O quarto discute-se assim. – Parece que o temor servil não é bom.
1. – Pois, é mau aquilo cuja atividade é má. Ora, a atividade do temor servil é má; porque, como diz a Glosa, quem age com temor, embora seja bom o que faz, não o faz bem. Logo, o temor servil não é bom.
2. Demais. – O que provém radicalmente do pecado não é bom. Ora, o temor servil nasce radicalmente do pecado; pois, aquilo da Escritura - Porque não morri eu dentro do ventre de minha mãe - diz Gregório: Quando tememos a pena presente, consequência do pecado, e não amamos o rosto perdido, de Deus, o temor vem do orgulho e não da humildade, Logo, o temor servil é mau.
3. Demais. – Assim como o amor mercenário se opõe ao da caridade, assim parece que o temor servil se opõe ao temor casto. Ora, o amor mercenário é sempre um mal. Logo, também o temor servil o é.
Mas, em contrário. – Nenhum mal vem do Espírito Santo. Ora, do Espírito Santo provém o temor servil; pois, aquilo da Escritura Não recebestes o Espírito de escravidão - diz a Glosa: Um mesmo Espírito é o que causa as duas espécies de temor - o servil e o casto. Logo, o temor servil não é mau.
SOLUÇÃO. – O temor servil, pelo seu caráter de servilidade, é mau, pois esta se opõe à liberdade. Por onde, sendo livre quem é senhor de si, como diz Aristóteles escravo é quem não obra por si mesmo, senão quase movido por uma causa externa. Ora, quem age por amor age como por si mesmo, pois é levado ao ato por uma inclinação própria. Portanto, é contra a natureza da servilidade agir por amor. Assim pois o temor servil, enquanto servil, é contrário à caridade. Se portanto a servilidade fosse da essência do temor servil, necessariamente haveria este de ser mau, assim como o adultério é em si mesmo mau pelo especificar a sua oposição à caridade. Ora, a servilidade em questão não pertence à espécie do temor servil, assim como a falta de informação não pertence à da fé informe. Pois um hábito moral ou um ato se especifica pelo seu objeto. Ora, o objeto do temor servil é a pena. E a esta é acidental que o bem, que ela contraria, seja amado como fim último, e por consequência seja ela temida como o mal principal; o que se dá com quem não tem caridade. Ou que seja ordenado para Deus, como fim, e por consequência não seja temida como mal principal, o que sucede com quem tem caridade. Ora, um hábito não muda de espécie por ser o seu objeto ou o seu fim ordenado a um fim ulterior. Logo, o temor servil é substancialmente bom; mas a sua servilidade é má.
DONDE A RESPOSTA À PRIMEIRA OBJEÇÃO. – As palavras citadas de Agostinho entendem-se de quem age por temor servil, como tal, de modo que não ame a justiça, mas somente tema a pena.
RESPOSTA À SEGUNDA. – O temor servil, na sua substância, não procede do orgulho, mas sim, a sua servilidade, por não querer o homem sujeitar o seu afeto, por amor, ao jugo da justiça.
RESPOSTA À TERCEIRA. – Chama-se amor mercenário o que ama a Deus por causa dos bens temporais, o que em si mesmo encontra a caridade. Por isso, tal amor é sempre mau. Mas o temor servil, na sua substância, não implica senão o temor da pena quer seja esta temida como o mal principal, quer não.