Domingo da Septuagésima
«Saiu cerca da terceira hora, viu outros, que estavam na praça ociosos, e disse-lhes: Ide vós também, para a minha vinha, e dar-vos-ei o que for justo» (Mt 20, 3)
Nestas palavras, quatro coisas são dignas de nota:
I. A bondade do Senhor. "Saiu", diz o Evangelho: saiu para a salvação do seu povo. Que Nosso Senhor tenha saído para conduzir os homens à vinha da justiça, é um ato de infinita bondade.
De cinco modos pode-se dizer que o Senhor saiu:
- No começo do mundo, como um semeador semeando as criaturas; "Saiu um semeador a semear a sua semente" (Lc 8, 5).
- Na sua natividade, iluminando o mundo, como aquilo de Isaías "brilhe a sua justiça como a aurora, e resplandeça a sua salvação como um facho" (Is 62, 1) e São João, "Saí do pai e vim ao mundo" (Jo 16, 28).
- Na sua paixão, resgatando os seus do poder do diabo e de todos os males. "A minha justiça está perto, saiu meu Salvador" (Is 51, 5).
- Para prover à sua família e às coisas, como um pai de família. "O reino dos céus é semelhante a um pai de família que, ao romper do dia, saiu a contratar operários para sua vinha" (Mt 20, 1)
- Enfim, sairá no dia do juízo e, como censor, argüirá severamente os ímpios; como invencível combatente, subjugará os rebeldes; como juiz, punirá os maus por seus atos.
II. A estultícia dos homens. Nada mais tolo na vida presente do que o homem que, ao invés de trabalhar para a eternidade, vive no ócio: "viu outros, que estavam na praça ociosos". A praça é a vida presente. A praça é o lugar dos litígios e do comércio, por isso significa a vida presente, pois compramos o progresso na graça e a glória do céu com as boas obras. E "viu que estavam na praça ociosos", pois já perderam parte de sua vida. Ociosos não são apenas aqueles que fazem o mal, mas também os que não fazem o bem. E assim como os ociosos não chegam a fim nenhum, assim também estes. O fim do homem é a vida eterna, quem, portanto, proceder como deve, não será ocioso e conseguirá a vida eterna.
É, portanto, uma grande tolice passar a vida presente no ócio; pois a ociosidade é má conselheira, sua ciência é má. É pelo ócio que perdemos os bens eternos; pois por um ócio breve adquirimos um labor eterno.
III. Necessidade de trabalhar na vinha do Senhor: "Ide vós também, para a minha vinha". Esta vinha, na qual são enviados para trabalhar, é a justiça e seus sarmentos, as virtudes. Nesta vinha devemos trabalhar de cinco modos:
- Plantar boas obras e virtudes;
- Arrancar os espinhos, i. é, os vícios;
- Cortar os supérfluos, "Toda a vara que não dá fruto em mim, ele a cortará" (Jo 15, 2).
- Impedir a ação das raposas, i. é, dos demônios;
- Protegê-la dos ladrões, i. é, guardando-se dos louvores e maledicências dos homens.
IV. Utilidade do trabalho: "dar-vos-ei o que for justo". O soldo do trabalho nesta vinha é o denário, que vale mil peças de prata. E sobre isto, diz o Cântico: "Salomão teve uma vinha, entregou-a aos guardas, cada um dos quais devia dar mil siclos de prata pelos frutos colhidos" (Ct 8, 11). Mil peças de prata são mil alegrias na eternidade, representadas pelo denário.
Serm. in Dom. Septuages.
(P. D. Mézard, O. P., Meditationes ex Operibus S. Thomae. Trad.: Permanência)