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Art. 3 — Se a criatura corpórea foi criada por Deus mediante os anjos.

O terceiro discute-se assim. — Parece que a criatura corpórea foi criada por Deus, mediante os anjos.
 
1. — Pois, assim como todas as coisas são governadas pela divina sabedoria, assim também por esta todas foram feitas, conforme a Escritura: Todas as coisas fizeste com sabedoria. Mas, ordenar é próprio do sábio, como diz Aristóteles. Por onde, no governo das coisas, as inferiores são regidas pelas superiores, numa certa ordem, como diz Agostinho. Logo, também na criação das coisas houve uma ordem tal, que a criatura corpórea, como inferior, foi criada pela espiritual, como superior.
 
2. Demais. — A diversidade dos efeitos mostra a das causas, porque a mesma causa sempre produz o mesmo efeito. Se, pois, todas as criaturas, tanto espirituais como corpóreas fossem criadas imediatamente por Deus, não haveria entre elas diversidade, nem uma distaria de Deus mais do que outra. O que é evidentemente falso, pois, como diz o Filósofo, alguns seres são corruptíveis por distarem muito de Deus.
 
3. Demais. — Para a produção de um efeito finito não se requer virtude infinita. Ora, todos os corpos são finitos. Logo, podiam ser produzidos por virtude finita das criaturas espirituais e o foram; pois, em tais criaturas não difere o ser do poder, sobretudo porque nenhuma dignidade conveniente a um ser, segundo a sua natureza, lhe é denegada, salvo por sua culpa.
 
Mas, em contrário, diz a Escritura: No princípio criou Deus o céu e a terra, pelos quais se entende a criatura corpórea. Logo, esta foi imediatamente criada por Deus.
 
Solução. — Alguns ensinaram, que as coisas procederam de Deus gradativamente, de modo que dele imediatamente procedeu a primeira criatura; esta produziu, outra, e assim por diante, até a criatura corpórea. — Mas esta opinião é inadmissível. Porque a primeira produção da criatura corpórea foi por via de criação, pela qual é produzida a matéria em si mesma; pois, no vir-a-ser, o imperfeito tem prioridade sobre o perfeito. Ora, é impossível que alguma coisa seja criada a não ser por Deus.
 
Para evidenciá-lo devemos considerar que, quanto mais superior é uma causa, tanto mais seres abrange no causar. Ora, o que nas coisas é substrato é mais comum do que o que as informa e restringe; assim, ser é mais comum do que viver e viver do que inteligir e a matéria do que a forma. Por tanto, quanto mais alguma coisa é substrato, tanto mais diretamente procede da causa superior. E logo, o que é o primeiro de todos os substratos propriamente depende da causalidade da causa suprema e, por conseqüência, nenhuma causa segunda pode produzir nada, sem que se pressuponha, na coisa produzida, algo causado pela causa superior. Ora, a criação é a produção de uma coisa na sua substância total, sem se pressupor nada de incriado ou de criado por outrem. Donde se conclui que ninguém pode criar nada, salvo Deus, causa primeira. E por isso, Moisés, para mostrar que todos os corpos foram criados imediatamente por Deus, disse: No princípio criou Deus o céu e a terra.
 
Donde a resposta à primeira objeção. — Na produção das coisas há uma certa ordem; não, por certo, de modo a ter uma criatura sido criada por outra, o que é impossível; mas de modo a terem sido, pela divina sapiência, constituídos diversos graus nas criaturas.
 
Resposta à segunda. — O próprio Deus, sem detrimento da sua simplicidade, conhece coisas diversas, como antes se demonstrou. E portanto, também é a causa pela sua sapiência das diversas coisas criadas, segundo as diversas coisas conhecidas; assim como o artífice, apreendendo diversas formas, produz diversos artefatos.
 
Resposta à terceira. — A grandeza da virtude do agente não só é medida pela coisa feita, mas também pelo modo de fazer; pois, uma mesma coisa é diferentemente feita por uma virtude maior e por uma menor. Ora, produzir um ser finito, sem que nada se lhe pressuponha, sendo próprio, como é, da virtude infinita, não pode competir a nenhuma criatura.

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