Skip to content

Art. 2 — Se os hábitos existem na alma, mais pela essência do que pela potência.

 (II Sent., dist. XXVI, a . 3, ad 4, 5).
 
O segundo discute-se assim. — Parece que os hábitos existem na alma mais pela essência que pela potência.
 
1. — Pois, disposições e hábitos respeitam a ordem da natureza, como já se disse1. Ora, a natureza é relativa mais à essência da alma do que às potências da mesma, porque esta é, por essência, a natureza de um tal corpo e a sua forma. Logo, os hábitos estão na alma essencial mais do que potencialmente.
 
2. Demais — Não pode haver acidente de acidente. Ora, de um lado o hábito é um acidente e, de outro, as potências da alma também pertencem ao gênero dos acidentes, como já se disse na Primeira Parte2. Logo, o hábito não está na alma, em razão da sua potência.
 
3. Demais — O sujeito é anterior ao que nele existe. Ora, o hábito, pertencente à primeira espécie de qualidade é anterior à potência, que pertence à segunda. Logo, o hábito não tem na potência da alma o seu sujeito.
 
Mas, em contrário, o Filósofo introduz hábitos diversos nas diversas partes da alma3.
 
SOLUÇÃO. — Como já dissemos4, o hábito implica uma certa disposição ordenada para a natureza ou para a operação.
 
Se o considerarmos como ordenado para a natureza, ele não pode existir na alma; isto se nos referimos à natureza humana, porque a alma é em si forma completiva dessa natureza. Por onde, a esta luz, um hábito ou uma disposição existirá antes no corpo, ordenado para a alma, que na alma, ordenado para o corpo. — Se nos referimos porém a alguma natureza superior, da qual o homem possa tornar-se participante, conforme aquilo da Escritura (2 Pd 1, 4) — para que sejamos feitos participantes da natureza divina — então nada impede haja na alma essencialmente algum hábito, a saber, a graça, como a seguir se dirá5.
 
Se porém considerarmos o hábito relativamente à operação, então ele existe por excelência na alma, porque esta não é determinada a uma só operação, mas, é susceptível de muitas, o que é exigido para o hábito, como já dissemos6. E como, pelas suas potências, é que a alma é princípio das operações, os hábitos nela existem pelas potências da mesma.
 
DONDE A RESPOSTA À PRIMEIRA OBJEÇÃO. — A essência da alma pertence à natureza humana, não como sujeito que deve receber alguma outra disposição, mas como forma e natureza à qual qualquer disposição é relativa.
 
RESPOSTA À SEGUNDA. — Um acidente não pode, em si mesmo, ser sujeito de outro. Mas como mesmo entre os acidente há uma certa ordem, pode um sujeito, enquanto por sua vez é acidente, ser também sujeito de outro acidente. E então dizemos que um acidente é o sujeito de outro; assim, a superfície é sujeito da cor e, do mesmo modo, a potência pode ser sujeito do hábito.
 
RESPOSTA À TERCEIRA. — O hábito tem prioridade sobre a potência enquanto importa disposição para a natureza; a potência porém sempre implica relação com a operação, que é posterior, porque a natureza é o princípio da operação. Ao passo que o hábito, cujo sujeito é a potência, não implica em ordenar-se para a natureza, mas para a operação, e por isso é posterior à potência. — Ou podemos dizer que o hábito é anterior à potência como o completo o é ao incompleto e o ato, à potência; pois, o ato tem naturalmente, prioridade, embora a potência lhe seja anterior na ordem da geração e do tempo, como diz Aristóteles7.

  1. 1. Q. 49, a. 2.
  2. 2. Q. 77, a. 1, ad 5.
  3. 3. I Ethic. (lect. XX).
  4. 4. Q. 49, a. 2, 3.
  5. 5. Q. 110, a. 4.
  6. 6. Q. 49, a. 4.
  7. 7. VII et IX Metaph. (lect. VII).
AdaptiveThemes