O sétimo discute-se assim. — Parece que o anjo supremo, dentre os que pecaram, não era o supremo de todos.
1. — Pois, diz a Escritura: Tu eras um Querubim que estendia as suas asas e protegia (o trono de Deus), e eu coloquei-te sobre o monte santo de Deus. Ora, a ordem dos Querubins está subordinada à dos Serafins, como diz Dionísio. Logo, o anjo superior, dentre os que pecaram, não era superior a todos.
2. Demais. — Deus fez a natureza intelectual para que ela conseguisse a beatitude. Se portanto o anjo superior a todos pecou, segue-se que o plano divino, na mais nobre das criaturas, ficou frustrado, o que é inconveniente.
3. Demais. — Quanto mais um ser se inclina para outro, tanto menos poderá deste separar-se. Ora, o anjo, quanto mais elevado, tanto mais se inclina para Deus. Logo, tanto menos poderá, pecando, perder a Deus; e, assim, resulta que o anjo que pecou não foi o supremo de todos, mas estava entre os inferiores.
Mas, em contrário, diz Gregório: o primeiro anjo que pecou, por ser o chefe de todas as ordens dos anjos e lhes transcender o esplendor, era, comparado com eles, mais esplêndido.
Solução. — Duas coisas se devem considerar no pecado: a propensão e o motivo para pecar. Se, pois, considerarmos, nos anjos, a propensão, menos parece terem pecado os superiores que os inferiores. Por isso Damasceno diz que o maior dos que pecaram era o chefe dos da ordem terrestre. E esta opinião parece consoante à posição dos Platônicos referida por Agostinho. Pois, diziam eles, que todos os deuses eram bons; mas, dos demônios, uns bons, outros maus, chamando deuses às substâncias intelectuais superiores ao globo lunar e, demônios, as inferiores a esse globo, mas superiores aos homens na ordem da natureza. Nem se deve rejeitar esta opinião como alheia à fé, pois toda criatura corporal é governada por Deus, por meio dos anjos, como diz Agostinho. Donde, nada impede dizer-se, que os anjos inferiores estão divinamente ordenados a administrar os corpos inferiores; os superiores, porém, a administrar os corpos superiores; e por fim, os mais elevados de todos, a assistirem a Deus. E segundo esta opinião, Damasceno diz que os que caíram foram dos inferiores, na ordem dos quais, todavia, permaneceram alguns bons.
Se porém se considerar o motivo para pecar, é este maior nos superiores que nos inferiores. Pois, o pecado dos demônios foi a soberba, como antes se disse; e desta o motivo é a excelência, maior nos superiores. Por isso diz Gregório que pecou o mais elevado de todos; opinião que parece mais provável. Porquanto o pecado do anjo não procedeu de nenhuma propensão, mas somente do livre arbítrio. Por onde, mais digna de consideração parece ser a razão tirada do motivo para pecar. — Mas nem por isto se deve rejeitar a outra opinião, porque mesmo nos chefes dos anjos inferiores podia haver algum motivo para pecar.
Donde a resposta à primeira objeção. — Querubim quer dizer plenitude da ciência e, Serafim, ardentes ou que incendeiam. Assim, é claro que o Querubim tira a sua denominação da ciência, que pode ir com o pecado mortal; porém, a denominação de Serafim vem do ardor da caridade, que não pode coexistir com tal pecado. Por isso, o primeiro anjo pecador não era denominado Serafim, mas Querubim.
Resposta à segunda. — A intenção divina não se frustra nem nos que pecam nem nos que se salvam. Pois, Deus tem a presciência de um e outro acontecimento, dos quais tira glória para si, salvando a uns pela sua bondade, punindo aos outros pela sua justiça. Ora, a criatura intelectual, pecando, desvia-se do último fim. E nem isso repugna a qualquer criatura sublime, pois, a criatura intelectual foi criada por Deus, de natureza tal que esteja no arbítrio dela agir visando o fim.
Resposta à terceira. — Por maior inclinação que o mais elevado de todos os anjos tivesse para o bem, ela, todavia, não se lhe impunha com necessidade. Donde, podia não a seguir, com seu livre arbítrio.