O quinto discute-se assim. – Parece que não há várias espécies de infidelidade.
1 – Pois, sendo a fé e a infidelidade contrárias, hão de ter o mesmo objeto. Ora, é o objeto formal da fé a verdade primeira, donde ela tira a sua unidade, embora recaia sobre muitas coisas materialmente. Logo, também o objeto da infidelidade é a verdade primeira.
Porém, aquilo em que o infiel não crê se inclui materialmente na infidelidade. Ora, a diferença específica se funda não em princípios materiais, mas, formais. Logo, não há diversas espécies de infidelidade, conforme aos diversos pontos em que os infiéis erram.
2. Demais. – De infinitos modos podemos nos desviar das verdades da fé. Se pois, conforme aos diversos erros, são diversas as espécies de infidelidade, resulta que estas espécies são infinitas. E portanto, não são susceptíveis de consideração.
3. Demais. – Uma mesma coisa não pode pertencer a espécies diversas. Ora, alguém pode ser infiel por errar em matérias diversas. Logo, a diversidade dos erros não acarreta as diversas espécies de infidelidade. Portanto, não há várias espécies de infidelidade.
Mas, em contrário, a cada virtude se opõem várias espécies de vícios; pois, o bem só se realiza de um modo, e o mal, ao contrário, de muitos, como se vê claramente em Dionísio e no Filósofo. Ora, é a fé uma virtude. Logo, a ela se lhe opõem muitas espécies de infidelidade.
SOLUÇÃO. – Toda virtude consiste na obediência a uma regra do conhecimento ou da ação humana, como se disse. Ora, em cada matéria, há um só modo de obedecer à regra; ao contrário, de muitos modos é possível desviar dela, e portanto, a uma virtude se opõem muitos vícios. Ora, a diversidade dos vícios, que se opõem a cada virtude, pode ser considerada à dupla luz. – Primeiro, quanto às suas relações diversas com a virtude. E então, há certas e determinadas espécies de vícios que se opõem a uma mesma virtude; assim, à virtude moral se opõe um vício, que peca contra ela por excesso, e outro, por defeito. – De outro modo, podemos considerar a diversidade dos vícios opostos a uma virtude, relativamente à corrupção das diversas circunstâncias exigidas pela virtude. E então, a uma mesma virtude, por exemplo, à temperança ou à fortaleza, opõem-se vícios infinitos, porque de infinitos modos podem corromper-se as diversas circunstâncias da virtude, e portanto dar-se o afastamento, da retidão da mesma. Por isso, os Pitagóricos ensinavam que o mal é infinito.
Por onde devemos dizer que, considerada a infidelidade relativamente ao fim, são diversas as espécies e determinado o número delas. Pois, a resistência à fé, que constitui o pecado da infidelidade, pode se dar de dois modos. Pois, ou se resiste à fé ainda não recebida, e essa é a infidelidade dos pagãos ou gentios. Ou se resiste à fé cristã já recebida, quer em figura, e tal é a infidelidade dos judeus; quer, na manifestação mesma da verdade, e tal é a dos heréticos. Por onde e em geral, podemos considerar como três as referidas espécies de infidelidade. - Se porém distinguirmos as espécies de infidelidade relativamente aos erros diversos em matéria de fé, então essas espécies não são determinadas, pois os erros podem multiplicar-se ao infinito, como se vê claramente em Agostinho.
DONDE A RESPOSTA À PRIMEIRA OBJEÇÃO. – A razão formal de um pecado pode ser considerada à dupla luz. Ou dependentemente da intenção do pecador, e nesse caso aquilo que ele busca é o objeto formal do pecado e lhe diversifica as espécies. Ou relativamente à noção do mal, e então o bem de que ele se afasta é o objeto formal do pecado. Mas isto não lhe dá a espécie, mas antes, a priva dela. Por onde devemos dizer, que o objeto da infidelidade é a verdade primeira, como aquilo de que ela se afasta; mas o seu objeto formal, como aquilo para o que se converte; é a ciência falsa que ela segue, e por este lado se lhe diversificam as espécies. Portanto, assim como a caridade é uma só, a que se une ao sumo bem; mas diversos os vícios a ela opostos não só por buscarem bens temporais diversos, afastando-se do sumo bem, mas, além disso, por causa das relações diversas desordenadas, para com Deus; assim também é a fé uma virtude só, por unir-se à verdade primeira única, ao passo que as espécies de infidelidade são muitas, por seguirem os infiéis opiniões falsas diversas.
RESPOSTA À SEGUNDA. – A objeção colhe quanto à distinção das espécies de infidelidade, relativamente aos pontos diversos em que se erra.
RESPOSTA À TERCEIRA. – Assim como é a fé uma só, porque crê em muitas verdades ordenadas a uma só, assim a infidelidade pode ser una, mesmo se errar em muitos pontos, enquanto todos estes se ordenam a um só. Nada porém impede que alguém erre, caindo em diversas espécies de infidelidade, assim como também pode um homem ser dominado por diversos vícios e sofrer diversas doenças do corpo.