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Art. 3 ─ Se as cinzas, de que o corpo humano se reconstituirá, tem alguma inclinação natural para a alma que lhe estava unida.

O terceiro discute-se assim. ─ Parece que as cinzas, de que o corpo humano se reconstituirá, tem uma inclinação natural para a alma que lhe estava unida.

1. ─ Pois, se nenhuma inclinação tivesse para a alma, estaria para ela como as cinzas dos outros corpos. Logo, nenhuma diferença haveria em o corpo, que devesse estar unido a essa alma, ser reconstituído das cinzas próprias dele ou das de outro. O que é falso.
 
2. Demais. ─ Maior é a dependência do corpo, da alma, que da alma, do corpo. Ora, a alma separada do corpo ainda tem uma certa dependência dele; por isso fica retardada a sua tendência para Deus, pelo desejo que tem a se unir ao corpo, como diz Agostinho. Logo e com maior razão, separado da alma, a que estava unido, tem o corpo para ela uma inclinação natural.

3. Demais. ─ Job diz: Os seus ossos se encherão dos vícios da sua mocidade e com ele dormirão no pó. Ora, vícios só os pode ter a alma. Logo, as cinzas do corpo ainda conservarão uma inclinação natural para a alma a que estava unida.

Mas, em contrário. ─ O corpo humano pode resolver-se nos seus elementos próprios ou converter-se na carne dos outros animais. Ora, os elementos são homogêneos; e semelhantemente, a carne do leão ou de outro animal qualquer. Logo, como as partes dos elementos ou dos animais não tem nenhuma inclinação natural para alma a que estiverem unidas, também as partes em que se converteu o corpo humano terá qualquer inclinação para a alma a que esteve unido. O que se conclui do seguinte lugar de Agostinho: O corpo humano, seja qual for a substância dos outros corpos ou os elementos a que se reduza; quaisquer que sejam os animais ou os homens a que sirva de alimento ou em cujas carnes se transforme, voltará a unir-se num momento àquela alma humana, que primeiro a animou para que se tornasse um homem, vivesse e crescesse.

2. Demais. ─ A toda inclinação natural corresponde um agente natural; aliás falharia em matéria necessária. Ora, nenhum agente natural pode fazer com que um corpo humano, reconstituído das suas cinzas, se una de novo à alma a que pertencia. Logo, essas cinzas nenhuma inclinação natural tem à referida união.

SOLUÇÃO. ─ Nesta matéria há três opiniões.

Uns dizem que os corpos humanos nunca se resolverão nos seus elementos primitivos. E assim as suas cinzas sempre conservarão uma virtude acrescentada aos elementos, que produz uma inclinação natural para a mesma alma. ─ Mas esta opinião encontra à autoridade citada de Agostinho, tanto literalmente, quanto ao sentido; pois, todos os compostos de elementos contrários podem resolver-se nesses elementos componentes. Por isso outros são de opinião que essas partes elementares, em que o corpo humano se resolve, conservam mais luz que os outros elementos, por terem estado unidos a uma alma humana. Por isso tem uma certa inclinação para as almas humanas. ─ Mas, não menos frívola que a anterior é esta opinião. Porque as partes dos elementos tem a mesma natureza e participam igualmente da luz e da obscuridade.

Devemos, portanto, admitir que essas cinzas não têm nenhuma inclinação natural para a ressurreição, senão só por ordem da divina providência, que determinou a essas cinzas se unirem de novo à alma. Donde resulta que as partes dos elementos se unirão às almas a que anteriormente pertenceram, e não partes alheias.

Donde se deduz a resposta à primeira objeção.
 
RESPOSTA À SEGUNDA. ─ A alma separada do corpo conserva a mesma natureza que tinha, quando estava unida ao corpo. O que não se dá com o corpo. Por onde, o símil não colhe.

RESPOSTA À TERCEIRA. ─ As palavras citadas de Job não devem entender-se como significando que as cinzas dos mortos permanecem atualmente pecaminosas; mas que, segundo a ordem da divina justiça, essas cinzas são destinadas à separação do corpo que, pelos pecados cometidos, será eternamente cruciado.

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