O segundo discute-se assim. – Parece que a discórdia não é filha da vanglória.
1. – Pois, a ira é vício diferente da vanglória. Ora, a discórdia parece ser filha da ira, conforme aquilo da Escritura: O homem iracundo provoca rixas. Logo, não é filha da vanglória.
2. Demais. – Agostinho, expondo aquilo do Evangelho - Ainda o Espírito não fora dado - diz: A inveja separa, a caridade une. Ora, a discórdia não é senão uma certa separação da vontade. Logo, a discórdia procede da inveja, isto é, da inveja, mais que da vanglória.
3. Demais. – Aquilo de que nascem muitos males é vício capital. Ora, tal é a discórdia; pois, ao lugar da Escritura. - Todo reino dividido contra si mesmo será desolado - diz Jerônimo: Assim como, pela concórdia, as coisas pequenas crescem, assim, pela discórdia as maiores caem em ruína. Logo, a discórdia mesma deve ser considerada vício capital, mais que filha da vanglória.
Mas em contrário, é a autoridade de Gregório.
SOLUÇÃO. – A discórdia implica certa separação das vontades, que consiste em se apegar a vontade de um a uma coisa, e a de outro, à outra. O apegar-se a vontade de um ao que lhe é próprio provém de preferirmos o nosso ao bem alheio; o que, se o fazemos desordenadamente, é próprio da soberba e da vanglória. Por onde, a discórdia, que nos leva a buscar o nosso bem próprio e nos afastarmos do que é de outrem, é considerada filha da vanglória.
DONDE A RESPOSTA À PRIMEIRA OBJEÇÃO. – A rixa não é o mesmo que a discórdia. Pois, a rixa consiste na obra exterior; por isso é propriamente causada pela ira, que move o ânimo a danificar o próximo. Ao passo que a discórdia consiste na separação dos movimentos da vontade, o que é produzido pela soberba ou pela vanglória, pela razão já dada.
RESPOSTA À SEGUNDA. – Na discórdia distinguimos, como termo de origem, a separação da vontade, de outrem; e então é causada pela inveja. Como termo final, o apego ao nosso bem próprio, e então é causada pela vanglória. E como, o termo final de qualquer movimento tem prioridade sobre o termo de origem, por ser o fim mais principal que o princípio, a discórdia é considerada, antes, filha da vanglória que da inveja, como se disse.
RESPOSTA À TERCEIRA. – Pela concórdia as coisas pequenas crescem e, pela discórdia, as maiores caem em ruína, porque a virtude, quanto mas unida, tanto mais forte, e diminui pela separação, como diz um autor: Por onde, é claro que isso constitui um efeito próprio da discórdia, que é a divisão das vontades; mas não provém de se originarem da discórdia diversos vícios, o que lhe daria a natureza de vício capital.