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Introdução

Por ocasião do quadragésimo aniversário da abertura do Concílio Vaticano II, alguns católicos, entre bispos, padres e leigos, reuniram-se em simpósio no Instituto Universitário São Pio X, nos dias 4 e 5 de outubro de 2002. Eles estudaram os textos do Concílio que se definiu como pastoral e não dogmático, à luz da Tradição da Igreja. A coerência interna da doutrina conciliar foi posta em evidência. Eis a síntese que eles gostariam de apresentar.

Síntese da doutrina de Vaticano II

1- A novidade: Vaticano II elabora um novo cristianismo, na medida da "fase nova da história [do gênero humano]" (GSnº4§2), inclusive na ordem espiritual. Trata-se, no dizer dos próprios historiadores e sociólogos, de uma religião diferente: apesar de reivindicar não haver mudança de fé, a religião é profundamente transformada pelo aggiornamento espiritual que traz a desordem entre os dogmas (cf. UR nº11 sobre a hierarquia das verdades)

2- A Inversão de fins: A nova relação entre o cristão e seu Deus resume-se na idéia de "serviço do homem" (GS nº3). De fato, ele é "a única criatura que Deus quis por si mesma" (GS nº24§3). Ele aparece no plano temporal como "centro e ponto culminante" de tudo. (GS nº12). O homem torna-se, portanto, um fim para a própria Igreja, a qual será definida doravante como "sacramento, isto é, um sinal e um meio" para o homem (LG nº1). Esta idéia do serviço do homem inverte o coração da religião, pois a vocação do homem é estar à serviço de Deus, da Igreja e do próximo, na Caridade.

3- A consciência é fonte da religião: A verdade religiosa aparece à consciência do homem (DH nº 1 e 3) por sua luz própria (DH nº 1). O documento Dei Verbum, que trata das fontes da fé, não afirma que nós acreditamos em razão da autoridade de Deus que se revela, mas apresenta a fé como  resposta existencial do homem ao "diálogo da salvação" (DV nº5) exercido por Deus (DV nº2). Neste documento, o depósito da fé não aparece mais em seu contúdo objetivo e imutável, mas é transmitido pela "tradição viva" (DV nº12), pela qual "a Igreja, ao longo dos séculos, tende contínuamente para a plenitude da verdade divina" (DV nº8)

4- Uma teologia da celebração: A liturgia deve tornar-se a expressão privilegiada dessa nova religião. Daqui para a frente, o homem cristão - consagrado pelo batismo - é o sujeito do rito sagrado e do sacerdócio (LG nº 9 a 11). Tema fundamental da constituição "Sacrosanctum Concilium", a "participação ativa" dos fiéis não é a participação fervorosa desejada por São Pio X, mas da assembléia enquanto atora do rito. A celebração se apresenta como um memorial, não da cruz, mas da ceia, onde a assembléia se oferece ela mesma.

5- A Igreja torna-se um sacramento: "A Igreja do Concílio" (cf. Paulo VI, discurso de encerramento, 7/12/1965) entende ser somente um "sinal" da presença invisível de Deus entre os homens (UR nº2), renunciando a ser a única sociedade de salvação. Enquanto sinal, ela é um "meio" (LG nº1) a serviço da vinda do verdadeiro Reino de Deus, o qual se estende às dimensões do universo (LG nº5). A doutrina da Igreja-sacramento, tornada clássica após o Concílio, sintetiza esta temática. Ela nos afasta da realidade da Igreja, sociedade visível a qual pertencemos pelo batismo, pela profissão de fé católica e pela submissão aos legítimos pastores.

6- A humanidade apresentada como Reino: As religiões convergem para este reino (NA). Ele coincide com o gênero humano inteiro, enquanto este tende à unidade (LG nº1; GS nº42 §3) A Igreja do Concílio, junto com as instituições públicas e privadas, deverá servir esta unidade crescente cujos sinais - verdadeiros sinais dos tempos, no dizer de João XXIII - são a "socialização de todas as coisas" (distribuição de rendas), "a revindicação dos direitos dos homens" (GS nº41 §1) e a preocupação comum com os valores espirituais (ecumenismo, diálogo interreligioso) (GS nº42) a serviço da paz mundial. A idéia tradicional de cristandade pelo reinado social de N. Sr Jesus Cristo aparece como caduca, tendo a Igreja aderido à visão liberal do laicismo do Estado, como sendo o único capaz de favorecer a unidade do gênero humano. (cf. a política concordatária de Paulo VI com os estados católicos após o Concílio) Esta adesão ao liberalismo aparece como condição da influência cristã e confere à Igreja do Concílio um papel político (GS nº42 §2).
Devemos assinalar que a "unidade do gênero humano" não é uma idéia cristã (p. ex. Jo V,28-29) mas um esquema gnóstico que se encontra na tradição maçônica (discurso de Ramsay, 1737) e que o Pe. Teilhard de Chardin usou como objeto teológico antes do concílio.

7- A unidade espiritual da humanidade: Teologicamente, esta noção de unidade do gênero humano se apresenta sob a forma de graus de comunhão (UR nº3). Para favorecer a unidade religiosa do gênero humano, a Igreja deve se arrepender do seu passado (UR nº3 e GS nº19§3 e 21§5) e entrar em diálogo com todos os grupos religiosos (cf. Paulo VI, Ecclesiam Suam, 1964). Não é mais necessário de impor a eles uma conversão à Igreja Católica já que se pretende que todos os cristãos, mesmo não católicos já estejam unidos a Cristo pelo batismo (LG nº15) e que os não cristãos sejam ordenados ao povo de Deus (LG nº16) e possuam em suas religiões as "sementes do Verbo" (AG nº11).

8- A salvação: Paralelamente a este crescimento histórico da unidade do gênero humano, a Incarnação do Filho de Deus realiza, "de certo modo" a identificação de todos os homens a Cristo (GS nº22). A questão fundamental da salvação ou da condenação perde sua urgência. Doravante a pastoral conciliar vai economizar no que toca o pecado original e a queda da natureza humana. A salvação torna-se uma tomada de consciência.

Conclusão

Vaticano II mostra-se em ruptura radical com a Tradição católica.

Enquanto esta é toda centrada em Deus, seu louvor e seu serviço, não seria exagero considerar que o Concílio estabeleceu as bases de uma nova religião destinada principalmente a exaltar a pessoa humana e a realizar a unidade do gênero humano.

Os membros do Simpósio (62 conferencistas entre os quais 25 leigos) reafirmam seu apego indefectível à religião católica tal como foi vivida pelos fiéis e ensinada por todos os papas até às vésperas de Vaticano II.

Leia os relatórios das comissões:

 

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