquecimento, a deminutio, para satisfazer os protestantes, do dogma definido pelo Concilio de Trento, segundo o qual só a Igreja é encarregada de “julgar a verdadeira significação e interpretação das Santas Escrituras” (DZ 786/507). O enfraquecimento deste dogma tem lugar na frase: “segundo a fé católica, o magistério autentico ocupa um lugar particular (peculiarem locum) para a explicação e a pregação da Palavra de Deus escrita” (UR 21). Somente um “lugar particular” na “explicação” e na “pregação” da Palavra escrita? Mas é bem mais do que isto que cabe ao Magistério, porque ele é sobrenaturalmente fundado e assistido, é o único juiz da “verdadeira significação e da interpretação das Escrituras”.
8.10 A afirmação errada segundo a qual os protestantes “querem, como nós, se apegarem à Palavra do Cristo como a fonte da força cristã, etc...” (UR 23). Esta afirmação está errada porque os protestantes querem, na realidade, se prenderem à “palavra do Cristo” não como católicos, quer dizer, não como a Igreja Católica ensina, mas segundo o falso principio do “livre exame”, que permite “proclamar livremente tudo o que [lhes] parecer verdadeiro” (confidenter confitendi quidiquid verum videtur) principio formalmente condenado como herético em 1520 por Leão X, na bula Exurge Domine, que condenou as heresias de Lutero (DZ769/1479).