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Art. 3 — Se a virtude humana se divide suficientemente em moral e intelectual.

O terceiro discute-se assim. — Parece que a virtude humana não se divide suficientemente em moral e intelectual.
 
1. — Pois, a prudência é considerada meio entre a virtude moral e a intelectual, por ser enumerada entre as virtudes intelectuais1; por outro lado, todos comumente a colocam entre as virtudes cardeais, que são morais, como a seguir se verá2. Logo, a virtude não se divide suficiente e imediatamente em intelectual e moral.
 
2. Demais. — A continência, a perseverança e mesmo a potência não se incluem nas virtudes intelectuais. E nem são morais, por não constituírem um meio termo de paixões que, antes, nelas abundam. Logo, a virtude não se divide suficientemente em intelectuais e morais.
 
3. Demais. — A fé, a esperança e a caridade são virtudes. Mas não intelectuais, que são só as cinco seguintes: a ciência, a sabedoria, o intelecto, a prudência e a arte, como já se disse3. E também não são virtudes morais, por não dizerem respeito às paixões, a que se referem principalmente as virtudes morais. Logo, as virtudes não se dividem suficientemente em intelectuais e morais.
 
Mas, em contrário, diz o Filósofo: há duas espécies de virtudes; uma intelectual e outra moral4.
 
SOLUÇÃO. — A virtude humana é um hábito que aperfeiçoa o homem para obrar retamente. Ora, os atos humanos têm só dois princípios: o intelecto, ou razão, e o apetite; estes são os dois princípios motores no homem, como já se disse5. Por onde, toda virtude humana há de forçosamente ser perfectiva de um desses dois princípios. Se o for do intelecto especulativo ou prático, a virtude será intelectual; e moral, se da parte apetitiva. Donde se conclui, que toda virtude humana ou é intelectual ou moral.
 
Donde a resposta à primeira objeção. — A prudência é essencialmente uma virtude intelectual; mas, pela sua matéria, convém com as virtudes morais, pois é a razão reta das nossas ações, como já dissemos6; e portanto, se enumera entre as virtudes morais.
 
Resposta à segunda. — A continência e a perseverança não são perfeições da virtude apetitiva sensitiva. E isto bem o demonstra o continente e o perseverante, em quem superabundam as paixões desordenadas; e isso não se daria se o apetite sensitivo fosse aperfeiçoado por algum hábito, que o pusesse de conformidade com a razão. Pois, a continência ou perseverança é a perfeição da parte racional que se contrapõe às paixões, para esta não ser levada de vencida. É deficiente, porém da noção de virtude, porque a virtude intelectiva, que faz a razão comportar-se retamente em relação à atividade moral, pressupõe o apetite reto do fim, para poder haver-se com acerto em relação aos princípios, i. é, os fins, nos quais se baseia para raciocinar; ora, isto falta ao continente e ao perseverante. Por outro lado, também não pode ser perfeita a obra procedente das duas potências, se cada uma delas não for aperfeiçoada pelo devido hábito; assim como não pode resultar uma ação perfeita do agente principal, que se serve de um instrumento, por mais perfeito que ele seja, se o instrumento estiver mal disposto. Por onde, se o apetite sensitivo, movido pela parte racional, não for perfeito, por mais que esta última o seja, a ação conseqüente não poderá ser perfeita. E portanto, nem será virtude o princípio da ação; e por isso, a continência dos prazeres e a perseverança nos sofrimentos não são virtudes, mas algo menos que a virtude, como diz o Filósofo7.
 
Resposta à terceira. — A fé, a esperança e a caridade são superiores às virtudes humanas; pois, são virtudes do homem enquanto participante da graça divina.

  1. 1. VI Ethic. (lect. III, IV).
  2. 2. Q. 61, a. 1.
  3. 3. Q. 57, a. 2-5.
  4. 4. II Ethic., lect. I.
  5. 5. III De anima (lect. XV).
  6. 6. Q. 57, a. 4.
  7. 7. VII Ethic. (lect. I, IX).
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