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Art. 1 – Se os atos nocionais se devem atribuir às Pessoas.

O primeiro discute-se assim. – Parece que os atos nocionais não se devem atribuir às pessoas.
 
1. – Pois, diz Boécio, que todos os gêneros aplicados à divina predicação, transformam-se na substância divina, exceto os relativos1. Ora, a ação é um dos dez gêneros. Se, pois, alguma ação é atribuída a Deus, pertencer-lhe-á à essência e não, à noção.
 
2. Demais. – Agostinho ensina, que tudo o que se diz de Deus, substancial ou relativamente se diz2. Ora, o que respeita à substância é ex­presso pelos atributos essenciais; porém o que respeita à relação é expresso pelos nomes das pessoas e pelos das propriedades. Logo, além destas atribuições, não se devem atribuir às pes­soas os atos nocionais
 
3. Demais. – É próprio da ação provocar a paixão. Mas, em Deus, não se admitem pai­xões. Logo, nem se devem nele admitir atos nocionais.
 
Mas, em contrário,diz Agostinho (Fulgên­cio): É próprio certamente do Pai o ter gerado o Filho3. Ora, a geração é um determinado ato. Logo, devemos admitir em Deus atos nocionais .
 
Solução. – Nas Pessoas divinas, conside­ra-se a distinção relativamente à origem. Ora, a origem não pode ser convenientemente desig­nada senão por certos atos. Por onde, para exprimir a ordem da origem, nas Pessoas divi­nas, é necessário atribuírem-se às Pessoas atos nocionais.
 
Donde a resposta à primeira objeção. – Toda origem é designada por algum ato. Ora, a Deus pode ser atribuída uma dupla ordem de origem. Uma, enquanto a criatura dele procede, o que é comum às três Pessoas. Por onde, as ações atribuídas a Deus, para designar a pro­cessão das criaturas, dele, pertencem à essência. Porém, considera-se em Deus outra ordem de origem enquanto uma Pessoa procede de outra. Por isso, os atos que designam a ordem dessa origem são nocionais, porque as noções das Pessoas são as relações mútuas delas, como do sobredito resulta4.
 
Resposta à segunda. – Os atos nocionais, considerados somente no seu modo de significar, diferem das relações das Pessoas; mas, na rea­lidade, são-lhes absolutamente idênticos. Por isso, diz o Mestre das Sentenças, que a geração e a natividade se chamam, por outros nomes, paternidade e filiação. – Para evidenciá-lo de­vemos atender a que, primeiramente, podemos atribuir a origem de uma coisa, a outra, pelo movimento. Pois é claro que só ao movimento, como causa, podemos atribuir a modificação, que um ser sofreu nas suas disposições. Por onde, a ação, na sua significação primária, importa origem do movimento. Pois, assim como o movi­mento, enquanto existente num móvel e proce­dente de outro, chama-se paixão, assim tam­bém, a origem desse mesmo movimento, enquanto causada por outro movimento e ter­minada no móvel, chama-se ação. Por onde, removido o movimento, a ação nada mais implica senão a ordem da origem, enquanto que o proveniente de um princípio procede de algu­ma causa ou princípio. Por isso, como em Deus não há movimento, a ação pessoal de quem produz a Pessoa não é senão os modos de se haver do princípio para com a Pessoa oriunda desse principio. E tais modos são as próprias relações ou noções. Mas, como nós não podemos falar das coisas divinas e inteligíveis senão ao modo das coisas sensíveis, das quais tiramos o conhecimento e cujas ações e paixões, enquanto implicam movimento, diferem das relações re­sultantes dessas ações e paixões; foi necessário exprimir os modos de se haver das Pessoas, separadamente, como atos e como relações. E assim é claro, que são idênticos na realidade, diferindo somente quanto ao modo de signi­ficar.
 
Resposta à terceira. – A ação, enquanto importa a origem do movimento, implica por si mesma a paixão. Por isso, não se admite ação nas Pessoas divinas. Por onde, nelas se não admitem paixões, senão apenas gramaticalmente falando, quanto ao modo de significar; assim como ao Pai atribuímos o gerar e ao Filho, o ser gerado.

  1. 1. De Trin., c. 4.
  2. 2. V de Trin., c. 4.
  3. 3. De Fide ad Petrum, c. 2.
  4. 4. Q. 32, a. 2, 3.
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