O oitavo discute–se assim. – Parece que alguma resistência pode haver à ordem do governo divino.
1. – Pois, a Escritura diz: a língua deles e as invenções da sua fantasia são contra o Senhor.
2. Demais. – Nenhum rei justo pune os que não lhe resistem às ordens. Se pois, nada se opusesse à ordem divina, ninguém seria punido justamente por Deus.
3. Demais. – Cada ser está sujeito à ordem do governo divino. Ora, há seres opostos a outros. Logo, há coisas que contrariam à ordem divina.
Mas, em contrário, diz Boécio: nada há que queira ou possa opor–se a este Sumo Bem. É pois o Sumo Bem. que rege firmemente todas as causas e as dispõe suavemente, como diz a Escritura falando da divina sapiência.
SOLUÇÃO. – De duplo modo podemos considerar a ordem da divina providência: em geral, enquanto resultante da causa governadora de tudo; e em especial, enquanto resultante de uma causa particular, executiva do governo divino. – Ora, do primeiro modo, nada se opõe à ordem do governo divino, o que se evidencia por duas razões. A primeira é que a ordem desse governo tende totalmente para o bem; e cada cousa, na sua operação e no seu impulso, não tende senão para o bem; pois, ninguém opera o mal refletidamente, como diz Dionísio. A segunda resulta clara de que, como já se disse antes, toda inclinação natural ou voluntária de um ser não é mais do que uma impressão do primeiro motor, assim como a inclinação da seta para o alvo determinado não é mais do que uma impressão do sagitário. Por onde todos os seres que agem, natural ou voluntariamente, chegam como espontaneamente ao fim para que foram ordenados divinamente. Por onde se diz que Deus dispõe de tudo suavemente.
DONDE A RESPOSTA À PRIMEIRA OBJEÇÃO. – Diz–se que alguns pensam, falam ou agem contra Deus, não porque totalmente resistam à ordem do governo divino, pois mesmo os pecadores buscam algum bem; mas porque se opõem a algum determinado bem que lhes é conveniente pela sua natureza ou estado. E por isso são justamente punidos por Deus.
E daqui se deduz clara a RESPOSTA À SEGUNDA OBJEÇÃO.
RESPOSTA À TERCEIRA. – O fato de uma cousa se opor a outra mostra que um ser pode resistir à uma ordem procedente de alguma causa particular; não porém à ordem dependente da causa universal total.