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Art. 9 — Se Deus tem ciência do não-ser.

(I Sent., dist. XXXVIII, a. 4; III, dist. XIV, art. 2, q. 2; I Cont. Gent., cap. LXVI; De Verit., q. 2, art. 8).
 
O nono discute-se assim. — Parece que Deus não tem ciência do não-ser.
 
1. — Pois, Deus não tem ciência senão da verdade. Ora, o ser e a verdade convertem-se. Logo, Deus não tem ciência do não-ser.
 
2. Demais. — A ciência exige semelhança entre o ciente e o sabido. Ora, o que não existe não pode ter nenhuma semelhança com Deus, que é o ser mesmo. Logo, o que não existe, não pode ser conhecido por Deus.
 
3. Demais. — A ciência de Deus é a causa do que ele conhece. Ora, não há causa do não-ser porque o não-ser não tem causa. Logo, Deus não tem ciência do que não existe.
 
Mas, em contrário, diz o Apóstolo (Rm 4, 17): O qual chama as coisas que não são como as que são.
 
SOLUÇÃO. — Deus conhece todas as coisas de qualquer modo que existam. Pois, nada impede aquelas coisas, que absolutamente não existem, virem de algum modo, a existir. Ora, existem, absolutamente falando, as coisas existentes em ato; e as que não existem em ato existem em potência, em relação ou a Deus mesmo, ou, à criatura. Em potência ativa ou passiva; ou, em potência de opinar, de imaginar, ou de qualquer outro, modo de significar. Ora, tudo o que pode a criatura fazer, pensar ou dizer, e também tudo o que, Deus mesmo pode fazer, ele o conhece, ainda que não exista em ato. Logo, pode dizer-se, que tem ciência, mesmo do não-ser; Mas, há uma certa diversidade a que devemos atender, nas coisas não existentes em ato. Pois, certas, embora não existam atualmente, contudo, existiram ou hão de existir; e de todas essas se diz que Deus as conhece pela ciência de visão. Porque, medindo-se o conhecimento de Deus, que é o seu ser, pela eternidade que, existindo sem sucessão, compreende a totalidade dos tempos, a intuição presente de Deus abarca essa totalidade temporal e todas as coisas existentes em qualquer tempo, como seres que lhe estão presentes. Há outras coisas, porém, que estão no poder de Deus, ou da criatura, e que, contudo, nem existem, nem existirão, nem existiram e, em relação a essas, não se diz que Deus tem a ciência de visão, mas, a de simples inteligência. E assim dizemos, porque as coisas, que vemos, têm um ser distinto, fora de nós.
 
DONDE A RESPOSTA À PRIMEIRA OBJEÇÃO. — O que não existe em ato, mas, em potência, tem, nessa mesma medida, a verdade; pois é verdadeiro que existe em potência, e desse modo é conhecido de Deus.
 
RESPOSTA À SEGUNDA. — Deus, sendo seu próprio ser, cada ser é, na medida em que participa da semelhança de Deus, como cada ser é cálido, na medida em que participa do calor. E assim, as coisas existentes em potência, embora não existam em ato, são conhecidas por Deus.
 
RESPOSTA À TERCEIRA. — A ciência de Deus é causa das coisas, juntamente com a vontade. Por onde, não é necessário, que tudo o que Deus sabe, seja, ou fosse, ou haja de ser, mas, somente, aquilo que ele quer que seja ou permitir que seja. E, logo, não está na ciência de Deus que isso seja, mas que possa ser.
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