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Art. 3 – Se os homens no estado de inocência eram todos iguais.

O terceiro discute-se assim. – Parece que os homens no estado de inocência eram todos iguais.

1. Pois, Gregório, no que não delinqüimos, somos todos iguais. Ora, no estado de inocência não havia delito. Logo, todos eram iguais.

2. Demais. – A semelhança e a igualdade é a razão do amor, conforme aquilo da Escritura: Todo o animal ama ao seu semelhante; assim também todo o homem ama ao seu próximo. Ora, no sobredito estado, abundaria entre os homens o amor, que é o vínculo da paz. Logo, no estado de inocência, todos eram iguais.

3. Demais. – Cessando a causa, cessa o efeito. Mas, a causa da desigualdade entre os homens, atualmente, provém da parte de Deus, que conforme os méritos premeia uns e pune outros; e da parte da natureza, pois por defeito da mesma uns nascem fracos e falhos, outros fortes e perfeitos. O que não se daria no primitivo estado.

Mas, em contrário, diz a Escritura: as que há, essas forma por Deus ordenadas: Ora, a ordem consiste, principalmente, na disparidade, como diz Agostinho: a ordem é a disposição de coisas iguais e desiguais, atribuindo a cada uma o lugar devido. Logo, no primeiro estado, que era ordenadíssimo, havia disparidade.

SOLUÇÃO. – Forçoso é admitir-se alguma disparidade no primeiro estado ao menos quanto ao sexo, pois sem a diversidade sexual não havia geração. E também semelhantemente quanto à idade, pois uns nasciam dos outros, não sendo estéreis os que se unissem.

Mas, no tocante à alma, também haveria diversidade, quanto à justiça e à ciência. Pois, o homem não obrava coagido, mas com livre arbítrio, pelo qual pode aplicar o espírito, mais ou menos, a fazer, querer ou conhecer alguma coisa. Por onde, uns progrediriam na justiça e na ciência, mais que outros. Também por parte do corpo podia haver disparidade. Pois, o corpo humano não estava de tal modo isento das leis da natureza que não recebesse, mais ou menos, alguma ajuda ao auxílio dos agentes exteriores, porquanto a vida do homem sustentava-se de alimentos. E assim, nada impede dizer que , segundo a disposição diversa do ar e o sítio diverso das estrelas, uns fossem gerados mais robustos de corpo, maiores, mais belos e de melhor compleição, que outros. Mas, de modo tal que, naqueles que se salientassem não houvesse nenhuma deficiência ou pecado, quer da alma quer do corpo.

DONDE A RESPOSTA À PRIMEIRA OBJEÇÃO. – Pelas palavras citadas, Gregório entende excluir a disparidade que se funda na diferença da justiça e do pecado; pela qual uns devem sofrer, penalmente, a coerção de outros.

RESPOSTA À SEGUNDA. – A igualdade é a causa de ser igual a dileção mútua. Todavia, entre desiguais pode haver maior dileção que entre iguais, embora não haja de lado a lado igual correspondência. Assim, o pai ama naturalmente, o filho mais do que o irmão, a outro; embora o filho não ame o pai tanto quanto dele é amado.

RESPOSTA À TERCEIRA. – A causa da disparidade podia provir, por parte de Deus, não de ele punir a uns e premiar a outros; mas, de sublimar mais a uns, e a outros, menos, de modo que a beleza da ordem resplendesse mais nos homens. E também por sua parte, a natureza podia causar a disparidade, ao modo supra-dito, sem nenhum defeito da mesma.

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