O décimo sexto discute-se assim. – Parece que a prudência pode perder-se pelo esquecimento.
1. – Pois, a ciência, tendo por objeto o necessário, é mais certa que a prudência, que versa sobre atos contingentes. Ora, a ciência se perde pelo esquecimento. Logo, com muito maior razão a prudência.
2. Demais. – Como diz o Filósofo, a virtude é produzida e corrompida pelas mesmas causas, agindo em sentido contrário. Ora, a prudência, para existir, precisa da experiência, pois ela só existe depois que a memória armazenou muitas experiências, como diz Aristóteles. Logo, opondo-se o esquecimento à memória, parece que a prudência pode perder-se pelo esquecimento.
3. Demais. – Não há prudência sem o conhecimento do universal. Ora, o conhecimento pode perder-se pelo esquecimento. Logo, também a prudência.
Mas, em contrário, diz o Filósofo, que o esquecimento é próprio da arte e não, da prudência.
SOLUÇÃO. – O esquecimento só é relativo ao conhecimento. Por onde, pelo esquecimento podemos perder totalmente, tanto a arte como a ciência, que residem na razão. Mas a prudência não consiste só no conhecimento, senão também no apetite; pois, como dissemos, o principal ato dela é mandar, que consiste em aplicar o conhecimento adquirido ao desejar e ao agir. Por isso, a prudência não fica diretamente eliminada pelo esquecimento, mas antes, corrompe-se pelas paixões; pois, como diz o Filósofo, o prazer e a tristeza pervertem o juízo da prudência. Donde o dizer a Escritura: A formosura te seduziu e a concupiscência te perverteu o coração; e noutro lugar: Não aceitarás donativos, porque eles fazem cegar ainda aos prudentes. - O esquecimento, porém, pode impedir a prudência, porque, para mandar ela parte do conhecimento, e esse podemos perdê-lo pelo esquecimento.
DONDE A RESPOSTA À PRIMEIRA OBJEÇÃO. – A ciência só existe na razão. Por onde, não se dá com ela o mesmo que com a prudência, como dissemos.
RESPOSTA À SEGUNDA. – A experiência da prudência não se adquire só pela memória, mas pelo exercício de mandar com retidão.
RESPOSTA À TERCEIRA. – A prudência consiste principalmente, não no conhecimento do universal, mas na aplicação desse conhecimento aos atos. Por onde, o esquecer-se o conhecimento universal não destrói o que a prudência tem de principal, mas lhe traz um certo impedimento, como se disse.