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Art. 5 — Se a fé é uma virtude.

(Ia-IIae, q. 65, a. 4; III Sent., dist. XXIII, q. 2, a. 4, qa 1; q. 3, a. 1, qa2; De Verit., q. 14, a. 36; De Virtut., q.1, a. 7; Ad Rom., cap. I, lect. VI).
 
O quinto discute-se assim. — Parece que não é a fé uma virtude.
 
1. — Pois, a virtude, tornando bom quem a possui, como diz o Filósofo1, ordena para o bem. Ora, a fé ordena para a verdade. Logo, não é virtude.
 
2. Demais. — Mais perfeita é a virtude infusa, que a adquirida. Ora, a fé, pela sua imperfeição, não é considerada virtude intelectual adquirida, segundo claramente o diz o Filósofo2. Logo, com maior razão, não pode ser considerada virtude infusa.
 
3. Demais. — A fé informada e a informe são da mesma espécie, como já se disse3. Ora, a informe não é virtude, por não ter conexão com as demais virtudes. Logo, também não é a fé informada.
 
4. Demais. — A graça gratuita e o fruto distinguem-se das virtudes. Ora, a fé está enumerada entre as graças gratuitas (1Cor 12, 9); e também entre os frutos (Gl 5, 23). Logo, não é a fé uma virtude.
 
Mas, em contrário, o homem se justifica pelas virtudes; pois, a justiça é a virtude total, como diz Aristóteles4. Ora, o homem se justifica pela fé, no dizer da Escritura (Rm 5, 1): Justificados pois pela fé, tenhamos paz, etc. Logo, é a fé uma virtude.
 
SOLUÇÃO. — Como do sobredito resulta5, a virtude humana torna bom o ato humano. Por onde, todo hábito, que for sempre princípio de atos bons, pode considerar-se como virtude humana. Ora, tal hábito é a fé informada. Pois, sendo crer um ato do intelecto, que assente à verdade, por império da vontade, duas condições se requerem para esse ser perfeito. Uma, que o intelecto tenda infalivelmente para o seu bem, que é a verdade; outra, que infalivelmente se ordene ao fim último, por causa do qual a vontade assente à verdade. Ora, ambos esses elementos se encontram na fé informada. Pois, é da essência mesma da Fé, que o intelecto seja sempre levado para a verdade, pois a fé não é susceptível de falsidade, como já estabelecemos6. Ora, pela caridade, que informa a fé, a alma tem uma vontade que se ordena infalivelmente para um fim bom. Logo, é virtude a fé informada.
 
A fé informe, porém, não é virtude, porque, embora tenha o ato de fé informe a perfeição devida, por parte do intelecto, não a tem contudo por parte da vontade. Assim, como se a temperança existisse no concupiscível, e não existisse no racional a prudência, não seria a temperança virtude, como já dissemos7. Porque o ato de temperança exige um ato de razão e outro do concupiscível, assim como o ato de fé exige o ato da vontade e o do intelecto.
 
DONDE A RESPOSTA À PRIMEIRA OBJEÇÃO. — A verdade, em si mesma, é o bem do intelecto, pois é a perfeição dele. Por onde, enquanto que pela fé, o intelecto é determinado para o verdadeiro, a fé se ordena para um certo bem. Mas ulteriormente, enquanto informada pela caridade, também se ordena para o bem, como objeto da vontade.
 
RESPOSTA À SEGUNDA. — A fé de que fala o Filósofo se apóia na razão humana que não conclui necessariamente e é suscetível de falsidade. Por onde, essa fé não é virtude. Ao contrário, a fé de que tratamos, funda-se na verdade divina infalível, e portanto não é suscetível de falsidade. Portanto, tal fé pode ser virtude.
 
RESPOSTA À TERCEIRA. — A fé informada e a informe não diferem especificamente, como se pertencessem a espécies diversas. Diferem porém como, na mesma espécie, o perfeito, do imperfeito. Por onde, a fé informe, sendo imperfeita, não realiza perfeitamente a essência da virtude, pois, a virtude é uma certa perfeição como diz o Filósofo8.
 
RESPOSTA À QUARTA. — Certos ensinam que a fé enumerada entre as graças gratuitas, é a fé informe. — Mas não é esta opinião fundada, porque as graças gratuitas, no caso enumeradas, não são comuns a todos os membros da Igreja. Donde o dizer o Apóstolo: Há repartição de graças; e ainda: a um é dado isto, a outro, aquilo. Ora, a fé informe é comum a todos os membros da Igreja; porque o ser informe não lhe pertence à substância, enquanto dom gratuito. – Por onde, devemos dizer que fé, no caso vertente, deve ser tomada por alguma excelência dela, p. ex., pela constância, como diz a Glosa, ou pela linguagem da fé. Por outro lado, é a fé considerada como fruto, enquanto o seu ato produz certo deleite, em razão da certeza. Por isso, quando o Apóstolo enumera os frutos, a Glosa explica que é a fé a certeza do invisível.

  1. 1. II Ethic. (lect. VI).
  2. 2. VI Ethic. (lect. II, III).
  3. 3. Q. 4, a. 4.
  4. 4. V Ethic. (lect. II)
  5. 5. Ia-IIae, q. 56, a. 3.
  6. 6. Q. 1, a. 3
  7. 7. Ia-IIae, q. 65, a. 1.
  8. 8. VII Phys. (lect. VI).
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