O terceiro discute-se assim. — Parece que não só os sacerdotes têm o poder das chaves.
1. — Pois, diz Isidoro, que o ostiário deve julgar entre os bons e os maus, recebendo aqueles e rejeitando estes. Ora, esta é a definição das chaves, como do sobre dito resulta. Logo, não só os sacerdotes, mas também os ostiários, tem o poder das chaves.
2. Demais. — O poder das chaves é dado aos sacerdotes quando são ungidos por Deus. Ora, os reis também tem de Deus o poder sobre o povo fiel, e são santificados pela unção. Logo, nem só os sacerdotes tem o poder das chaves.
3. Demais. — O sacerdócio é uma ordem que cabe só a uma pessoa em particular. Ora, às vezes é toda uma congregação que tem o poder das chaves; pois, certos capítulos podem impor a excomunhão, o que pertence ao poder das chaves. Logo, nem só os sacerdotes tem o poder das chaves.
4. Demais. — A mulher, não podendo ensinar nas igrejas, como o afirma o Apóstolo, não pode também receber a ordem sacerdotal. Ora, certas mulheres tem o poder das chaves; assim as abadessas tem poder espiritual sobre as suas súditas. Logo, nem só os sacerdotes tem o poder das chaves.
Mas, em contrário, diz Ambrósio: este direito, isto é, de ligar e absolver, é permitido só aos sacerdotes.
2. Demais, — O poder das chaves estabelece um mediador entre o povo e Deus. Ora, isso cabe somente aos sacerdotes, constituídos naquelas causas que tocam a Deus, para que ofereçam dons e sacrifícios pelos pecados, no dizer do Apóstolo. Logo, só os sacerdotes tem o poder das chaves.
SOLUÇÃO. — Duplo é o poder das chaves, — Um tem por fim imediato de remover os obstáculos à entrada no céu, pela remissão dos pecados, E este se denomina chave da ordem, que só os sacerdotes tem, porque só eles se ordenam ao povo naquelas coisas que tocam diretamente a Deus. — Outra é a chave que não tem por objeto direto abrir o céu, mas só mediante a Igreja militante, que nos torna possível entrar nele; pois, por esse poder das chaves somos excluídos do consórcio da Igreja militante, ou nele admitidos, pela excomunhão e pela absolvição. E essa se chama a chave da jurisdição no foro das causas. Por onde, também os não sacerdotes podem tê-la; assim, os arquidiáconos, os prelados eleitos e outros, que podem excomungar.
DONDE A RESPOSTA À PRIMEIRA OBJEÇÃO. — Os ostiários tem o poder das chaves, a fim de guardar as coisas contidas no templo material; e podem julgar os que devem ser excluídos desse templo ou nele admitidos. Não que julguem por natureza própria, quais sejam os dignos ou os indignos, mas devem cumprir as decisões dos sacerdotes, de modo que sejam assim de certo modo executores do poder sacerdotal.
RESPOSTA À SEGUNDA. — Os reis, não tendo nenhum poder na ordem espiritual, não recebem a chave do reino celeste; mas o poder deles é puramente temporal, o qual também não pode provir senão de Deus, segundo o Apóstolo. Nem recebem unção que lhes conferisse qualquer ordem sacra; o serem ungidos significa apenas que a excelência do poder deles vem de Cristo, para reinarem, sujeitos a Cristo, sobre o povo cristão.
RESPOSTA À TERCEIRA. — Assim como na ordem política o governo pode ser confiado ora a um só juiz, como na monarquia: ora a muitos constituídos, mesmo por igual, em diversos oficias, assim também a jurisdição espiritual pode ser exercida por um só, como pelo bispo, e por vários ao mesmo tempo, como pelo capitulo. E assim todos têm simultaneamente a chave da jurisdição, mas não a da ordem.
RESPOSTA À QUARTA. — A mulher, segundo o Apóstolo, vive em estado de sujeição. Por isso não pode exercer nenhuma jurisdição espiritual; pois, o próprio Filósofo também diz que a ordem da cidade se corrompe quando o poder vem a cair em mãos de mulher. Eis porque ela não tem a chave da ordem nem a da jurisdição. É-lhes porém cometido um certo uso das chaves, de modo que possa governar outras mulheres, por causa do perigo que podia advir de homens conviverem com elas.