(II Sent., dist. XI, part. I, a. 1).
O primeiro discute-se assim. — Parece que os homens não são guardados pelos anjos.
1. — Pois, guardas se delegam para os que não sabem ou não podem se guardar a si mesmos, como as crianças e os doentes. Ora, o homem, pelo livre arbítrio, pode-se guardar a si mesmo; e sabe guardar-se pelo conhecimento natural da lei natural. Logo, não é guardado pelo anjo.
2. Demais. — A guarda mais forte torna inútil a mais fraca. Ora, os homens são guardados por Deus, conforme a Escritura: Não adormecerá, nem dormirá o que guarda Israel. Logo, não é necessário o homem ser governado pelo anjo.
3. Demais. — A perda do guardado redunda em negligência do guarda; por onde, diz a Escritura: Guarda este homem: se ele fugir, a tua vida responderá pela vida dele. Ora, muitos homens perecem quotidianamente caindo em pecado, aos quais os anjos não podem socorrer, ou aparecendo visivelmente, ou fazendo milagres, ou de qualquer modo semelhante. Portanto, os anjos seriam negligentes, se os homens lhes tivessem sido entregues à guarda, o que é claramente falso. Portanto, eles não são guardas dos homens.
Mas, em contrário, diz a Escritura: Mandou aos seus anjos acerca de ti, que te guardem em todos os teus caminhos.
Solução. — Conforme a disposição da divina providência, todas as coisas móveis e variáveis são movidas e regidas pelas imóveis e invariáveis. Assim, todos os seres corpóreos, pelas substâncias espirituais imóveis; e os corpos inferiores, pelos superiores, substancialmente invariáveis. E também nós somos regidos, quanto às conclusões, em relação às quais podemos opinar diversamente, pelos princípios a que invariavelmente nos atemos. Ora, é manifesto, que o conhecimento e os afetos do homem podem, em relação às coisas que ele deve fazer, multiplícemente variar e falhar, quanto ao bem. E por isso é necessário sejam delegados anjos para guarda dos homens, que os rejam e movam para o bem.
Donde a resposta à primeira objeção. — Pelo livre arbítrio o homem pode de certo modo evitar o mal, mas não suficientemente, porque os seus afetos bons são enfraquecidos pelas múltiplas paixões da alma. Semelhantemente, também o conhecimento universal da lei natural, que o homem naturalmente tem, de certo modo o dirige para o bem, mas não suficientemente, porque acontece que ele se engana muitas vezes, aplicando os princípios universais de direito às obras particulares. Por onde, diz a Escritura: Os pensamentos dos mortais são tímidos, e incertas as nossas providências. E, portanto, é necessária ao homem a guarda dos anjos.
Resposta à segunda. — Duas condições são necessárias para se fazer o bem: que o afeto se incline para ele, o que se dá em nós pelo hábito da virtude moral; e que a razão descubra vias congruentes para realizar o bem da virtude, o que o Filósofo atribui à prudência. Quanto à primeira, Deus guarda o homem, infundindo-lhe graça e virtudes. Quanto à segunda, guarda-o como instrutor universal, cuja instrução chega ao homem mediante os anjos como já se estabeleceu.
Resposta à terceira. — Assim como os homens desviam-se do instinto natural do bem, pela paixão do pecado; assim também desviam-se das inspirações dos bons anjos, que procedem invisivelmente, iluminando-os, para bem agir. E por isso não é por negligência dos anjos, mas por malícia própria, que eles perecem. E por graça especial de Deus é que eles, contra a lei comum, às vezes aparecem visivelmente aos homens; assim como também fazem milagres, contra a lei comum.