O oitavo discute-se assim. – Parece que a ordem da caridade não é objeto de preceito.
1. – Pois, todo aquele que transgride um preceito pratica uma injustiça. Ora, quem ama a outrem quanto deve, e mais ama a um terceiro, a ninguém faz injustiça. Logo, não transgride o preceito e, portanto, a ordem da caridade não constitui objeto de preceito.
2. Demais. – O que constitui objeto de preceito para nós, a Escritura nô-lo ensina suficientemente Ora, a Escritura em lugar nenhum nos ensina a ordem da caridade supra-referida. Logo, não constitui objeto de preceito.
3. Demais. – A ordem implica uma certa distinção. Ora, sem nenhuma distinção é preceituado o amor do próximo, quando se diz Amarás a teu próximo como a ti mesmo. Logo, a ordem da caridade não constitui objeto de preceito.
Mas, em contrário. – O que Deus obra em nós pela graça, ele nos ensina pelos preceitos da lei, conforme aquilo da Escritura. Imprimirei a minha lei nas suas entranhas, Ora, Deus causa em nós a ordem da caridade, segundo a Escritura: ordenou em mim a caridade. Logo, a ordem da caridade constitui objeto de preceito.
SOLUÇÃO. – Como dissemos, o modo pertinente à natureza do ato virtuoso constitui objeto do preceito, que regula o ato da virtude. Ora, a ordem da caridade pertence à natureza mesma da virtude, pois, é estabelecida sobre a proporção entre o amor e o objeto amado, segundo do sobredito resulta. Por onde, é manifesto que a ordem da caridade deve constituir objeto de preceito.
DONDE A RESPOSTA À PRIMEIRA OBJEÇÃO. – O homem mais satisfaz Aquele a quem mais ama. E assim, quem amasse menos aquele a quem devesse amar mais, quereria satisfazer mais aquele a quem menos devia fazê-la. E então seria feita injustiça aquele a quem mais devia amar.
RESPOSTA À SEGUNDA. – A Sagrada Escritura enumera os quatro objetos a serem amados com caridade. Assim, quando manda amarmos a Deus de todo o coração, dá a entender que devemos amá-la acima de tudo. Quando manda amarmos ao próximo como a nós mesmos, antepõe o amor de nós mesmos ao do próximo. Semelhantemente, quando nos diz que devemos dar a nossa vida pelos nossos irmãos, isto é, a vida corpórea, dá a entender que devemos amar mais ao próximo que ao nosso próprio corpo. Do mesmo modo quando manda, façamos bem principalmente aos domésticos da fé, e censura quem não tem cuidado dos seus e principalmente dos da sua casa, dá a entender que dentre os próximos, devemos amar mais os melhores e os mais chegados.
RESPOSTA À TERCEIRA. – A expressão: Amarás ao teu próximo - dá consequentemente a entender que os que nos são mais chegados devem ser mais amados.