O décimo discute-se assim. – Parece que a prudência não se estende ao governo da multidão, mas só ao de nós mesmos.
1. – Pois, diz o Filósofo que a virtude relativa ao bem comum é a justiça. Ora, a prudência difere da justiça. Logo, a prudência não se refere ao bem comum.
2. Demais. – Parece que prudente é considerado quem procura e pratica para si mesmo o bem. Ora, frequentemente, os que buscam o bem comum descuidam do próprio. Logo, não são prudentes.
3. Demais. – A prudência se separa, por oposição, da temperança e da fortaleza. Ora, parece que a temperança e a fortaleza assim se chamam por só dizerem respeito ao bem próprio. Logo também a prudência.
Mas, em contrário, a Escritura: quem crês que é o servo fiel e prudente, a quem seu senhor pôs sobre a sua família?
SOLUÇÃO. – Como diz o Filósofo, alguns ensinaram que a prudência não se estende ao bem comum, mas só ao próprio. E isto por pensarem, que o homem não há de buscar senão o bem próprio. Mas esta doutrina repugna à caridade, que não busca os seus próprios interesses, como diz a Escritura Por isso, o Apóstolo diz, e si mesmo: Não buscando o que me é de proveito, senão o de muitos, para que sejam salvos. E também repugna à razão reta, que considera o bem comum melhor que o particular. Ora, à prudência pertence aconselhar retamente, julgar e ordenar sobre os meios conducentes ao fim devido. Por onde, é manifesto que a prudência se ocupa, não só com o bem particular de cada um, mas também, com o comum, de todos.
DONDE A RESPOSTA À PRIMEIRA OBJEÇÃO. – No lugar citado, o Filósofo se refere à virtude moral. Pois, assim como toda virtude moral, relativa ao bem comum, chama-se justiça legal, assim também a prudência, relativa ao bem comum, chama-se prudência política. De modo que a política está para a justiça legal, como a prudência, absolutamente considerada, para a virtude moral.
RESPOSTA À SEGUNDA. – Quem busca o bem comum da multidão busca, por consequência, também o seu bem próprio, por duas razões. Primeiro, porque o bem particular não pode existir sem o bem comum ou da família, da cidade, ou do reino. Por isso Valério Máximo diz, e os antigos Romanos preferiam ser pobres num império rico, que ricos num império pobre. - Segundo, porque, fazendo o homem parte de uma casa ou de uma cidade, é preciso levar em conta o que lhe constitui o bem, procedendo como prudente relativamente ao bem da multidão. Pois, a boa disposição das partes depende da sua relação com o todo; porque, como diz Agostinho, disforme toda parte que não está ligada ao todo.
RESPOSTA À TERCEIRA. – Também a temperança e a fortaleza podem referir-se ao bem comum; por isso, se estabeleceram preceitos de lei que lhes regem os atos, como diz Aristóteles. Mas, a esse bem mais se refere a prudência e a justiça, pertencentes à parte racional, que tem por objeto o geral, assim como a parte sensitiva tem por objeto o particular.