O terceiro discute–se assim. – Parece que a idolatria não é o mais grave dos pecados.
1. – Pois, o péssimo se opõe ao ótimo, como diz Aristóteles. Ora, o culto interno, que consiste na fé, na esperança e na caridade, é melhor que o externo. Logo, a infidelidade, o desespero e o ódio de Deus, opostos ao culto interno, são pecados mais graves que a idolatria, oposta ao culto externo.
2. Demais. – Tanto mais grave é um pecado quanto mais vai contra Deus. Ora, parece que vai mais diretamente contra Deus quem blasfema ou impugna a fé o que quem presta culto divino à criatura, o que constitui a idolatria. Logo, a blasfémia ou a impugnação da fé é pecado mais grave que a idolatria.
3. Demais. – Parece que os pecados maiores são castigos dos menores. Ora, o pecado de idolatria é punido pelo pecado contrário à natureza, como diz o Apóstolo.
4. Demais. – Agostinho diz: Nem a vós, isto é, aos Maniqueus, vos consideramos pagãos, ou como cismáticos pagãos; mas, como tendo certas semelhanças com eles porque adorais a muitos deuses. Sois, porém muito piores que eles; porque eles prestam culto divino a seres existentes, aos quais não deveriam prestá–lo; enquanto que vós cultuais o que de nenhum modo existe. Logo, o vício da corrupção herética é mais grave que a idolatria.
5. Demais. – Aquilo do Apóstolo – Como tornais outra vez aos rudimentos fracos e pobres – diz a glosa de Jerônimo: A observância da lei a que então eram dados, era pecado quase igual à servidão dos ídolos, a que se entregavam, antes da conversão. Logo, o pecado da idolatria não é o gravíssimo.
Mas, em contrário, àquilo da Escritura sobre a imundície da mulher, que padece de fluxo sanguíneo, diz a Glosa: Todo pecado é imundice da alma; mas, sobretudo, o de idolatria.
SOLUÇÃO. – A dupla luz podemos considerar a gravidade de um pecado. – Relativamente ao próprio pecado. E então o de idolatria é de todos o mais grave. Pois, assim como na república terrena a falta considerada mais grave é atribuir honras reais a outrem que não o verdadeiro rei, porque, como tal, essa falta perturba a ordem de toda a república; assim também, dos pecados mais graves cometidos contra Deus, é considerado gravíssimo o que comete quem presta honras divinas à criatura. Porque, como tal, esse pecado diminui o primado divino, admitindo, no mundo outro Deus. – A outra luz, a gravidade do pecado pode ser considerada relativamente ao pecador; assim, dizemos ser mais grave o pecado cometido com conhecimento do que o por ignorância. E então nada impede pequem mais gravemente os heréticos, que cientemente corrompem a fé que receberam, do que os idólatras, que pecam por ignorância. E do mesmo modo, também certos outros pecados podem ser maiores, pelo maior desprezo com que o pecador os comete.
DONDE A RESPOSTA À PRIMEIRA OBJEÇÃO. – A idolatria pressupõe a infidelidade interior, à qual acrescenta o culto externo indevido. Se, porém a idolatria for exterior, sem a infidelidade interna, ela acrescenta a culpa da falsidade, como antes dissemos.
RESPOSTA À SEGUNDA. – A idolatria encerra em si uma grande blasfémia, por privar a Deus do seu domínio exclusivo sobre as criaturas. E impugna efetivamente a fé.
RESPOSTA À TERCEIRA. – Por natureza, a pena contraria a nossa vontade. Por onde, o pecado que serve de punição a outro há de ser mais manifesto, de modo a tornar o pecador detestável a si mesmo e a outrem; mas, não é preciso que seja mais grave. E, assim sendo, o pecado contra a natureza é menos grave que o da idolatria. Mas, por ser mais manifesto, é considerado por assim dizer como uma pena imposta ao pecado de idolatria. De modo que, assim como pela idolatria o homem perverte a ordem da honra divina, assim, pelo pecado contra a natureza, sofre a perversidade que lhe transtorna a própria natureza.
RESPOSTA À QUARTA. – A heresia dos Maniqueus é pecado, mesmo genericamente considerado, mais grave que o pecado dos outros Idólatras. Porque fere mais a honra divina, admitindo dois deuses contrários e muitas imaginações vãs e fabulosas a respeito de Deus. O mesmo não se dá com outros heréticos que creem num só Deus a quem prestam curto.
RESPOSTA À QUINTA. – Observar os preceitos da lei antiga, na vigência da lei da graça, não é um pecado, genericamente considerado, de todo em todo igual à idolatria. Mas, quase igual, porque tanto um como outro são funestas espécies de superstição.