O décimo discute-se assim. – Parece que a mediedade da justiça não é uma mediedade real.
1. – Pois, a ideia do gênero aparece em todas as espécies. Ora, a virtude moral é definida como um hábito eletivo, consistindo numa mediedade e determinada pela nossa razão. Logo, a justiça consiste numa mediedade, não, real, mas, racional.
2. Demais. – Os bens absolutos não são susceptíveis de aumento e de diminuição e, por consequência, nem de mediedade, como as virtudes claramente o mostram, e Aristóteles o diz. Ora, a justiça versa sobre bens absolutos, como o prova Aristóteles. Logo, na justiça não há mediedade real.
3. Demais. – Diz-se que as outras virtudes comportam uma mediedade racional e não, real, porque essa mediedade varia de pessoa para pessoa. Pois, o que para um muito, é pouco para outro, como diz Aristóteles. Ora, o mesmo também se dá com a justiça; assim, quem feriu um chefe não é punido com a mesma pena que castiga quem feriu um particular. Logo, na justiça também não há mediedade real, mas racional.
Mas, em contrário, o Filósofo funda a mediedade da justiça numa proporção aritmética, o que é uma mediedade real.
SOLUÇÃO. – Como já dissemos as outras virtudes morais, que não a justiça, regulam principalmente as paixões, cuja retificação não depende senão do sujeito mesmo a que elas pertencem, fazendo, por exemplo, com que ceda à ira e ao desejo, como deve, de conformidade comas diversas circunstâncias. Por onde, a mediedade dessas virtudes não implica nenhuma proporção entre urna coisa e outra, mas, só relativamente ao sujeito da virtude. E, por isso, nelas a mediedade é só dependente da nossa razão. A matéria da justiça, porém, é a obra externa, enquanto que esta, ou o seu objeto, mantém a proporção devida com outra pessoa. Por onde, a mediedade da justiça consiste numa certa proporção de igualdade entre a nossa obra externa e uma outra pessoa. Ora, o igual é uma mediedade real entre o mais e o menos, como diz Aristóteles Logo, a mediedade da justiça é real.
DONDE A RESPOSTA À PRIMEIRA OBJEÇÃO. – A mediedade real é também mediedade racional. Por onde, a justiça realiza a ideia de virtude moral.
RESPOSTA À SEGUNDA. – De dois modos podemos considerar um bem absoluto. - Primeiro, por ser bem a todos os respeitos; assim o são as virtudes. E, então, em tais bens absolutos não há lugar para meio e extremos. - Noutro sentido, bem absoluto é o que por natureza o é, embora, pelo abuso, possa vir a ser um mal, como se dá com as riquezas e as honras. E tais bens são susceptíveis de aumento, de diminuição e de mediedade, em relação aos que podem usar bem ou mal deles. Ora, a justiça versa sobre os bens absolutos, neste segundo sentido.
RESPOSTA À TERCEIRA. – A injúria assacada contra um chefe não tem as mesmas proporções que a assacada contra um particular. Por onde e necessariamente a justiça vindicativa há de se proporcionar diferentemente a uma e outra. O que implica uma diversidade real e não somente racional.