O segundo discute-se assim. ─ Parece que os filhos ilegítimos nenhum detrimento devem sofrer pela sua ilegitimidade.
1. Pois, o filho não deve ser punido pelo pecado do pai, como está claro nas palavras do Senhor. Ora, o fato de um ter nascido de concúbito ilícito, não é pecado seu, mas do pai. Logo, disso não deve sofrer nenhum sofrimento.
2. Demais. ─ A justiça humana tem na divina o seu modelo. Ora, Deus distribuiu os seus bens naturais igualmente tanto aos filhos legítimos como aos ilegítimos. Logo, pelo direito humano também os filhos ilegítimos devem ser equiparados aos legítimos.
Mas, em contrário, a Escritura diz, que Abrão deu tudo quanto possuía a Isaac, e pelos filhos das concubinas distribuiu dádivas. E contudo estes não eram nascidos de concúbito ilícito. Logo e com maior razão, os nascidos de concúbito ilícito devem sofrer o detrimento de não receberem a herança paterna.
SOLUÇÃO. ─ De dois modos podemos dizer que alguém sofre detrimento de alguma coisa. Primeiro, por ter sido privado do que lhe era devido. E então o filho ilegítimo não sofre nenhum detrimento. ─ De outro modo, por não lhe ser devido o que, de outra maneira, lh'o seria. E então, um filho ilegítimo padece duplo detrimento. Um, o de não ser admitido a atos legítimos, como às funções e às dignidades que requerem uma determinada honorabilidade da parte daqueles que são delas investidos. O outro detrimento que sofre é o de não poder herdar do pai: ─ Contudo, os filhos naturais podem suceder só na sexta parte. ─ Mas os espúrios em nenhuma parte, embora por direito natural os pais estejam obrigados a lhes fornecer o necessário à vida. Por onde, pertence à solicitude do bispo obrigar os pais a manter tais filhos.
DONDE A RESPOSTA À PRIMEIRA OBJEÇÃO. ─ Sofrer detrimento nesse segundo sentido não é nenhuma pena. Assim, não dizemos que sofre uma pena quem, por não ser filho de rei, não lhe sucede do reino. Semelhantemente, nenhuma sofre quem, por não ser filho legítimo, não lhe é devido o que só aos filhos legítimos o é.
RESPOSTA À SEGUNDA. ─ O concúbito ilegítimo não é contrário à lei, enquanto ato da potência geratriz, mas enquanto procedente de uma vontade depravada. Por onde, o filho ilegítimo não sofre nenhum sofrimento nas causas que se adquirem pela sua origem natural, mas só naquela cuja produção ou posse dependeu da vontade.