O sexto discute–se assim. – Parece que os profetas dos demônios nunca falam verdade.
1. – Pois, diz Ambrósio, que toda verdade, seja dita por quem for, procede do Espírito Santo. Ora, os profetas dos demônios não falam inspirados pelo Espírito Santo, porque, no dizer do Apóstolo, não há concórdia entre Cristo e Belial. Logo, parece que esses tais nunca declaram a verdade.
2. Demais. – Assim como os verdadeiros profetas são inspirados pelo Espírito de verdade, assim os profetas dos demônios, pelo de mentira, segundo da Escritura: Eu irei e serei um espírito mentiroso na boca de todos os teus profetas. Ora, os profetas inspirados pelo Espírito Santo nunca mentem, como se estabeleceu. Logo, os profetas dos demônios nunca falam verdade.
3. Demais. – O Evangelho diz que o diabo, quando diz a mentira, fala do que lhe é próprio, porque é mentiroso e pai dela, isto é, da mentira. Ora, quando inspira os seus profetas, o diabo não fala senão do que lhe é próprio; pois, não foi constituído ministro de Deus para declarar a verdade, porque não há comércio entre a luz e as trevas, como diz o Apóstolo. Logo, os profetas dos demônios nunca anunciam a verdade.
Mas, em contrário, uma Glosa diz, que Balaão era divino, isto é, pelo ministério dos demônios, e às vezes predizia o futuro por artes mágicas. Ora, ele anunciou muitas causas verdadeiras, como a de que fala a Escritura: Nascerá uma estreia de Jacó e levantar–se–á uma vara de Israel. Logo, também os profetas dos demônios às vezes predizem a verdade.
SOLUÇÃO. – O que se dá com o bem, em relação às causas, dá–se com a verdade, em relação ao conhecimento. Ora, como é impossível existir um ser totalmente privado do bem, também é impossível um conhecimento totalmente falso, sem nenhuma mistura de verdade. Por isso, diz Beda, nenhuma doutrina há tão falsa que não manifeste, de mistura com a sua falsidade, alguma verdade. Por onde, o ensino mesmo dos demônios, com que instruem os seus profetas, contém certas verdades, que o torna aceitável: pois, assim o intelecto se deixa arrastar à falsidade pela aparência da verdade, como a vontade, ao mal, pela aparência do bem. Por isso diz Crisóstomo: Admite–se que o diabo às vezes fale verdade, para fazer passar a sua mentira de mistura com essa verdade esporádica.
DONDE A RESPOSTA À PRIMEIRA OBJEÇÃO. – Os profetas dos demônios nem sempre falam para exprimir a revelação demoníaca; mas, às vezes, por inspiração divina, como manifestamente se lê de Balaão, a quem, segundo a Escritura, o Senhor falou, embora fosse Balaão profeta dos demônios. Pois, Deus se serve mesmo dos maus para utilidade dos bons. E assim, pelos profetas dos demônios, anuncia certas verdades; quer porque, testemunhada mesmo pelos adversários, se torna mais digna de crédito; quer também porque, crendo neles, os seus ditos mais facilmente conduzem os homens à verdade. E essa é também a razão pela qual as Sibilas predisseram muitas verdades a respeito de Cristo. Mas, ainda quando os profetas dos demônios são por eles instruídos, eles predizem certas verdades.
Ora, em virtude da própria natureza, cujo autor é o Espírito Santo; ora, também pela revelação dos bons espíritos, como está claro em Agostinho. De modo que mesmo as verdades anunciadas pelos demônios procedem do Espírito Santo.
RESPOSTA À SEGUNDA. – O verdadeiro profeta é sempre inspirado pelo Espírito de verdade, no qual nenhuma falsidade existe; e portanto, nunca mente. Ao contrário, o profeta de falsidades nem sempre é instruído pelo espírito da falsidade, mas, às vezes, o é pelo Espírito da verdade. Mas, o espírito mesmo da falsidade, umas vezes anuncia verdades e outras, mentiras, como dissemos.
RESPOSTA À TERCEIRA. – Próprio dos demônios se chama aquilo que de si mesmos têm, a saber a mentira e o pecado. Mas o que lhes pertence à própria natureza não o têm de si mesmos, mas de Deus. Ora, por virtude da própria natureza, às vezes predizem a verdade, como se disse. E também Deus se serve deles para, por meio deles, manifestar a verdade, revelando–lhes, pelos anjos, os mistérios divinos, como dissemos.